TOXICIDADE DO MONÓXIDO DE CARBONO Gás asfixiante bioquímico, incolor, inodoro, sem sabor, não irritante, mais leve que o ar, subproduto da combustão incompleta de combustíveis orgânicos. Mecanismos bioquímicos envolvidos na toxicidade do CO A hemoglobina é uma proteína – é um tretâmero – tem 4 cadeias polipéptidicas ligadas duas a duas por ligações não covalentes. Cada cadeia é chamada de globina e tem ligado a si covalentemente um grupo heme, onde se ligará o oxigénio. Assim, cada molécula de hemoglobina pode ligar-se a 4 de oxigénio. O grupo heme é composto por uma parte orgânica (protoporfirina IX) e por um átomo de ferro. Cada grupo heme é um complexo de ferro ( II ) de geometria octaédrica, coordenado por quatro ligações com uma molécula de porfirina (tetradentada) e outras duas ligações perpendiculares a esta molécula , uma delas disponível para a ligação aos gases da respiração O2 e CO2. O heme está localizado numa fenda próxima da face externa da molécula de hemoglobina, delimitada por cadeias laterais de resíduos hidrofóbicos. É este ambiente apolar que torna possível a ligação reversível do oxigénio ao ferro sem que este seja oxidado. Esse átomo está directamente ligado a duas histidinas chamadas de histidina proximal e histidina distal. Pela reacção: Hb + O2 HbO2 A ligação do oxigénio à Hb é feita através do ião Fe2+ do grupo heme. O ferro está directamente ligado à histidina proximal (F8), fora do plano hémico. Durante a oxigenação da Hb o ferro aproxima-se do grupo heme e esse movimento é transmitido às outras subunidades da Hb pela histidina, que assim também se ligarão a outros O2. É uma ligação cooperativa, a ligação num grupo heme aumenta a tendência para a ligação no segundo e assim sucessivamente MAS… A afinidade da hemoglobina ao CO é cerca de 240x maior que para O2. A molécula de hemoglobina também se liga ao monóxido de carbono, tendo para ele uma maior afinidade. Isto vai provocar um défice de oxigenação dos tecidos. O monóxido de carbono combina-se com a ferro-hemoglobina, bloqueando o transporte de oxigénio: Hb + CO HbCO (carboxihemoglobina) HbO2(aq) + CO (g) ⇄ HbCO (aq) + O2 (g) O mecanismo de toxicidade do monóxido de carbono melhor delineado é a sua capacidade de ligação competitiva nos sítios dos grupos heme da hemoglobina, que se traduz numa redução da quantidade de O2 no sangue arterial Este efeito é magnificado pelas propriedades alostéricas da hemoglobina: sua estrutura tetramérica sofre uma mudança na sua conformação quando o monóxido de carbono se une a um dos seus quatro grupos heme, continuando a permitir a ligação do O2 aos restantes heme. Esta ligação é reversível, porém muito mais estável quando comparada à associação hemoglobina-oxigénio. Tem uma velocidade de dissociação 1500 vezes mais lenta do que a da oxihemoglobina, com uma afinidade 200 a 300 vezes maior pela molécula de heme (como já foi dito). Devido à alteração da conformação da sua estrutura a curva de dissociação da hemoglobina é alterada para a esquerda e muda a sua forma de sigmóide para hipérbole. Assim, o resultado e uma molécula de hemoglobina incapaz de libertar o O2 para os tecidos. Um grupo heme isolado em solução tem muito maior afinidade pelo CO do que pelo O2; contudo, com o heme na hemoglobina a afinidade pelo CO diminui porque a histidina distal que está ligada ao ferro faz com que a ligação do CO ao ferro tenha de ser angular e não linear. Isto dificulta a ligação de CO ao heme, torna-a mais fraca. Além disso, impede a oxidação do grupo heme ao estado férrico (mantém-se Fe2+) permitindo que o O2 se ligue. (isto porque só há ligação quando o ião de ferro está no estado ferroso/reduzido) Ainda assim, pequenas quantidades de CO reduzem dramaticamente a capacidade de transporte de oxigénio, até porque o sistema nervoso central vai responder a estas alterações com um esforço respiratório, aumentando ainda mais a quantidade de CO. Sintomas Como a hemoglobina tem uma afinidade cerca de 200 vezes maior para o monóxido de carbono do que para o oxigénio quando este composto é inalado, a capacidade da hemoglobina para transportar oxigénio reduz dramaticamente. Este facto conduz a uma hipoxia celular que será a causa dos sintomas verificados em paciente que sofrem de envenenamento por monóxido de carbono. Quando o ar inspirado contem uma concentração de 0,02% de CO ocorrem dores de cabeça, tonturas, náusea e sintomas parecidos com os da gripe. Com exposição prolongada com uma concentração superior a 1% cerca de 20% dos locais activos de ligação ao oxigénio são bloqueados pelo CO, conduzindo a danos no sistema nervoso central e no coração, que conduzirão a disritmias, ataques, isquémia cardíaca e em envenenamento severo até mesmo coma e morte. Sequelas devido a um envenenamento agudo ocorrem com frequência. A exposição crónica a este gás pode conduzir a depressões severas, confusão e perda de memória. O monóxido de carbono pode causar ainda severas deformações fetais. Pacientes com patologias cardíacas e grávidas são grupos de alto risco. O tratamento para o envenenamento por CO consiste em administração de oxigénio e em casos extremos, terapia em câmaras hiperbáricas. Fontes endógenas O CO é um gás gerado pela acção das isoenzimas hemeoxigenases (constitutiva e indutível) ou pela peroxidação não enzimática dos lípidos da membrana celular. As isoenzimas são enzimas que diferem entre si na sequência de aminoácidos, embora catalisem a mesma reacção. Além disso, apresentam parâmetros cinéticos diferentes (Km, propriedades reguladoras). Na degradação da hemoglobina, a enzima heme oxigenase (HEOX) promove a degradação do grupo heme através da abertura do anel de tetrapirrol da porfirina. Ocorre com duas oxigenações e usa NADPH como poder redutor para libertar Fe2+, CO e biliverdina, um pigmento verde em macrófagos no baço, fígado e medula óssea. A componente proteica (globina) é degradada nos seus aminoácidos constituintes para reutilização. Posteriormente, a maior parte da bileverdina é reduzida pela enzima biliverdina redutase. Esta enzima catalisa a adição de um hidrogénio fornecido pelo NADPH para reduzir a ligação dupla entre os pirróis III e IV, formando-se a bilirrubina, um pigmento amarelo que será encaminhado para o fígado para a sua posterior transformação. O excesso de bilirrubina no plasma sanguíneo designa-se por hiperbilirrubinémia. Quando ultrapassa a concentração de 2.5 mg/dl de plasma, a bilirrubina difunde-se nos tecidos, causando icterícia. A bilirrubina apresenta propriedades antioxidantes, sendo constituinte da bilis. O Fe3+ é isolado pela ferritina e reutilizado para síntese de hemoglobinas. O CO activa a enzima guanilil ciclase, o que induz a produção de 3,5-monofosfato de guanosina cíclico. Esta enzima oxida-se durante o processo de degradação do grupo heme. Para poder degradar uma novo grupo heme, a isoenzima necessita da acção redutora da redutase da família citocromo P450. Esta é uma superfamília muito ampla e diversificada de hemoproteínas. Normalmente constituem parte de multicomponentes das cadeias de transferência de electrões. A reacção mais comum catalisada pelo citocromo P450 é uma reacção mono-oxigenase, isto é, inserção de um átomo de oxigénio num substrato orgânico (RH) enquanto o outro átomo de oxigénio é reduzido a água: RH + O 2 + 2H+ + 2e– → ROH + H2O Curiosidade: Porque é que o excesso de carne vermelha na dieta pode actuar como factor desencadeante para a doença de Parkinson do tipo esporádico? Na deficiência dos co-factores da enzima redutase da família citocromo P450 (as formas activas da vitamina B2 – FAD e FMN) a degradação do grupo heme pela HEOX encontra-se limitada, pois esta deixa de ser ciclicamente reconstituída na sua forma reduzida (activa), com consequente elevação sobrecarga de ferro às células nervosas. Sinalização Celular Podemos definir a Sinalização celular como um meio de comunicação que existe entre as células de um organismo, esta comunicação sendo feita através da troca de sinais químicos entre as células e da captação de estímulus provenientes do meio ambiente isto tudo sendo primordial para o ciclo celular. Pois é graças a essa comunicação celular que as células recebem sinais que lhes permite em seguida determinar a suas funcões e posiçoes no organismo. As moléculas que participam nessa comunicaçao celular são: proteínas, nucleotídeos, esteróides, retinóides, óxido nítrico e monóxido de carbono. A maior parte dessas moléculas são secretadas por células sinalizadoras por meio da exocitose, outras se difundem através da membrana e outras ainda permanecem firmemente ligadas à superfície celular e só influenciam células que entram em contacto com a célula sinalizadora. Podemos ainda observar que nesta comunicação existem células sinalizadoras e Células-alvo. Na superfície ou no citoplasma das Células-alvo estão receptores específicos que reconhecem as moléculas sinalizadoras extra celulares. A célula-alvo responde ao sinal através de uma proteína denominada receptor, que ao ligar-se à molécula sinalizadora desencadeia sinais geralmente intracelulares alterando o comportamento da membrana. Em alguns casos o receptor está dentro da célula e o ligamento precisa entrar para ativá-la. Existem diferentes formas das células secretoras atingirem os receptores das células alvo: sinalização parácrina, sinalização endócrina e sinalização sináptica. • • • • • O monóxido de carbono, presente no organismo, é gerado pela enzima heme oxigenase (HO) durante a degradação de heme. Das três diferentes isoformas da enzima HO, a isoforma constitutiva HO-2 parece ser a responsável pela síntese de CO no trato gastrointestinal. A enzima HO-2 pode estar presente nos neurónios entéricos em várias espécies, incluindo o Homem. No trato gastrointestinal, o CO hiperpolariza e relaxa as células do músculo liso circular do intestino delgado, modulando uma corrente de K+ lenta, enquanto que, no músculo liso vascular, o CO parece activar um canal de K+ de alta condutância dependente de Ca2+. O CO medeia também a dilatação de artérias cerebrais activado os canais K Ca, contribuindo assim para a regulação do fluxo sanguíneo cerebral. Fins Terapêuticos Existem já entidades que dedicam o seu trabalho ao desenvolvimento de terapias à base de monóxido de carbono, para combater doenças como a esclerose múltipla, artrite reumatóide, a asma, a trombose ou a doença de Alzheimer. Sabe-se hoje que o monóxido de carbono está presente naturalmente no organismo humano e tem propriedades vasodilatadoras e anti-inflamatórias, entre outras. As terapias com monóxido de carbono são tanto mais eficazes quanto mais directamente forem aplicadas nos tecidos. Estes medicamentos exercem a sua acção terapêutica muito abaixo dos níveis de toxicidade que costuma associar-se ao monóxido de carbono. Tratamento da esclerose múltipla associada ao monóxido de Carbono: Uma investigação realizada por uma equipa de investigadores portugueses revelou que o monóxido de carbono evita o desenvolvimento de esclerose múltipla, divulgou esta segunda-feira o Instituto Gulbenkian de Ciência de Oeiras (IGC), onde o estudo foi desenvolvido. O estudo teve como objectivo verificar se os mecanismos de protecção que previnem lesões de tecidos poderiam ser usados para travar o desenvolvimento da esclerose múltipla. Esta hipótese teve na base descobertas anteriores do laboratório de Miguel Soares, que revelaram que as células que expressam o gene heme-oxygenase-1, que codifica uma proteína produtora de monóxido de carbono, estão protegidas contra lesões provocadas pelo sistema imune. Assim, este estudo vem agora demonstrar que o monóxido de carbono previne a formação de lesões neuronais associadas ao desenvolvimento de uma síndrome relacionada com esclerose múltipla em ratinhos (encefalomielite auto-imune experimental). A investigação permitiu verificar que a indução farmacológica da proteína heme-oxygenase-1 ou a exposição a níveis baixos de monóxido de carbono por inalação pararam a progressão da esclerose múltipla em ratinhos. Estes resultados sugerem assim que a modulação daquela proteína ou a exposição a monóxido de carbono (um gás tóxico em concentrações elevadas) poderão ser usadas de forma terapêutica no combate à esclerose múltipla, e provavelmente no tratamento de outras doenças auto-imunes, em humanos. A esclerose múltipla resulta de um ataque por parte do sistema imunitário às células do sistema nervoso central. Uma vez que é o próprio sistema imunitário o agente causador da doença, a esclerose múltipla é reconhecida como uma doença auto-imune.