Parte III: Economia Monetária Internacional

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PARTE III
A ECONOMIA
MONETÁRIA
INTERNACIONAL
1
ÍNDICE
Capítulo 8 – O mercado cambial
4
8.1. O mercado cambial e as taxas de câmbio
5
8.1.1. Definição e funções do mercado cambial
5
8.1.2. A taxa de câmbio
6
8.1.2.1. Cotação ao incerto e cotação ao certo
6
8.1.2.2. Taxa de câmbio à vista e taxa de câmbio a prazo
7
8.1.2.3. Taxa de câmbio nominal, real e efectiva
8
8.1.2.4. Taxa de câmbio bid e taxa de câmbio ask
9
8.1.3. Regimes cambiais e determinação da taxa de câmbio à vista
10
8.1.3.1. Regime de câmbios flexíveis
10
8.1.3.2. Regime de câmbios fixos
11
8.1.3.3. Outros regimes cambiais
11
8.1.4. Arbitragem das taxas de câmbio, risco cambial e especulação
12
8.1.4.1. A arbitragem em dois pontos (ou espacial) e a unicidade
das taxas de câmbio
12
8.1.4.2. A arbitragem em três pontos (ou triangular) e a consistência
das taxas de câmbio
13
8.1.4.3. Risco cambial
14
8.1.4.4. A cobertura comercial
15
8.1.4.5. A arbitragem das taxas de juro com cobertura do risco
de câmbio: a condição de paridade dos juros coberta
17
8.1.4.6. Especulação
19
8.2. Teorias explicativas do valor da taxa de câmbio
21
8.2.1. Paridade dos poderes de compra e lei do preço único
21
8.2.2. Versão absoluta e versão relativa da paridade dos poderes de compra
22
8.2.2.1. Versão absoluta
22
8.2.2.2. Versão relativa
22
8.2.3. Versão generalizada da paridade dos poderes de compra
23
Anexos do Capítulo 8
25
Anexo 8.1: Taxas de câmbio de referência diárias
26
Anexo 8.2: Evolução de algumas taxas de câmbio bilaterais
27
Anexo 8.3: Taxas de câmbio nominais, reais e efectivas
29
Anexo 8.4: Taxas de câmbio bid e ask
30
2
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
31
9.1. Caracterização da Balança de Pagamentos
32
9.1.1. Definições e convenções acerca da Balança de Pagamentos
32
9.1.2. Princípio do registo contabilístico
33
9.1.3. Componentes da Balança de Pagamentos e identidades fundamentais
34
9.1.3.1. Balança de Transacções Correntes
34
9.1.3.2. Balança de Capitais
34
9.1.3.3. Balança Básica
35
9.1.3.4. Balança de Operações Não Monetárias
35
9.1.3.5. Balança de Operações Monetárias
35
9.1.4. Excepções ao critério de residência
36
9.1.5. O financiamento do défice da BTC
37
9.1.6. Os aspectos monetários da Balança de Pagamentos
38
9.2. A abordagem monetária da Balança de Pagamentos
39
9.2.1. O conceito de desequilíbrio da Balança de Pagamentos
39
9.2.2. O modelo monetário
40
9.2.2.1. Hipóteses e equações do modelo
40
9.2.2.2. A equação monetária para a determinação da taxa de câmbio
43
9.2.3. Efeitos de uma desvalorização
44
9.2.4. Críticas à abordagem monetária
45
Anexos do Capítulo 9
47
Anexo 9.1: Dados sobre a Balança de Pagamentos Portuguesa
48
Capítulo 10 – A integração monetária
49
10.1. As teorias sobre as zonas monetárias óptimas
50
10.2. Os custos e os benefícios da integração monetária
52
10.2.1. Os custos da integração monetária
52
10.2.2. Os benefícios da integração monetária
54
10.2.3. A relação entre os custos/benefícios da moeda única e o grau de
abertura dos países
55
Exercícios sobre o Capítulo 10
57
Bibliografia e sítios utilizados/recomendados
58
3
CAPÍTULO 8
O mercado cambial
4
Capítulo 8 – O mercado cambial
Existe uma diferença entre as transacções económicas efectuadas entre cidadãos
residentes num determinado país e aquelas que envolvem agentes económicos
estrangeiros. Ao contrário das primeiras, as últimas requerem, geralmente, a troca de
moeda estrangeira por moeda nacional (ou vice-versa) no mercado cambial.
Neste capítulo iremos caracterizar o funcionamento do mercado cambial.
Analisaremos a forma de determinação das taxas de câmbio, os diferentes regimes
cambiais, a explicação do comportamento de alguns agentes económicos que recorrem
ao mercado de câmbios, os processos de arbitragem das taxas de câmbio e das taxas de
juro, de cobertura do risco cambial e de especulação. Na última parte deste capítulo,
iremos fazer uma breve referência às teorias de determinação da taxa de câmbio,
nomeadamente às três versões da teoria da paridade dos poderes de compra.
8.1. O mercado cambial e as taxas de câmbio
8.1.1. Definição e funções do mercado cambial
O mercado cambial traduz o “local” onde se troca uma moeda (ou divisa) de um
determinado país, por outra. A sua existência encontra-se necessariamente ligada à
existência de transacções internacionais, na medida em que para que se realize uma
transacção internacional poderá haver a necessidade da conversão de uma moeda
noutra. Dados dois países, N e J, respectivamente com moedas n e j, a oferta da primeira
divisa (n) pode ser garantida por importadores de N, turistas de N em J, imigrantes em
N, etc.; e a procura de n por importadores de J, turistas de J em N, imigrantes em J, etc..
O mercado cambial não pode ser, portanto, considerado como sendo um espaço
singular, uma vez que funciona em vários locais (ou praças) permanentemente.
Inclusivamente, poderemos acrescentar que o mercado cambial é caracterizado por
diversos espaços imateriais, constituídos por redes telefónicas, de computadores,
telegráficas e de telex, onde os agentes económicos realizam as suas operações de
compra e venda de moeda a preços livremente estabelecidos pela concorrência entre os
agentes1.
Além disso, o mercado cambial trata-se de um mercado em contínuo,
funcionando 24 sobre 24 horas por dia. De facto, se analisarmos o mapa-mundo, em
1
Nas salas de câmbios, os cambistas estão ligados entre si por dois sistemas de tratamento de
informações: o Reuter (inglês) e o Telerate (americano) e podem obter, de forma rápida, as diversas
cotações de que precisam.
Apontamentos de Economia Monetária
5
Capítulo 8 – O mercado cambial
qualquer momento do dia existe sempre pelo menos uma praça a nível mundial que se
encontra em funcionamento2.
Em suma, o mercado cambial tem como função a troca de moedas e traduz o
resultado da actividade dos agentes económicos que compram e vendem divisas ao
pretenderem satisfazer as suas necessidades expressas em moeda externa. Para o efeito,
confrontam a oferta e a procura de cada uma das moedas e durante a respectiva
transacção especificam igualmente as condições inerentes, incluindo os preços ou as
cotações e as datas de entrega ou realização das operações estabelecidas.
8.1.2. A taxa de câmbio
A taxa de câmbio é uma relação de troca entre duas moedas, ou seja, traduz o
preço de uma moeda expresso noutra. Se:
t: momento de tempo;
n: moeda do país N;
j: a moeda do país J;
então Sn,j (t) designará a taxa de câmbio que relaciona as duas divisas referidas.
8.1.2.1. Cotação ao incerto e cotação ao certo
Podem-se utilizar duas formas diferentes para cotar a moeda nacional. A moeda
nacional tem uma cotação ao incerto se a taxa de câmbio nos indica directamente o
número de unidades de moeda nacional necessário para se obter uma unidade de moeda
estrangeira. Sempre que a taxa de câmbio nos indica directamente o número de unidades
de moeda estrangeira necessário para obter uma unidade da moeda nacional, diz-se que
a moeda nacional apresenta uma cotação ao certo.
Generalizando e utilizando a notação atrás definida pode dizer-se que3:
 Quando se utiliza Sn,j (t), a moeda n está cotada ao incerto e a moeda j está
cotada ao certo;
2
Olhando o mapa-mundo e tomando como referência o Tempo do Meridiano de Greenwich, se partirmos
do Extremo Oriente verificamos que os mercados abrem em Wellington, na Nova Zelândia (12 horas de
desfasamento), e em Melborne, na Austrália. Depois, começam a abrir Hong-Kong, Singapura, Tóquio,
Bahrein. Vemos assim, que entre as 24 horas e as 10 horas, o mercado é predominantemente asiático e
que está aberto, aproximadamente, 10 horas. Quando estes começam a fechar, é entretanto manhã na
Europa e abre o mercado europeu: Frankfurt, Zurique, Paris, Londres, .... Sendo manhã na Europa, é noite
na Ásia e madrugada na América. À medida que as horas passam, começam a abrir os mercados
americanos. Às 13 horas, começam a aparecer nos ecrãs dos bancos europeus as cotações dos mercados
americanos: primeiro Nova Iorque, depois Toronto, Chicago, Los Angeles e São Francisco.
Sensivelmente até às 17 horas, temos as moedas a serem cotadas quer na Europa, quer no continente
americano. Segue-se, depois, um período em que apenas funciona o mercado americano. Com o mercado
americano a fechar, abre o mercado na Nova Zelândia e na Austrália e o “percurso” repete-se
novamente…
3
Vejam-se, neste contexto, o Anexo 8.1: Taxas de câmbio de referência diárias e o Anexo 8.2: Evolução
de algumas taxas de câmbio bilaterais.
Apontamentos de Economia Monetária
6
Capítulo 8 – O mercado cambial
 Quando se utiliza Sj,n (t), a moeda j está cotada ao incerto e a moeda n está
cotada ao certo.
De acordo com estas definições podemos concluir que:
S n, j t  
1
S j,n t 
ou S n, j t xS j,n t   1
Exemplo 1:
Admita-se que, num determinado dia: 1 euro = 1,2621 dólares americanos, isto
é, 1 EUR = 1,2621 USD4. Considerando o euro como moeda nacional (n) e o
dólar americano como moeda estrangeira (j), temos:
Cotação ao certo para o euro (e ao incerto para o dólar): SUSD,EUR (t) = 1,2621
(USD). Este valor significa que, naquele dia, um euro valia 1,2621 dólares
americanos (note-se que, de acordo com esta forma de cotação, a moeda que se
encontra a variar é o dólar – o euro apresenta sempre um valor de uma unidade
monetária).
Logo, a cotação ao incerto para o euro (e ao certo para o dólar):
S n, j t  
1
S j,n t 
 S EUR,USD t  
1
 S EUR,USD t   0,7923 EUR .
1,2621
Este
valor significa, por sua vez, que um dólar americano valia naquele dia 0,7923
euros (note-se que, de acordo com esta forma de cotação, a moeda que se
encontra a variar é agora o euro – o dólar americano apresenta sempre um
valor de uma unidade monetária).
Confirmando, temos: S n, j t xS j,n t   1  0,7923x1,2621  1 .
8.1.2.2. Taxa de câmbio à vista e taxa de câmbio a prazo
A taxa de câmbio atrás descrita, Sn,j (t), é designada por taxa de câmbio à vista
para o momento t, porque se regista e se aplica às transacções efectuadas no momento
referido. É também possível definir uma taxa de câmbio no momento t para operações a
realizar no momento t+h. Esta taxa de câmbio denomina-se de taxa de câmbio a prazo
para o momento t+h e é designada por Fn,j (t+h).
4
De acordo com a norma ISO (International Standard Organization), a denominação das moedas é
composta por 3 siglas, em que as duas primeiras dizem respeito ao país e a última refere-se à moeda.
Apontamentos de Economia Monetária
7
Capítulo 8 – O mercado cambial
Exemplo 2:
Se FUSD,EUR (t) = 1,2621 (USD) isso significa que, no momento presente (t), o
acordo de qualquer transacção que envolva as moedas USD e EUR a realizar no
momento t+h utilizará a seguinte relação de troca: 1 EUR = 1,2621 USD.
8.1.2.3. Taxa de câmbio nominal, real e efectiva
As taxas de câmbio à vista podem ainda ser nominais ou reais. Relativamente às
taxas de câmbio nominais, não se consideram os níveis de preços dos países cujas
moedas estão relacionadas pela taxa de câmbio (é o que acontece com Sn,j (t)). Nas taxas
de câmbio reais5 já se tem em conta essa informação acerca dos preços praticados em
ambos os países.
r
S n,
j t   S n, j t x
P*
P
ou
S rj,n t   S j,n t x
P
P*
sendo P* o índice de preços do país J e P o índice de preços do país N.
Analisando as fórmulas anteriores podemos retirar as seguintes conclusões:
i) Quando o Sn,j (t) sobe, a moeda n deprecia-se, logo aprecia-se a moeda j;
r
ii) Se S n,
j t  aumenta, a moeda n regista uma depreciação real e a moeda j
uma apreciação real, traduzindo um ganho de competitividade para o país N;
iii) Quando Sj,n (t) aumenta, a moeda n aprecia-se e a moeda j deprecia-se;
iv) Se S rj,n t  sobe, a moeda n regista uma apreciação real e a moeda j uma
depreciação real, traduzindo um ganho de competitividade para o país J.
Pode falar-se, ainda, na taxa de câmbio efectiva (para o país N) e defini-la como
uma média geométrica das taxas de câmbio nominais para o mercado de câmbios à
vista, onde as ponderações reflectem o peso do comércio com o país J (J = 1, …, T) em
relação ao comércio total do país N com os T países considerados6. Se designarmos esta
taxa por EN, então7
5
As taxas de câmbio reais são frequentemente utilizadas como indicadores da competitividade de uma
economia.
6
r
Caso se utilize S n , j em vez de S n , j , obtém-se a taxa de câmbio efectiva em termos reais para o país N
E Nr .
7
Veja-se, neste contexto, o Anexo 8.3: Taxas de câmbio nominais, reais e efectivas.
Apontamentos de Economia Monetária
8
Capítulo 8 – O mercado cambial
T

E N   S n, j
α
J
J 1
em que  J 
comércio com o país J
.
total do comércio do país N
8.1.2.4. Taxa de câmbio bid e taxa de câmbio ask
Finalmente, ainda sobre as taxas de câmbio, convém fazer uma breve referência
às taxas bid e ask. De facto, se estivermos situados perante duas moedas, verificamos
que o conceito de taxa de câmbio pode dar origem a alguma confusão, quando
queremos falar de compra e de venda. Com efeito, se tivermos euros e quisermos
comprar dólares americanos, dizemos que estamos a comprar dólares mas, se
estivermos do lado do banco, se estamos a comprar dólares (a vender euros) o banco,
por seu lado, está a vender dólares (que nos fornece) e a comprar euros (que nós lhe
vendemos). Se tivermos dólares e quisermos euros, fazemos exactamente o raciocínio
oposto: compramos euros e vendemos dólares, enquanto que esta mesma operação, vista
pelo banco, significa que este compra dólares e vende euros.
Basta olharmos para um quadro de cotações de moedas de um banco para
verificarmos que temos duas cotações para a mesma moeda – a de compra e a de
venda8. Trata-se da compra e venda do próprio banco, já que este agente económico
(que representa o mercado) compra sempre pelo valor mais baixo e vende pelo valor
mais alto, ou seja, um indivíduo vende sempre pelo valor mais baixo e compra pelo
valor mais alto9. Em linguagem do mercado cambial, à taxa de compra de uma divisa,
ou seja, à taxa a que o banco a compra dá-se o nome de taxa bid; à taxa de venda de
uma divisa, isto é, à taxa a que o banco vende a divisa dá-se o nome de taxa ask10.
Exemplo 3:
USD/EUR = 1,27362 (Bid)
Taxa de câmbio
USD/EUR = 1,27362
1,23598 (ask)11
Operador cambial
A esta taxa, o banco
compra
dólares
americanos e vende
euros. É a taxa de compra
ou taxa bid da divisa
dólar americano.
Cliente
A esta taxa o cliente vende
dólares
americanos
e
compra euros. Como é
evidente, as operações são
simétricas.
8
Veja-se, neste contexto, o Anexo 8.4: Taxas de câmbio bid e ask.
Naturalmente que este “indivíduo” pode ser, igualmente, um banco face a outro banco a quem pede
cotação, representando este último o mercado.
10
Diz-se que estamos perante uma cotação central quando a taxa de câmbio apresentada é a média entre a
taxa de compra e a taxa de venda.
11
Note-se que as cotações se encontram ao certo para o euro e ao incerto para o dólar americano.
9
Apontamentos de Economia Monetária
9
Capítulo 8 – O mercado cambial
USD/UER = 1,23598
A esta taxa o banco A esta taxa o cliente compra
vende dólares americanos dólares americanos e vende
e compra euros. Esta é a euros.
taxa de venda da divisa
dólar americano ou taxa
ask
8.1.3. Regimes cambiais e determinação da taxa de câmbio à vista
O modelo ou a teoria tradicional que apresentaremos nesta secção relaciona a
procura e oferta de moeda com as exportações e importações de bens e serviços. Neste
contexto, as variações de Sn,j (t) designam-se por apreciações ou depreciações se
ocorrem num regime de câmbios flexíveis e por revalorizações ou desvalorizações se
ocorrem num regime de câmbios fixos.
Se utilizarmos a cotação ao incerto para a moeda nacional (n), estamos perante
uma apreciação (revalorização) de n se o seu preço aumentou relativamente a j, isto é,
se Sn,j (t) diminui. Nas mesmas circunstâncias, uma depreciação (desvalorização) da
moeda nacional reflecte um aumento do preço da moeda j em termos da moeda n, ou
seja, uma subida de Sn,j (t).
8.1.3.1. Regime de câmbios flexíveis
Comecemos então pelo regime de câmbios flexíveis. Num regime de câmbios
flexíveis, a taxa de câmbio de equilíbrio é determinada, no mercado cambial, pela lei da
oferta e da procura, como o preço de um qualquer bem. Utilizando como referência a
cotação ao certo de j em relação a n, o equilíbrio para as transacções que ocorrem no
mercado cambial entre estas moedas pode ser representado pelo ponto E do gráfico
seguinte:
Gráfico 8.1: O regime de câmbios flexíveis e a taxa de câmbio
Sn,j (t)
js
jd < js
Apreciação da moeda n
s
d
n <n
Sn,j (t1)
Sen,j (t)
E
Sn,j (t0)
Depreciação da moeda n
jd > js
ns > nd
0
jd
Qej
Qj
Como se observa, sempre que a taxa de câmbio se encontra acima do seu valor
de equilíbrio, o mercado regista excesso de oferta de moeda j (js). Para valores da taxa
de câmbio inferiores ao nível de equilíbrio existe excesso de procura da divisa j (jd). Em
Apontamentos de Economia Monetária
10
Capítulo 8 – O mercado cambial
ambos os casos, por que se admite ser a taxa de câmbio perfeitamente flexível, o
mercado converge para o ponto E.
8.1.3.2. Regime de câmbios fixos
Quando o regime é de câmbios fixos, o nível da taxa de câmbio é decidido pelo
banco central que intervém no mercado cambial, comprando ou vendendo a moeda
estrangeira de forma a manter fixa uma determinada cotação.
Gráfico 8.2: O regime de câmbios fixos e a taxa de câmbio
Sn,j (t)
js
Aumento das reservas cambiais
do país N (compra de j)
S n, j t1 
S n,e j
S n, j t0 
j
0
Qej
Diminuição das reservas
cambiais do país N (venda de j)
d
Qj
No gráfico anterior considera-se, alternativamente, três valores distintos para a
taxa de câmbio neste regime:
 Quando o nível é fixado em S n, j t1  , existe excesso de procura de n (excesso
de oferta de j). Para que o banco central de N mantenha esta cotação terá de
vender a sua moeda e comprar a divisa j, registando um aumento das suas
reservas;
 Quando o nível é fixado em S n, j t0  , existe excesso de oferta de n (excesso de
procura de j). Para que o banco central de N mantenha esta cotação terá de
comprar a sua moeda e vender a divisa j, registando uma diminuição das suas
reservas;
 Quando o nível é fixado em S n,e j , o mercado está em equilíbrio e o banco
central de N não necessita de efectuar qualquer intervenção para manter fixa a
cotação da sua moeda.
8.1.3.3. Outros regimes cambiais
Atendendo ao grau de intervenção do banco central no mercado cambial, podem
ainda identificar-se outros regimes cambiais, dos quais se podem destacar:
 Regime de câmbios ajustáveis, implícito nos acordos de Bretton Woods que
fixava a taxa de câmbio e um intervalo para a sua variação, podendo a mesma
ser ajustada em caso de desequilíbrio fundamental da balança de pagamentos;
Apontamentos de Economia Monetária
11
Capítulo 8 – O mercado cambial
 Regime de câmbios deslizantes ou crawling peg caracterizado por uma
alteração permanente e gradual da cotação de uma moeda em relação a outra ou
a um cabaz de divisas;
 Regime de flutuação gerida onde as taxas de câmbio são, basicamente,
determinadas pelo mercado mas as autoridades monetárias intervêm no mercado
para “amortecer” as flutuações de curto prazo não alterando o equilíbrio de
longo prazo.
8.1.4. Arbitragem das taxas de câmbio, risco cambial e especulação
A arbitragem das taxas de câmbio consiste na compra e venda simultânea de
moeda de forma a obter um ganho. Os agentes económicos estabelecem processos de
arbitragem das taxas de câmbio sempre que:
 A mesma taxa de câmbio apresenta valores diferentes em duas praças
financeiras e/ou
 As taxas de câmbio são inconsistentes, o que acontece quando a taxa de
câmbio directa difere da taxa de câmbio indirecta.
Em cada uma destas situações os processos de arbitragem que se estabelecem
envolvem a intervenção em diferentes praças financeiras. No primeiro caso, os
arbitragistas recorrem a duas praças (ou pontos); no segundo caso, em três praças (ou
pontos). Comecemos pela primeira situação.
8.1.4.1. A arbitragem em dois pontos (ou espacial) e a unicidade das taxas de
câmbio
Exemplo 4:
Admita-se que:
SUSD,EUR = 1,2621 (USD), em Lisboa;
SUSD,EUR = 1,2521 (USD), em Nova Iorque.
Neste caso, qualquer arbitragista que compre euros em Nova Iorque e os venda
em Lisboa obtém um ganho de 0,01 dólares por cada euro transaccionado.
Consequentemente, deverá registar-se:
 Um aumento da procura de euros (oferta de dólares americanos) em Nova
Iorque, apreciando o euro relativamente ao dólar americano nesta praça;
 Um aumento da oferta de euros (procura de dólares americanos) em Lisboa,
depreciando o euro relativamente ao dólar americano nesta praça.
Apontamentos de Economia Monetária
12
Capítulo 8 – O mercado cambial
É importante notar que os procedimentos atrás descritos só cessarão quando a
taxa de câmbio bilateral do euro relativamente ao dólar americano for igual nas duas
praças, podendo concluir-se que a actividade destes agentes conduz a este resultado.
Generalizando, podemos dizer que os processos de arbitragem espacial garantem
que:
N
J
S n,
j t   S n, j t   S n, j t 
representando S n,i j t  i  N, J  , a taxa de câmbio à vista para o momento t na praça i.
8.1.4.2. A arbitragem em três pontos (ou triangular) e a consistência das taxas
de câmbio
Além da arbitragem em dois pontos (ou arbitragem espacial) atrás referida, pode
também suceder a arbitragem em três pontos (ou arbitragem triangular). De facto,
apesar de se verificar a unicidade das taxas de câmbio em todas as praças financeiras, a
taxa de câmbio directa pode ter um valor diferente da taxa de câmbio indirecta, como
acontece no exemplo que se segue.
Exemplo 5:
SUSD,EUR = 1,2621 (USD)
SGBP,EUR = 0,6884 (GBP)
SUSD,GBP = 1,8479 (USD)
Neste caso, é possível trocar directamente 1 euro por 1,2621 dólares
americanos. Alternativamente, e de forma indirecta, poder-se-á trocar o mesmo euro
por 0,6884 libras e, posteriormente, trocar estas libras por, aproximadamente, 1,2721
dólares americanos (0,6884 x 1,8479). Comparando as duas soluções apresentadas,
pode concluir-se que a última gera, relativamente à primeira, um lucro de,
aproximadamente, 0,01 dólares americanos por cada euro transaccionado.
Esquematicamente, temos:
0,6884 GBP
1,2721 USD
1 EUR
Apontamentos de Economia Monetária
1,2621 USD
13
Capítulo 8 – O mercado cambial
Sempre que no mercado cambial se verifica uma situação deste tipo, diz-se que
as taxas de câmbio são inconsistentes. Considerando os países N, J e K com moedas n, j
e k respectivamente, pode concluir-se que a consistência das três taxas de câmbio só se
verifica quando:
S n, j xS j,k xS k,n  1
Esta relação é possível porque se verifica a Lei da Circularidade dos Preços
Relativos e permite-nos determinar uma taxa de câmbio conhecida a partir de duas taxas
de câmbio, isto é:
S n, j 
S k, j
S n,k
1
ou S n, j 
ou ainda S n, j 
S j,k xS k,n
S j,k
S k,n
Generalizando para m moedas:
S a,b xS b,c x...xS m,a  1
8.1.4.3. Risco cambial
Qualquer agente económico que tenha de efectuar uma transacção em moeda
estrangeira no futuro, não consegue saber antes o valor que essa divisa apresenta no
mercado cambial à vista no momento em que a operação se concretiza. Deste modo, élhe impossível avaliar se deve comprar (ou vender) a moeda estrangeira antes ou no
momento em que a transacção se realiza e corre o risco de adoptar a pior opção. A este
risco dá-se o nome de risco cambial.
A cobertura do risco cambial consiste num conjunto de procedimentos que
permitem evitar o risco cambial, isto é, trata-se de uma acção deliberada para contornar
os efeitos que resultam da incerteza da evolução cambial. Sempre que se assume o risco
cambial, no fundo está a especular-se. O agente económico que procede desta forma
designa-se por especulador.
Diz-se que a moeda j tem um prémio ou está a prémio e que a moeda n está a
desconto (no mercado de câmbios a prazo) se se verificar a relação:
Fn, j t  h   S n, j t 
ou
Fn, j t  h 
S n, j t 
1
ou
Apontamentos de Economia Monetária
14
Capítulo 8 – O mercado cambial
Fn, j t  h 
S n, j t 
10
isto é, se a sua cotação no mercado de câmbios a prazo for superior à sua cotação no
mercado de câmbios à vista.
O desconto de uma moeda implica sempre o prémio de outra. Considerando as
moedas n e j, pode dizer-se que o prémio da moeda j é aproximadamente igual ao
desconto da moeda n.
Exemplo 6:
FUSD/EUR (1 ano) = 1,2721 > SUSD/EUR = 1,2621
Assim, conclui-se que o euro tem um prémio ou está a prémio, logo, o dólar
americano tem um desconto ou está a desconto.
O prémio do euro é dado por:
FUSD/EUR  SUSD/EUR 1,2721  1,2621

 0,007923 (0,7923%)
SUSD/EUR
1,2621
O desconto do dólar americano é dado por:
FEUR/USD  S EUR/USD
S EUR/USD
1
1

1,2721 1,2621

 0,007861 (-0,7861%)
1
1,2621
8.1.4.4. A cobertura comercial
Uma vez analisado o risco cambial, vejamos alguns exemplos de cobertura a este
tipo de risco, nomeadamente a cobertura comercial, quer no caso do importador, quer no
caso do exportador. Comecemos pelo caso do importador.
Admita-se que um importador português tem de pagar m libras daqui a h
períodos. Para evitar o risco cambial, este agente económico dispõe de duas alternativas:
a cobertura a prazo e a cobertura à vista12.
i) Cobertura no mercado de câmbios a prazo
Neste caso o agente económico deverá comprar as m libras (vender euros) a
prazo. A sua despesa em euros será:
mxFEUR/GBP t  h 
12
Nos exemplos apresentados neste e no parágrafo seguintes, admite-se que, dentro de cada país, não é
possível efectuar depósitos ou solicitar créditos em moeda estrangeira.
Apontamentos de Economia Monetária
15
Capítulo 8 – O mercado cambial
ii) Cobertura no mercado de câmbios à vista
Nesta situação o importador deve:
 Comprar m’ < m: m 1  i RU   m libras, em que iRU é a taxa de juro que
remunera os depósitos em libras para o período considerado, isto é,
comprar m  
m
;
1  i RU 
 Solicitar ao banco um empréstimo de
m
xSEUR/GBP euros;
1  i RU 
 Depositar as libras até ao momento do pagamento. O custo total em
euros será
m
xS
x 1  i P  em que iP é a taxa de juro que o
1  i RU  EUR/GBP
banco português cobra pelos empréstimos para o período considerado.
iii) Decisão
Depois de comparada a despesa das duas alternativas, o importador opta pelo
mercado onde esta é menor. Neste contexto pode concluir-se que:
 Se
FEUR/GBP t  h   S EUR/GBP x
1  i P 
1  i RU
, o importador recorre ao
mercado de câmbios à vista;
 Se
FEUR/GBP t  h   S EUR/GBP x
1  i P 
1  i RU
, o importador recorre ao
mercado ao mercado de câmbios a prazo;
 Se
FEUR/GBP t  h   S EUR/GBP x
1  i P 
1  i RU
,
o
importador
recorre,
indiferentemente, a qualquer dos dois mercados.
Vejamos agora o caso do exportador. Admita-se agora que um exportador
português tem de receber m libras daqui a h períodos. Para anular o risco cambial, o
exportador pode, também, recorrer ao mercado de câmbios à vista ou ao mercado de
câmbios a prazo.
i) Cobertura no mercado de câmbios a prazo
Nesta situação o agente económico deverá vender as m libras (comprar euros) a
prazo. A sua receita em euros será:
mxFEUR/GBP t  h 
Apontamentos de Economia Monetária
16
Capítulo 8 – O mercado cambial
ii) Cobertura no mercado de câmbios à vista
Neste caso o exportador deve:
 Pedir um empréstimo de m’ < m: m 1  i RU   m libras, que liquidará com
o pagamento do seu cliente;
m
xSEUR/GBP euros;
1  i RU 
 Vender m’ libras à vista (compra euros) e obter
 Depositar
os
euros
por
h
períodos.
A
sua
receita
será
m
xS
x 1  i P  .
1  i RU  EUR/GBP
iii) Decisão
Depois de comparada a receita das duas alternativas, o exportador opta pelo
mercado onde esta é maior. Neste contexto pode concluir-se que:
 Se
FEUR/GBP t  h   S EUR/GBP x
1  i P 
1  i RU
, o exportador recorre ao
mercado de câmbios a prazo;
 Se
FEUR/GBP t  h   S EUR/GBP x
1  i P 
1  i RU
, o exportador recorre ao
mercado de câmbios à vista;
 Se
FEUR/GBP t  h   S EUR/GBP x
1  i P 
1  i RU
,
o
exportador
recorre,
indiferentemente, a qualquer dos dois mercados.
8.1.4.5. A arbitragem das taxas de juro com cobertura do risco de câmbio: a
condição de paridade dos juros coberta
Considere-se que um investidor do país N deseja fazer uma aplicação em moeda
n (m unidades) por um período específico. Caso o investimento seja efectuado no país a
que pertence, o resultado da sua aplicação em moeda n será:
m1  i N 
em que iN representa a taxa de juro da economia N que remunera a aplicação no período
considerado.
Para efectuar a aplicação no país J, o mesmo investidor deverá, se não quiser
correr risco cambial:
Apontamentos de Economia Monetária
17
Capítulo 8 – O mercado cambial
 Comprar j (vender n) à vista, isto é, trocar m unidades de n por
1
S n, j
.m unidades
de j;
 Aplicar a moeda j no país J durante o período considerado;
 Liquidar a aplicação no final do período que terá um valor igual a
1
S n, j
.m1  i J  unidades de moeda j, e
 Combinar, no momento presente, a venda a prazo da moeda j (compra de n) para
o final do prazo da aplicação. O resultado da aplicação será igual a
Fn, j .
1
S n, j
.m1  i J  unidades de n.
Comparando o resultado das duas alternativas, o investidor optará pela solução
que lhe proporcionar o maior rendimento.
Pode comprovar-se que, em qualquer solução, as atitudes que o investidor
assume tendem a igualar os dois resultados. Com efeito, quando a aplicação privilegia o
país N – caso em que 1  i N  
Fn, j .1  i J 
S n, j
a diminuir. Na situação contrária, 1  i N  
– a taxa de juro que a remunera (iN) tende
Fn, j .1  i J 
S n, j
, as atitudes tomadas tendem a
baixar a taxa de juro que remunera as aplicações em J (iJ), a fazer diminuir a cotação de
j a prazo relativamente a n (Fn,j) e a fazer aumentar a cotação de j relativamente a n à
vista (Sn,j).
Neste exemplo, o tipo de actividade desempenhado pelo agente económico
considerado designa-se por arbitragem das taxas de juro com cobertura do risco
cambial. Pelo que ficou dito, pode concluir-se que a existência de processos desta
natureza garante que:
1  i N  
Fn, j .1  i J 
S n, j
ou seja, que
Fn, j t  h 
S n, j t 

Fn, j t  h 
1  iN
1  iN

1
1
1  iJ
S n, j t 
1  iJ
Considerando ainda que
Apontamentos de Economia Monetária
18
Capítulo 8 – O mercado cambial
Fn, j t  h 
S n, j t 
 1  f n, j t  h 
obtém-se
f n, j t  h  
1  iN
 1  f n, j t  h   f n, j t  h .i J  i N  i J
1  iJ
A condição acima é designada por condição de paridade das taxas de juro com
cobertura do risco cambial (ou condição de paridade dos juros coberta). Na sua forma
aproximada (admitindo que fn,j . iJ ≈ 0) reduz-se a:
f n, j t  h   i N  i J
Pela sua análise podemos concluir que a um desconto da moeda nacional (n) no
mercado a prazo deve corresponder uma taxa de juro nacional superior à estrangeira e
que a um prémio da moeda nacional deve corresponder uma taxa de juro nacional
inferior à estrangeira.
8.1.4.6. Especulação
Para terminarmos esta secção sobre o mercado cambial e as taxas de câmbio,
vejamos agora o comportamento do especulador. Vimos anteriormente, que o
arbitragista age com conhecimento da taxa de juro e da taxa de câmbio objectivando a
realização de um lucro. O especulador, por sua vez, prossegue o mesmo objectivo mas
actua com base em preços conhecidos e na sua expectativa para a taxa de câmbio à vista
no período t+h, que designaremos de agora em diante por S n,e j t  h  .
Tal como os agentes económicos que se cobrem do risco cambial, o especulador,
que incorre deliberadamente nesse risco, pode conduzir as suas actividades para o
mercado de câmbios à vista ou para o mercado de câmbios a prazo. Comecemos pela
especulação a prazo.
Diz-se que a especulação é a prazo quando o especulador recorre ao mercado de
câmbios a prazo. Atendendo à relação entre a taxa de câmbio a prazo para t+h e a
expectativa formulada para a taxa de câmbio à vista para o mesmo período, podem
distinguir-se duas situações:
e
i) Primeira situação: Fn, j t  h   S n,
j t  h 
Neste caso, o especulador considera que a moeda j vale mais no mercado de
câmbios a prazo para t+h do que espera que venha a valer no mercado de
câmbios à vista em t+h.
Apontamentos de Economia Monetária
19
Capítulo 8 – O mercado cambial
Objectivando a realização de uma mais-valia, este agente económico deverá,
então, vender j a prazo (comprar n a prazo) e comprar j à vista daqui a h
períodos (vender n à vista daqui a h períodos).
O sucesso da operação depende da verificação, daí a h períodos, da igualdade
entre o valor esperado e o valor efectivo da taxa de câmbio. Deste modo,
 Se S n, j t  h   Fn, j t  h  o especulador terá lucro;
 Se S n, j t  h   Fn, j t  h  o especulador terá prejuízo.
e
ii) Segunda situação: Fn, j t  h   S n,
j t  h 
Quando a condição acima se verifica, o especulador considera que a moeda n
vale mais no mercado de câmbios a prazo para t+h do que espera que venha a
valer no mercado de câmbios à vista em t+h.
Objectivando a realização de uma mais-valia, este agente económico deverá,
então, vender n a prazo (comprar j a prazo) e comprar n à vista daqui a h
períodos (vender j à vista daqui a h períodos).
O sucesso da operação depende da verificação, daí a h períodos, da igualdade
entre o valor esperado e o valor efectivo da taxa de câmbio. Deste modo,
 Se S n, j t  h   Fn, j t  h  o especulador terá prejuízo;
 Se S n, j t  h   Fn, j t  h  o especulador terá lucro.
Vejamos agora a especulação à vista. Quando privilegia o mercado de câmbios
à vista, o especulador compara a sua expectativa para a taxa de câmbio à vista para o
momento t+h com o resultado duma aplicação no momento presente até t+h. Devem,
igualmente, considerar-se duas situações.
i) Primeira situação: S n,e j t  h  
S n, j 1  i N 
1  i J 
 Fn, j t  h 
Tal como acontecia na especulação a prazo, o especulador, seguindo a sua
expectativa, vai querer deter moeda j no período t+h para a vender no mercado
de câmbios à vista. Recorrendo apenas ao mercado de câmbios à vista, o
especulador deve:
 Pedir um empréstimo em moeda n;
 Comprar j (vender n) à vista no momento presente;
 Aplicar a moeda j por h períodos, e
Apontamentos de Economia Monetária
20
Capítulo 8 – O mercado cambial
 Liquidar a aplicação e vender j (comprar n) à vista em t+h.
O sucesso da operação depende da verificação, daí a h períodos, da igualdade
entre o valor esperado e o valor efectivo da taxa de câmbio. Deste modo,
 Se S n, j t  h  
 Se S n, j t  h  
ii) Segunda situação:
S n, j 1  i N 
1  i J 
S n, j 1  i N 
1  i J 
S n, j 1  i N 
1  i J 
o especulador terá lucro;
o especulador regista um prejuízo.
 Fn, j t  h   S n,e j t  h 
Quando a condição acima referida se verifica, o especulador, seguindo a sua
expectativa, vai querer deter moeda n no período t+h para a vender no mercado
de câmbios à vista. Recorrendo apenas ao mercado de câmbios à vista, o
especulador deve:
 Pedir um empréstimo em moeda j;
 Comprar n (vender j) à vista no momento presente;
 Aplicar a moeda n por h períodos, e
 Liquidar a aplicação e vender n (comprar j) à vista em t+h.
O sucesso da operação depende da verificação, daí a h períodos, da igualdade
entre o valor esperado e o valor efectivo da taxa de câmbio. Deste modo,
 Se
 Se
S n, j 1  i N 
1  i J 
S n, j 1  i N 
1  i J 
 S n, j t  h  o especulador terá lucro;
 S n, j t  h  o especulador regista um prejuízo.
8.2. Teorias explicativas do valor da taxa de câmbio
8.2.1. Paridade dos poderes de compra e lei do preço único
A teoria da paridade dos poderes de compra assenta na lei do preço único. Esta
lei, baseada nos pressupostos de que os mercados são perfeitos, os custos de transporte
são negligenciáveis e que as barreiras ao comércio são inexistentes, defende que,
quando convertido na mesma moeda, o mesmo bem tem um preço idêntico em dois
países diferentes. Genericamente, para o bem i, a lei resume-se à seguinte igualdade:
Pi  SPi*
Apontamentos de Economia Monetária
21
Capítulo 8 – O mercado cambial
onde Pi designa o preço do bem i expresso em moeda do país doméstico, Pi* o preço
para o mesmo bem expresso em moeda da economia estrangeira e S a taxa de câmbio,
definida ao incerto, para a divisa doméstica.
8.2.2. Versão absoluta e versão relativa da paridade dos poderes de compra
8.2.2.1. Versão absoluta
A versão absoluta da paridade dos poderes de compra (PPP) aplica a lei do
preço único a um cabaz de bens particular que serve de base ao cálculo do índice de
preços nos dois países considerados. Desta forma, considera-se que
P  S.P *
ou
S
P
P*
onde P e P* designam o índice de preços, respectivamente na economia doméstica e
estrangeira.
A última expressão revela-nos a versão absoluta da PPP e assegura-nos que o
mesmo cabaz de bens e serviços em dois países diferentes, quando convertido na mesma
moeda, apresenta um índice de preços idêntico. Em conclusão, a teoria da PPP na sua
versão absoluta diz-nos que, em câmbios flexíveis, a taxa de câmbio é determinada pela
evolução dos índices de preços relativos dos dois países.
8.2.2.2. Versão relativa
A versão relativa da PPP assegura-nos que a taxa de câmbio se ajusta em função
do diferencial das taxas de inflação entre duas economias.
Em termos analíticos obtemos, através da logaritmização da igualdade que
traduz a versão absoluta da PPP, a seguinte expressão:
logS  logP  logP *
A sua derivação permite chegar a:
dS dP dP *


S
P
P*
Considerando finalmente que P , S , P * representam as taxas de crescimento
de P, S e P* respectivamente, tem-se que:
S  P  P *
Esta expressão sintetiza a versão relativa da PPP e revela-nos que a alteração
percentual na taxa de câmbio durante um certo período de tempo é igual à diferença da
Apontamentos de Economia Monetária
22
Capítulo 8 – O mercado cambial
alteração percentual dos índices de preços dos dois países no mesmo período. Deve
registar-se que a versão relativa da PPP não exige que se verifique a lei do preço único,
logo não exige que os mercados funcionem em concorrência perfeita, nem que o cabaz
de bens seja o mesmo nos dois países. De acordo com a última expressão (respeitante à
versão relativa da PPP), se um país apresentar uma taxa de inflação de 10% e o outro de
apenas 4%, haverá uma depreciação de 6% da moeda do país onde se regista a taxa de
inflação mais elevada. No entanto, esta versão não considera os bens não
transaccionáveis, o que levou ao aparecimento da versão generalizada da PPP, que veio
colmatar esta falha.
8.2.3. Versão generalizada da paridade dos poderes de compra
Segundo a lei do preço único, a igualdade do preço para o mesmo bem nos
diferentes países resulta da existência de processos de arbitragem que se accionam
sempre que tal não acontece. Como consequência, esta lei só se aplica a produtos
transaccionáveis, isto é, a produtos (bens) que possam ser transaccionados no mercado
internacional.
Porém, o cabaz que serve de base ao cálculo do índice de preços, e que é
considerado nas duas versões da PPP apresentadas anteriormente, é também composto
por bens que não podem ser transaccionados no mercado internacional e em relação aos
quais não se pode aplicar a lei do preço único. Neste contexto, as versões referidas
apresentam uma limitação evidente que foi superada por uma terceira versão da PPP – a
versão generalizada – ao incluir os bens não transaccionáveis.
Esta versão da PPP considera os bens transaccionáveis – susceptíveis de
concorrência no mercado internacional – que não são transaccionados no mercado
internacional. Deste modo, o índice de preços agregado (PI) para cada país resulta da
média ponderada dos preços dos dois tipos de bens (PT – preço dos bens
transaccionáveis; PN – preço dos bens não transaccionáveis);
PI  αPT  1  α PN
onde  é o peso dos bens transaccionáveis e (1–) o peso dos bens não transaccionáveis
no cabaz do qual se construiu o índice de preços do país doméstico.
 
Do mesmo modo, para o país estrangeiro o índice de preços PI* será:
PI*  βPT*  1  β PN*
onde  é o peso dos bens transaccionáveis e (1–) o peso dos bens não transaccionáveis
no índice de preços do país estrangeiro.
Apontamentos de Economia Monetária
23
Capítulo 8 – O mercado cambial
Como a lei do preço único só se aplica aos bens transaccionáveis:
PT  SPT*
A razão do índice de preços vem
PI
PI*

αPT  1  α PN
βPT*  1  β PN*
Considerando a lei do preço único (relativamente aos bens transaccionáveis),
podemos dividir o numerador da expressão acima por PT, e o denominador por SPT* :
PI
PI*
α  1  α 

PN
PT
P*
β
 1  β  N*
S
SPT
ou
PI
PI*
α  1  α 

PN
PT
PN* 
1
 β  1  β  * 
S 
PT 
Esta expressão pode ainda ser apresentada da seguinte forma:

PN*
 β  1  β . *
P 
PT
S  I* .
PI  α  1  α . PN
PT







Esta última expressão sintetiza a versão generalizada da PPP. Nela a evolução da
taxa de câmbio passa a depender dos preços dos bens não transaccionáveis. Assim, um
aumento do preço relativo dos bens não transaccionáveis num país levará à apreciação
da sua moeda, considerando tudo o resto constante. Ou seja, as alterações da taxa de
câmbio, devido a alterações no preço relativo entre os bens transaccionáveis e não
transaccionáveis, traduzem-se em alterações na taxa de câmbio real.
Apontamentos de Economia Monetária
24
ANEXOS DO CAPÍTULO 8
O mercado cambial
25
Capítulo 8 – O mercado cambial
Anexo 8.1: Taxas de câmbio de referência diárias
Apontamentos de Economia Monetária
26
Capítulo 8 – O mercado cambial
Fonte: www.bportugal.pt
Anexo 8.2: Evolução de algumas taxas de câmbio bilaterais
Fonte: Boletim Mensal do Banco Central Europeu – Dezembro de 2005.
Apontamentos de Economia Monetária
27
Capítulo 8 – O mercado cambial
Fonte: Boletim Mensal do Banco Central Europeu – Dezembro de 2005.
Apontamentos de Economia Monetária
28
Capítulo 8 – O mercado cambial
Anexo 8.3: Taxas de câmbio nominais, reais e efectivas
Fonte: Relatório Mensal do Banco Central Europeu – Dezembro de 2005.
Apontamentos de Economia Monetária
29
Capítulo 8 – O mercado cambial
Fonte: Relatório Mensal do Banco Central Europeu – Dezembro de 2005.
Anexo 8.4: Taxas de câmbio bid e ask
Fonte: www.bancobpi.pt
Apontamentos de Economia Monetária
30
CAPÍTULO 9
A Balança de
Pagamentos
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
Neste capítulo iremos caracterizar a Balança de Pagamentos e abordaremos
alguns assuntos com ela relacionados. Inicialmente, iremos apontar as principais
definições e convenções normalmente utilizadas quando se fala da Balança de
Pagamentos, iremos de seguida caracterizar sucintamente o princípio do registo
contabilístico, definir as suas principais componentes e identidades fundamentais,
estudar a problemática do financiamento do défice da Balança de Transacções Correntes
e abordar os principais aspectos monetários da Balança de Pagamentos. Finalmente,
iremos caracterizar, com algum pormenor, a abordagem monetária da Balança de
Pagamentos.
9.1. Caracterização da Balança de Pagamentos
9.1.1. Definições e convenções acerca da Balança de Pagamentos
A Balança de Pagamentos consiste num documento contabilístico onde se
registam as transacções económicas efectuadas entre agentes económicos residentes e os
não residentes (do país em questão), num dado período de tempo (regra geral, um ano).
Antes de mais, interessa clarificarmos o critério de residência. Neste contexto,
considera-se um agente económico como residente desde que este exerça a sua
actividade no país com carácter de permanência (mais de um ano) e esteja sujeito às leis
nacionais. Assim, em Portugal, são agentes económicos residentes:
 As filiais das empresas transnacionais a operarem em Portugal;
 Os cidadãos portugueses que realizam temporariamente (durante menos de um
ano) trabalho no estrangeiro;
 Os turistas portugueses no estrangeiro; e
 As embaixadas que o nosso país mantém no exterior.
Por sua vez, são considerados como não residentes:
 As filiais de empresas portuguesas a operarem no exterior;
 Os cidadãos estrangeiros que realizam temporariamente (durante menos de um
ano) trabalho em Portugal;
 Os emigrantes possuidores de contrato de trabalho de duração superior a um
ano;
 Os turistas estrangeiros em Portugal; e
 As embaixadas estrangeiras em território nacional.
Apontamentos de Economia Monetária
32
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
As transacções económicas que são alvo de registo na Balança de Pagamentos
dividem-se em dois grandes grupos: as transacções económicas com contrapartida e as
transacções económicas sem contrapartida. Nas transacções económicas com
contrapartida incluem-se a compra e venda de bens e serviços contra activos
monetários e/ou financeiros; a troca directa de bens e serviços e a troca de uns activos
monetários e/ou financeiros por outros. O fornecimento de bens e serviços sem
contrapartida e o fornecimento de activos monetários e/ou financeiros sem contrapartida
constituem o grupo das transacções económicas sem contrapartida.
9.1.2. Princípio do registo contabilístico
Nos registos da Balança de Pagamentos utiliza-se o método das partidas
dobradas, ou seja, qualquer conta debitada tem por contrapartida a movimentação de
uma ou mais contas a crédito de igual valor. Desta forma, contabilisticamente a Balança
de Pagamentos está sempre equilibrada.
Os princípios gerais de lançamento diferem segundo o tipo de operações
envolvidas. As operações não monetárias devem ser lançadas a crédito quando dão
origem a uma entrada de fundos do resto do mundo, e devem ser lançadas a débito
sempre que estejam associadas a uma saída de fundos para o resto do mundo.
As operações monetárias são operações que se referem a pagamentos e/ou
recebimentos efectuados e são lançadas de forma a equilibrar as operações não
monetárias que lhes deram origem. O seu registo deve ser efectuado a crédito sempre
que representam pagamentos efectuados e a débito os recebimentos efectivados.
Esquematicamente, temos:
Operações não monetárias
Operações monetárias
Débito (–)
Se dão origem a
pagamentos ao exterior
Se são recebimentos do
exterior
Crédito (+)
Se dão origem a
recebimentos do exterior
Se são pagamentos ao
exterior
Constituem exemplos de operações lançadas a crédito na Balança de
Pagamentos a exportação de mercadorias, o investimento directo estrangeiro em
Portugal e a prestação de serviços a turistas em Portugal. A sua contrapartida monetária
deverá ser registada a débito pelo aumento das disponibilidades líquidas sobre o
exterior. Facilmente se conclui que a importação de mercadorias, o investimento directo
de Portugal no exterior e a prestação de serviços a turistas portugueses no estrangeiro
Apontamentos de Economia Monetária
33
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
devem ser registados a débito; a sua contrapartida monetária regista-se a crédito pela
diminuição das disponibilidades líquidas sobre o exterior13.
9.1.3. Componentes da Balança de Pagamentos e identidades fundamentais
A Balança de Pagamentos é constituída por diferentes balanças. Vejamos, com
algum pormenor, cada uma delas.
9.1.3.1. Balança de Transacções Correntes
A Balança de Transacções Correntes (BTC) tem como principal componente a
Balança Comercial (ou Balança de Mercadorias). A Balança Comercial exprime a
diferença entre o valor das exportações (FOB14) e o valor das importações (FOB) de
bens que cruzam a fronteira nacional. O valor das exportações é registado a crédito e o
valor das importações é registado a débito, na Balança de Pagamentos15.
Se à Balança Comercial somarmos as Balanças de Serviços, de Rendimentos dos
Factores e de Transferências Unilaterais obter-se-á a Balança de Transacções
Correntes. A Balança de Serviços reflecte a diferença entre as receitas provenientes das
exportações de serviços e as despesas que respeitam a importações de serviços como
por exemplo transportes, turismo, seguros, serviços bancários, etc.. Na Balança de
Rendimentos dos Factores registam-se as receitas e os pagamentos dos factores
trabalho e capital, respectivamente, dos residentes em países estrangeiros e dos
residentes em território nacional. A Balança de Transferências Unilaterais integra as
transferências públicas efectuadas entre o nosso país e o estrangeiro. Tratam-se de
fluxos que não têm qualquer contrapartida. Relativamente ao caso português, destacamse as remessas dos emigrantes e os fundos da União Europeia.
A Balança de Transacções Correntes assume, assim, uma grande importância,
na medida em que expressa, de certa forma, a estrutura produtiva do país.
9.1.3.2. Balança de Capitais
A Balança de Capitais (BC) divide-se em duas balanças: a Balança de Capitais
de Médio e Longo Prazo (BCLP) e a Balança de Capitais de Curto Prazo (BCCP). A
BCLP concentra as operações que respeitam a saídas ou entradas por um período de
pelo menos um ano. A BCCP exprime fluxos de capitais entre o país e o estrangeiro que
13
Neste contexto, deve-se então destacar que: falar em desequilíbrios da Balança de Pagamentos só faz
sentido quando se consideram saldos parciais da mesma; um aumento das reservas é lançado a débito
(sinal “–“) e uma diminuição das reservas é lançada a crédito (sinal”+”). Além disso, nas operações sem
contrapartida, como o envio de remessas por emigrantes, de forma a respeitar o princípio das partidas
dobradas, movimenta-se a rubrica de transferências unilaterais.
14
FOB: Free on Board.
15
Sempre que a Balança Comercial apresenta um saldo positivo, isso significa que o país ganhou mais
com as suas exportações do que pagou pelas suas importações.
Apontamentos de Economia Monetária
34
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
entram ou saem por um período inferior a um ano, e inclui fundamentalmente créditos
comerciais privados e bancários.
9.1.3.3. Balança Básica
A Balança Básica (BB) resulta da soma da Balança de Transacções Correntes
com a Balança de Capitais de Médio e Longo Prazo, isto é:
BB = BTC + BCLP
A Balança Básica assume-se de elevada importância já que indica a situação
estrutural do país16.
9.1.3.4. Balança de Operações Não Monetárias
A Balança de Operações Não Monetárias (BONM) resulta do somatório da
Balança Básica com a Balança de Capitais de Curto Prazo mais os atrasos e
ajustamentos estatísticos17 e as operações em fase de classificação, isto é,
BONM = BB + BCCP + Atrasos e ajustamentos + Operações em fase de
classificação
Portanto, a Balança de Operações Não Monetárias mostra a quantia de divisas
que um país vai somar às suas reservas ou, pelo contrário, aquela que terá de ser coberta
pelas suas reservas, consoante o seu saldo seja positivo ou negativo.
9.1.3.5. Balança de Operações Monetárias
A Balança de Operações Monetárias (BOM) é formada pela variação das
disponibilidades líquidas sobre o exterior do banco central (DLXBC) e pela variação
das disponibilidades líquidas sobre o exterior em posse de outras instituições monetárias
(∆DLXOIM). O saldo da BOM indica-nos se as reservas de um país aumentaram ou
diminuíram (respectivamente, sinal “–“ e “+”).
Exemplo 1:
Considere-se uma exportação de mercadorias no valor de 1.000 u.m.. O registo
contabilístico desta operação será:
(–) Exportações (+)
1.000
(–) Divisas (+)
1.000
16
A partir de 1996 o seu cálculo deixou de ser feito no Relatório do Banco de Portugal por já não se fazer
a distinção entre capitais de curto e de médio e longo prazo.
17
Os atrasos e ajustamentos estatísticos decorrem dos problemas que as autoridades enfrentam na
elaboração da Balança de Pagamentos. A impossibilidade de obter informação sobre a totalidade das
transacções entre nacionais e estrangeiros pode estar relacionada com múltiplos factores, dos quais se
destacam o tratamento das encomendas postais, a fuga ao fisco através de declarações alfandegárias não
verdadeiras, etc.. Normalmente, este problema é ultrapassado através da elaboração de estimativas.
Apontamentos de Economia Monetária
35
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
Como se observa no Exemplo 1, na rubrica das divisas, o sinal negativo está
associado a um aumento das reservas. Repare-se que só assim é possível cumprir o
princípio contabilístico subjacente que assegura que a Balança de Pagamentos está
sempre equilibrada.
A Balança de Pagamentos é o resultado do somatório da BONM e da BOM18.
Como, por definição, o saldo da Balança de Pagamentos é nulo, podemos concluir que:
BONM = BOM
Atendendo ainda a que na BOM se registam apenas variações das
disponibilidades líquidas sobre o exterior (∆DLX), estejam elas na posse do banco
central (∆DLXBC), ou de outras instituições monetárias (∆DLXOIM), pode concluir-se
que:
∆DLX + BB + BCCP = 0
9.1.4. Excepções ao critério de residência
Depois de analisados os princípios de registo das operações da Balança de
Pagamentos, analisemos novamente o critério de residência que apresentámos no início
deste capítulo. De facto, existem algumas excepções ao critério de residência, que
analisaremos melhor com os exemplos seguintes.
i) Compra de ouro por parte do Banco de Portugal a uma empresa mineira
portuguesa
Trata-se de uma operação que é registada como se de uma exportação se
tratasse, ou seja:
Exportações
(+)
Reservas oficiais líquidas
(–)
(ouro monetário)
Esquematicamente, temos:
(–)
Divisas
(+)
Aumento das
reservas oficiais
líquidas
18
(–)
Balança Comercial
(+)
Exportações
Veja-se, neste contexto, o Anexo 9.1: Dados sobre a Balança de Pagamentos portuguesa.
Apontamentos de Economia Monetária
36
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
ii) Venda de divisas ao Banco de Portugal por parte das OIM
(–)
Divisas
Aumento das disponibilidades líquidas externas
do Banco de Portugal
(+)
Diminuição das disponibilidades externas das OIM
iii) Reinvestimento de lucros por parte de uma filial de uma multinacional
(regista-se como se a filial exportasse os lucros para a sede e esta
reinvestisse na filial)
Considerando que os lucros totais são 300 u.m. das quais 100 u.m. são
reinvestidas, o registo processa-se como se a filial repatriasse a totalidade dos
lucros e reinvestisse a parte não distribuída, ou seja:
(–)
BCLP
(+)
100
(–)
Reservas
100 300
(+)
(–)
Rendimentos (+)
300
iv) Importação de mercadorias no valor de 1.000 u.m.. Transporte respectivo
por uma transportadora nacional no valor de 50 u.m..
O registo do transporte processa-se como se o mesmo tivesse sido feito por uma
transportadora estrangeira, efectuando-se, de seguida, o lançamento oposto.
(–)
Importações (FOB) (+)
1.000
(–)
Reservas
(+)
50 1.000
50
(–)
Serviços
50 50
(+)
9.1.5. O financiamento do défice da BTC
Tal como vimos anteriormente:
BONM = BOM
Atendendo a que BONM = BTC + BCLP + BCCP e BOM = ∆DLX, a
identidade acima pode ser reescrita da seguinte forma:
BTC + BCLP + BCCP = –∆DLX
ou ainda
–BTC = ∆DLX + BCLP + BCCP
A análise desta última igualdade permite-nos retirar algumas conclusões sobre a
relação que existe entre o saldo da BTC e as componentes que figuram no segundo
membro da identidade. De facto:
Apontamentos de Economia Monetária
37
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
 Um défice da BTC tem como contrapartida uma redução das disponibilidades
líquidas sobre o exterior (∆DLX>0) e/ou uma aquisição de activos financeiros
nacionais por não residentes, ou Investimento Directo Estrangeiro (IDE) em
Portugal (BC>0);
 Um excedente da
BTC
tem como
contrapartida um
aumento
das
disponibilidades líquidas sobre o exterior (∆DLX<0) e/ou uma aquisição de
activos financeiros externos por residentes, ou IDE de Portugal no exterior
(BC<0).
9.1.6. Os aspectos monetários da Balança de Pagamentos
De acordo com a análise que temos vindo a fazer em relação à Balança de
Pagamentos, com certeza que já pudemos constatar que existe uma relação entre a
Balança de Pagamentos e a massa monetária. Essa relação resulta do facto de um das
componentes da BP, as DLX (ou reservas), constituírem um factor de criação
monetária.
Esquematicamente19, o Balanço Consolidado do Sistema Bancário (ou Síntese
Monetária) pode ser apresentado da seguinte forma:
Activo
Passivo
DLX
M2
CI
em que:
DLX: disponibilidades líquidas sobre o exterior;
CI: crédito interno.
Em termos de variações, poderá então dizer-se que:
∆DLX + ∆CI = ∆M2
Neste sentido, podemos então afirmar que ∆DLX e ∆CI constituem factores de
criação monetária. Assim, uma variação das disponibilidades líquidas sobre o exterior
pode fazer variar a massa monetária. Tal só não acontece se as autoridades monetárias
esterilizarem os efeitos da Balança de Pagamentos na massa monetária, isto é, se:
∆CI = –∆DLX
Porém, deve notar-se que, no Balanço Consolidado, as DLX apresentam um
sinal contrário ao que registam na Balança de Pagamentos (por exemplo, um aumento
das DLX é registado com sinal negativo na BP e com sinal “+” no Balanço Consolidado
19
Reveja-se, neste contexto, a secção 3.1. A Base Monetária: componentes e contrapartidas.
Apontamentos de Economia Monetária
38
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
do Sistema Bancário). Se se proceder à correcção devida, a equação anterior apresentará
a seguinte forma:
–∆DLX + ∆CI = ∆M2
ou, e utilizando a relação já definida atrás:
BTC + BCLP + BCCP + ∆CI = ∆M2
o que permite concluir que:
∆CI = 0 e se BTC < 0 e BTC  BCLP  BCCP então ∆M2 < 0
9.2. A abordagem monetária da Balança de Pagamentos
A principal proposição da abordagem monetária à Balança de Pagamentos (BP)
é que esta é, essencialmente, embora não exclusivamente, um fenómeno monetário.
A abordagem monetária é uma análise de longo prazo: no curto prazo (ou
curtíssimo prazo) os factores não monetários são importantes para explicarem a
evolução da BP.
Assim, em termos de longo prazo, um défice na BP é o resultado de um excesso
de oferta de moeda (Ms > Md) resultante, por exemplo, de uma excessiva criação de
crédito. Da mesma forma, um superávite na BP estará associado a um excesso de
procura de moeda (Md > Ms). Deste modo, um aumento da procura nominal de moeda,
ceteris paribus, levará a um superávite na BP e a um consequente aumento da oferta de
moeda para restabelecer o equilíbrio no mercado monetário. Da mesma forma, um
aumento da oferta de moeda resultante de um aumento do crédito interno, ceteris
paribus, (logo Ms – Md > 0) levará a um défice da BP e a uma consequente redução da
oferta de moeda para restabelecer o equilíbrio no mercado monetário.
A ilação fundamental para a política económica que se retira desta proposição da
abordagem monetária é a seguinte: sendo o desequilíbrio da BP (desequilíbrio de
fluxos) motivado pelo desequilíbrio entre a procura e a oferta de moeda (desequilíbrio
de stocks) então deve “atacar-se a distorção na sua fonte”, ou seja, devem utilizar-se os
instrumentos de política monetária no combate ao desequilíbrio externo.
9.2.1. O conceito de desequilíbrio da Balança de Pagamentos
Tal como vimos anteriormente,
BP = BTC + BC + ∆DLX  BTC + BC = –∆DLX, com ∆R = ∆DLX.
Para os monetaristas, a variação das reservas (∆R) é o reflexo do desequilíbrio
no mercado monetário. O que é determinante para os desequilíbrios da BP é saber se o
Apontamentos de Economia Monetária
39
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
stock de moeda que os agentes económicos estão a deter é igual à oferta de moeda.
Quando a oferta de moeda é diferente da procura de moeda, há um desequilíbrio ao
nível dos stocks, justificando assim o desequilíbrio ao nível dos fluxos dos bens. Assim,
há défice na BP quando Ms > Md, e há superávite na BP quando Md > Ms.
Em câmbios flexíveis, a BP é automaticamente equilibrada através das
alterações da taxa de câmbio porque BTC + BC = –∆R e ∆R = 0. Assim, um défice na
BP reflecte que Ms > Md, e a moeda deprecia-se, o que leva a que Md aumente até que
Md = Ms. Por outro lado, um superávite na BP reflecte Md > Ms, havendo uma
apreciação da moeda, que faz com que Md diminua até que Md = Ms.
Em câmbios fixos, o banco central intervém no mercado monetário para manter
a taxa de câmbio fixa. Se houver um défice na BP (Ms > Md) o banco central intervém
no mercado cambial comprando moeda nacional e vendendo moeda estrangeira, logo há
diminuição de reservas e diminuição de Ms até que Ms = Md. Na equação que nos dá o
equilíbrio da BP temos ∆DLX > 0 e BONM < 0.
Se houver um superávite na BP (Md > Ms), o banco central intervém no mercado
cambial comprando moeda estrangeira e vendendo moeda nacional, logo há um
aumento das reservas e um aumento de Ms até que Ms = Md. Na equação que nos dá o
equilíbrio da BP tem-se ∆DLX < 0 e BONM > 0. Assim BTC + BC + ∆DLX = 0
quando a BP está equilibrada.
9.2.2. O modelo monetário
Neste modelo vamos considerar que:
 Existem 2 países apenas, o país doméstico e o país estrangeiro, cujas
variáveis são identificadas com “*”;
 S designa a taxa de câmbio definida ao incerto para a moeda do país
doméstico;
 P* é o nível de preços no país estrangeiro (geralmente, considera-se P* =
1);
 R representa as reservas: divisas e ouro em posse do banco central.
9.2.2.1. Hipóteses e equações do modelo
As hipóteses subjacentes à construção deste modelo são:
Hipótese 1: A função de procura de moeda, Md, é estável, definida com base na
teoria quantitativa da moeda, e pode ser traduzida pela equação:
Md = k.PY, k > 0, k =
Apontamentos de Economia Monetária
1
V
40
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
Md
 k.Y
logo,
P
em que Md é a procura nominal de moeda, k mede a sensibilidade da procura
nominal às variações nominais do rendimento, P é o índice de preços domésticos, Y é o
rendimento real doméstico, V é a velocidade de circulação da moeda e
Md
é a procura
P
de moeda em termos reais.
A partir desta função podemos dizer que:
 Se o rendimento real variar (∆Y), a procura de moeda (Md) varia no
mesmo sentido;
 Se o nível de preços domésticos (P) variar, a procura nominal de moeda
varia no mesmo sentido;
 A função de procura agregada (AD) do modelo vai ser:
1 1
Y  Md . .
k P
 Quando os preços aumentam, o rendimento real diminui e vice-versa.
A representação geométrica da AD pode obter-se considerando k fixo, e
Ms Md

definindo P = f(Y) a partir da equação de equilíbrio
, ou seja,
P
P
Ms = k.PY. Assim, a curva é convexa em relação à origem e desloca-se
para a direita, por exemplo, por um aumento da oferta de moeda,
conforme a figura seguinte:
P
Gráfico 9.1: O efeito de um aumento da
oferta de moeda na curva de procura
agregada
AD2
AD1
Y
Hipótese 2: O modelo admite pleno emprego, o que implica que a curva da
oferta agregada é vertical.
Graficamente:
Apontamentos de Economia Monetária
41
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
P
AS1
Y1
Gráfico 9.2: O efeito de um aumento da
produtividade (devido ao progresso
técnico) na curva de oferta agregada
AS2
Y2
Y
A AS1 desloca-se para AS2 por um aumento da produtividade devido ao
progresso técnico e, assim, o pleno emprego fica associado a um nível mais elevado de
rendimento real, Y2.
Hipótese 3: A evolução da taxa de câmbio é explicada pela teoria da paridade
dos poderes de compra (PPP), ou seja, S 
P
. A PPP significa que um cabaz de bens
P*
tem o mesmo preço nos dois países quando esse preço é expresso na mesma moeda. Ou,
ainda, que a taxa de câmbio é determinada pelos índices de preços relativos dos bens
transaccionáveis.
Gráfico 9.3: A evolução da taxa de
câmbio e o nível de preços
Graficamente:
P
P = SP*
C
A
B
S3
S1
S2
S
A inclinação da PPP é dada por P*. Assim, a recta desloca-se para cima quando
P* aumenta e desloca-se para baixo quando P* diminui.
No ponto A verifica-se a condição de PPP: SP* = P. Considerando que P* se
mantém constante, no ponto B o nível de preços interno é o mesmo que em A, mas SP*
> P, o que significa que o preço dos bens é menor na economia doméstica, ou seja, a
economia doméstica tem um ganho de competitividade. Sendo assim, aumenta a
procura de moeda nacional, pelo que essa moeda tende a apreciar-se, ou seja, S tende a
diminuir até que a taxa de câmbio volte a atingir S1.
Apontamentos de Economia Monetária
42
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
Em C temos que: P > S3P*, o que significa que o preço dos bens é menor na
economia estrangeira, ou seja, perda de competitividade para a economia doméstica.
Logo diminui a procura de moeda nacional e S aumenta até voltar a S1.
Hipótese 4: A função de oferta de moeda é dada por: Ms = CI + R. A ideia
subjacente a esta equação é a seguinte: para aumentar a oferta de moeda o banco central
ou cede crédito interno (CI) ou compra divisas (R).
Graficamente:
Gráfico 9.4: A procura de moeda, a
oferta de moeda e as reservas
Ms, Md
Ms
M1
Md
CI1
R1
R
Variações de R provocam deslocações na curva Ms, e variações de CI provocam
deslocações da mesma curva.
Apresentadas as várias hipóteses e equações, a ilustração geométrica do modelo
em equilíbrio é a seguinte:
Gráfico 9.5: O modelo monetário em equilíbrio
P
P
AS
Ms, Md
Ms
P = SP*
P1
P1
M1
AD
S1
S
Y1
Md
CI1
Y
R1
R
9.2.2.2. A equação monetária para a determinação da taxa de câmbio
Considerando que:
i) A procura de moeda no país doméstico é definida por:
Md = k.PY
ii) A procura de moeda do país estrangeiro é definida por:
Apontamentos de Economia Monetária
43
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
Md* = k*.P*.Y*
iii) A taxa de câmbio é determinada pela PPP:
S
P
P*
iv) Em equilíbrio, a procura de moeda é igual à oferta de moeda em cada país:
Md = Ms,
Md* = Ms*
v) A função de oferta relativa de moeda é:
Ms
Ms *

kPY
k * .P * .Y *
vi) Resolvendo a última expressão em ordem à taxa de câmbio, vem:
S
Ms
k* Y * P
.

P*
M * k Y
s
.
em que a moeda do país doméstico está cotada ao incerto.
Esta última equação diz-nos que a taxa de câmbio é determinada pela procura e
oferta relativa de moeda nos dois países. Assim, o aumento da oferta de moeda
nacional, ceteris paribus, levará à sua depreciação enquanto o aumento do rendimento
doméstico relativamente ao rendimento estrangeiro leva à apreciação da moeda
nacional. A razão é que o aumento no rendimento leva ao aumento da procura de moeda
doméstica para transacções, que implica uma apreciação em câmbios flexíveis.
O aumento de Ms implica, deste modo, a depreciação da moeda, considerando
que tudo o resto permanece constante20.
9.2.3. Efeitos de uma desvalorização
De acordo com a abordagem monetária, a desvalorização só tem efeitos na BP
porque provoca antes o desequilíbrio no mercado monetário.
Considerando que tudo o resto permanece constante, este aumento de Md levará
ao superávite da BP e a um consequente aumento da oferta nominal de moeda (Ms) para
manter o equilíbrio no mercado monetário. Esse aumento de Ms tem como contrapartida
um aumento das reservas.
Como uma das hipóteses da abordagem monetária é a verificação da PPP
P 

S 
 se o nível de preços internacionais, P*, se mantiver, então a desvalorização
P *

20
Nesta forma de apresentar o modelo monetário e a equação monetária foi seguida a abordagem de K.
Pilbeam (1992).
Apontamentos de Economia Monetária
44
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
da moeda nacional (aumento de S) tem como consequência no longo prazo um aumento
do índice de preços (aumento de P).
Em termos geométricos, e seguindo a metodologia de Pilbeam21, temos:
Gráfico 9.6: O efeito da desvalorização no modelo monetário
P
P
AS
Ms, Md
P = SP*
Ms
P2
P2
A
P1
AD2
P1
AD1
S1
S2
Y1
S
M2
M2 d
M1
M1 d
CI1
Y
R1
R2
R
A desvalorização da moeda nacional (aumento de S1 para S2) teve como
consequência um ganho de competitividade no curto ou curtíssimo prazo (ponto A).
Este ganho de competitividade levou a um aumento das exportações com consequente
aumento da procura nominal de moeda por parte dos importadores estrangeiros.
Regista-se um desequilíbrio no mercado monetário: Md > Ms. No pressuposto de
estarmos em câmbios fixos, para evitar a revalorização da moeda nacional, o banco
central intervém no mercado cambial oferecendo a moeda nacional (aumento de Ms) e
comprando a moeda estrangeira (aumento de R). Começa, assim, o processo de
ajustamento que restabelecerá o equilíbrio no mercado monetário: o aumento de Ms leva
ao aumento da procura agregada de bens (deslocamento da AD1 para AD2) com o
consequente aumento do nível de preços (aumento de P1 para P2); o aumento do nível
de
preços
restabelece
o
equilíbrio
no
mercado
monetário
 M 2 M1
M d M s 


com

encontrando-se novamente a economia sobre a PPP.
 P

P
P
P
2
1


Em síntese, a vantagem competitiva da desvalorização – vantagem de curto ou
curtíssimo prazo – que se traduziu por um aumento das reservas, teve como
contrapartida o custo do aumento da inflação, no longo prazo.
9.2.4. Críticas à abordagem monetária
Alguns monetaristas argumentam que num sistema de câmbios fixos o aumento
da oferta de moeda pode não se reflectir numa equivalente redução das reservas.
21
Pilbeam, Keith (1992), “International Finance”, London, McMillan.
Apontamentos de Economia Monetária
45
Capítulo 9 – A Balança de Pagamentos
Suponhamos que o aumento inicial da oferta de moeda se deveu a um aumento
do crédito interno (∆CI). Então, para que a oferta de moeda se mantenha constante é
necessário haver redução equivalente nas reservas, isto é, ∆CI = –∆R. Esta análise pode
ser confirmada, também, a partir da equação da determinação da taxa de câmbio no
modelo monetário:
S n,j
M s k* Y*
 s . .
M * k Y
Para que a taxa de câmbio se mantenha fixa, Ms tem de se manter constante
(considerando que todas as outras variáveis se mantêm constantes).
A argumentação defende que ΔR  ΔM s . Tal resulta da hipótese da curva da
oferta agregada, AS, não ser vertical, ou melhor, ter um ramo ascendente o que traduz a
hipótese de, no curto prazo ou curtíssimo prazo, haver desemprego. Neste caso, o
aumento de Ms pode levar ao aumento do produto real (Y), ao aumento da procura de
moeda (Md = k.PY), diminuindo as pressões para a desvalorização da moeda nacional.
Neste caso, as reservas não terão de diminuir na mesma proporção do aumento da oferta
de moeda.
Por outro lado, a abordagem monetária assenta na hipótese de uma função de
procura de moeda estável e na hipótese da taxa de câmbio ser determinada pela
evolução dos índices de preços relativos dos bens transaccionáveis. Estas duas hipóteses
são pouco realistas no curto prazo e têm sido postas em causa pelos dados estatísticos.
Finalmente, critica-se também o facto da abordagem monetária não proceder à
análise da composição do défice da Balança de Pagamentos, nomeadamente a distinção
entre a Balança de Transacções Correntes e a Balança de Capitais. Para os monetaristas,
o desequilíbrio na BP deve-se ao desequilíbrio no mercado monetário, logo não devem
ser tomadas medidas de política económica, nomeadamente políticas de carácter
orçamental, para corrigir um défice na BP, por exemplo. Concretamente, se há um
excesso de oferta de moeda – devido, por exemplo, à diminuição da procura de moeda –
que, segundo a abordagem monetária, conduz à diminuição das exportações e ao défice
da BP, então a solução preconizada pelos monetaristas é a redução da oferta de moeda
através da redução do crédito interno, ou seja, uma medida de política económica
contraccionista. Quando aos efeitos de curto prazo em termos de desemprego, essa não
é uma preocupação da abordagem monetária.
Apontamentos de Economia Monetária
46
ANEXOS DO CAPÍTULO 9
A Balança de Pagamentos
47
Anexo 9.1: Dados sobre a Balança de Pagamentos portuguesa
Fonte: Relatório Anual do Banco de Portugal (2004).
48
CAPÍTULO 10
A integração monetária
49
Capítulo 10 – A integração monetária
A União Económica e Monetária (UEM) constitui o exemplo mais recente da
criação de uma zona de integração monetária. Num contexto de integração monetária é
particularmente relevante identificar as condições que possibilitam a criação de uma
zona monetária óptima, isto é, identificar os factores que minimizam os custos e
maximizam os benefícios que estão associados à criação de uma União Monetária
(UM).
As uniões monetárias podem ser completas ou incompletas. Uma união
monetária é completa quando os países abdicam das suas moedas nacionais e se cria
uma moeda única. A união monetária é incompleta quando os países decidem manter as
taxas de câmbio fixas mas não abdicam das suas moedas nacionais.
A análise tradicional das zonas monetárias só considera os custos que decorrem
da constituição de uma união monetária. O pioneiro desta análise é Mundell (1961) que
se preocupou com a minimização dos custos para que a UM pudesse ser considerada
óptima. A análise moderna considera também os seus benefícios.
10.1. As teorias sobre as zonas monetárias óptimas
O problema de se saber qual a dimensão óptima que deve ter um espaço
monetário é uma questão cujas respostas, na teoria económica, são dadas
essencialmente pelos seguintes critérios:
- o critério da mobilidade de factores;
- o critério do grau de abertura das economias.
Tendo em conta o critério da mobilidade de factores, de Mundell22, dois países
têm interesse em constituir uma união monetária, se a mobilidade de factores entre eles
for mais acentuada do que entre eles e países terceiros. No caso contrário, os dois países
deverão, de acordo com este critério, adoptar, entre si, o regime de câmbios flexíveis.
Suponhamos que se verifica, por razões não monetárias, uma deslocação da
procura de produtos do País A para o País B. Esta deslocação da procura cria uma
tendência para que surja um défice da Balança de Pagamentos e para o aumento do
desemprego no País A, e simultaneamente, tensões inflacionistas e um excedente da
Balança de Pagamentos do País B. Em regime de câmbios flexíveis, a depreciação da
moeda A e a subida do valor da moeda B, permitiria corrigir desequilíbrios nos dois
países.
22
Mundell, R. (1961), “A Theory of Optimal Currency Areas”, American Economic Review, 51.
Apontamentos de Economia Monetária
50
Capítulo 10 – A integração monetária
Se a mobilidade de factores entre os dois países for elevada, este desequilíbrio
pode também ser corrigido mediante as deslocações de mão-de-obra, capital, e de outros
factores de produção, do País A para o País B, sem alteração da taxa de câmbio. Essa
deslocação de factores de produção permite eliminar, no País A, o défice da Balança de
Pagamentos e a tendência para o aumento do desemprego, e no País B, eliminar as
tensões inflacionistas e impedir o excedente da Balança de Pagamentos. Nestas
circunstâncias, a união monetária entre dois países seria preferível à modificação das
taxas de câmbio.
Gráfico 10.1: Choque assimétrico na procura agregada em dois países
País A
País B
PA
PB
SA
SB
D’B
DA
DB
D’A
YA
YB
O critério de abertura das economias de Mckinnon23 baseia-se no peso das
transacções internacionais do país, em relação ao PIB. De acordo com este critério,
quando este indicador apresenta valores bastante elevados, torna-se conveniente para o
país escolher um regime de câmbios fixos relativamente aos seus principais parceiros
comerciais. Isto porque uma variação dos preços dos produtos transaccionados com o
exterior (tanto exportados como importados) exerce, neste caso, uma influência muito
acentuada sobre a repartição entre procura interna e externa. Por exemplo, uma
depreciação da moeda, para corrigir um défice da Balança de Pagamentos, tem como
resultado um aumento muito significativo das transferências de recursos para o exterior
(exportações) e uma diminuição também acentuada da utilização de recursos externos
(importações). Neste caso seria mais conveniente, de acordo com este critério, escolher
o regime de câmbios fixos ou a união monetária com os principais parceiros comerciais.
Se, pelo contrário, o grau de abertura do país ao exterior é reduzido, as variações da taxa
23
Mckinnon, R. (1963), “Optimum Currency Areas”, American Economic Review, 53.
Apontamentos de Economia Monetária
51
Capítulo 10 – A integração monetária
de câmbio apenas afectam os preços de um número reduzido de produtos, pelo que o
regime de câmbios flexíveis se torna preferível.
Outros autores, como Kenen24, vêm juntar aos argumentos da mobilidade de
factores e do grau de abertura das economias a importância da diversificação duma
economia para que esta adira a um sistema de câmbios fixos ou a uma união monetária,
e demonstra que as economias mais diversificadas são menos afectadas em termos de
emprego, quando surge um choque negativo sobre a procura externa, em regime de
câmbios fixos. Posteriormente, Kindleberger25 realçou a necessidade dos países que
constituem uma união monetária manifestarem o mesmo tipo de preferências no que
toca a variáveis como a taxa de inflação e a evolução da produtividade e dos salários
reais, entre outros. Essa necessidade da convergência de preferências fundamenta-se
nas teorias explicativas da taxa de câmbio, particularmente na teoria da paridade dos
poderes de compra26 e a teoria da paridade das taxas de juro27.
10.2. Os custos e os benefícios da integração monetária
10.2.1. Os custos da integração monetária
Falar em custos da moeda única é o mesmo que falar dos custos de se deixar de
ter a moeda nacional. Em termos de política económica, as autoridades deixam de ter à
sua disposição dois instrumentos: alteração do preço da moeda nacional em termos de
outras moedas (taxa de câmbio) e alteração da quantidade de moeda nacional em
circulação (a oferta de moeda com os consequentes efeitos sobre a alteração da taxa de
juro).
A política económica intervém no mercado ou para alterar os preços, e
indirectamente alterar a quantidade, ou para alterar directamente a quantidade. Perder a
moeda nacional é perder os instrumentos de política económica: taxa de câmbio e taxa
de juro.
Considera-se que perder o instrumento taxa de câmbio tem um custo elevado
porque se pressupõe que a utilização deste instrumento é benéfica em certos períodos
para aumentar o nível do produto e do emprego. Quando se considera que a perda deste
Kenen, P. (1969), “The Theory of Optimum Currency Areas: An Ecletic View”.
Kindleberger, C. (1986), “International Public Goods without International Government”, American
Economic Review, 76.
26
Reveja-se, neste contexto, o Capítulo 8 – O mercado cambial, Secção 8.2. Teorias explicativas do
valor da taxa de câmbio.
27
Reveja-se, neste contexto, o Capítulo 8 – O mercado cambial, Secção 8.1.4.5. A arbitragem das taxas
de juro com cobertura do risco de câmbio: a condição de paridade dos juros coberta.
24
25
Apontamentos de Economia Monetária
52
Capítulo 10 – A integração monetária
instrumento tem custos elevados admite-se que os efeitos benéficos no curto prazo
podem ser significativos para os países que desvalorizam as suas moedas. Todavia,
estes benefícios não são evidentes. Não ocorrem imediatamente e no longo prazo
produzem efeitos sobre o nível de preços28.
Perde-se, também, como se disse, a possibilidade de alterar a oferta de moeda
uma vez que esta passa a ser gerida centralmente pelo banco central e a sua influência
sobre a taxa de juro é definida pelo conjunto de países que integram a moeda única. Se
todos os países perderem este instrumento, então parece que não faz sentido falar em
custos da moeda única para um dado país. Fará sentido defender-se a ideia de que um
país terá mais custos que outros se, no momento da integração, as estruturas económicas
desses países diferirem significativamente29, nomeadamente se apresentarem:
- diferentes reacções aos choques assimétricos na procura e na oferta;
- diferentes preferências em relação à inflação e ao desemprego;
- diferenças nas instituições do mercado de trabalho e em relação à mobilidade
laboral e flexibilidade salarial;
- diferenças nas taxas de crescimento económico dos países;
- diferenças nos sistemas fiscais;
- diferenças nos graus de abertura ao exterior das respectivas economias.
Outro custo importante da união monetária afecta os países onde a produtividade
é mais baixa. É que uma das consequências da moeda única é a tendência para a
uniformização dos preços de cada produto, em todo o espaço monetário integrado.
Assim, suponhamos que, no País A, a produtividade média do trabalho é metade da que
se verifica no País B30. Assim, um bem cuja produção requer duas horas de trabalho no
País A leva uma hora a produzir no País B. Para que ele tenha o mesmo preço em
ambos os países, os salários no País A deverão ser metade dos do País B. Isto significa
que dentro da união monetária os habitantes dos países cuja produtividade é mais baixa
28
De facto, um dos custos suportados por um país ao aderir a uma união monetária é a perda da
possibilidade de manter, ou de fazer aumentar, a competitividade externa dos seus produtos através de
manipulações (depreciações) do valor externo da sua moeda. A desvalorização de moeda nacional
permite a um país ganhar competitividade externa, na medida em que as suas exportações se tornam mais
baratas para o exterior. No entanto, esta desvalorização também acarreta o aumento dos preços das
importações. Se estas tiverem um peso acentuado na economia do país, a sua subida de preço pode criar
tensões inflacionistas que anulam ou, pelo menos, reduzem os ganhos de competitividade obtidos com a
desvalorização inicial.
29
Relembre-se, neste contexto, a importância que foi atribuída aos critérios de convergência no âmbito do
nascimento da União Económica e Monetária.
30
Devido, por exemplo, à melhor tecnologia disponível no País B, ou à maior abundância de recursos
naturais.
Apontamentos de Economia Monetária
53
Capítulo 10 – A integração monetária
(ou progride menos do que as restantes) irão empobrecer relativamente aos habitantes
dos outros países. Se cada país possuísse a sua moeda, e o poder de compra dos salários
fosse idêntico nos dois países, o nível médio de preços no País A seria o dobro do País
B e, tendo em conta a teoria da paridade dos poderes de compra, a taxa de câmbio entre
as duas moedas deveria ser 2A = 1B. Deste modo, as diferenças de produtividade
seriam corrigidas pela taxa de câmbio31.
10.2.2. Os benefícios da integração monetária
Segundo Fonseca (2005), de entre as principais vantagens da criação de uma
união monetária podemos destacar:
 A eliminação dos custos suportados com as operações cambiais (comissões
pagas aos bancos pelos importadores e exportadores, entre outros);
 A eliminação do risco cambial (que constitui, por vezes, um obstáculo ao
comércio internacional);
 A disciplina monetária a que os bancos centrais dos países aderentes à união
monetária se vêm obrigados durante o processo de integração monetária,
com o objectivo de manter a taxa de inflação em valores relativamente
baixos;
 Para as empresas importadores e exportadoras torna-se muito mais fácil fazer
a comparação dos preços dos produtos entre os diferentes países membros;
 A importância, no sistema monetário e financeiro internacional, da moeda
única é maior do que a moeda nacional de cada país membro da união
monetária, o que permite assegurar mais facilmente a estabilidade do seu
valor em relação às moedas de outros países;
 Os países menos importantes da união monetária podem conseguir manter as
taxas de juro internas a um nível mais baixo do que anteriormente, visto que
os investidores estrangeiros não exigem prémios de risco tão elevados para
neles aplicarem os seus capitais32.
31
Este argumento, levado ao extremo, implicaria que dentro de cada país fossem criadas diferentes
unidades monetárias, uma vez que, no mesmo espaço nacional existem, frequentemente, diferenças de
produtividade entre regiões.
32
De facto, foi o que veio a acontecer no caso português. Comparando as taxas Lisbor e as taxas Euribor
(para uma mesma maturidade) pudemos constatar que, durante o período de transição (em que coexistiam
as duas taxas de referência), as taxas Euribor apresentaram valores relativamente mais baixos do que as
taxas Lisbor (para igual maturidade).
Apontamentos de Economia Monetária
54
Capítulo 10 – A integração monetária
10.2.3. A relação entre os custos/benefícios da moeda única e o grau de
abertura dos países
A adesão de um país a uma zona de integração monetária deve exigir a avaliação
dos custos e dos benefícios que atrás foram enunciados.
Nos países relativamente abertos, a desvalorização aumenta o preço dos
consumos intermédios (CI) importados quando esse preço é expresso em moeda
nacional. O aumento do preço dos CI faz deslocar a curva de oferta agregada para a
esquerda, levando ao aumento do nível de preços interno sem que haja alteração do
produto e do emprego.
Como a propensão marginal a importar é menor nos países relativamente
fechados, a deslocação da curva de oferta agregada é menor nestes países. Por isso, nos
países relativamente fechados, a desvalorização leva a um menor aumento do índice de
preços e tem um efeito positivo sobre o nível do produto e o nível de emprego.
Geometricamente, temos:
Gráfico 10.2: Os efeitos de uma desvalorização num país aberto e num país fechado
País fechado
País aberto
P
P
AS’
E2
AS
E1
AD’
AD
Y
E2
AS’
AS
E1
AD’
AD
Y
Assim, a taxa de câmbio (nomeadamente a política de desvalorização) é um
instrumento pouco eficaz num país aberto. Logo, perder esse instrumento não representa
um grande custo para um país relativamente aberto como Portugal. Quanto ao país
relativamente fechado a situação é diferente.
Geometricamente, esta relação inversa entre o grau de abertura e os custos da
moeda única está representada na figura seguinte:
Apontamentos de Economia Monetária
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Capítulo 10 – A integração monetária
Gráfico 10.3: Os custos da moeda única e o grau de abertura
Custos
PIB
X M
PIB
É também possível relacionar os benefícios de uma união monetária com o grau
de abertura de uma economia. Neste caso, deverá notar-se que as economias mais
abertas são as que têm maiores custos de transacção (a maior parte das suas transacções
são com o exterior) e a eliminação desses custos favorecem-nas mais.
Por outro lado, antes de uma adesão à união monetária, os países mais abertos
registam maiores riscos cambiais, uma vez que as suas empresas exportam para
diferentes mercados. Logo, serão as economias mais abertas que mais ganharão com a
eliminação do risco cambial. Geometricamente, a relação entre os benefícios da
constituição de uma união monetária e o grau de abertura pode, portanto, ser
representada da seguinte forma:
Gráfico 10.4: Os benefícios da moeda única e o grau de abertura
Benefícios
PIB
X M
PIB
Sobrepondo os dois gráficos, temos:
Apontamentos de Economia Monetária
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Capítulo 10 – A integração monetária
Gráfico 10.5: Os custos e os benefícios da moeda única e o grau de abertura
Custos, Benefícios
PIB
Benefícios
E
Custos
X M
PIB
Uma análise do gráfico anterior permite-nos então concluir que existe um valor
crítico para o grau de abertura de uma economia a partir do qual se revela acertada a
adesão a uma união monetária.
Exercícios sobre o Capítulo 10
1 – À luz da teoria das zonas monetárias óptimas diga, sinteticamente, se a União
Europeia forma uma zona monetária óptima.
2 – Discuta, em termos de análise de custos-benefícios, a participação de Portugal na
União Económica e Monetária.
3 – Relacione a análise custos-benefícios da moeda única com o grau de abertura dos
países.
Apontamentos de Economia Monetária
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BIBLIOGRAFIA
 FERRRAZ, António (2002), “Economia Monetária Internacional”, Lisboa,
Escolar Editora;
 FONSECA, J. A. Soares da (2005), “Moeda e Crédito”, Coimbra, FEUC;
 MENDONÇA, António e outros (1998), “Economia Financeira Internacional”,
Amadora, McGraw-Hill;
 PILBEAM, K. (1992), “International Finance”, London, McMillan;
 SILVA, Ilídio (2002), “Sebenta de Mercados Financeiros”, Viseu, IPV;
 Boletim Mensal do Banco Central Europeu – Dezembro de 2005.
SÍTIOS UTILIZADOS/RECOMENDADOS
 www.bportugal.pt
 www.bancobpi.pt
 www.ecb.org
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