Universidade Federal Fluminense Departamento de Medicina Clínica Texto didático para o curso de graduação em Medicina Professora Mônica Kopschitz Praxedes Lusis Anemia Aplástica Conceituação Síndrome caracterizada pela destruição das células precursoras da hematopoese, que resulta em pancitopenia periférica, com marcada hipocelularidade da medula óssea e substituição do tecido medular por células gordurosas. É uma doença rara, porém com mortalidade elevada. A maior parte é adquirida e idiopática. Epidemiologia Incide igualmente em ambos os sexos. Alguns estudos observaram variação bimodal (15-25 anos e >60 anos). Europa – 2 casos/milhão de habitantes por ano. Etiologia Adquirida 1. Radiações ionizantes Sobreviventes das explosões nucleares no Japão Acidentes em usinas nucleares Exposição médica e profissional 2. Drogas e Substâncias químicas 2.1. Agentes que regularmente produzem depressão medular nas suas doses habitualmente utilizadas ou na exposição normal Drogas citotóxicas para o tratamento do câncer Benzeno – hidrocarboneto lipofílico volátil, obtido do carvão e destilados de petróleo, utilizado na indústria de borracha, couro, corantes, baterias, explosivos e solventes. É encontrado na gasolina e na fumaça do cigarro. O espectro do envenenamento pelo benzeno inclui, mais freqüentemente que a anemia aplástica, o achado de anemia ou trombocitopenia ou leucopenia, podendo causar também anemia hemolítica e LMA. 2.2 Agentes que muito provavelmente estão associados à anemia aplástica, porém com baixa probabilidade de que a doença ocorra. Cloranfenicol Risco de 1:20.000 ou 10-50X o risco normal. Anemia aplástica ocorre durante o seu uso ou até semanas ou meses após. Supressão da eritropoese dose dependente ocorre em 50% dos pacientes expostos a doses elevadas da droga. Reversível se a droga for suspensa. Causa vacuolização dos precursores eritróides, elevação do ferro sérico e reticulocitopenia. Aplasia irreversível – Reação idiossincrásica. Inseticidas Drogas para tratamento de infecções por protozoários: quinacrina e cloroquina AINE – Fenilbutazona, Indometacina, Ibuprofeno Anticonvulsivantes – Hidantoínas, Carbamazepina Sais de ouro e outros metais pesados como arsênico, bismuto e mercúrio. Sulfas Drogas anti-tireoidianas como metimazol e propiltiouracil Antidiabéticos como tolbutamida e clorpropamida Acetazolamida (inibidor da anidrase carbônica) D penicilamina Estrogênios 2.3. Agentes raramente associados com Anemia Aplástica Antibióticos como Streptomicina, tetraciclina, meticilina, sulfametoxazol+TMP Mebendazol Cimetidina, Ranitidina, clorfeniramina Clorpromazina, clordiazepóxido Allopurinol Metildopa Quinidina Lítio 3. Vírus Hepatites Epstein Barr vírus HIV Hereditária Anemia de Fanconi Doença autossômica recessiva que pode estar associada a baixa estatura, pigmentação anormal da pele, anormalidades esqueléticas como ausência ou hipoplasia nos polegares, carpo e rádio, hipoplasia do baço, agenesia renal e microcefalia. As contagens sanguíneas são normais até os 5-10 anos de idade, quando passam a sofrer quedas progressivas. Diagnosticada ao exame de citogenética que mostra numerosas quebras cromossômicas ao acaso. A ausência de reparo do DNA está associada a neoplasias sólidas e LMA e o único tratamento curativo é o TMO. Fisiopatologia Células progenitoras CD34 ou células tronco hematopoéticas muito reduzidas em número. Estroma da medula óssea normal. Produção de Fatores de crescimento hematopoéticos pelo estroma é normal. Supressão medular imunologicamente mediada por linfócitos T citotóxicos. Pacientes que sobrevivem têm maior chance de desenvolver Síndrome mielodisplásica e LMA anos mais tarde. Quadro Clínico Tríade Clássica da Síndrome de Insuficiência Medular Anemia Hemorragias por plaquetopenia (petéquias, equimoses, sangramentos mucosos, hemorragia digestiva, AVC hemorrágico) Infecções por granulocitopenia (Sepse por bactérias e fungos) Ausência de adeno e organomegalias Diagnóstico Hemograma Anemia normo ou macrocítica com reticulócitos baixos Ausência de eritroblastos ou de reação leuco-eritroblástica Leucopenia com neutropenia acentuada Trombocitopenia marcada Biópsia de Medula Óssea e Mielograma Medula aplásica, ausência dos precursores das linhagens eritróide, mielóide e megacariocítica Substituição por células gordurosas Presença de linfócitos, plasmócitos e histiócitos Prognóstico e Tratamento Mortalidade elevada. Sobrevida média 3-6 meses, sem tratamento adequado. 1. Tratamento curativo com transplante alogênico de medula óssea. Melhores resultados com pacientes até 20 anos (75% sobrevida em 5 anos) e piores acima de 40 anos (35% sobrevida em 5 anos). 70% dos pacientes não tem irmãos HLA compatíveis, necessitando recorrer a doadores não relacionados. A sensibilização por múltiplas transfusões aumenta o risco de rejeição do enxerto. Parte dos pacientes desenvolve reação enxerto versus hospedeiro, devendo fazer uso prolongado de imunossupressores, que causa cataratas, disfunções endócrinas e infertilidade, além do risco aumentado de desenvolvimento de neoplasias secundárias. 2. Terapia Imunossupresora Soro anti-linfocitário: ATG- derivado da imunização de animais com timócitos humanos normais ALG- derivado da imunização de animais com linfócitos humanos do ducto torácico Ciclosporina – droga que causa imunossupressão de linfócitos T Pulsos de 6 Metilprednisolona Muitos pacientes tratados com imunossupressão respondem parcialmente e recaem anos mais tarde. Este tratamento aumenta o risco de neoplasias secundárias como LMA, Linfomas não Hodgkin e tumores sólidos e pode provocar complicações como cataratas, necrose óssea e falência renal. 3. Tratamento suporte Transfundir o mínimo possível, pacientes com chance de TMO, evitando sempre sangue de doadores da família. Se possível administrar sangue previamente irradiado e utilizando filtros leucocitários. Utilizar concentrados de plaquetas de doador único por aférese. Antibióticos de largo espectro para tratamento das infecções em paciente com neutropenia severa.