LEGALIZAÇÃO DA MACONHA ÉPOCA 1- Em março, uma reunião ministerial na Áustria discutirá a política de combate às drogas na última década. Espera-se que o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, modifique a posição conservadora histórica dos Estados Unidos. A questão racial pode influir, já que, na população carcerária americana, há seis vezes mais negros que brancos. Os EUA gastam US$ 35 bilhões por ano na repressão e, em pouco mais de 30 anos, o número de presos por envolvimento com drogas decuplicou: de 50 mil, passou a meio milhão. A cada quatro prisões no país, uma tem relação com drogas. No site da Casa Branca, Obama se dispõe a apoiar a distribuição gratuita de seringas para proteger os viciados de contaminação por aids. Alguns países já adotam essa política de “redução de danos”, mas, para os EUA, o cumprimento dessa promessa da campanha eleitoral representa uma mudança significativa. A Colômbia, sede de cartéis do narcotráfico, foi nos últimos anos um laboratório da política de repressão. O ex-presidente Gaviria afirmou, no Rio, que seu país fez de tudo, tentou tudo, até violou direitos humanos na busca de acabar com o tráfico. Mesmo com a extradição ou o extermínio de poderosos chefes, mesmo com o investimento de US$ 6 bilhões dos Estados Unidos no Plano Colômbia, a área de cultivo de coca na região andina permanece com 200 mil hectares. “Não houve efeito no tráfico para os EUA”, diz Gaviria. Há 200 milhões de usuários regulares de drogas no mundo. Desses, 160 milhões fumam maconha. A erva é antiga – seus registros na China datam de 2.723 a.C. –, mas apenas em 1960 a ONU recomendou sua proibição em todo o mundo. O mercado global de drogas ilegais é estimado em US$ 322 bilhões. Está nas mãos de cartéis ou de quadrilhas de bandidos. Outras drogas, como o tabaco e o álcool, matam bem mais que a maconha, mas são lícitas. Seus fabricantes pagam impostos altíssimos. O comércio é regulado e controla-se a qualidade. Crescem entre estudiosos duas convicções. Primeira: fracassou a política de proibição e repressão policial às drogas. Segunda: somente a autorregulação, com base em prevenção e campanhas de saúde pública, pode reduzir o consumo de substâncias que alteram a consciência. Liderada pelos ex-presidentes, a comissão defende a descriminalização do uso pessoal da maconha em todos os países. “Temos de começar por algum lugar”, diz FHC. “A maconha, além de ser a droga menos danosa ao organismo, é a mais consumida. Seria leviano incluir drogas mais pesadas, como a cocaína, nessa proposta”. 2- “A lei sempre pode melhorar, mas sou contra esse tipo de mudança”, diz o deputado estadual Edson Ferrarini (PTB-SP), que há 36 [???] mantém uma entidade de recuperação de dependentes de drogas. “Nossa legislação já é atualizada. Hoje, não existe ninguém preso por fumar maconha. O problema é que 90% das pessoas envolvidas com drogas como cocaína, heroína e crack começaram com maconha. E, no Brasil, as pessoas começam cedo nas drogas.” Para ele, assim como para a ONU ou para o governo americano, controlar a oferta das drogas por meio de políticas de segurança e do combate ao tráfico e ao consumo é a melhor forma de combater os danos que elas causam à saúde. 3- Liberar ou não? A FAVOR CONTRA - Menos pessoas morreriam no combate ao tráfico - Centenas de bilhões gastos todo ano por governos do mundo com a repressão às drogas poderiam ser investidos em outras áreas - Poderia haver redução da criminalidade, pois muitos crimes são cometidos para financiar o tráfico - Haveria menos presos apenas por uso de drogas e, portanto, mais espaço nas cadeias para criminosos perigosos - Poderia haver maior controle de qualidade das drogas, o que reduziria o número de mortes - As violentas disputas entre traficantes pelo mercado de drogas não terminariam - Com mais viciados, poderia haver um aumento no número de crimes cometidos, em busca de dinheiro para sustentar o vício - Poderia haver um aumento no número de dependentes, pois as drogas seriam mais baratas e acessíveis - Grandes indústrias poderiam distribuir drogas e, como fazem com cigarros ou álcool, incentivar seu consumo - Os sistemas públicos de saúde gastariam mais com o tratamento de dependentes 4- As drogas pelo mundo China – Mantém uma política de tolerância zero. Os traficantes são condenados à morte e os viciados são obrigados por lei a seguir programa de desintoxicação Tailândia – Não há tolerância. O tráfico de drogas também pode ser punido com a pena de morte. Traficantes menores podem ser condenados a cumprir penas em campos de serviço militar Alemanha, Espanha e Itália – Descriminalizaram o uso da maconha recentemente. Como a Holanda, a Alemanha mantém programas de distribuição de seringas entre viciados em drogas injetáveis, para reduzir casos de aids Suécia – Tem uma lei conservadora, que não distingue a maconha das outras drogas. O consumo de qualquer droga é considerado perigoso e reprimido pela polícia Inglaterra – Desde 2002, a maconha é considerada droga de baixo risco, que não leva à prisão. Mas, em 2008, o governo começou a estudar um novo endurecimento em sua política Estados Unidos – Em alguns estados, como Massachussetts, não é crime usar maconha. Em outros, como o Oregon, a maconha pode ser usada em tratamentos médicos. Mas a política nacional é de repressão Holanda – Foi o primeiro país a liberar o uso da maconha, em 1976. O consumo em bares especiais é liberado, mas a venda fora deles é proibida. Os consumidores de heroína são presos, mas encaminhados para tratamento Dinamarca e Suíça – São tolerantes com o uso de maconha e, como a Holanda, mantêm programas de apoio a viciados em heroína Austrália – Liberou o consumo da maconha e criou até salas especiais para viciados em heroína 5QUEM É O CONSUMIDOR Homem, jovem e da classe A 85% são brancos 62% estão na classe A 60% deles têm entre oito e 11 anos de estudos 80% ocupam a posição de filhos dentro de casa 49% têm cartão de crédito 35% têm cheque especial Fonte: Pesquisa “O estado da juventude: drogas, prisões e acidentes”, de Marcelo Negri (FGV) 6- “O Rio é uma cidade sitiada por causa do comércio de cocaína e, de repente, uns garotos tiram a atenção do que é mais importante”, afirma Mauro Lima, diretor do filme Meu nome não é Johnny – baseado na história real de um rapaz rico que vira traficante internacional. A realidade é conhecida dos moradores de qualquer cidade grande no Brasil. A menos de 1 quilômetro da casa de qualquer latino-americano ou norteamericano, diz o ex-presidente FHC, a maconha está disponível. Mas quem fuma maconha não dispõe da ajuda do sistema de saúde pública. Caso se torne um dos 10% que, em algum momento da vida, se tornam dependentes ou viciados, ele não terá assistência do Estado. GALILEU 1- Segundo dados do Cebrid (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas), o Brasil abriga cerca de 5 milhões de usuários de maconha. 2- No mundo, a produção de maconha cresceu 10 vezes em 25 anos. Nos EUA, a erva é agora o cultivo mais lucrativo, com o valor da colheita anual excedendo o do milho, da soja ou do feno – os três cultivos legais mais importantes do país. 3- O advogado criminalista César Rodrigues, de São Paulo, o mais procurado na cidade por jovens flagrados pela polícia na posse de maconha, é taxativo: “Eu estou com o governador do Rio de Janeiro e não abro. Maconha é calmante e não atrapalha em nada. Quem fuma não mata. Tenho 70 casos de crime. Nenhum teve maconha no meio”. 4- A erva e a lei Canadá – Primeiro país a aprovar a prescrição da maconha como um produto farmacêutico. O uso medicinal da droga já é legal há vários anos Holanda – A maconha está disponível nos “coffe shops” com licença do governo Índia – A erva é utilizada nos tratamentos que seguem a medicina tradicional do país EUA – O consumo da droga é ilegal pela legislação federal, embora alguns estados autorizem o uso da maconha Reino Unido – O uso pessoal de maconha continua ilegal, mas as autoridades fazem vista grossa. A aprovação farmacêutica ainda está sendo avaliada Austrália – A autorização para uso médico ainda rende um debate acalorado 5- Segundo o agente antidrogas mais famoso do Brasil, Francisco Carlos Garisto, além de não diminuir a criminalidade, a liberação deve provocar o aumento no número de usuários e um conseqüente crescimento nos casos em que a rede pública de saúde precise ser acionada. “O INSS não tem estrutura para tratar quem tem ataque epilético. Cuidam do baleado, mas, se não fossem os Alcoólicos Anônimos, não teríamos estrutura nem para atender pinguço. Que dirá drogados”. 6- Chefe da Divisão de Prevenção e Educação do Denarc, o Departamento de Narcóticos de São Paulo, o delegado Luiz Carlos Freitas Magno trabalha na área de repressão e prevenção ao tráfico há 30 anos e também pensa que o maior efeito da liberação seria a adesão de mais gente à droga. “Cigarro e álcool são muito consumidos porque há uma indústria legal e poderosa por detrás. Liberar a maconha é incrementar o número de consumidores”. 7- Mesmo entre os que defendem a proibição da droga, mandar para a cadeia quem consome maconha é considerado exagero. Para eles, a despenalização é a melhor saída, porque muitos juízes, promotores e delegados acabaram vendo que mandar um jovem pego com maconha para a cadeia era mais perigoso – para o indivíduo e para a sociedade – do que a própria droga. Nos Estados Unidos, 800 mil pessoas foram indiciadas por porte de maconha. Dez mil delas acabaram sendo processadas pelo Estado. Em 2003, havia 70 mil pessoas nas prisões dos EUA por posse de maconha. Muitos deles eram criminosos primários e jovens de classe média. Na cadeia, fizeram contato com bandidos de verdade. 8- O artigo 28 da lei 11.343, de 2006, que substitui a legislação anterior sobre o tema, dispõe que “quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização” está sujeito a penas de advertência, prestação de serviços à comunidade e medida educativa. 9- A erva e o nosso corpo O LADO MAU Cérebro – Provoca alterações na química cerebral, entre elas o bloqueio do neurotransmissor acetilcolina, que dispara vários processos no sistema nervoso Comportamento – Pode provocar dificuldade de concentração, atenção a detalhes e aprendizado de coisas novas e complexas. “Embaça” a percepção de tempo e certos aspectos da memória Coração – Aumenta o trabalho do órgão. As alterações nos batimentos e na pressão sanguínea são similares às de quem está sob forte estresse Pulmões – Com 50% a mais de alcatrão que o tabaco, irrita o órgão e pode provocar câncer no pulmão, cabeça e pescoço Sangue – Diminui o fluxo para os membros. Em casos extremos, pode provocar amputações O LADO BOM Dor – Amplia a sensação de euforia. Ajuda a diminuir o sofrimento provocado por enxaqueca e câncer Olhos – Reduz a pressão intraocular, uma bênção para quem sofre de males como o glaucoma Espasmos – Acredita-se que a droga ajude a reduzir os espasmos provocados por ferimentos na medula espinhal. No início dos anos 1900, o extrato de canabis era vendido como antiespasmódico Estômago – Ajuda a restabelecer o apetite de quem tenha perdido peso por câncer ou aids Náusea – Combate o mal-estar provocado pela quimioterapia e ajuda a diminuir os vômitos 10- “A maconha não é essa erva maldita que tanto falam, mas ela tem um efeito deletério sim. O problema é que ainda não sabemos todas as suas extensões. Em 2005, um tabu foi quebrado: a revista The Lancet, uma das mais importantes do mundo sobre medicina, trouxe um artigo que analisava 80 trabalhos científicos sobre a maconha. A publicação revelava que esses estudos eram todos de má qualidade. Não há relação direta de causalidade entre o uso da droga, distúrbios de comportamento e mau desempenho escolar. Há outros fatores operando. Não só a maconha”, diz o médico Elisaldo Carlini, do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas. SUPERINTERESSANTE 1- Quem fuma regularmente por muitos anos tem dificuldade para organizar grandes quantidades de informações complicadas. Num tipo de teste, um cidadão empilha cartas segundo regras que o paciente precisa deduzir, apenas observando o “jogo”. Com o tempo, as regras vão sendo mudadas. Quem não fuma deixa de perceber cinco de cada 100 mudanças de regra. Fumantes pesados cometem o mesmo erro oito vezes. 2- Grande parte dos usuários pesados, desses que fumam diariamente durante meses, acaba se viciando. As estatísticas indicam que até metade dos fumantes desse tipo perdem o controle sobre o hábito e precisam de tratamento para se recuperar. Entre os que não conseguem a cura, muitos apresentam sintomas que agravam a dependência. Ficam desmotivados para qualquer coisa, tornam-se menos produtivos em suas atividades, sofrem de depressão e têm a auto-estima abalada. 3- “Nota-se que a experiência com a canabis precede o interesse por outras substâncias”, segundo relatório da OMS. São as colas de sapateiro, as anfetaminas, a cocaína e a heroína. Os especialistas também escrevem que, “quanto mais cedo se começa a fumar, maior é o envolvimento com a maconha”. E concluem que, entre os jovens nessa situação, é maior a possibilidade de contato com coisas mais perigosas. 4- A canabis reage com moléculas dos neurônios em diversas partes do cérebro, como as que controlam o comportamento, o centro de memória e a coordenação motora. 5- “Usar a droga antes ou durante a gestação pode deixar as crianças mais suscetíveis a certos tipos raros de câncer”. Entre os tumores observados está o da chamada leucemia não-linfoblástica, que contamina o sangue, e o do rabdomiosarcoma, que ataca os tecidos nervosos. Mas ainda não há certeza de que a canabis esteja mesmo associada a esses males porque, se existe alguma outra causa, as pesquisas já feitas não conseguiram detectar. O relatório da OMS declara que é preciso investigar a hipótese mais a fundo. Um outro problema são as crianças que nascem pesando abaixo do normal devido ao contato prévio da mãe com a erva tóxica. Sobre esse ponto quase não restam dúvidas. 6- Existem indícios de que a droga deixa o organismo com falta de diversas substâncias essenciais à reprodução, entre as quais os hormônios. A carência ocorre durante uma das etapas da menstruação, a chamada fase luteal, e a ovulação demora mais do que demoraria normalmente. Esse efeito ainda não está bem esclarecido nas mulheres porque em alguns exames ele aparece e em outros, não. Mas os especialistass reunidos pela OMS estão convencidos de que ele existe, pois, nos testes com ratos e macacos, a queda de produção pôde sr medida com precisão. A conclusão dos pesquisadores é que a ação da maconha sobre o aparelho reprodutor feminino não deve ser menosprezada. 7- A maconha é prejudicial e ilícita. Mas o tabaco é um assassino e, paradoxalmente, é oferecido nos meios de comunicação como um irresistível objeto de desejo. Segundo a OMS, o cigarro é o réu principal em 80% dos cânceres do pulmão, 75% das bronquites e dos enfisemas do mundo, e aumenta em quase dez vezes as chances de derrame cerebral. A situação é tão delicada que diversos países, entre os quais a Alemanha e a França, proibiram o patrocínio dos carros de Fórmula 1 por companhias de cigarro. Existe pressão para que todos os países façam a mesma coisa a partir de 2000. No Brasil, um país em que o piloto Ayrton Senna virou herói nacional e ídolo das crianças usando as cores e a marca de um fabricante de cigarro, ainda não se combate com a necessária energia a propaganda do tabaco. 8- Beber é uma satisfação que os arqueólogos dizem ter sido descoberta pelo homem há cerca de 5.000 anos. Hoje, centenas de milhões de cidadãos cultivam os prazeres do álcool, há campanhas vendendo marcas e mais marcas de bebida e a lei não as proíbe – o que não quer dizer que elas não sejam ameaçadoras. Nenhuma droga pode concorrer com o copo em matéria de perigo: ele é responsável por mais da metade de todas as mortes provocadas pelas substâncias tóxicas consumidas na atualidade. Tomado por longo tempo, o álcool tem efeito corrosivo sobre os órgãos. No fígado, destrói as células e leva à cirrose. No sistema nervoso, as lesões desativam os sentidos e os reflexos, e cortam ordens do cérebro aos sistemas vitais, como o da respiração e o da circulação sanguínea. O colapso desses sistemas é uma das maneiras que a bebida tem de matar. DISSERTAÇÃO Discuta os pontos positivos e negativos da legalização da maconha e dê a sua opinião NARRAÇÃO Narre a história de um usuário, contando um episódio relacionado ao uso da maconha e o desfecho disso para a vida dele. CARTA Escreva para alguém com poder de influência para mudar as leis, dando a sua opinião sobre a legalização da maconha.