RESPONSABILIDADE DOS MÉDICOS – Rui Stocco (in Tratado de Responsabilidade Civil – 6ª ed., RT) NOTA INTRODUTÓRIA DE DOUTRINA: a) A atividade médica: origem e regulamentação 1- A tentativa ou o exercício da cura remonta a período longínquo, no início da civilização. Constituía uma prática empírica e rudimentar através da técnica "tentativa/erro - tentativa/acerto". Era, portanto, experimental. A atividade médica e a preocupação com o problema que as doenças ainda sem cura causavam não se traduzem em prática e discussão atual. Constituem matéria tratada desde os primeiros registros da existência de uma sociedade organizada. A existência de médicos leigos e curiosos ou experimentadores recebe notícia em épocas remotas da nossa civilização e já despertava a atenção da sociedade e dos dirigentes. Há registro do surgimento de médicos, ao lado dos "mágicos", curandeiros ou feiticeiros, nos primórdios.da humanidade, com indícios que remontam ao ano de 4000 antes de Cristo, entre os Sumérios, na Mesopotâmia. .. Até então, a cura dos males do homem (físicos ou mentais) era atribuída a forças divinas e à ocorrência de doenças relacionadas aos pecados. A conversão dessa prática em ciência ocorreu tempos depois. Mas os registros confiáveis mais antigos acerca da regulamentação da atividade médica surgiram nos séculos XVIII e XVII a.C, levada a efeito pelo sexto rei da Primeira Dinastia da Babilônia, o Rei KhamuRabi ("Hamurabi"), que reinou de 1728 a 1686 antes de Cristo, ao qual se atribui a instituição do Código de Hamurabi (cf. Revista Ser Médicos, ano V, n. 18). Nesse momento surgiram a discussão acerca da prática médica e as punições que ensejava. Nos seus 282 artigos, que dispõem sobre diversos assuntos, o Código de Hamurabi contém três preceitos cuidando da prática médica: "Art. 215. Se um médico trata alguém de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o cura ou se ele abre a alguém uma incisão com a lanceta de bronze e o olho é salvo, deverá receber dez siclos. " "Art. 218. Se um médico trata alguém de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o mata, ou lhe abre uma incisão com a lanceta de bronze e o olho fica perdido, dever-se-lhe-á cortar as mãos. " "Art. 219. Se o médico trata o escravo de um liberto de uma ferida grave com a lanceta de bronze e o mata, deverá dar escravo por escravo. " A romancista Taylor Caldwell, em livro baseado na vida de São Lucas, lembrou: "O poderoso e esplêndido Império Babilônico (ou Caldéia) não é familiar para muitos leitores, bem como não o são os estudos de medicina, os tratamentos médicos ali feitos pelos sacerdotes-médicos e sua ciência - que egípcios e gregos herdaram totalmente. Os cientistas babilônicos conheciam as forças magnéticas e se utilizavam delas. Tudo isso constava dos milhares de volumes da maravilhosa Universidade de Alexandria, incendiada pelo imperador Justiniano vários séculos mais tarde, num acesso de errôneo zelo. A medicina e a ciência modernas estão começando a redescobrir essas coisas. A época atual ficou mais pobre, em conseqüência do fervor de Justiniano. Se a ciência e a medicina da Babilônia nos tivessem chegado intactas, nosso conhecimento do mundo seria muitíssimo mais avançado do que atualmente" (Médico de homens e de almas. 29. ed. Rio de Janeiro: Editora Record, 2001, prefácio, p. 7). Extrai-se dos relatos bíblicos o cuidado dos judeus com a circuncisão dos infantes, que, ao lado de preceito religioso, apresenta indisfarçável preocupação higiênica e preventiva (cf. Euclides Benedito de Oliveira. Direito à saúde: garantia e proteção pelo Poder Judiciário. Revista de Direito Sanitário, São Paulo: LTr, v. 2, n. 3, 2001, p. 36-58). Na Pérsia antiga, exigia-se dos médicos habilitação profissional, após submissão a "prova" perante o Conselho Real. Nesse período o misticismo ainda prevalecia e a medicina era considerada uma arma para combater os demônios. No período de declínio do império romano, entre as diversas causas que contribuíram para a sua queda (ano 476 d.C., marcando o fim da Antigüidade e o início da Idade Média), ocorreram pestes e epidemias, com as quais os médicos não conseguiram sucesso, nem mostraram eficiência, até porque naquela época a medicina como ciência ainda era embrionária e incipiente. Esse insucesso contribuiu para o ressurgimento das práticas supersticiosas (cf. Roberto Margotta. História ilustrada da medicina. Editora Manole, 1998). Na Grécia antiga tivemos Hipócrates como a figura mais expressiva na área médica, nascido na llha de Cós (mar Egeu), em 460 ou 450 a.C., segundo o biógrafo Sorano de Éfeso. Aliás, entre os gregos o incentivo a práticas desportivas ligava-se ao ideal de saúde e vitalidade, com o objetivo de dotar-se de dois elementos fundamentais, ''força" e "beleza", visando o equilíbrio entre corpo e alma. O juramento que Hipócrates redigiu, invocado até hoje por sua atual pertinência, ressalta a dedicação ao doente, a boa prática da medicina e a busca incessante do conhecimento, nos seguintes termos: "Eu juro por Apolo médico, por Esculápio, Hígia e Panacea, e tomo por testemunhas todos os deuses e 1 todas as deusas, cumprir, segundo meu poder e minha razão, a promessa que se segue: estimar, tanto quanto a meus pais, aquele que me ensinou esta arte; fazer vida comum e, se necessário for, com ele partilhar meus bens; ter seus filhos por meus próprios irmãos; ensinar-lhes esta arte, se eles tiverem necessidade de aprendê-la, sem remuneração e nem compromisso escrito; fazer participar dos preceitos, das lições e de todo o resto do ensino, meus filhos, os de meu mestre e os discípulos inscritos segundo os regulamentos da profissão, porém, só a estes. Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém. A ninguém darei por com prazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza à perda. Do mesmo modo, não darei a nenhuma mulher uma substância abortiva. Conservarei imaculada minha vida e minha arte. Não praticarei a talha, mesmo sobre um calculoso confirmado: deixarei essa operação aos práticos que disso cuidam. Em toda casa, aí entrarei para o bem dos doentes, mantendo-me longe de todo o dano voluntário e de toda a sedução, sobretudo dos prazeres do amor, com as mulheres ou com os homens livres ou escravizados. Àquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto. Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça. " Segundo Roberto Margotta (ob. cit.), essa figura importante da nossa história possuía profundo conhecimento do sofrimento humano e enfatizava que o lugar do médico era ao lado do paciente. 11- Nos tempos atuais, aquele que pretender dedicar-se ao exercício da arte médica e tornar-se um profissional médico terá que cursar a escola básica ou fundamental (primeiro grau),.o segundo grau ou ensino médio e, depois, prestar vestibular como condição para freqüentar o curso superior e ser aprovado em uma das Universidades credenciadas a manter Faculdade de Medicina. Terminado o curso específico com duração de seis anos, terá que cumprir estágio de dois anos, vulgarmente denominado "residência médica”, em hospital. Somente após esse périplo é que poderá obter registro no Conselho Regional de Medicina como condição para exercer o seu mister. Aliás, observa Sérgio Cavalieri Filho: "Algumas profissões, pelos riscos que representam para a sociedade, estão sujeitas a disciplina especial. O erro profissional, em certos casos, pode ser fatal, razão pela qual é preciso preencher requisitos legais para o exercício de determinadas atividades laborativas, que vão desde a diplomação em curso universitário, destinado a dar ao profissional habilitação técnica especial, até a inscrição em órgão especial. Estão nesse elenco ,os médicos, dentistas, farmacêuticos, engenheiros etc.” (Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Malheiros Editores, 1996, p. 249). Cuida-se, pois, de atividade que depende de expressa autorização do Poder Público para ser exercida. Aliás, nos termos do art. 22, inciso XVI da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre as condições para o exercício de profissões. Para o exercício da medicina, impõe-se a inscrição 'no Conselho Regional do respectivo Estado, Território ou Distrito Federal. Portanto, a atividade médica é regrada, impondose ao profissional normas de conduta médica e até mesmo de comportamento pessoal. Essas regras e sistema de fiscalização encontramse estabelecidas no Código de Ética Médica, posto em vigor pela Resolução do Conselho Federal de Medicina 1.246, de 08.01.1988. Acerca desse estatuto, Jurandir Sebastião, ilustre magistrado em Minas Gerais e destacado autor, assim se expressa: "O atual Código de Ética Médica (Resolução n. 1.246/88) estabelece uma série de normas de conduta profissional, de proibição ou de obrigação e, ainda, o rol de prerrogativas individuais ou em grupo. Como categoria profissional regulamentada em lei (inciso XIII do art. 5°da CF/88, Decreto-lei n. 7.955, de 13.09.1945, Lei n. 3.268, de 30.09.1957, e Decreto n. 44.045, de 19 de julho de 1958), cumpre ao órgão de Cúpula Conselho Federal de Medicina - por competência delegada e mediante Resoluções, estabelecer e alterar as regras de conduta profissional de acordo com os avanços constantes da medicina e das novas necessidades do Estado e da civilização, como um todo – visto que a saúde é questão de interesse da própria humanidade. O próprio Código de Ética Médica em vigor prevê essa possibilidade de mudança constante, nos arts. 143 e 144, ancorados na letra 'd' do art 5.°, da Lei n. 3.268/57. As modificações, como dito, são feitas mediante Resoluções Normativas baixadas pelo CFM, revogando, modificando, complementando ou regulamentando os dispositivos atuais ou mesmo, a qualquer momento, adotando novo CEM. Portanto, para o exercício da medicina, as Resoluções Normativas baixadas pelo CFM são normas de cumprimento obrigatório. É óbvio que tais normas profissionais não podem se sobrepor às leis existentes. Estas prevalecerão sobre aquelas, em caso de eventual conflito. As normas regulamentares vigentes (CEM e Resoluções complementares) destinadas à punição dos médicos, devem ser 2 interpretadas restritivamente - como é da essência de qualquer direito punitivo. As novas obrigações ou proibições impostas, tanto por modificação no próprio CEM quanto por edição de Resolução que lhe venha complementar, entram em vigor na data de sua publicação; como regra. Só a partir da publicidade legal o cumprimento será obrigatório. Para que norma internacional, relativa à conduta profissional, seja cumprida no território nacional, em caráter cogente, é necessário que Resolução Normativa do CFM a adote. Por exemplo, a Declaração de Helsinque, elaborada por ocasião da 18ª Assembléia Mundial de Médicos em, 1964 e revista em 1975, cuidando de pesquisa clínica na prática terapêutica, foi adotada pelos médicos brasileiros por intermédio da Resolução n. 671/75 e revista pela Resolução nº 1.098/83 do CFM. Esta última se encontra em vigor. Assim como ocorreu, por exemplo, com a Resolução n. 1.243/87 (que cuida de 'quelação' nas doenças vasculares), o CFM pode, a todo instante, condenar ou regulamentar conduta técnica, permitindo, limitando ou reprovando determinada prática terapêutica. Em conclusão, pela Resolução n. 1.499/98 os médicos não podem utilizar qualquer prática terapêutica 'não reconhecida pela comunidade científica' . E o reconhecimento em nosso país é feito por meio de Resolução baixada pelo CFM" (Responsabilidade médica civil, criminal e ética. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 91-92). b) A relação entre médico e paciente Na passagem do século XIX para o século XX o médico era visto como profissional cujo título garantia a onisciência - médico da família, amigo e conselheiro - figura de uma relação social que não admitia dúvida sobre a qualidade de seus serviços e, menos ainda, a litigância sobre eles (cf. Ruy Rosado de Aguiar Júnior. Responsabilidade civil do médico. RT 718/33). O ato médico se resumia na relação entre uma confiança (a do cliente) e uma consciência (a do médico) (Miguel Reale. Código de Ética Médica. RT 503/47). Atualmente, conforme correta observação de Ruy Rosado de Aguiar Jr., "as circunstâncias estão mudadas. As relações sociais se massificaram, distanciando o médico do seu paciente. A própria denominação dos sujeitos da relação foi alterada, passando para usuário e prestador de serviços, tudo visto sob a ótica de uma sociedade de consumo, cada vez mais consciente de seus direitos, reais ou fictícios, e mais exigente quanto aos resultados" (artigo citado, p. 33). E mais, o considerável avanço científico, a extrema especialização em áreas estanques, a ponto dessa exacerbação do conhecimento localizado conduzir à especialização dentro da própria especialidade (ortopedista que só cuida das mãos, oftalmologista que só cuida de miopia ou do nervo ótico, ou da retina...), o desenvolvimento de técnicas médicas novas, a dependência de exames cada vez mais sofisticados, a globalização das descobertas e das drogas desenvolvidas, aumentando os recursos à disposição desses profissionais, fizeram aumentar a possibilidade de ação, no afã da cura, e, na mesma proporção, fizeram crescer os riscos. Aliás, o notável dramaturgo britânico Bernard Shaw, em tom de crítica, dizia que o especialista sabe cada vez mais sobre menos, até saber tudo sobre nada, enquanto o generalista sabe cada vez menos sobre mais, até saber nada sobre tudo. E, como a competência e a eficácia do resultado (embora se cuide, como regra, de uma obrigação de meios) éque caracteriza a medicina moderna, exacerbou-se grandemente a suspeita e a prevenção do paciente para com o médico, com o qual passou a ter uma relação episódica, rápida, pontual, e desprovida de uma maior interação.e empatia entre eles, até porque também o médico já não dispensa a mesma atenção que antes concedia aos seus pacientes, limitando-se a diagnosticar e prescrever. O automatismo no atendimento aos pacientes e a imposição do sistema público de saúde ou das grandes e modernas clínicas e hospitais particulares, conveniados ou credenciados por planos de saúde, nos quais a dinâmica de atendimento, com horários fixos de plantão e rígida repartição de tempo nos atendimentos, impuseram partilhamento na atenção aos pacientes e conduziram ao absurdo de o médico já não mais saber quem está atendendo e sequer o seu nome. O histórico de antecedentes desse paciente, o seu perfil e anamnese - necessários a uma consulta criteriosa e à busca do diagnóstico correto - são; mais das vezes, colhidos por outros, fazendo com que o profissional não se "envolva" com o paciente, não desenvolva sentimento de amizade, afeto, afeição ou consideração, nem lhe dedique um mínimo de comiseração. Quando indagado, como ocorreu recentemente em reportagem de televisão, certo profissional médico não lembrou de um nome sequer de seus pacientes e ainda indagou, verbis: "por que eu deveria lembrar dos nomes dos meus pacientes?" Do que se conclui que também o paciente converteu-se em um número. Esse estado de coisas converteu o médico em "prestador de serviços" e o paciente em "consumidor", e fez aumentar e exacerbou a suspeita e a prevenção deste último para com o primeiro e vice-versa. A conseqüência disso foi o excessivo número de ações de responsabilidade civil, ações essas que se proliferaram no mundo todo, especialmente nos Estados Unidos da América, onde, em 1970, um quarto dos médicos respondia a ações de reparação de dano (cf. Wanderby Lacerda Panasco. A 3 responsabilidade civil, penal e ética dos médicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,1984). c) As causas que podem conduzir ao dever de reparar Mas, independentemente disso, o médico tem o dever de agir com diligência e cuidado no exercício de sua profissão, dever esse consubstanciado em um Código que dita o seu comportamento moral e ético, ao qual deve respeito e obrigação. Portanto, essa exigência e cuidado devem ser estabelecidos segundo o atual estágio da ciência e as regras consagradas pela prática médica. São deveres estabelecidos no referido Código de Ética, ao qual todos os médicos devem respeito e obediência. Aliás, a legislação a respeito é pobre e escassa, pois regem a matéria, basicamente, a Lei 3.268, de 30.09.1957, dispondo apenas sobre os Conselhos de Medicina, regulamentada pelo Decreto 44.045, de 19.07.1958, e o Código de Ética Médica (Resolução 1.246, de 08.01.1988, do Conselho Federal de Medicina). Aguiar Dias assim decompõe as obrigações implícitas no contrato médico: 1. Conselhos; 2. Cuidados; 3. Abstenção de abuso ou desvio de poder (Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, n. 116). O primeiro deles corresponde ao dever de informação. O médico deve esclarecer o seu paciente sobre a sua doença, prescrições a seguir, riscos possíveis, cuidados com o seu tratamento; aconselhando a ele e a seus familiares sobre as precauções essenciais requeridas pelo seu estado. Mostra Caio Mário da Silva Pereira que, ao reverso do que ocorria anteriormente, a tendência hoje, seguindo a escola americana, é a de manter o paciente informado da realidade do seu estado (Responsabilidade médica. Coad 217). Quando os prognósticos são graves, é preciso conciliar esse dever de informar com a necessidade de manter a esperança do paciente, para não levá-lo à angústia ou ao desespero (Georges Boyer Chamard e Paul Monzein. La responsabilité médicale. Presses Universitaires, 1974, p. 132). Se a perspectiva é de desenlace fatal, a comunicação deve ser feita ao responsável nos termos do art. 59 do Código de Ética - Resolução n. 1.246, de 1988, do Conselho Federal de Medicina O prognóstico grave pode ser compreensivelmente dissimulado; o fatal, revelado com circunspecção ao responsável. Em se tratando de risco terapêutico, o médico deve advertir os riscos previsíveis e comuns, os excepcionais podem ficar na sombra (cf. Jean Penneau. La réforme de la responsabilité médicale. Revue Internationale de Droit Comparé, 1990, n. 3, p. "530). Na cirurgia, porém, especialmente na estética, a informação deve ser completa e exaustiva, inclusive quanto ao uso de novos medicamentos ou novas técnicas cirúrgicas. Tais esclarecimentos devem ser feitos em termos compreensíveis ao leigo, mas suficientemente esclarecedores para atingir seu fim, pois destinam-se a deixar o paciente em condições de se conduzir diante da doença e de decidir sobre o tratamento recomendado ou sobre a cirurgia proposta (cf. Ruy Rosado de Aguiar Jr., artigo citado, p. 36). Outro aspecto importante a ser evidenciado é que a intervenção médica há, sempre, de estar precedida do consentimento do paciente ou de seu responsável, salvo, evidentemente, os casos de atendimento de emergência, quando haja risco de vida ou de dano físico irreversível ou quando, durante a intervenção cirúrgica, surge um fato novo, a exigir imediata providência, sem tempo para interrompê-la e consultar os familiares. " "Nesse sentido o art. 46 do Código de Ética, que veda ao médico efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e o consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal. Demonstra o ilustre Min. Ruy Rosado que, "além dos deveres de informação, obtenção de consentimento e de cuidado, tem o médico os deveres de: a) sigilo, previsto no art. 102 do Código de Ética; b) não abusar do poder, submetendo o paciente a experiências, vexames ou tratamentos incompatíveis com a situação; c) não abandonar paciente sob seus cuidados, salvo caso de renúncia ao atendimento, por motivos justificáveis, assegurada a continuidade do tratamento (art. 61 do Código de Ética); d) no impedimento eventual, garantir sua substituição por profissional habilitado; e) não recusar o atendimento de paciente que procure seus cuidados em caso de urgência, quando não haja outro em condições de fazê-lo" (artigo citado, p. 37). Em resumo, a doutrina estabeleceu a conduta e a obrigação médica segundo alguns parâmetros, quais sejam: a) dever de aconselhar adequadamente o paciente; b) obrigação de tomar os cuidados necessários e manter sigilo; c) não cometer desvio ou abuso de poder (experiências médicas); d) dever de informação, esclarecendo o paciente sobre a doença, os cuidados, as prescrições, os riscos possíveis e as precauções a serem tomadas; e) manter o paciente informado da realidade do seu estado e dos riscos possíveis; f) nos casos de cirurgia exigir o consentimento do paciente (art. 46 do Código de Ética), salvo nas emergências, com informações completas sobre o 4 procedimento cirúrgico e a técnica a ser utilizada; g) não recusar atendimento ou omitir socorro. Com base nessa construção da doutrina, pode-se, desde logo, apontar algumas causas, diversas do erro médico, que poderão conduzir à obrigação de indenizar: I - a violação da lei ou do regulamento e o abuso de poder; II - a prática de experiências médicas com técnicas não aceitas; III - deixar de informar e aconselhar adequadamente o paciente; IV - o erro grosseiro no diagnóstico, como causa do insucesso no procedimento médico; V - a quebra do sigilo médico; VI - exorbitar dos limites estabelecidos no contrato; VII - a violação do consentimento do paciente; VIII - omitir ou negar socorro em caso de iminente perigo de vida ou de urgência. Do que ficou assentado pode-se extrair a primeira conclusão, ou seja: "O médico poderá ser responsabilizado em razão da infringência da lei e dos preceitos éticos, quando deles resultar danos". Ocorre que, como não se desconhece, a atividade do médico é de meio e não de resultado, salvo na cirurgia estética ou nos procedimentos embelezadores ou cosmetológicos. Assim, o profissional obriga-se apenas a empregar todo o seu esforço e atenção e a utilizar as técnicas consagradas e aceitas, não devendo fazer experimentos ou experiências, dele se exigindo apenas o melhor tratamento e a diligência necessária. Não se cobra dele um resultado, ou seja, a cura, a longevidade, a saúde perfeita ou que sobreviva até os cem anos de idade. Diante disso, podemos agora estabelecer a segunda conclusão, no sentido de que: "Por falta de resultado não se pune, nem se impõe reparação" (salvo as exceções apontadas). d) O erro médico e suas conseqüências Um dos aspectos da responsabilidade civil, no campo da atividade médica, que mais dificuldades apresenta pertine ao "erro médico", sua natureza, conceito e alcance. Segundo nos parece, ainda não ficou claro na doutrina o que seja "erro médico". Cabe esclarecer, desde logo, que o "erro de técnica", que não se confunde com o "erro médico", é visto com prudência e especial cuidado pelo Poder Judiciário e seus membros, no exercício da atividade de julgar. É que não cabe ao Juiz dizer se aquela técnica é boa ou má; se adequada, ou que existe outra melhor. O notável Yussef Said Cahali já alertava que "ao Juiz é defeso, por não ser de sua competência, pronunciar-se por essa ou aquela escola, optar por esse ou aquele método operatório" (Responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 348). Isso porque todo aquele que exerce publicamente uma arte, profissão ou ofício presume-se habilitado. E não poderia ser diferente, pois o médico - tal como outros profissionais liberais (advogado, dentista, psicólogo, engenheiro, arquiteto) -, ademais de ter de comprovar a conclusão de curso superior específico, estágio de residência e especialização para determinadas áreas, necessita autorização expressa do Poder Público para atuar, e, ainda, de credenciamento especial por parte do órgão de classe, no caso, o Conselho Regional de Medicina. Esse credenciamento, que às vezes é precedido de exigência de prova de capacitação, significa habilitação para o exercício da profissão. Ademais disso, sob outro enfoque, nos casos controvertidos ou duvidosos, o erro profissional não pode ser considerado imperícia, imprudência ou negligência. Impõe-se fazer nítida distinção entre "erro profissional" e "imperícia". Ocorre o "erro profissional" quando a conduta médica é correta, mas a técnica empregada é incorreta. Significa que o médico aplica corretamente uma técnica ruim para aquele caso. Há "imperícia" quando a técnica é correta e adequada, mas a conduta ou atuação do médico é incorreta ou desastrosa. Quer dizer o médico aplica mal uma técnica boa. A primeira hipótese ("erro profissional") contém o chamado "erro escusável", ou seja, justificável quando se cuida de técnica conhecida, usual e aceita. A segunda hipótese ("imperícia") contém o "erro inescusável" ou não justificável, portanto erro punível no plano civil e que impõe o dever de reparar. Diante desse escorço podemos fixar e estabelecer uma terceira conclusão, no sentido de que: "o erro profissional não pode ser objeto de valoração pelo Juiz, nem pode ser considerado como hipótese de imperícia, imprudência ou negligência". Impõe-se, então, resumir no sentido de que o médico pode ser responsabilizado não só quando se afasta daqueles parâmetros acima apontados, que são antecedentes ou anteriores à sua atuação procedimental propriamente dita junto ao paciente, e que ofendem os preceitos legais e éticos, como também responderá quando, no exercício de sua atividade típica junto ao paciente, age com dolo ou intenção de lesar ou com culpa, nas modalidades de imperícia - não confundível com o "erro profissional" -, negligência ou imprudência. Não há, contudo, como apontar exemplos ou estandartes que ensejem reparação, pois as hipóteses 5 em que nasce esse dever são várias e dependem da análise de cada caso concreto. Cabe, entretanto, não deslembrar que o médico é o guardião da vida, o protetor e responsável pela saúde física e mental das pessoas. Dele se exige correção, dedicação e até mesmo perfeição muito maior do que dos demais profissionais, pois o seu erro poderá importar em uma vida a menos e conduzir ao sofrimento, à dor, à angústia e à perda irreparável. Mas também deve ser visto como profissional e como indispensável à sociedade. Cabem aqui as palavras de advertência de Rosana Jane Magrini, forte em ensinamentos de Savatier: "O médico não é o responsável pelo caos da saúde no Brasil. Eliminar de nosso sistema de uma vez a indesculpável injustiça que se comete contra este nobre profissional é o que se deve buscar, porque, como disse René Savatier (De la responsabilité civile, 2. ed., t. 2, p. 778): 'A medicina não é ciência exata., a arte de curar requer, muitas vezes, dom divino" (Médico. Conduta. Teoria da imprevisão. Caso fortuito. Força maior. Nexo causal: Em matéria de responsabilidade, o exame da conduta do médico deve ser aferido com flexibilidade. RT 78l/145). Essa visão deve ser resguardada e preservada, pois o erro é exceção e acontecimento isolado ou episódico, não podendo extravasar e projetar-se em toda a classe e afetar a imagem da instituição como unidade. Portanto, valorizar o médico é valorizar a vida. O ideal a alcançar é que os médicos, que são guardiães da vida, possam continuar sendo verdadeiros guardiães. Mas, em conclusão, se da ação ou omissão dolosa ou culposa, que, neste caso, se traduz em "erro médico", o paciente vier a sofrer dano de qualquer ordem, seja físico, psíquico ou moral, nasce o dever de reparar, pois é ele destinatário daquele dever de guarda e incolumidade. 18.01 - A obrigação contratual do médico é de "meios" ou de "resultado"? (a questão da inversão do ônus da prova) V. tb. o Item 2.20 deste Capítulo (A Teoria do Resultado à Luz do Código de Defesa do Consumidor) e, também neste Capítulo, o Item 18.12 abaixo (Responsabilidade do Cirurgião Plástico na Cirurgia Estética ou Reparadora). NOTA DE DOUTRINA: 1. No Item 2.20 deste Capítulo, ao desenvolver estudos acerca da defesa do consumidor, esclarecemos a relevância e a distinção entre as obrigações de meio ou de resultado em face da chamada "teoria do resultado", aprofundando a pesquisa em torno desse tema instigante e controvertido, trazido a lume por R. Demogue, mas pouco compreendido por alguns e repudiado por outros, que não lhe dão importância, embora o tema seja de extrema importância no campo da prova. Convida-se o leitor a visitar aquela página, a fim de melhor entender a questão aqui estudada. 2. Ensina Aguiar Dias: "o que se torna preciso observar é que o objeto do contrato médico não é a cura, obrigação de resultado, mas a prestação de cuidados conscienciosos, atentos e, salvo circunstâncias excepcionais, de acordo com as aquisições da ciência" (op. cit, p. 284). Teresa Ancona Lopez, forte em ensinamentos de René Savatier (Traité de la responsabilité civile en droit français. Paris: LGDJ, 1939, t.l, p.146), traz esclarecimentos mais dilargados sobre a questão, assim expondo: "A questão da presunção de culpa e conseqüente inversão do onus probandi não se liga à divisão entre culpa contratual e aquiliana, mas, sim, ao fato de a doutrina e a jurisprudência, mais recentemente, interpretarem as obrigações contratuais como obrigações de meio e obrigações de resultado, e aí está, segundo o mesmo autor, 'a chave da mudança sobrevinda quanto ao ônus da prova'. Em resumo, o que importa na responsabilidade dos médicos é a relação entre a culpa e o dano para que possa haver direito à reparação; mas para maior apoio ao ofendido é preciso saber-se se o dano foi causado no inadimplemento de uma obrigação de meios ou, ao contrário, de resultado, pois neste último caso (e somente neste, cabe acrescentar) haverá inversão do ônus da prova e a vítima da lesão ficará em posição mais cômoda." "Ora, na obrigação de meios o que se exige do devedor é pura e simplesmente o emprego de determinados meios sem ter em vista o resultado. É a própria atividade do devedor que está sendo objeto do contrato. Esse tipo de obrigação é o que aparece em todos os contratos de prestação de serviços, como o de advogados, médicos, publicitários etc. Dessa forma, a atividade médica tem de ser desempenhada da melhor maneira possível com a diligência necessária e normal dessa profissão para o melhor resultado, mesmo que este não seja conseguido. O médico deve esforçar-se, usar de todos os meios necessários para alcançar a cura do doente, apesar de nem sempre alcançá-la." "Na obrigação de resultado o devedor, ao contrário, obriga-se a chegar a determinado fim sem o qual não terá cumprido sua obrigação. Ou consegue o resultado avençado ou deverá arcar com as conseqüências. É o que se dá, por exemplo, no contrato de empreitada, transporte e no de cirurgia estritamente estética ou cosmetológica. Em outras palavras, na obrigação de meios a finalidade é a própria atividade do devedor e na obrigação de 6 resultado, o resultado dessa atividade." "A obrigação do médico pode ser de meios, como geralmente é, mas também pode ser de resultado, como quando faz um Raio X, um checkup, aplica ondas de calor, dá uma injeção, faz transfusão de sangue, procede a determinada esterilização necessária ou, como já nos referimos, no caso da cirurgia plástica estética. Também há possibilidade da obrigação do médico ser de resultado quando assume expressamente a garantia da cura." "Dessa forma, a responsabilidade contratual do médico pode ser presumida ou não. Não há obrigatoriedade de presumir-se a culpa só por estarmos diante de um contrato. O parâmetro deve ser o tipo de obrigação assumida pelo facultativo com seu cliente. Se este se propôs a alcançar um determinado resultado, como na cirurgia estética, é presumidamente culpado caso não o atinja. Cabe a este profissional demonstrar a sua não culpa ou ocorrência de caso fortuito ou força maior. O cliente (credor) só deve demonstrar o inadimplemento, isto é, que o resultado não foi alcançado." "Ao contrário, se o médico somente se compromete a se esforçar para conseguir a cura, cabe à vítima do dano provar a sua culpa ou dolo. É o cliente ou a sua família que tem de demonstrar que o médico agiu com negligência, imprudência ou imperícia para que possa receber a indenização devida" (Responsabilidade civil dos médicos. Responsabilidade civil. Coord. Yussef Cahali. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 319-321). Desse entendimento, dentre outros, difere Reynaldo Andrade da Silveira ao dizer que "a responsabilidade contratual pode ou não ser presumida, e no caso do médico não o é", esclarecendo que assim se tem entendido porque via de regra o médico no desempenho de suas funções não tem comprometido um determinado resultado, mas apenas exige-se-lhe que se conduza de certa forma e que no caso do médico "não há o compromisso de curar, mas tão-somente o de proceder de acordo com as regras e os métodos da profissão". Por fim, alinha que "desta forma, a obrigação médica é de meio, e não de resultado, o que difere basicamente, sua responsabilidade das demais contratuais, mesmo que pertença no modelo jurídico a esta espécie" (Responsabilidade civil do médico. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 674, p. 57, dez./91). Discordamos desse ponto de vista pois há, sem dúvida comportamentos na profissão médica que se traduzem como uma obrigação contratual de resultado, como bem demonstrou Teresa Ancona, anteriormente citada, apontando, v.g., a cirurgia plástica de efeito meramente estético, em que a pessoa busca melhorar a sua aparência, não padecendo de qualquer mal, mas apenas afetada de vaidade, que é um bem. Nessa e em outras hipóteses o profissional promete, sem dúvida, um resultado e, portanto, assume contratualmente essa obrigação. Evidentemente que se o resultado procurado for a cura de um mal, de uma doença, não se poderá responsabilizar o médico tão-só em razão da não obtenção desse objetivo. Tal não poderá jamais ser exigido do médico pois a ciência médica é, por definição, uma ciência incompleta, que a cada dia busca e encontra novas fronteiras mas que defrontase com enfermidades novas ou desconhecidas. Como observou Nestor José Forster, "numa visão radical da questão, exigir do médico obrigação de resultado seria o mesmo que exigir dele onipotência devida, em que ele atuasse como senhor supremo da vida e da morte. Como, infelizmente, os seres humanos continuam a morrer, e isso ocorre também com os médicos, é evidente que a cura nem sempre é possível. Logo, tal resultado não poderia ser exigido de nenhum ser humano, nem mesmo do médico (Cirurgia plástica estética: obrigação de resultado ou obrigação de meios? Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 736, p. 83, fev./97). Mas nossa concordância com o autor citado não vai além disso. Em se tratando de cirurgia meramente estética não há como deixar de afirmar a obrigação de resultado do médico. Não se pode deslembrar que a responsabilidade de que cogitamos é contratual. Enquanto na atividade tradicional o médico oferece serviços de atendimento através de meios corretos e eficazes, comprometendo-se a proporcionar a seu paciente todo o esforço, dedicação e técnicas, sem, contudo, comprometer-se com a cura efetiva, na atividade de cirurgião estético o médico contrata um resultado, previsto, antecipado e anunciado. Não ocorrendo este, salvo nas intercorrências e episódios que atuem como elidentes de sua responsabilidade, cabe exigir-lhe o adimplemento da obrigação de resultado assumida. "Entende-se que a obrigação contratual assumida pelo médico não é de resultado mas de meios ou de prudência e diligência, como correntemente é referido. Não constitui objeto do contrato a cura do doente mas a prestação de cuidados conscienciosos e atentos. Caracterizada assim a natureza da obrigação resultante desse contrato, que obviamente não tem necessidade de ser firmado, mas cujo vínculo se forma quando, chamado, o médico aceita a incumbência de tratar o doente, assume em conseqüência, a obrigação de dar a este o tratamento adequado, isto é, conforme os dados atuais da ciência. A atenção ao chamado, seguida da visita e do tratamento iniciado, estabelecem o contrato entre o médico e o cliente" (TJRS – 1ª C.-Ap. -j. 21.l0.1976-AJURIS 17/76). V. tb. RJTJRS 61/194. 7 ''A responsabilidade dos médicos é contratual, mas baseada fundamentalmente, na culpa. A obrigação assumida não é de resultado, mas de meios, ou de prudência e diligência" (TJRJ -4ª C.Ap. 10.898-j. 11.03.1980 - Diário da Justiça do Rio de Janeiro, 07.05.1981, p. 64, Responsabilidade civil, 2. ed., coordenador Yussef Said Cahali, São Paulo, Saraiva, 1988, p. 348). "Não há obrigação por risco profissional, pois os serviços médicos são de meios e não de resultado" (TJSP – 2ª C. - EInfrs. - j. 30.12.1980 - RJTJSP 68/227). "A responsabilidade civil do médico não é idêntica à dos outros profissionais, já que sua obrigação é de meio e não de resultado, exceção feita à cirurgia plástica. A vida e saúde humanas são ditadas por conceitos não exatos" (TJSP – 7ª C. Ap. - Rel. Sousa Lima - j. 11.11.1992-JTJ-LEX 142/117). "A obrigação médica não é de resultado; não assume o médico o dever de curar o paciente. de aplacar todos os seus males e de transformar-se em guardião absoluto da sua vida. É intuitivo que a obrigação é de meio, mas nem por isso está o médico desobrigado de esgotar os cuidados terapêuticos disponíveis ao seu alcance" (TJRJ – 1ª C. - Ap. - Rel. Pedro Américo Rios Gonçalves-j. 27.09.1994-RT 723/435). "Embora haja um contrato entre médico e paciente, não basta a alegação de eventual descumprimento desse contrato para que o profissional da área da saúde seja responsabilizado, eis que sua atividade assume uma obrigação de meio e não de resultado; assim. o médico somente será obrigado a satisfazer o dano se este resultar de imprudência. negligência ou imperícia, conforme disposto no art. 1.545 do CC [atual art. 951]" (TJSP – 1ª C. de Dir. Privado - Ap. 21.815-4/8 - Rel. Guimarães e Souza-j.27.01.1998-RT 752/177). “Responsabilidade civil. Médico. Cirurgia plástica. "Onus probandi". Obrigação de resultado. Tabagismo no pós-operatório. - "A cirurgia plástica, com fins exclusiva ou preponderantemente estéticos, é cirurgia embelezadora e, por isso, a obrigação não é de meio e sim de resultado. Na hipótese de o resultado ser negativo e oposto ao que foi convencionado, presume-se a culpa profissional do cirurgião, até que ele prove sua não culpa ou qualquer outra causa exonerativa. Inobstante o fumar no período pós-operatório possa provocar os danos ocorridos, há necessidade de o réu provar que a cliente fumou, embora contra-indicação médica. Prova suficiente. Responsabilidade civil reconhecida" (TJRS - 1.a C. - Ap. - Rel. Tupinambá M. C. do Nascimento - j. 05.05.1992 - Bol. AASP 2.065/56). . "A responsabilidade contratual não pode ser presumida e no caso do médico não o é, porque, via de regra a obrigação deste é de meio e não de resultado, incumbindo, dessarte, ao autor provar se houve com culpa o médico ou o hospital, para fazer jus ao recebimento da indenização pleiteada" (TAPR - Ap. 128982700 - Rel. Mario Rau - j. 22.12.1998 Informativo Incijur, Joinville-SC, 13 ago. 2000, p. 11). · "No procedimento cirúrgico estético, em que o médico lida com paciente saudável que apenas deseja melhorar sua aparência física e. conseqüentemente, sentir-se psiquicamente melhor, estabelece-se uma obrigação de resultado que impõe ao profissional da medicina, em casos de insucesso a cirurgia plástica, presunção de culpa, competindolhe ilidi-la com a inversão do ônus da prova. de molde a livrá-lo da responsabilidade contratual pelos danos causados ao paciente em razão do ato cirúrgico" (STJ – 3ª T. - REsp 81.101 -Rel. Waldemar Zveiter - j.13.04.1999-RT 767/111 e RSTJ 119/290). Voto vencido do Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: "Pela própria natureza do ato cirúrgico, pouco importando sua subespecialidade, a relação entre o cirurgião e o paciente está subordinada a uma expectativa do melhor resultado possível, eis que toda a intervenção cirúrgica pode apresentar resultados não esperados, mesmo na ausência de culpa ou erro médico. Assim, a satisfação do contrato firmado entre médico e paciente para realização de cirurgia plástica; de cunho especificadamente estético, não depende, exclusivamente, da perícia ou diligência do cirurgião, mas de fatores idênticos aos de qualquer outra cirurgia, razão pela qual impossível autorizarse a inversão do ônus da prova, em casos de insucesso do procedimento cirúrgico, pois a responsabilidade do profissional, em tais hipóteses, deve ser apurada mediante a verificação da sua culpa no evento, nos termos do art. 14, § 4°, do CDC". ''A responsabilidade do cirurgião plástico é subjetiva, mas, em se tratando de obrigação de resultado e não de meio em que fica invertido o ônus da prova, prevalece a presunção da culpa pelos médicos pelo insucesso ou pela imperícia na cirurgia de melhoramento executada na autora, sem que houvesse prova idônea que ilidisse tal culpa. Resultado nefasto da cirurgia plástica e prova pericial não favorável aos réus. Reparação de danos material e moral. Aplicação, quanto aos ônus da sucumbência, do disposto no parágrafo único do art. 21 do CPC. Redução do valor do dano moral. 8 Recursos parcialmente providos" (TJRJ – 7ª C. Cível- Ap. 03.886/2001- Rel. Paulo Gustavo Horta j. 05.06.2001 - Bol. AASP 2.260/540). 18.02 - Anestesia: danos dela decorrentes (responsabilidade do anestesista) V. tb. a Nota de Doutrina do Item 18.13 abaixo. NOTA DE DOUTRINA: I - Um dos ramos da medicina e especialidade que mais tem progredido é aquele relativo ao campo da anestesiologia. Atualmente esse ramo é reconhecido como especialidade médica e não mais se admite que uma cirurgia extensa seja realizada sem a presença do médico anestesista. Aliás, sua atuação tem início antes do ato cirúrgico, pois impõe-se-lhe fazer. a anamnese, ou seja, uma pesquisa prévia sobre as condições do paciente; existência de problemas ou doenças preexistentes; alergia a algum produto ou medicamento; e, enfim, uma investigação completa da sua higidez, à luz dos exames prévios solicitados pelo médico cirurgião e pelo próprio anestesista, quando necessário, inclusive exame ou teste de sensibilidade e dos questionamentos e exames in loco daquele que será submetido à cirurgia. Somente diante desses dados e informações é que poderá planejar a técnica adequada e o tipo de anestésico a ser ministrado. Bem se verifica que a responsabilidade do anestesista não se resume apenas à sua atuação durante o ato cirúrgico. Tem início muito antes. Essa a razão pela qual a avaliação pré-anestésica assume fundamental importância e, se comprometer o ato anestésico em si ou, ainda, o pós-operatório, empenha responsabilidade de tantos quanto atuaram nessas fases, se qualquer das falhas verificadas estiver na linha causal que conduziu ao resultado lesivo. Constitui procedimento comum e usual a consulta antes da cirurgia (avaliação pré-anestésica) ser feita por um profissional e a anestesia ser ministrada por outro. Nesse caso, haverá responsabilidade solidária se o erro de avaliação (antecedente) influir no ato principal (conseqüente). É que se o insucesso teve como causa eficiente a negligência, imprudência ou imperícia na avaliação prévia, o médico anestesista, que a aceitou sem verificar a sua adequação; assume o risco das conseqüências que possam advir, embora não queira o resultado lesivo. Constituem erro médico a deficiência técnica, o descuido do profissional, que não atenta para os primeiros indícios de provável ou possível acidente. O monitoramento deve ser constante. O profissional deve permanecer junto do paciente durante todo o tempo de duração do procedimento. A sua ausência do local induz negligência e faz presumir culpa pelo acidente, ainda que a dinâmica dos grandes hospitais modernos ou dos hospitais públicos, com horários fixos de plantão imponha partilhamento na atenção aos pacientes. Compete a este profissional manter o paciente equilibrado no que pertine à pressão sangüínea, batimentos cardíacos, oxigenação adequada e outros parâmetros. Será sua a decisão de remoção do paciente para um hospital melhor aparelhado no caso de alguma intercorrência nociva. Sua omissão poderá implicar em negligência. . O choque anafilático, ou seja, a reação exagerada do organismo ou o aumento da sensibilidade a determinado produto ou substância poderá levar o paciente à morte ou causar-lhe lesões irreversíveis. Geralmente essa reação pode ser evitada se tomadas as precauções e realizados os procedimentos que o atual estado da ciência preconiza, de modo que a ocorrência desse fenômeno será sempre um indício em desfavor do anestesista. merecendo investigação pormenorizada. Apenas para exemplificar, exsurge evidente e sem disceptação que a utilização de anestésico de alto risco ou de diluente inadequado induz culpa, pois a atuação do médico terá sido de extrema imprudência, ou mesmo de imperícia, por desconhecimento do produto e forma de sua atuação no organismo humano. Até mesmo a forma de aplicar o anestésico ou qualquer outro medicamento com opção pela via endovenosa, como a má escolha desta ou daquela artéria; a inabilidade que conduza a qualquer lesão ou necrose e que evolua para a gangrena ou, mesmo, outra complicação, ainda que o ato em si tenha sido praticado por enfermeiro, empenha a obrigação de reparar do médico anestesista, desde que o auxiliar esteja sob as suas ordens. Este também responderá, ou solidariamente, através de ação judicial dirigida a ambos, ou através de ação regressiva daquele que for condenado. II - Mas a grande discussão surge quando o procedimento é realizado por equipe médica da qual faça parte o anestesista ou com a qual tenha atuado. Nota-se na doutrina e na jurisprudência francesa uma certa tendência em considerar autônoma a responsabilidade do anestesista. até mesmo em relação ao cirurgião (cf. Philippe Le Tourneau. La responsabilité civile. Dalloz, 1976, p.1.172 e 1.173). Contudo, caso fique caracterizado o trabalho de equipe, sem possibilidade de identificar a atuação de cada qual, impõe-se responsabilizar todos, e não só o anestesista ou o chefe da equipe. Obtempera Sérgio Cavalieri Filho: "Essa concepção unitária da operação cirúrgica, entretanto, não é mais absoluta em face da moderna ciência médica. As múltiplas especialidades da medicina e o 9 aprimoramento das técnicas cirúrgicas permitem fazer nítida divisão de tarefas entre os vários médicos que atuam em uma mesma cirurgia. Em outras palavras: embora a equipe médica atue em conjunto, não há, só por isso, solidariedade entre todos os que a integram. Será preciso apurar que tipo de relação jurídica há entre eles. Se atuam como profissionais autônomos, cada qual em sua especialidade, a responsabilidade será daquele que deu causa ao erro" (Programa de responsabilidade civil. 1ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 255). Entretanto, impõe-se esclarecer que ainda persiste divergência quanto à responsabilidade exclusiva do anestesista quando o acidente ocorre no interior do centro cirúrgico e esteja ele sob o comando ou sob as ordens do cirurgião ou do chefe da equipe. Nesse caso a responsabilidade será solidária, tanto do cirurgião quanto do anestesista. Correta,-pois, a: afirmação no sentido de que se o erro foi exclusivo do anestesista e que se a cirurgia, em si, foi adequada, executada com sucesso e sem intercorrências, não :se poderá responsabilizar também o cirurgião ou o chefe da equipe médica. A recíproca também é verdadeira. Mostra-se enfático Carlos Roberto Gonçalves quando afirma ser "fora de dúvida a' existência de responsabilidade autônoma do anestesista no pré e pós operatório" (Responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva. 2003, p. 364). III - O médico anestesista responde civilmente tal como qualquer outro profissional liberal, ou seja, mediante verificação de culpa em sentido lato (dolo ou culpa stricto sensu), nos termos do que dispõe o art. 14, § 4°, do Código de Defesa do Consumidor e o art. 951 do Código Civil, dispondo especificamente sobre os profissionais da área médica, ao utilizar-se da expressão "paciente".' Evidentemente que, em algumas hipóteses, a intercorrência nociva que às vezes surge poderá não decorrer de culpa do profissional. Nem sempre a complicação causada pela anestesia pode ser debitada à sua imperícia, imprudência ou negligência. Tal como em qualquer outra área da responsabilidade civil, as causas de exclusão da responsabilidade, de que são exemplos o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima, podem manifestar-se na atividade médica. Significa, ainda no campo dos exemplos, que se o paciente era portador de qualquer doença como diabetes, insuficiência renal, cardiopatia grave, propenso a vômitos constantes, alérgico ou sensível a: algum medicamento e esconde do médico essa circunstância preexistente, evidentemente que se ocorrer algum problema durante o ato cirúrgico em decorrência dessa insuficiência, ou mal de que padecia o paciente então não se pode afirmar a responsabilidade do profissional. Impõe-se, para que a causa de exclusão da responsabilidade atue, a existência de nexo entre a doença omitida pelo paciente e o insucesso do procedimento anestésico aplicado, ou seja, a interferência da condição física daquele no procedimento médico, pois, nesse caso, rompe-se o nexo de causalidade que poderia existir entre a conduta do anestesista e o resultado lesivo verificado. Indenização. Responsabilidade civil. Falecimento em razão de choque anafilático decorrente do medicamento alfatesin. Alegação de fenômeno imprevisível na anestesia geral. Inadmissibilidade. Choque resultante do uso de anestésico de alto risco, com diluente impróprio no paciente que se mostrou intolerante ao mesmo, culpa demonstrada. Ação procedente (TJSP -1ª C. - Ap. 137.706-1-Rel. Renan Lotufo- j. 25.02.1992). Ação de indenização. Responsabilidade civil do médico. Atos profissionais de que resulte dano ao cliente em conseqüência de imperícia, negligência ou imprudência. Anestesia geral em operação de menor importância. Acidente relacionado com a anestesia. Injeção paravenosa de medicamento destinado a impedir o vômito transanestésico. Subseqüente isquemia e gangrena da mão direita. Amputação de todos os dedos. Atrofia muscular. Perda funcional do membro superior direito: Aplicação do disposto no art. 1.545 do CC [atual art. 951]. Demanda julgada procedente em relação ao médico anestesista. Embargos providos por maioria de votos (TJRS 1º Gr. Cs.- j. 22.12.1967 - RJTJRS 11/219 e AJURIS 17/76). "Com a evolução e o aprimoramento das técnicas cirúrgicas operou-se a divisão do trabalho, por equipes especializadas. A concepção unitária da operação cirúrgica é conceito ultrapassado. A noção de ato destacável, própria do direito administrativo, encontram plena receptividade em tema de responsabilidade dos médicos. Todo o que for destacável do ato operatório engaja a responsabilidade de quem o praticou e não necessariamente a do cirurgião. Impende, pois, isolar a atuação do anestesista frente ao caso concreto. Embora a escolha do médico ou tipo de anestesia tenha sido feita de comum acordo, o ato cirúrgico propriamente dito transcorreu normalmente. o que afasta a responsabilidade do cirurgião pela lesão e dano que veio a sofrer o paciente. Essa lesão resultou da injeção de um medicamento antiemético na preparação do paciente para a anestesia. O antiemético era vasoconstritor e, por acidente, foi injetado na artéria umeral do paciente, eis que havia implantação anômala dessa artéria em local - a dobra 10 do cotovelo - onde geralmente há uma veia. Essa aberração, constatada pela perícia, insuspeitada e inverificável sem exame com destinação específica. Observadas que foram todas as regras da ciência médica e atendidos os cuidados habituais, não há como responsabilizar o anestesista, nem por imprudência, nem por imperícia. nem por negligência; nenhuma falta grave lhe pode ser imputada" (TJRS – 2ª C. Ap. -j. 29.07.1965-RJTJRS 75/237 e AJURIS 17/75). "Se a morte da vítima durante a cirurgia a que se submeteu escapava à previsibilidade, não se podendo exigir do médico anestesista comportamento diverso nas circunstâncias em que atuou. Sem a mínima notícia de que o paciente era predisposto a hipertermia maligna, causa do evento letal, inexiste justa causa para o seu processamento por homicídio culposo" (TACRIM-SP – 4ª C. – HC Rel. Godofredo Mauro - j. 28.05.1981-RT 557/350). · "A responsabilidade civil é a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra (Savatier). Apesar de se inserir no capítulo dos atos ilícitos, a responsabilidade médica é contratual, conforme predomínio da doutrina e jurisprudência. Há obrigação de meios e de resultado. Anestesia é obrigação do resultado, concernente a antes, durante e após o ato anestésico, daí a profunda responsabilidade técnica do médico anestesista, que estatui até uma condição arbitrária para seu desempenho dentro da equipe médica. A determinação de sua responsabilidade dependerá do exame do caso concreto, onde se aplicou anestesia peridural-raquiana, e após algum tempo, sem dor, mas consciente, o paciente veio a ter concussão cerebral, com traumatismo crânio-encefálico, ficando com lesão cerebral, com dano permanente, em razão da P.C.R. (parada cardiorrespiratória). Ocorre que não foi feito o exame de sensibilidade do paciente e, não sendo intervenção "cirúrgica urgente", tanto assim que a anestesia fora setorial, houve falta de cuidado objetivo e técnico do médico anestesista, que, por negligência e também imperícia, tanto pelo aspecto omissivo e comissivo, não teve atitude correta, pronta, técnica e profissional condizente ao momento e ao paciente, havendo agido com culpa e respondendo pelo dano causado (artigos 159 [atual art. 186] e 1.145 [atual art. 511] c/c o artigo 1.056 [atual art. 389] do CC). Ainda mais, o acréscimo angustioso, visto não tirar a conscientização ao paciente, o temor de seu estado psicológico, ocasionando a ele, paciente, e conseqüentemente a terceiros, inequívoco dano moral permanente, além do dano material físico" (TJGO- 1ª C. - Ap.- Rel. José Soares de Castro - j. 18.05.1993 - Bol. AASP 2.065/55). "Para atribuição de responsabilidade civil, considera-se erro médico a simples falha de previsão de conseqüências danosas que, ainda que remotamente, possam advir do método anestésico utilizado" (TAMG-EInfrs. 0214048-3/01- Rel. Ernane Fidélis- j. 05.03.1998 - DJ 04.02.1998 Informativo Incijur, Joinville-SC, 13, ago/2000, p. 10). "O erro inescusável na falha de entubação e monitoramento, a ponto de não observar a tempo a mudança de estado da paciente, representam condutas culposas dos médicos, que provocaram dor moral à família" (TAPR: Ap. 117324800 - Rel. Lidio J. R de Macedo j. 06.10.1998 - DJ 16.10.1998 - Informativo Incijur, Joinville-SC 13, ago./2000, p. 10). · "Age com culpa o médico anestesiologista que, após misturar droga, afasta-se, mesmo que momentaneamente, da sala cirúrgica, quando, então, a vítima vai a óbito por parada cardiorrespiratória" (TJRS – 3ª C. - Ap. 70.000317.016-Rel. Saulo Brum Leal - j. 16.03.2000 - RT 779/656). 18.03 - Choque alérgico causado por medicamento Responsabilidade civil. Morte resultante de choque alérgico provocado pela aplicação de injeção de analgésico. Inexistência de responsabilidade do médico que prescreveu o medicamento. Carência de ação contra ele e o hospital onde ocorreu o fato. Decisão confirmada. Voto vencido (TJSP - 3ªC - Ap. Rel. Evaristo dos Santos - j. 20.08.1964 - RT 357/199). 18.04 - Cirurgia: danos dela decorrentes "Observadas que foram todas as regras da ciência médica e atendidos os cuidados habituais, não há como responsabilizar o anestesista, nem por imprudência, nem por imperícia, nem por negligência; nenhuma falta grave lhe pode ser imputada" (TJRS – 2ª C. - Ap. j. 29.07.1965 AJURIS 17/75). Responsabilidade civil. Dano resultante de operação cirúrgica. Vinculação de causa e efeito entre a lesão e a operação. Inocorrência, contudo, de qualquer ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência do facultativo. - "Não há obrigação por risco profissional, pois os serviços médicos são de meios e não de resultado. Essa teoria, bem exposta por Demogue (Ensaios e pareceres de direito empresarial, de Fábio Konder Comparato, Forense, 1978, p. 524), alude ao exemplo dos serviços profissionais do médico que se obriga a usar todos os 'meios indispensáveis para alcançar a cura do doente, porém sem jamais assegurar o resultado, isto é, a própria cura. Como não há risco profissional independente de culpa, deixa de haver base para 11 fixação de responsabilidade civil" (TJSP – 2ª C. EInfrs. - j. 30.12.1980-RJTJSP 68/227). Responsabilidade civil. Ato ilícito. Intervenção cirúrgica realizada por profissional sem orientação comprovada de especialista em Ortodontia. Defeito da oclusão ou articulação e diastemas dela decorrentes. Imprudência caracterizada. Obrigação de pagar as despesas do novo tratamento a que se submeteu a vítima. Ação procedente. - "Não sendo o profissional especialista em Ortodontia, defeso lhe era levar a efeito um diagnóstico e sem diagnóstico comprovado, impedido estava de realizar intervenção típica dessa especialidade sem, ao menos, encaminhar posteriormente o paciente a uma especialista, assumindo, assim, inteira responsabilidade pela operação praticada" (TJSP – 1ª C. - Ap. Rel. Gomes Corrêa - j. 06.09.1983 - RT 585/93). "Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Gaze deixada no organismo do autor, obrigando-o a submeter-se, com urgência, a nova intervenção cirúrgica por outros profissionais. Existência do corpo estranho não demonstrada. Insuficiência, como prova, do resultado de ultrasonografia, por não envolver juízo de certeza. Verba não devida. Recurso provido. - "Afirmada a presença de corpo estranho deixado no organismo de paciente, durante cirurgia, não vale como prova apenas a conclusão de resultado de exame na ultrasonografia, onde, ainda que com alta possibilidade, se sugeriu ou admitiu tal presença" (TJSP - 4ª C. Ap. - Rel. Olavo Silveira - j. 11.02.1993 -JTJ-LEX 144/74). Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Inocorrência. Patologia degenerativosistêmica, sem relação alguma com intervenção cirúrgica. Verba indevida. Ação indenizatória julgada improcedente. Improvimento ao recurso. "Se não há relação causal entre a patologia incapacitante e a intervenção cirúrgica a que é atribuída, não procede a ação indenizatória por erro médico" (TJSP – 2ª C. Dir. Privado - Ap. 33.843-4 - Rel. Cezar Peluso - j. 18.08.1998-JTJ-LEX 217/154). Responsabilidade civil. Indenização por dano médico. Agulha de sutura deixada no corpo do paciente. Instrumento de espessura e tamanho reduzidos. Irrelevância. Nexo causal comprovado. Danos morais evidenciados pela apreensão da autora, ciente da existência de corpo estranho em seu abdômen. Indenização majorada. Recurso provido para esse fim (TJSP - 6ª C. Dir. Privado - Ap. 98.039-4 - Rel. Munhoz Soares - j. 29.06.2000 - JTJLEX 234/126). 18.05 - Dolo ou culpa como pressupostos da responsabilidade NOTA DE DOUTRINA: Em seu excepcional trabalho sobre o tema, Teresa Ancona expõe a questão com invulgar maestria, sendo de prudência reproduzir parte de sua explanação de inexcedível clareza e pertinência, quando assevera: "O Código Civil brasileiro coloca essa responsabilidade entre os atos ilícitos, o que não lhe tira o caráter de contratual. "...De outro lado, é claro que pode existir responsabilidade médica que não tenha origem no contrato, como por exemplo, a responsabilidade daquele médico que atende alguém que está desmaiado na rua, daquele que dá socorro ao suicida, que por sinal o recebe contra a vontade, daqueles que fornecem atestados falsos ou mesmo o caso do médico que, por sua culpa, deixa o seu cliente contagiar outra pessoa. "Com efeito, a obrigação de reparar o dano sempre existe, seja ele produzido dentro do contrato ou fora dele. O modo de atuação dessa responsabilidade é que pode ser diferente na prática. Apesar de nosso Código Civil ter separado os dois tipos de responsabilidade, a moderna doutrina segue a tendência de considerar o conceito de culpa uno, não vendo senão diferenças secundárias entre a responsabilidade contratual e a extracontratual. Na verdade, nos países como o nosso, onde a responsabilidade é fundada na culpa, para que haja indenização é preciso que haja dano, mas que esse dano tenha vindo de uma ação ou omissão voluntária (dolo) ou de negligência, imprudência ou imperícia (culpa em sentido estrito) e que seja também provado o nexo de causalidade entre a culpa e o dano. Ora, esses requisitos se aplicam tanto à responsabilidade contratual como à aquiliana. A principal diferença técnica entre esses dois tipos baseia-se na questão da presunção de culpa que haveria na responsabilidade contratual, acarretando a reversão do ônus da prova e, portanto, deixando a vítima em uma posição mais cômoda para conseguir sua indenização. Em matéria delitual, ao contrário, a culpa do autor do dano deveria ser provada pela vítima. "No Direito brasileiro a responsabilidade civil do médico está expressamente consagrada no art. 1.545 do Código Civil [atual art. 951]. "Vemos, portanto, que o Direito Civil pátrio abraçou totalmente a teoria da culpa no que diz respeito à responsabilidade médica. Sendo assim, terá a vítima do dano de provar a imprudência, a negligência e a imperícia do profissional para ser plenamente ressarcida" (op. cit., p. 319-321). Cabe acrescentar que o Código de Defesa do Consumidor reafirmou o princípio da 12 responsabilidade aquiliana dos médicos (art. 14, § 4°) o que nos levou a afirmar na Nota Introdutória que a distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual, para esse efeito, perde o significado e a razão de ser, posto que ampliou-se, para os profissionais da área médica, o espectro probatório, cabendo ao reclamante provar-lhe a culpa, ainda que o serviço prestado tenha supedâneo em contrato entre eles firmado. Isto, porque a responsabilidade médica, derivada de contrato, já não pode mais conduzir a uma presunção de culpa e inversão do ônus probatório, salvo em casos excepcionais, plenamente justificados. A culpa, ainda que levíssima, obriga a indenizar (in lege Aquilia et levissima culpa venit), pois em se tratando da vida humana, não há lugar para culpas "pequenas". Como afirma Miguel Kfouri Neto "não é preciso que a culpa do médico seja grave: basta que seja certa" (A responsabilidade civil do médico. RT 654/57). Esse também o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves (Responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 363). Outro aspecto que se mostra, no tema em estudo, é o relativo ao chamado erro profissional, isto é, o que resulte da incerteza ou da perfeição da arte e não da negligência ou incapacidade de quem a exercita, salvo se se tratar de um erro grosseiro. Comentando a disposição do art. 1.545 do Código Civil (atual art. 951), Carvalho Santos expressou-se no sentido de que "a imperícia no exercício de uma arte, ofício ou profissão constitui uma espécie particular de culpa, assim sendo considerar deste o Direito Romano: imperitia culpae adnumeratur (Gaio, in L. 132, D, de r. i., L. 17)" (Código Civil brasileiro interpretado, v. 21, p. 247). Todavia, segundo a melhor doutrina, não se deve considerar como culpa o erro profissional. É que a imperfeição da ciência é uma realidade. Daí a escusa que tolera a falibilidade do profissional. Como pondera Sourdat, hoje em dia ninguém contesta, em tese, a responsabilidade do médico pelos danos que, por ato culposo seu, resultam para o cliente. Assim, se age com culpa, se por uma imprudência ou negligência manifestas resulta em prejuízo para o seu cliente, tem este contra ele a ação para exigir perdas e danos (Traité de la responsabilité, v. 2, p. 276). Não é possível traçar regras fixas como limite dessa responsabilidade, embora existam princípios gerais a regê-la. O primeiro deles é o de que "não se considera erro profissional o que resulta da imprecisão, incerteza ou imperfeição da arte, sendo objeto de controvérsias e dúvidas". Segundo observação do autor francês por último citado, "é princípio assente que os Tribunais não têm o direito de examinar se o médico afastou-se das regras de sua profissão, abordando a questão de ordem científica, de apreciação e de prática médica, não lhes sendo lícito, tampouco, decidir coisa alguma sobre a oportunidade de uma intervenção cirúrgica, sobre o método preferível a empregar, ou sobre o melhor tratamento a seguir. As questões puramente técnicas escapam à sua competência" (op. cit., p. 259). O erro de técnica, acentua Aguiar Dias, "é apreciado com prudente reserva pelos Tribunais. Com efeito, o julgador não deve nem pode entrar em apreciações de ordem técnica quanto aos métodos científicos que, por sua natureza, sejam passíveis de dúvidas e discussões" (Responsabilidade dos médicos. Coad, p. 10). Convenha-se, porém, que se o profissional se mostrar imperito, por inadmissível desconhecimento da arte médica e do próprio mister a que se dedica, raiando esse procedimento ao erro grosseiro - aquele que se diz perfeitamente inescusável- tal procedimento traduz e se transfunde em proceder culposo e que obriga a que se indenize a vítima. "A culpa é um dos pressupostos da responsabilidade civil e, no caso de médicos deve ser provada, ficando afastada a responsabilidade não resultando comprovada a imprudência, imperícia ou negligência, nem o erro grosseiro, em virtude, mesmo, da presunção de capacidade constituída pelo diploma obtido após as provas regulamentares. Logo, se foi o autor aconselhado pelo réu a adquirir o referido medicamento não se pode afirmar que houve engano ou precipitação do facultativo na prescrição de uso de remédio inútil. Ademais, o autor deixou de se internar em hospital para receber adequadamente o remédio indicado, permitindo que se esvaísse seu prazo de validade, devendo, pois, arcar com a própria incúria. Outrossim, se o médico sugere que o remédio seja vendido a outrem, já que não seria mesmo utilizado, nem por isso se vislumbra imprudência na sua recomendação. Havendo, então, aceitação dos riscos por parte da vítima, pode não apenas valer como uma cláusula de não responsabilidade, como produzir uma outra conseqüência: caracterizar ou manifestar a culpa da vítima, traduzida na aceitação de uma situação de perigo, por ser dever de todos preservar não apenas a integridade dos outros como a sua própria integridade" (TJSP – 6ª C. -Ap. 147.056-1-Rel. Ernani de Paiva - j. 17.10.1991). Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Obrigação de meio e não de resultado. Dever de indenizar, no entanto, quando comprovadas negligência ou imperícia do profissional. Ação procedente. Recurso não provido (TJSP – 7ª C. - Ap. - Rel. Campos Mello - j. 13 05.06.1991-RJTJSP 134/153). Responsabilidade civil. Operação cirúrgica. Paciente portador de hérnia recidiva. Culpa ou imperícia dos médicos. Falta de prova. Ação de indenização improcedente. - "Julga-se improcedente ação de indenização se não provada a culpa ou imperícia dos médicos operadores" (TJSP – 5ª C. Ap. - Rel. Sylvio Barbosa j. 20.03.1969 - RT 407/174). · Responsabilidade civil. Internamento em hospital. Amputação de perna. Indenização pleiteada. Inexistência de prova de culpa ou imperícia do profissional. Ação improcedente. Voto vencido. - "Ainda que se admita a natureza contratual do serviço médico, não se pode presumir a culpa do profissional, por envolver obrigação de meio e não de resultado. Sem prova dessa culpa improcede ação de indenização" (TJSP – 6ª C. - Ap. - Rel. José Cardinale - j. 26.10.1978 - RT 523/68). "Improcede ação de indenização contra médico, com fundamento em defeito físico decorrente de operação, se não ficar demonstrada culpa do cirurgião" (TJSP – 2ª C. - Ap. -Rel. Aniceto Aliende- j. 12.08.1980 –RT 545/73). Médico. Responsabilidade civil. Quando ocorre. Ação improcedente - "A responsabilidade civil dos médicos somente decorre de culpa provada, constituindo espécie particular de culpa. Não resultando provadas a imprudência, imperícia ou negligência, nem o erro grosseiro, fica afastada a responsabilidade dos doutrinadores em Medicina em virtude, mesmo, da presunção de capacidade constituída pelo diploma obtido após as provas regulamentares" (TJRJ – 2ª C. - Ap. - Rel. Felisberto Ribeiro - j. 20.08.1981 - RT 558/178). "O médico só pode ser civilmente responsabilizado se demonstrada conduta culposa. Inexistindo qualquer prova de erro de diagnóstico, não há como se comprovar o nexo causal existente entre a morte do paciente e a alta médica dada pelo preposto do Estado" (TJSP – 8ª C. - Ap. -Rel. Fonseca Tavares - j. 08.10.1986 - RT 618/59). Dano moral. Indenização. Erro médico. Fato não comprovado. Verba, ademais, que se justifica quando o ilícito resulte de ato doloso e não culposo. Improcedência da ação decretada. Declaração de voto. - "É imperioso lembrar que o dano moral só se justifica quando o ilícito resulte de ato doloso, em que a carga de repercussão ou perturbação nas relações psíquicas, na tranqüilidade, nos sentidos e nos afetos de uma pessoa, se reflita como decorrência da repulsa ao ato intencional do autor do crime. Tal carga, à evidência, não pode ser encontrada num delito culposo, especialmente como no caso, sem demonstração de culpa, em qualquer de suas modalidades e ressalte-se, duvidosa até a prova da ocorrência do apontado erro médico" (TJSP-4ª C. - Ap. - Rel. Olavo Silveira - j. 11.02.1993 – RT 704/98). "O problema do erro médico se reveste de dificuldades sérias, como refere Aldo Carta (Responsabilità civile del medico, Roma, 1976), sobretudo na hora de tomá-lo em consideração para a determinação de responsabilidade, pois se o bom pai de família comete erros, o melhor dos médicos também. Por isso, acrescenta, a solução destes problemas deve estar na análise dos elementos da responsabilidade civil, ação ou omissão, dano, culpa, relação de causalidade, como usual na doutrina" (TJSP – 4ª C. - Ap. - Rel. Olavo Silveira _ j. 11.02.1993 - RT704/98). "Não se há de imputar responsabilidade indenizatória ao médico, face ao insucesso de intervenção cirúrgica, se não restar evidenciada sua conduta culposa, uma vez que o compromisso assumido constitui obrigação de meio e não de resultado" (TAPR – 6ª C. - Ap. _ Rel. Salatiel Resende - j. 28.04. 1994-RT711/182). "Profissional que diagnosticou corretamente a existência de corpo estranho no olho do cliente e que também providenciou sua retirada e aplicou o tratamento adequado a uma ceratite ulcerosa, que, a despeito disso, evoluiu e deu causa à perda parcial da visão, tratando-se de atividade-meio, na qual o médico não se compromete a curar, mas a aplicar toda a diligência na cura, não se pode falar de culpa quando não chega o profissional ao resultado desejado. Desde que o diagnóstico foi correto e a terapêutica adequada, não há que cogitar de relação de causa e efeito entre a atividade do médico e o dano. Descaracterização da culpa em qualquer das modalidades. Improcedência do pedido condenatório" (TJPR – 2ª C. - Ap. - Rel. Sydney Zappa - j. 30.03.1994 - RT714/207). "A seqüela de intervenção cirúrgica, por si só, não comprova a culpa do médico, devendo antes ficar demonstrada sua imperícia ou negligência para que respondam o nosocômio e o profissional pelos danos físicos, estéticos e psicológicos causados na menor. Recurso provido" (TJSP-8ª C. Dir. PrivadoAp. 7.174-4- Rel. Egas Galbiatti - j. 04.08.1999 JTJ-LEX222/75). 18.06 - Erro de diagnóstico NOTA DE DOUTRINA: O diagnóstico consiste na determinação da 14 doença do paciente, seus caracteres e suas causas. O erro no diagnóstico, como regra, não gera responsabilidade, salvo se tomado sem atenção e precauções, conforme o estado da ciência, apresentando-se como erro manifesto e grosseiro. Comete-o o médico que deixa de recorrer a outro meio de investigação ao seu alcance ou profere um juízo contra princípios elementares de patologia (cf. Georges Boyer Chamard e Paul Monzein. La responsabilité médicale. Presses Universitaires, 1974, p. 119-120). A doutrina mais antiga entendia que o "erro de diagnóstico" não é culposo, mas, ainda assim, atrai a responsabilidade do médico (Malaurie e Aynés). Contudo, Antônio Jeová Santos entende que "o erro de diagnóstico responsabiliza o médico pelos danos que causar ao paciente", mas que esse erro "deve ser grave e inescusável e verifica-se na prescrição de um tratamento inadequado ou a intervenção cirúrgica desnecessária" (Dano moral indenizável. 1ª ed. São Paulo: Lejus, 1997, p. 100). Preleciona Aguiar Dias que se o erro do diagnóstico, desde que escusável em face do estado atual da ciência médica, não induz à responsabilidade do médico, o engano grosseiro ou manifesto não permite isentá-la. Assim: a) o tratamento, como fratura, de ferida causada pela introdução de um estilhaço de madeira na perna do paciente; b) tomar uma mulher grávida como portadora de fibroma e operá-la, causando-lhe a morte; c) aplicar ao doente o tratamento de uma doença que não tinha, sem se esforçar por descobrir de que moléstia realmente se tratava; d) o contrasenso cometido pelo médico em face de radiografia terminantemente clara; e) ou o diagnóstico leviano ou inexato, em presença de sintomas positivamente contrários aos apresentados pela moléstia, e malgrado o protesto enérgico do doente (op. cit., p. 296-297, n. 116). Nenhuma responsabilidade se poderá imputar ao médico se em razão de diagnóstico errôneo e equivocado dano algum provir. Não há reparação sem dano. Se da ação ou omissão nenhum resultado lesivo advém, o fato é irrelevante no mundo jurídico. Se, porém, em razão desse equívoco o paciente sofrer dano, ou porque não fazendo o correto tratamento e deixando de atacar o verdadeiro mal teve sua situação agravada, ou se, em razão do diagnóstico, submeteu-se a tratamento inócuo ou maléfico, haverá, então, de se perquirir se nas circunstâncias poder-se-ia dele exigir opinião correta e precisa. Para tanto caberá indagar se à luz da ciência e do avanço médico-tecnológico poderia o profissional obter essa certeza, tendo em vista apoio em exames de laboratório, ultra-sonografia, ressonância magnética, tomografia computadorizada e tantos outros exames postos à disposição. Se a resposta for afirmativa, estará caracterizada a sua culpa, sob a modalidade de negligência, considerando que deveria ter submetido o seu cliente a esses exames e não fez, concluindo por um diagnóstico sem que tivesse base científica para isso. Se a resposta for negativa, não se poderá falar em culpa, pois o equívoco, transmudado em mero erro profissional, não foi querido, desejado, nem nas circunstâncias se poderia exigir maior atenção, cuidado ou precisão do médico. É o erro justificável ou escusável. "Repele-se, pois, a teoria de que o erro de diagnóstico não é culposo, mas, ainda assim. empenha obrigação. Cabe fazer" aquela distinção entre erro injustificável e, portanto, culposo, e o erro profissional justificável, por não se poder, nas circunstâncias, exigir outro comportamento médico à luz do estado da ciência. Indenização, Responsabilidade civil. Erro médico. Realização de dois exames endoscópicos com diagnósticos totalmente diferentes. Desnecessidade de prova pericial a constatar o erro do médico. Equívoco evidente. Alegação de cerceamento de defesa afastada. Recurso não provido (TJSP-13ª C. -Ap. - Rel. Minhoto Júnior-j. 16.05.1989-RJTJSP 120/178). Indenização. Responsabilidade civil. Dano moral. Moléstia grave diagnosticada erroneamente, com recomendação de imediata cirurgia, trazendo à autora angústia intensa. Negligência e imprudência inocorrentes e ausência de prova quanto à imperícia. Ação improcedente. Embargos rejeitados. Voto vencido. - "A ação de indenização por dano moral sofrido pela paciente em razão de errôneo diagnóstico de moléstia grave, causando-lhe angústia não se funda na responsabilidade objetiva ou em presunção absoluta de culpa; no caso, reclama-se a demonstração de imprudência, negligência ou imperícia do médico" (TJSP – 8ª C. EInfrs. - Rel. José Osório- j. 12.08.1992-JTJ-LEX l40/182). Responsabilidade civil. Menor internada em hospital. Apendicite. Morte de paciente. Negligência e imperícia atribuídas aos facultativos. Assistente Técnico dos autores roborando, ademais, a culpabilidade dos réus. Afastamento, entretanto, da hipótese, por erro escusável do diagnóstico inicial. Sintomatologia vaga e imprecisa. Escusabilidade que não induz culpabilidade. Indenização, assim, indevida. Embargos infringentes para esse fim recebidos. Votos vencedor e vencido declarados. "Quando escusável, o erro do diagnóstico não induz a responsabilidade do médico. Assim sempre se entendeu, não só porque a medicina está longe de ser infalível como também, porque o médico, ao prestar seus serviços, apenas se obriga a tratar do doente 15 com zelo e diligência, utilizando os recursos da ciência e da arte médicas" (TJSP – 5ª C. - EInfrs. Rel. Nogueira Garcez j.06.08.1981 - RT569/93). Observação: Acórdão embargado na RT 540/82. "O diagnóstico de grave doença e a recomendação de imediata cirurgia trazem angústia intensa e o dano, em regra é indenizável, mas o fato de o exame de laboratório ter-se revelado errôneo não leva necessariamente à conclusão de que houve culpa, e para saber se houve aí erro imputável aos réus nada foi demonstrado a propósito de qual devesse ter sido o adequado comportamento dos mesmos. Trata-se de questão altamente especializada exigindo-se perícia para pronunciamento seguro da Justiça. Dessa forma, inexistindo tal providência técnica, tem-se que admitir como razoável, e portanto não culposo, o comportamento dos profissionais que recomendaram a cirurgia, a qual, aliás não era radical e irreversível. De um lado estava, dependendo do comportamento dos profissionais, o risco de vida do autor, de outro, o risco de amedrontá-lo ou angustiá-lo. A opção que se fez foi normal e adequada, preponderando o valor maior" (TJSP – 8ª C. - EInfrs. Rel. José Osório- j. 12.08.1992-RT695/84). · Dano moral. Responsabilidade civil. Diagnóstico equivocado que apurou a presença do vírus da Aids. Incontroverso nos autos que a autora sofreu angústia, desconforto emocional e pânico por aquilo que se pode chamar de "morte anunciada". Indenização devida, mas que não pode ser excessiva - Recursos parcialmente providos. Responsabilidade civil. Dano material. Diagnóstico equivocado fornecido por órgão da Fazenda Pública que apurou a presença do vírus da Aids. Autora que não demonstrou os prejuízos sofridos. Indenização indevida. Recursos parcialmente providos (TJSP – 8ª C. Dir. Público Ap. 49.742-5 - Rel. Paulo Travain j. 09.12.1999-JTJLEX 226/72 e Bol. AASP 2.248, 28.01 a 03.02.2002). 18.07 - Exames em geral: danos daí decorrentes "O médico executor de aortografia não responde por culpa moral se deixa de avisar ao paciente dos riscos do exame - Obrigação que incumbe ao médico clínico, solicitante do exame. O executor, no caso, só responderia pela culpa marcada pela negligência, imperícia ou imprudência, que não se vislumbrou na espécie" (TJRS – 4ª C. - Ap. - j. 24.08.1977 RJTJRS 68/340 e AJURlS 7/77). 18.08 - Lesões causadas ao nascituro Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Lesões provocadas em nascituro, ocasionando-lhe danos físicos irreversíveis, durante o trabalho de parto. Ocorrência de inadimplemento na prestação de serviço. Omissão culposa caracterizada. Indenização devida (TJSP _1ª C. - Ap. 129.718-1- Rel. Roque Komatsu j.01.11.199O). · "Feto em posição invertida e distorcida de rotação são fatos naturais que escapam ao controle do profissional médico, não se podendo responsabilizá-lo por lesões que estes venham a causar na criança se não restar comprovado ter ele agido com negligência, imprudência ou imperícia" (TJSP - 7 .ac. -Ap. - Rel. Sousa Lima -j.11.11.1992RT 694/84). Indenização. Dano moral. Negligência e omissão médica, resultando na morte do filho. Indenização devida. Possibilidade da ocorrência de crime. Cópias das peças dos autos a serem remetidas ao Ministério Público para os fins de direito. – “É devida indenização por danos morais à mãe parturiente, cujo filho nasce morto por respirar mecônio no útero em razão do retardamento do parto, por negligência e omissão médica" (TJRO -C. Civil-Ap. 95.0050385 - Rel. Eliseu Fernandes de Souza - j. 27.06.1995 Bol. AASP 2.065/56). Vide RT729/290. 18.09 - Omissão de socorro NOTA DE DOUTRINA: A omissão de socorro caracteriza ilícito civil e ilícito penal. Dispõe o art. 135 do Código Penal: "Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública. - Pena: detenção de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa". Portanto, a omissão pura, configuradora do ilícito, consiste em deixar, intencionalmente, de prestar assistência médica, quando possível fazê-lo, sem risco pessoal, ou em não pedir socorro à autoridade pública. Constitui infração penal a conduta do médico, dos dirigentes de hospital, pronto-socorro, ou casa de saúde, bem como de seus prepostos, em deixar de dar socorro a pessoa ferida ou doente, em grave e iminente perigo. Para a caracterização da omissão de socorro não há necessidade de a vítima estar correndo risco de vida. Basta que haja perigo à incolumidade física ou psíquica da pessoa. Se para o homem comum a obrigação de prestar socorro traduz-se em preceito do direito natural e manifestação de solidariedade humana, para o médico essa obrigação, como imposição legal, decorre da natureza da profissão que escolheu e, como dever moral, decorre dos preceitos de ética médica. 16 Aliás, a omissão de socorro está expressamente prevista no art. 58 do Código de Ética Médica, quando estabelece a relação do médico com pacientes e familiares (Resolução do Conselho Federal de Medicina 1.248, de 08.01.1988, Cap. V). Se houver ação penal e o médico for condenado como incurso na disposição legal acima, essa decisão faz coisa julgada no âmbito civil, de modo que à vítima ou às pessoas legitimadas a agir, bastará executar o título executivo formado com a sentença penal transitada em julgado. A ação no âmbito civil terá o objetivo de apurar o valor da indenização e de executá-lo. Contudo, se absolvido no juízo criminal por insuficiência de provas, ou não tendo sido instaurada a ação penal, a vítima, na ação civil que intentar, terá de fazer prova da culpa do médico, reabrindo-se a discussão no que pertine ao meritum causae. Apenas na hipótese de absolvição penal por inexistência do crime ou prova de que o. acusado não é o seu autor é que essa decisão interferirá na esfera civil, impedindo que a ação prossiga, pois, transitada em julgado, põe fim a qualquer discussão. · Omissão de socorro. Estudante de medicina escalado para plantão noturno. - "O delito de omissão de socorro só é punível a título de dolo e não o comete quem, por insuficiente formação científica, ou inexperiência, não avalia corretamente a gravidade do perigo e não determina providência que profissional mais capaz e atento eventualmente adotaria" (TACRIM-SP – 3ª C. - Ap. Crim.-Rel. Dante Busana - j. 11.10.1983 -RT580/357). 18.10 - Omissão do profissional como causa dos danos Indenização. Responsabilidade civil. Negligência médico-hospitalar. Paciente atendida em ambulatório, com fortes dores abdominais, e submetida a medicação. Retorno por quatro vezes até ser internada. Exames que constataram apendicite aguda. Cirurgia realizada só no dia seguinte, apesar da gravidade do estado da paciente. Falecimento treze dias após. Negligência caracterizada porque os sintomas indicavam necessidade de internação imediata, com exames aptos ao diagnóstico. Recurso provido para decretar a procedência do pedido de indenização. Voto vencido (TJSP-5ª C. - Ap. - Rel. Afonso André - j. 25.10.1979 - RJTJSP 64/100). Ação de reparação de danos. Responsabilidade civil de médico. Profissional que desconsidera quadro clínico anormal de paciente. Necessidade de intervenção cirúrgica no dia seguinte, por outro esculápio. Culpa manifesta. Indenização devida. - "É induvidosamente negligente o médico que, após realizar uma episiotomia em parturiente, não dá maior atenção às suas queixas posteriores, deixando de proceder a um exame mais detalhado muito embora o quadro anormal, permitindo a formação de um abscesso de graves proporções, com perfuração do reto, que exigiu cirurgia de emergência no dia imediatamente após a última consulta com o profissional, sem que qualquer providência mais atuante fosse tomada. Em casos tais, a responsabilidade médica reside em sua omissão, resultando conseqüências perfeitamente previsíveis, acarretando a obrigação do esculápio em reparar os prejuízos" (TJPR 3ª C. - Ap. - Rel. Renato Pedroso j. 22.04.1986 - RT 608/160). 18.11 - Responsabilidade contratual e o Código de Defesa do Consumidor NOTA DE DOUTRINA: Muito se tem debatido e escrito sobre a questão relativa à responsabilidade dos médicos, sendo rica a literatura sobre a questão, a mostrar e confirmar sua importância e o relevo que essa atividade vem ganhando, notadamente na teoria da responsabilidade, exacerbando o interesse das vítimas de erros médicos e suas conseqüências, como, aliás, já vem ocorrendo de há muito na América do Norte, a partir de uma noção mais clara das pessoas sobre o que seja cidadania e seus direitos como cidadãos, frente à atitude culposa causadora de danos. Tal ali ocorre em razão do grau de cultura das pessoas e o apoio da mídia, que tendo consciência de seus direitos, reclama-os na Justiça, obtendo vultosas indenizações por procedimentos culposos de médicos desidiosos, como observou Reynaldo Andrade da Silveira. (Responsabilidade civil do médico. RT 674/57). Essa noção da responsabilidade dos médicos já existia no Direito Romano, em texto de Ulpiano (D., 1, 18,6,7), onde se lê: sicut medico imputari eventus mortalitatis non debet, ita quod per imperitiam commisit imputari ei debet ("assim como não se deve imputar ao médico o evento da morte, deve-se imputar a ele o que cometeu por imperícia''). Segundo Josserand, um dos processos de que se tem valido a jurisprudência para ir em socorro da vítima consiste na substituição da responsabilidade delitual pela responsabilidade contratual. Esta, "espalha-se como a mancha de óleo e não se sabe onde se deterá, na sua marcha progressiva", indagando o mestre "se um dia os tribunais não declararão o médico ou o cirurgião responsável contratualmente pelos danos resultantes de um tratamento contra-indicado ou de uma intervenção infeliz" (Evolução da responsabilidade civil. RF 86/548). A responsabilidade médica foi regulada em dispositivo incluído entre os que disciplinam a responsabilidade aquiliana (CC, art. 951). Toda a doutrina mais abalizada reconhece que a classificação se orientou para a culpa contratual. 17 Esta encontra fundamento no art. 389 do Código Civil e a responsabilidade extracontratual funda-se no art. 186 do mesmo Código. Aguiar Dias pondera que a responsabilidade do médico é contratual, não obstante sua colocação no capítulo dos atos ilícitos (op. cit., p. 282, n. 114). Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves, "não se pode negar a formação de um autêntico contrato entre o cliente e o médico, quando este o atende" (op. cit. 8. 00., 2003, p. 359, n. 54). Nesse sentido também o entendimento de. Teresa Ancona Lopez ao afirmar que a discussão a respeito do enquadramento da responsabilidade médica dentro da culpa contratual ou extracontratual está hoje superada, posto que tanto a doutrina quanto a jurisprudência são francamente pela responsabilidade ex contractu do médico, citando, ainda entendimento convergente de Henri Mazeaud e León Mazeaud, Aguiar Dias, Henri Lalou e Sílvio Rodrigues (Responsabilidade civil dos médicos. (Responsabilidade civil dos médicos. Responsabilidade civil. Coord. Yussef Cahali. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 319). E, realmente, apesar da legislação anterior lhes atribuir diferentes conseqüências, essa distinção já vinha sendo abandonada pela moderna doutrina, que nela não, via utilidade, fazendo residir o fundamento único da responsabilidade civil no contrato social (cf. Clóvis do Couto e Silva. Principes fundamentaux de la responsabilité civile en droit brésilien comparé, p: 9). Aliás, os tribunais franceses têm declarado que a responsabilidade do médico é contratual, não só quando presta serviço remunerado, mas ainda quando sua assistência é ato de pura cortesia (cf. Savatier, op. cit., t. 2, p. 390, n. 775). Entretanto, obtempera Aguiar Dias que a responsabilidade do médico é contratual apenas em casos em que há convenção, o que não importa exigir estipulação escrita: o chamado, seguido da visita, já estabelece o contrato, seja diretamente com o enfermo, seja com pessoa de sua família ou qualquer outra, estipulando por terceiro, no caso, o doente (op. cit., p. 284). Perfeita, aliás, a colocação de Ruy Rosado de Aguiar Jr. sobre esse aspecto: ("Devemos admitir que a responsabilidade médica não obedece a um sistema unitário. Ela pode ser contratual, derivada de um contrato estabelecido livremente entre paciente e profissional, a maioria das vezes de forma tácita, e compreende as relações restritas ao âmbito da medicina privada, isto é, do profissional que é livremente escolhido, contratado e pago pelo cliente. Será extracontratual quando, não existindo o contrato, as circunstâncias da vida colocam frente a frente médico e doente, incumbindo àquele o dever de prestar assistência, como acontece no encontro de um ferido em plena via pública, ou na emergência de intervenção em favor de incapaz por idade ou doença mental. Será igualmente extracontratual a relação da qual participa o médico servidor público, que atende em instituição obrigada a receber os segurados dos institutos da saúde pública, e também o médico contratado pela empresa para prestar assistência a seus empregados. Nestes últimos casos; o atendimento é obrigatório, pressupondo uma relação primária de Direito Administrativo ou de Direito Civil entre o médico e a empresa ou o hospital público, e uma outra entre o empregado com.a empresa, ou entre o segurado com a instituição de seguridade, mas não há contrato entre o médico e o paciente (Jean Penneau. La réforme..., p. 528; Markesinis, Basil. Problemes de responsabilité médicale en Droit Anglais. Revue Internationale de Droit Comparé,1988, n. 2, § 351-367)"(In: Responsabilidade civil do médico: RT 718/33). Embora a responsabilidade do médico, como profissional liberal e, portanto, prestador de serviços, seja contratual, como regra, agora, contudo, essa distinção mostra-se despicienda, pois a legislação hoje em vigor rompeu com a anterior. O Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 11.09.1990) em vigor desde 11.03.1991, posto a lume por força do mandamento contido no art. 5°, XXXII, da CF/88, atribuiu ao consumidor farta gama de direitos que até então se via privado o cidadão comum, posto que desamparado de um instrumento eficaz e específico. A nova lei impôs ao fornecedor de bens e serviços, inclusive o Poder Público, uma série de obrigações, visando o respeito ao consumidor. Em sua Seção II, do Capítulo IV da "responsabilidade pelo fato do produto e do serviço", o CDC consagrou a responsabilidade objetiva (arts. 12 e 14), ou seja, responsabilizando o fabricante, o produtor, o construtor e o importador pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmu1as, manipu1ação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos, independentemente da existência de culpa. E mais, fixou a responsabilidade subsidiária do próprio comerciante, quando o fabricante, construtor, produtor ou importador não puderem ser identificados ou quando não conservar adequadamente os produtos perecíveis, também objetiva. Ressalvou, contudo, a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais, que só poderá ser declarada mediante a verificação de culpa (art. 14, § 4°). Discorrendo sobre esse aspecto, Francisco Chagas de Moraes abordou a questão esclarecendo 18 que a responsabilidade civil do médico na qualidade de profissional liberal, em face do disposto no art. 14, § 4°, do CDC, será apurada mediante verificação da culpa, regra, aliás, aplicável a todos os demais profissionais liberais, cujo elenco está relacionado no anexo do art. 577 da CLT. E acrescentou: "Quando se tratar de serviços médicos prestados por hospital, como fornecedor de serviços (art. 14, caput), a apuração da responsabilidade independe da existência de culpa, conforme esclarece Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin: "O Código é claro ao asseverar que só para a 'responsabilidade pessoal' dos profissionais liberais, é que se utiliza o sistema alicerçado em culpa. Logo se o médico trabalhar em hospital responderá apenas por culpa, enquanto a responsabilidade do hospital será apreciada objetivamente" (Comentários ao Código de Proteção do Consumidor. Obra coletiva. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 80, apud Francisco Chagas de Moraes, Responsabilidade civil do médico, RT 672/275). E, realmente, apesar de nossa discordância com relação a algumas posições pontuais dos autores citados, nesse aspecto o Código de Defesa do Consumidor inovou com profundidade. Segundo lição de Ruy Rosado de Aguiar Jr., "a diferença fundamental entre essas duas modalidades de responsabilidade está na carga da prova atribuída as partes: na responsabilidade contratual, ao autor da ação, lesado pelo descumprimento, basta provar a existência do contrato, o fato do inadimplemento e o dano, com o nexo de causalidade, incumbindo ao réu demonstrar que o dano decorreu de uma causa estranha a ele; na responsabilidade extracontratual ou delitual, o autor da ação deve provar, ainda, a imprudência, negligência ou imperícia do causador do dano (culpa), isentando-se o réu de responder pela indenização se o autor não se desincumbir desse ônus" (artigo citado, p. 35). Como a responsabilidade pessoal do médico pela prestação de serviços deve ser apurada mediante culpa, por força da regra de exceção do art. 14, § 4º, do CDC, a distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual, para esse efeito, como antes enfatizado, perde o significado e a razão de ser, posto que ampliou-se, para o médico, o espectro probatório, cabendo ao reclamante provar-lhe a culpa, ainda que o serviço prestado tenha supedâneo em contrato entre eles firmado. 18.12 - Responsabilidade do cirurgião plástico na cirurgia estética ou reparadora V. tb. o Item 18.01, acima, e Dano Estético no Capítulo XVII. NOTA DE DOUTRINA: Segundo Wanderby Lacerda Panasco (A responsabilidade civil, penal e ética dos médicos. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 242), a cirurgia plástica, como ramo da cirurgia geral, surgiu como especialidade, a partir de 1914, tendo em vista a readaptação funcional dos traumatizados de guerra. Contudo, já no final do século XIX, com as primeiras próteses nasais, seus conhecimentos adquirem dimensões incipientes, dando surgimento ao que atualmente se denomina rinoplastia. Somente em 1930 é criada a Sociedade Científica Francesa de Cirurgia Reparadora, Plástica e Estética. A expressão cosmetologia surgiu no Congresso Internacional de Dermatologia, em Bucareste, em 1935, quando o Dr. Auriel Voina a apresentou en hommage à la beauté conservée, renovée ou suplée de la femme eternelle. E em 1950 apareceu a Sociedade Francesa de Cosmetologia, constituindo-se os seus objetivos na terapeutique de la laiderus. Nas observações de Aguiar Dias, "aspecto eminentemente moderno da medicina é a cirurgia estética. Esta aplicação da ciência não tem sido encarada com muita benevolência pelos tribunais, naturalmente impressionados pela feição menos nobre da cirurgia estética posta a serviço da vaidade fútil ou dos até hoje inexeqüíveis processos de rejuvenescimento, mas esquecidos das assombrosas possibilidades que ela pode abrir à humanidade, dentro das altas finalidades da arte médica" (op. cit., p. 303, n. 117). Como enfatiza Teresa Ancona Lopez, "ramo da medicina hoje em dia em franco desenvolvimento é o que diz respeito às operações que visam melhorar a aparência externa de alguém, isto é, tem por objetivo o embelezamento da pessoa humana. São as operações plásticas estéticas ou cosmetológicas. Tais intervenções foram muito combatidas no passado e, hoje, apesar de aceitas, a responsabilidade pelos danos produzidos por elas é vista com muito maior rigor que nas operações necessárias à saúde ou à vida do doente" (O dano estético. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1980, p. 61-62). Em verdade esse maior rigor vem sendo enfatizado apenas com relação à cirurgia meramente estética, pois a chamada plástica reparadora é considerada tão necessária e imprescindível quanto qualquer outra intervenção cirúrgica, pois tem a mesma finalidade terapêutica que as demais. Bastante polêmica é a definição da natureza jurídica da cirurgia estética, quando o paciente busca apenas melhorar sua aparência, ao contrário da cirurgia dita reparadora, onde se pretende a correção de lesões deformantes ou defeitos congênitos ou adquiridos (cf. Antônio Chaves. Responsabilidade civil das clínicas, hospitais e médicos. Revista Jurídica, 159/118). Anota Ruy Rosado de Aguiar Jr. que a orientação hoje vigente na França, na doutrina e na jurisprudência, se inclina para admitir que a 19 obrigação a que está submetido o cirurgião plástico não é diferente daquela dos demais cirurgiões, pois corre os mesmos riscos e depende da mesma álea. Seria, portanto, como a dos médicos em geral, uma obrigação de meios (Responsabilidade civil dos médicos. RT 718/39). A particularidade residiria no recrudescimento dos deveres de informação, que deve ser exaustiva, e de consentimento, claramente manifestado, esclarecido, determinado (Jean Penneau. La réforme de la responsabilité médicale. Revue Internationale de Droit Comparé, 1990, p. 35) Duas decisões da Corte de Lyon e da Corte de Cassação, de 1981, comentadas por Georges Durry (Revue Trimestrielle de Droit Civil, 1982, p. 153), reafirmam que se trata de uma obrigação de meios, porque em toda operação existe uma álea ligada à reação do organismo, e acentuam a existência de um dever particular de informação. Mais recentemente, em 21.02.1991, a Corte de Versailles, reconhecendo a existência de uma obrigação de meios, condenou o cirurgião plástico que não comparou convenientemente os riscos e os benefícios de uma cirurgia considerada prematura, deixando de fornecer a correta informação sobre os riscos possíveis (Recueil Dalloz-Sirey, 1993, p. 29). O professor Luís Andorno, citado por Ruy Rosado, após ter sido defensor da idéia oposta, no último curso ministrado em Porto Alegre, assim se expressou: "Se bem tenhamos participado durante algum tempo deste critério de situar a cirurgia plástica no campo das obrigações de resultado, um exame meditado e profundo da questão nos levou à conclusão de que resulta mais adequado não fazer distinções a respeito, colocando também o campo da cirurgia estética no âmbito das obrigações de meios, isto é, no campo das obrigações gerais de prudência e diligência. É assim, porquanto, como bem assinala o brilhante jurista e catedrático francês e estimado amigo, Prof. François Chabas, de acordo com as conclusões da ciência médica dos últimos tempos, o comportamento da pele humana, de fundamental importância na cirurgia plástica, é imprevisível em numerosos casos. Ademais, agrega dito jurista, toda a intervenção sobre o corpo humano é sempre aleatória (La responsabilidad civil médica. AJURIS 59/224). Ao mesmo tempo em que adere a esse posicionamento (obrigação apenas de meios), obtemperando que embora algum cirurgião plástico ou muitos deles, "assegurem a obtenção de um certo resultado, isso não define a natureza da obrigação, nem altera a sua categoria jurídica, que continua sendo a obrigação de prestar um serviço que traz consigo o risco", Ruy Rosado de Aguiar Jr. anota que, no Brasil, a maioria da doutrina e da jurisprudência defende a tese de que se trata de uma obrigação de resultado. Comungamos de opinião diversa, pois para nós a obrigação, em hipóteses que tais, é de resultado. Aliás, como o admirado autor aqui sempre citado evidenciou, "forte corrente de doutrinadores de escol entende que a obrigação assumida pelos cirurgiões plásticos nas intervenções meramente estéticas é uma obrigação de resultado e não apenas de meios podendo-se invocar, nesse sentido, Sílvio Rodrigues (Responsabilidade Civil, p. 258; Aguiar Dias, op. cit, p. 283; Caio Mário, CoadI/15; Savatier, op. cit., vol. 2, p. 391, n. 775). E, realmente, assim devem ser entendidas as intervenções dessa natureza. Diz Miguel Kfouri Neto que "no caso de cirurgia plástica estética ou cosmetológica, que constitui, como visto, obrigação de resultado, a responsabilidade por dano deverá ser apreciada com muito maior rigor" (A responsabilidade civil do médico. RT 654/57). Em sua obra O dano estético, Teresa Ancona obtempera que "na verdade, quando alguém, que está muito bem de saúde, procura um médico somente para melhorar algum aspecto seu, que considera desagradável, quer exatamente esse resultado, não apenas que aquele profissional desempenhe seu trabalho com diligência e conhecimento científico, caso contrário, não adiantaria arriscar-se e gastar dinheiro por nada. Em outras palavras, ninguém se submete a uma operação plástica se não for para obter um determinado resultado, isto é, a melhoria de uma situação que pode ser, até aquele momento, motivo de tristezas" (op. cit. 62). Essa, aliás, a ratio essendi, o sentido teleológico buscado pela ética médica. São, portanto, lícitas as intervenções cirúrgicas com finalidade meramente estética ou embelezadora, se assim desejar o paciente e expressamente manifestar sua vontade; quando necessárias ou quando o eventual defeito a ser removido ou atenuado seja fator de desajustamento psíquico ou social. O atual Código de Ética Médica, posto em vigor pela Resolução 1.246, de 08.01.88, do Conselho Federal de Medicina (DOU de 26.01.1988, p. 1.574), dispõe no art. 6° que: "O médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana, atuando sempre em benefício do paciente", não impedindo, pois, as intervenções cirúrgicas em pessoas sadias e hígidas sob o aspecto físico e mental, com o objetivo único de embelezamento ou de rejuvenescimento, desde que aplicadas técnicas aceitas e consagradas. Em sua obra específica sobre a responsabilidade dos médicos a autora citada, buscando esclarecer o sentido da chamada "obrigação de resultado", professorou que "na obrigação de resultado o devedor, ao contrário, obriga-se a chegar a determinado fim sem o qual não terá cumprido sua 20 obrigação. Ou consegue o resultado avençado ou deverá arcar com as conseqüências. É o que se dá, por exemplo, no contrato de empreitada, transporte e no de cirurgia estritamente estética ou cosmetológica. Em outras palavras, na obrigação de meios a finalidade é a própria atividade do devedor e na obrigação de resultado, o resultado dessa atividade" (Responsabilidade civil dos médicos, cit., p. 320). Como assinalou Aguiar Dias, a cirurgia estética deve ser apreciada do ponto de vista subjetivo, esclarecendo: "'É, decerto impossível compreender a irresponsabilidade do médico que pratica operação dessa natureza sem a existência de um como que estado de necessidade, apreciável segundo as circunstâncias e na proporção dos riscos que imponha ao paciente, isto é, embora reconhecida a necessidade da operação, deve o médico recusar-se a ela, se o perigo da intervenção é maior que a vantagem que poderia trazer ao paciente. Sempre e em todos os casos, compete ao médico a prova de que existia esse estado de necessidade e de que a operação, normalmente encarada, não oferecia riscos desproporcionados ao fim colimado. Não vale, para nenhum efeito, neste particular, a prova do consentimento do cliente. Na matéria, em que predomina o princípio da integridade do corpo humano, norma de ordem pública, não vale a máxima volenti non fit injuria. Mas, ainda que não corresponda ao sucesso esperado, a operação estética pode bem deixar de acarretar a responsabilidade do profissional, desde que: a) seja razoavelmente necessária; b) o risco a correr seja menor que a vantagem procurada; c) seja praticada de acordo com as normas da profissão" (op. cit., p. 309-310, n. 118). Para sustentar o entendimento de que a obrigação do médico na cirurgia meramente estética é apenas de meios Nestor José Forster assim se expressa: "É certo que o médico não pode controlar todos os fatores a influírem na cirurgia estética. Basta dar o exemplo do 'quelóide', aquela calosidade cicatricial que pode ocorrer no local da cirurgia. A ciência médica simplesmente desconhece, hoje, porque o quelóide ocorre em algumas pessoas, ao passo que não se apresenta em outras. Portanto, ao realizar cirurgia estética, o cirurgião não tem condições de assegurar ao paciente que não resultará a cicatrização sob forma de quelóide. Se a realidade é esta, e aqui cita-se apenas um exemplo, não há como exigir do médico o resultado. Ainda aqui, pois, seria de meios e não de resultados o contrato com o cirurgião plástico" (Cirurgia plástica estética: obrigação de resultado ou obrigação de meios. RT 738/85). Nada mais inexato. A premissa se nos afigura falsa. A eventual intercorrência de fatores e reações estranhas à cirurgia não infirma a tese da obrigação de resultado do médico, eis que se postam como causas eficientes autônomas e se configuram como excludentes por romperem o nexo etiológico. O surgimento de quelóides em pessoas propensas a essa reação, como o aparecimento de complicações outras não atribuíveis à atuação do médico tanto ocorrem nas cirurgias tradicionais como nas cirurgias meramente estéticas, razão pela qual essa circunstância não pode servir de fundamento para a exclusão incondicional da responsabilidade assumida pelo médico em contrato firmado com o paciente, no qual esteja embutida uma promessa de resultado. Como não se desconhece, o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima constituem causas excludentes tanto da responsabilidade aquiliana como objetiva, pois rompem o nexo causal. Mas, só por si, a causa excludente da responsabilidade não pode servir de fundamento para estabelecer a natureza e o alcance da responsabilidade do cirurgião plástico. O que importa considerar é que o profissional na área de cirurgia plástica, nos dias atuais, promete um determinado resultado (aliás, essa é a sua atividade fim), prevendo, inclusive, com detalhes, esse novo resultado estético procurado. Alguns utilizam-se mesmo de programas de computador que projetam a nova imagem (nariz, boca, olhos, seios, nádegas etc.), através de montagem, escolhida na tela do computador ou na impressora, para que o cliente decida. Estabelece-se, sem dúvida, entre médico e paciente relação contratual de resultado que deve ser honrada. Portanto, pacta sunt servanda. Segundo nos parece, com relação às cirurgias plásticas com objetivo meramente estético, cabe fazer distinção, de fundamental importância, entre a cirurgia que apenas não logrou obter o resultado pretendido e contratado entre o médico e seu cliente, daquela na qual a intervenção cirúrgica, além de não atingir esse desiderato, causou um agravamento, ou uma lesão estética na vítima. No primeiro caso, se o resultado não foi obtido, sem, contudo, agravar a situação do paciente, isto é, mantido o statu quo ante, caberá ao médico apenas restituir-lhe aquilo que pagou pelo serviço. Se, contudo, a cirurgia, além de não alcançar o resultado querido, agravou a situação do paciente, criou defeito estético ou agravou aquele existente, além de restituir o que recebeu ou deixar de receber o valor contratado, deverá submeter o paciente a nova cirurgia, visando corrigir o defeito que causou. Evidentemente, se o cliente não quiser, por falta de confiança, que o mesmo profissional proceda à correção, deve-se-lhe facultar o direito de escolher médico de sua confiança para realizar a intervenção 21 reparadora, custeada pelo cirurgião causador dessa anomalia. Mas se esse defeito não for passível de correção e tomar-se definitivo e irreparável, o médico causador desse mal, além de devolver o que recebeu, deverá indenizar a vítima pelo dano estético e moral que causou, na proporção do dano e levando em consideração os efeitos que esse defeito possa causar no seu portador, sob o aspecto psicológico, moral, social e profissional. 48 Há, porém, casos em que o cirurgião; embora aplicando corretamente as técnicas que sempre utilizou em outros pacientes com absoluto sucesso, não obtém o resultado esperado. Se o insucesso parcial ou total da intervenção ocorrer em razão de peculiar característica inerente ao próprio paciente e se essa circunstância não for possível de ser detectada antes da operação, estar-seá diante de verdadeira escusa absolutória ou causa excludente da responsabilidade. O renomado cirurgião plástico Paulo Jatene, radicado na capital do Estado de São Paulo, esclarece que a cirurgia plástica divide-se em dois ramos distintos, mas que estão interligados entre si: a) a cirurgia plástica reparadora, que visa a reconstrução dos tecidos danificados em razão de acidente ou doença adquirida ou congênita; e b) a cirurgia plástica estética. Esta última. conforme esclarece o cirurgião citado, "rotulada como meramente cosmética e desnecessária, quando, em verdade, um indivíduo convive melhor com uma doença do que com um problema estético em seu corpo". E acrescenta: "Deve-se convir que, quando o médico aplica um tratamento cosmético está cuidando de uma doença da alma, pois os pacientes da cirurgia plástica estética são, em sua maioria, mulheres na faixa de 30 a 50 anos de idade, carentes de afetividade, geralmente, superando ou recuperando perdas (final de um casamento, traumas, vida atribulada, crise existencial), acreditando que a cirurgia e a modificação de sua aparência física irá resolver seus problemas. Um outro tipo de paciente é aquele que tem um problema e busca resolvê-lo, como, por exemplo, a mulher que engordou mais de quinze quilos na gravidez e após o parto ficou com o abdome flácido ou com os seios caídos. Observou, ainda, o cirurgião Paulo Jatene que o princípio básico de uma cirurgia plástico-estética é o respeito às dobras e linhas naturais do corpo humano, cuja preservação se impõe. E mais, não existe cirurgia sem cicatriz, de modo que o paciente deve sempre saber que está trocando o resultado que buscou com uma cicatriz, embora esta esteja "escondida" (nas axilas, na parte posterior da orelha, na região do "trágus" etc.) ou imperceptível. Casos há, porém. enfatiza, que apesar da aplicação de técnicas consagradas e todos os cuidados preconizados, o resultado não é obtido em sua inteireza. É o que ocorre, ad exemplum, com certa freqüência, com pessoas "que - por possuir tipo de pele extremamente sensível ou em razão de infecção posterior apresentam, após o ato cirúrgico, cicatriz hipertrófica, ou cicatriz queloidiana, formando-se quelóides na extensão do corte e tornando-o mais evidente, com comprometimento do resultado esperado ou prometido. Caracterizam-se pela formação excessiva de tecido colágeno. Enquanto na cicatriz normal há um equilíbrio entre a síntese do colágeno e sua degradação, nas cicatrizes hipertróficas, em razão de causas desconhecidas, ocorre um aumento dessa síntese do colágeno. Como fatores conhecidos e já identificados, que podem influir no aparecimento dos "quelóides", mencionam-se: a) Raça de origem: O tipo de pele dos indivíduos de raça negra e amarela é mais susceptível de manifestar cicatrizes hipertróficas do que os caucasianos; b) Hereditariedade: Embora os estudos sejam ainda inconclusivos, existem alguns grupos de indivíduos com acometimento severo e história familiar positiva; c) Idade: Em um mesmo indivíduo a tendência ao quelóide pode estar presente em uma certa idade e, posteriormente, ficar atenuada ou desaparecer; d) Fatores locais: As regiões mais propensas à hipertrofia cicatricial são as peitorais, deltóides e face (rosto), sendo comum o surgimento de quelóides nas perfurações das orelhas. Mostra-se também comum a coexistência, numa mesma região, de quelóides e cicatrizes finas. Aliás, a mesma cicatriz pode apresentar segmentos normais e hipertróficos intercalados; e) Tensão entre os bordos da ferida; f) Ocorrência de infecção local; g) Suturas muito apertadas: hipótese em que surgirão áreas de necrose; h) Descumprimento aos cuidados exigidos no pós-operatório. Em algumas dessas hipóteses, em que a manifestação adversa é absolutamente imprevisível, não obstante o procedimento cirúrgico mostre-se escorreito e sem jaça e, portanto, exsurge como verdadeiro fortuito, não se poderá imputar responsabilidade ao profissional pelo insucesso, desde que tenha alertado previamente o paciente da possibilidade dessas intercorrências. Fora dessas hipóteses, a não obtenção do resultado prometido empenha responsabilidade. 22 a) Obrigação de resultado na cirurgia estética embelezadora (cosmetológica) · "Contratada a realização de cirurgia estética embelezadora, o cirurgião assume obrigação de resultado, sendo obrigado a indenizar pelo não cumprimento da mesma obrigação, tanto pelo dano material quanto pelo moral, decorrente de deformidade estética, salvo prova de força maior ou caso fortuito" (STJ – 3ª T. – Resp - Rel. Dias Trindade- j. 21.06.1991-RSTJ33/555); "Se o cliente fica com aspecto pior, após a cirurgia, não se alcançando o resultado que constituía a própria razão de ser do contrato, cabelhe o direito à pretensão indenizatória pelo resultado não alcançado" (TJSP - lª C.-Ap.227.747-1 Rel.Guimarães e Souza - j. 15.07.1995).. Cirurgia plástica embelezadora. Obrigação de resultado, respondendo o cirurgião pelos danos patrimoniais e morais resultantes do insucesso da intervenção cirúrgica. Provimento parcial do recurso para julgar procedente a ação (TJSP – 8ª C. Dir. Privado - Ap. 32.132-4 - Rel. Aldo Magalhães – j. 24.06.1998 - RJTJSP 208/100). "No procedimento cirúrgico estético, em que o médico lida com paciente saudável que apenas deseja melhorar sua aparência física e, conseqüentemente, sentir-se psiquicamente melhor, estabelece-se uma obrigação de resultado que impõe ao profissional da medicina, em casos de insucesso da cirurgia plástica, presunção de culpa, competindo-lhe ilidi-la com a inversão do ônus da prova, de molde a livrá-lo da responsabilidade contratual pelos danos causados ao paciente em razão do ato cirúrgico" (STJ – 3ª T - REsp 81.101 Rel. Waldemar Zveiter - j. 13.04.1999 - RT767/111 e RSTJ 119/290). Voto vencido do Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: "Pela própria natureza do ato cirúrgico, pouco importando sua subespecialidade, a relação entre o cirurgião e o paciente está subordinada a uma expectativa do melhor resultado possível, eis que toda a intervenção cirúrgica pode apresentar resultados não esperados, mesmo na ausência de culpa ou erro médico. Assim, a satisfação do contrato firmado entre médico e paciente para realização de cirurgia plástica, de cunho especificadamente estético, não depende, exclusivamente, da perícia ou diligência do cirurgião, mas de fatores idênticos aos de qualquer outra cirurgia, razão pela qual impossível autorizarse a inversão do ônus da prova, em casos de insucesso do procedimento cirúrgico, pois a responsabilidade do profissional, em tais hipóteses, deve ser apurada mediante a verificação da sua culpa no evento, nos termos do art. 14, § 4°, do CDC". b) Caso fortuito. Admissibilidade na cirurgia estética Responsabilidade civil. Cirurgia estética. Ocorrência de infecção que obstou ao prosseguimento do tratamento avençado. Caracterização de caso fortuito. Restituição das partes ao status quo ante, com a devolução dos honorários. Recurso extraordinário não conhecido (STF - lª T. - RE- Rel. Thompson Flores- j. 08.05.1979 -RT529/254). c) Culpa exclusiva da vítima. Alegação de inobservância das prescrições médicas Responsabilidade civil. Médico. Cirurgia plástica. "Onus probandi". Obrigação de resultado. Tabagismo no pós-operatório. - "A cirurgia plástica, com fins exclusiva ou preponderantemente estéticos, é cirurgia embelezadora e, por isso, a obrigação não é de meio e sim de resultado. Na hipótese de o resultado ser negativo e oposto ao que foi convencionado, presume-se a culpa profissional do cirurgião, até que ele prove sua não culpa ou qualquer outra causa exonerativa. Inobstante o fumar no período pós-operatório possa provocar os danos ocorridos, há necessidade de o réu provar que a cliente fumou, embora contra-indicação médica. Prova insuficiente. Responsabilidade civil reconhecida" (TJRS – 1ª C. - Ap. - Rel. Tupinambá M. C. do Nascimento - j. 05.05.1992 - Bol. AASP 2.065/56). "Inexistindo prova de que a paciente, submetida a cirurgia plástica de reparação estética, não tenha observado prescrições médicas ou tenha manipulado os curativos, lhe é devida indenização por dano estético e moral se o resultado da intervenção cirúrgica piorou seu aspecto físico" (TJSP -1ª C. Ap. - Rel. Alexandre Germano j. 26.05.1998RT757/156). d) Cicatrizes hipertróficas causadas por cirurgia embelezadora Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Cirurgia plástica. Danos estéticos. Hipótese de cicatrizes hipertróficas localizadas nas mamas. Considerações sobre a cirurgia reparadora e estética. Configuração da obrigação de resultado. Verba devida para a realização de nova cirurgia para reparação do dano. Recurso provido. - "Quanto aos cirurgiões plásticos, a obrigação que assumem é de resultado. Os pacientes, na maioria dos casos de cirurgia plástica, não se encontram doentes, mas pretendem corrigir um problema estético. Interessalhes, precipuamente, o resultado. Se o cliente fica com aspecto pior, após a cirurgia, não se alcançando o resultado que constituía a própria razão de ser do contrato, cabe-lhe o direito à pretensão indenizatória pelo resultado não alcançado" (TJSP _1ª C. -Ap. 23 227.747 L - Rel. Guimarães e Souza - j. 15.07.1995). e) Cicatrizes suprapúbicas com prolongamentos laterais excessivos Paciente que, após o ato cirúrgico, apresenta deformidades estéticas. Cicatrizes suprapúbicas com prolongamentos laterais excessivos. Depressão na parte mediana da cicatriz, em relação à distancia umbigo/púbis. Gorduras remanescentes. Resultado não satisfatório. "Embora não evidenciada culpa extracontratual do cirurgião, é cabível o ressarcimento. A obrigação, no caso, é de resultado, e não de meio. Conseqüentemente, àquele se vincula o cirurgião plástico. Procedência parcial do pedido, para condenar o réu ao pagamento das despesas necessárias aos procedimentos médicos reparatórios. Dano estético reduzido. Ressarcimento proporcional. Custas e honorários de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação" (TJRJ 5ª C. Ap. - Rel. Marcus Faver - DJU 04.06.1993 - Bol. AASP 2.065/55). f) Complicação surgida no pós-operatório. Inexistência de nexo causal Cirurgias plásticas realizadas. Paralisia do nervo ciático poplíteo surgida no período pós-operatório. Nexo causal inexistente. Ação improcedente. "A queixa do autor não se refere ao resultado das cirurgias, mas de um mal surgido no período pósoperatório, consistente em paralisia do nervo ciático poplíteo externo esquerdo. Reconhece que a lesão do nervo ciático não teve vinculação com as cirurgias. Não houve relação de causalidade imediata entre as cirurgias, com o tratamento respectivo e o mal" (TJSP 6ª C. - Ap. - Rel. Francisco Negrisollo - j. 07.08.1980 - RJTJSP 68/148). g) Critérios para a fixação dos danos Indenização. Responsabilidade civil. Operação plástica. Dano estético. Verba devida relativamente aos danos morais e aos apurados quando da realização de nova cirurgia para reparação. Acréscimo de correção monetária. Decisão confirmada. Voto vencido (RJTJSP 65/174). Indenização. Erro médico. Culpa grave. Honorários profissionais. Dano estético e moral. "Em se tratando de pedido de indenização por cirurgia plástica malsucedida, provada a culpa, fica o profissional obrigado a restituir ao paciente os honorários, bem como a reparar os danos decorrentes do erro médico" (TAMG 4ª C. - Ap. 110.111-3 - Rel. Mercêdo Moreira - j. 21.08.1991RT 692/149). "Se em ação de indenização houve pedido de reparação pecuniária por danos morais e estéticos decorrentes de defeitos da cirurgia e outro para pagamento de despesas com futura cirurgia corretiva, atendido este, inadmissível será o deferimento do primeiro" (TAMG - 4ª C. -Ap.-Rel. Mercêdo Moreira - j. 21.08.1991 – RT 692/149). h) Culpa presumida na cirurgia estética Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Deformação de seios, decorrente de mamoplastia. Culpa presumida do cirurgião. Cabimento. Hipótese de cirurgia plástica estética e não reparadora. Obrigação de resultado. Negligência, imprudência e imperícia, ademais caracterizadas. Recurso não provido (TJSP – 9ª C. Ap. - Rel. Accioli Freire - j. 09.06.1994 - RJTJSP 157/105). i) Dano estético causado pela plástica "O que se busca com a cirurgia plástica é a correção de defeitos físicos, que comprometem a beleza do ser humano. Ora, se, em conseqüência de uma cirurgia mal-executada, sobrevém a uma mulher, um dano estético, é evidente que ele deve ser reparado, não se podendo negar o direito ao ressarcimento pelos lucros cessantes pelo dano estético. A aparência física da pessoa, tanto para as que executam determinadas profissões, como para aquelas que possam aspirar a uma colocação compatível com seu grau de instrução ou com a sua capacidade de trabalho, é fundamental como fator de emprego. O certo é que, em conseqüência de uma cirurgia plástica malconduzida e pior executada, a autora sofreu deformação física, que lhe causa depressão psíquica, que é fator imprescindível para o êxito social ou econômico de qualquer ser humano” (TJSP – 4ª C. - EInfrs. - j. 18.12.1980 - RJTJSP 70/217). Vide RJTJSP 65/174. Indenização. Responsabilidade civil. Ato ilícito. Dano estético. Deformidade causada por erro médico em cirurgia plástica. Condenação do réu no custeio de outra cirurgia reparadora. Escolha do médico e do hospital a critério da autora. Verba fixada na fase de liquidação, que será por artigos. Sentença confirmada (TJSP 6ª C. - Ap. - Rel. Melo Júnior - j. 19.12.1991-RJTJSP 137/182). "Cirurgia plástica destinada a melhorar a aparência de paciente. Lesões resultantes de ato operatório, de que decorreu dano estético à paciente. Responsabilidade civil do médico operador. Sentença confirmada" (TJRJ -8ª C. -Ap.- Rel. Lopes de Sousa - j. 16.12.1980 –RT 554/234). "O dano estético resultante de cirurgia plástica deve ser indenizado pelo médico em razão de 24 inadimplemento contratual, já que assume ele obrigação de resultado" (TJSP – 1ª C. - Ap. - Rel. Roque Komatsu - j. 25.10.1988 -RT638/89). "O profissional que se propõe a realizar cirurgia, visando a melhorar a aparência física do paciente, assume o compromisso de que, no mínimo, não lhe resultarão danos estéticos, cabendo ao cirurgião a avaliação dos riscos. Responderá por tais danos, salvo culpa do paciente ou a intervenção de fator imprevisível, o que lhe cabe provar" (STJ -3ª T. AgReg. 37.060 - Rel. Eduardo Ribeiro - j. 28.11.1994-RT 718/270 e RSTJ 119/293). j) Deformação dos seios em razão de flacidez preexistente da pele Médico. Responsabilidade civil. Indenização. Mamoplastia da qual resultou deformidade estética. Se a deformação dos seios deve ser atribuída à flacidez da pele da autora, resta incólume a culpa do cirurgião. Assim, duas hipóteses merecem destaque. Primeira, o réu, que, evidentemente, examinou os seios da autora, percebeu a alegada flacidez da pele, ocultando esse fato da paciente, agindo com imprudência, pois como conceituado cirurgião que alega ser, devia prever o resultado indesejável da deformação apontada. Segunda, se não percebeu a flacidez, agiu com negligência, outra modalidade da culpa" (TJSP – 9ª C. - Ap. Rel. Accioli Freire-j. 09.06.1994-RT713/125). I) Dever do médico de alertar o paciente da possibilidade de resultado negativo Danos materiais e morais decorrentes de cirurgia estética malsucedida. Fundada suposição de imperícia. Obrigação de resultado, de acordo com o estágio de desenvolvimento das técnicas cirúrgicas, ou dever do médico de alertar o paciente da probabilidade de resultado negativo. Improvimento da apelação dos réus. Provimento do recurso adesivo da autora (TJSP – 2ª C. Dir. Privado -Ap. - Rel. Lino Machado - j. 07.04.1998 JTJ-LEX207/116). m) Impossibilidade de o juiz pronunciar-se acerca do método operatório utilizado Responsabilidade civil do médico. Cirurgia estética malsucedida. Culpa não provada. - "A responsabilidade dos médicos é contratual, mas baseada, fundamentalmente, na culpa. A obrigação assumida não é de resultado, mas de meios, ou de prudência e diligência. Ao juiz é defeso, por não ser de sua competência, pronunciar-se por essa ou aquela escolha, optar por esse ou aquele método operatório. Exame da prova, onde não há comprovação de culpado réu. Ninguém pode ser condenado por meras conjecturas" (TJRS – 4ª C. Ap. 10.898 - j. 11.03.1980-DJRJ07.05.1981, p. 64. Responsabilidade civil. Coord. Yussef Said Cahali. São Paulo: Saraiva, 2. ed., 1988, p. 348). n) Resultado diverso do pretendido "Na cirurgia estética existe responsabilidade do médico quando há resultado diverso do pretendido pelo paciente" (TJRJ – 6ª C. - Ap. - Rel. Dourado de Gusmão - j.02.09.1982-RT556/191). o) Resultado pretendido não Inexistência de responsabilidade alcançado. 'Cirurgia plástica. Erro profissional. Deformação. - "Em se tratando de tratamento médico-estético com emprego de peeling químico e ação mecânica "dermo-abrasão" a que foi submetida a paciente, o resultado é levado em conta. Nessa hipótese, o médico pode não garantir o resultado, ou seja, embelezar o paciente, respondendo, entretanto, se for alcançado resultado negativo, ou melhor, diverso, ou seja, se agravar os defeitos ou se deformar a paciente. Se a paciente submetida a cirurgia estética ou a tratamento médico-estético, como é o caso dos autos, não alcançar o resultado visado pelo tratamento ou pela cirurgia, não há culpa do médico. Mas, se o tratamento estético agravar os defeitos, deformar, enfear, em vez de embelezar, nesse caso o resultado é levado em consideração, havendo culpa do médico, porque as contra-indicações do tratamento ou da cirurgia devem ser, em cada caso, pesquisadas com muita cautela antes de se submeter o paciente a tratamento médico ou médico-cirúrgico. Assim, se a finalidade embelezar - não é atingida, não responde o médico, mas, se alcançado resultado oposto com o tratamento estético, ou seja, a imagem da pessoa, do ponto de vista estético, piora com o tratamento, o resultado é considerado, havendo, nesse caso, também culpa profissional" (TJRJ – 8ª C. - Ap. Rel. Dourado de Gusmão - j. 21.09.1982 - RT 566/192). p) Resultado pretendido não alcançado, com deformação e afeamento da vítima V. tb. o acórdão acima. . "Em se tratando de cirurgia plástica, se o cliente fica com o aspecto pior, não se alcançando o resultado que constituía a própria razão do contrato, cabe-lhe direito à indenização" (TJSP – 1ª C. D. Privado - Ap. 18.982-4 - Rel. Alexandre Germano - j. 26.05.1998). 18.13 - Responsabilidade pessoal do chefe da 25 equipe médica e do anestesista Vide tb. o Item 18.02, acima. NOTA DE DOUTRINA: O médico, conforme lição de Teresa Ancona Lopez, responde não só por fato' próprio como pode vir a responder por fato danoso praticado por terceiros, esclarecendo que "em princípio, responde esse profissional por fato de terceiros que estejam diretamente sob suas ordens" (op. cit., p. 322). Sustenta Miguel Kfouri Neto que "se houver dano, em princípio presume-se culpado o cirurgião-chefe. Se se puder entretanto, individualizar a responsabilidade - como no caso do anestesista - responderá o próprio profissional ou o hospital (e aí a responsabilidade estará consubstanciada na Súmula 341 do STF: 'É presumida a culpado patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto'" (A responsabilidade civil do médico. RT 654/57). Ocorre que questão complexa surge quando se trata de uma equipe médica. É que o notável progresso da medicina conduziu, inexoravelmente, à especialização, de modo que a equipe médica, embora comandada por um médico-chefe, écomposta por profissionais altamente especializados em áreas diversas e heterogêneas. . Para Teresa Ancona Lopez é o médico-chefe quem se presume, em princípio, culpado pelos danos que acontecem, "pois é ele que está no comando dos trabalhos e sósob suas ordens é que são executados os atos necessários ao bom desempenho da intervenção" (op. cit, p. 323). Essa é a opinião de René Savatier, para quem a responsabilidade é totalmente do cirurgião durante a operação, pois é ele o chefe, os outros são auxiliares sob suas ordens (Comment repenser, p. 35 e 37). Nos tempos atuais, contudo, a afirmação comporta temperamentos. É certo que em determinadas circunstâncias a responsabilidade recairá sobre o chefe da equipe, não tanto por ~sa razão (ser "chefe"), mas nos casos em que. os demais médicos sejam, ad exemplum, contratados dele. Mas aí responde por presunção que se faz da responsabilidade do "patrão" por ato de seu preposto, que independe da apuração de culpa, posto que objetiva nos termos do art. 932, m, c.c. o art. 933 do Código Civil. A nós parece que se o dano verificado não está na linha causal do procedimento, ação ou omissão do chefe da equipe, mas decorre de ato independente de qualquer dos membros da equipe, só se poderá imputar culpa a quem lhe deu causa. A questão se resolve tão-só através do nexo de causalidade. Exemplo disso é o do anestesista, cujo atuar é independente e sua função nada tem a ver com a cirurgia posteriormente executada por outrem. Se o paciente vier a sofrer danos em razão da anestesia, responderá o anestesista. Contudo, se a cirurgia foi mal-executada ou o cirurgião utilizouse de técnica experimental. temerária ou não aprovada pela comunidade científica, não há como responsabilizar o anestesista ou o chefe da equipe que poderia até estar momentaneamente ausente da sala, ou sequer participando do ato cirúrgico. A responsabilidade do anestesista há de resultar de sua própria atuação ou omissão, como os erros: a) de diagnóstico (avaliar o risco anestésico, a resistência do . paciente); b) de procedimento terapêutico (medicação pré-anestésica ineficaz, omissões durante a aplicação); c) de técnica (uso de substância inadequada, oxigenação insuficiente etc.); ausência de anamnese preliminar. Discordamos, aliás, de Guilherme Chaves Sant'ana quando afirma que o anestesista assume uma obrigação de resultado, desde que tenha tido oportunidade de avaliar o paciente antes da intervenção, e concluir pela existência de condições para a anestesia, assumindo a obrigação de anestesiá-lo e de recuperá-lo (Responsabilidade civil dos médicos anestesistas, p. 133 et seq). A obrigação é apenas de meios, considerando a possibilidade de intercorrências independentes da vontade do médico ou acima de suas possibilidades e ligadas exclusivamente às condições físicas ou pessoais do paciente e, portanto, fora da linha causal. Como observou Ruy Rosado de Aguiar Jr., citando acórdão da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Revista Jurídica 75/237), "o anestesista ocupa hoje uma posição especial, em razão da autonomia que alcançou a especialidade: em relação a estes, tem sido aplicada a noção de ato destacável, próprio do direito administrativo, a fim de determinar a sua responsabilidade, e não necessariamente a do 'cirurgião'" (Responsabilidade civil do médico. RT 718/42). Suponha-se um trabalho de parto em que o cirurgião dá nascimento a uma criança através da chamada cirurgia "cesariana", com absoluto sucesso, entregando-a em seguida ao pediatra, pertencente à equipe médica, e este, por atitude negligente e autônoma, coloca a criança de bruços, de modo a asfixiá-la, causando-lhe a morte. Não se consegue atinar como seria possível responsabilizar o chefe da equipe, considerando que seu atuar estaria fora da linha causal. Por fim, Teresa Ancona resume a questão 26 afirmando que "com o desenvolvimento das especialidades médicas a tendência hodierna é de se considerar separadamente a responsabilidade do anestesista e do operador. Há uma redistribuição de competências em razão das funções próprias e específicas de cada médico (a respeito do assunto, cf. Charles Vdar. L' évolution, cit., Revue, t. 72). · Ação ordinária de indenização. Dano estético. Intervenção cirúrgica. Responsabilidade do chefe de equipe médica. - "A permanência do cabo do aparelho de Diatermia, após a realização da operação, de forma a causar queimaduras no paciente é de responsabilidade do médico chefe de equipe. Essa responsabilidade, pelo dano estético causado ao paciente, inclui a obrigação de assegurar a necessária cirurgia reparadora. Ação procedente" (TJPR _4.. C. - Ap. - Rel. Jorge Andriguetto - j. 21.03.1984 - RT5881161). · "O médico chefe é quem se presume responsável, em princípio, pelos danos ocorridos em cirurgia, pois, no comando dos trabalhos, sob suas ordens é que executam-se os atos necessários ao bom desempenho da intervenção" (STJ - 3.. T. REsp - Rel. Waldemar Zveiter - j. 04.03.1997 RSTJ97/179). · Civil- Ação de indenização. Erro médico. Responsabilidade solidária do cirurgião (culpa "in eligendo") e do anestesista reconhecida pelo acórdão recorrido. Matéria de prova. Súmula 7/STJ -..A apuração da responsabilidade por erro médico depende do exame do caso concreto. Induvidosamente há responsabilidade autônoma do anestesista quando se cuida de atos praticados no pré ou pós-operatório. Porém, dentro da sala de cirurgia, como sucede no caso versante, aquela se apura consoante a prova realizada nos autos para verificação a culpa do gmu em que concorreu o agente e se atribuível exclusivamente ao anestesista ou não" (STJ 3.. T. - REsp - Rel. Waldemar Zveiter - j. 04.03.1997 RSTJ 97/179 e RT7481182). · Responsabilidade civil. Médico anestesista. ''Anestesia é obrigação de resultado, concernente a antes, durante e após o ato anestésico, daí a profunda responsabilidade técnica do médico anestesista, que estatui até uma condição arbitrária para seu desempenho dentro da equipe médica. Paciente que veio a ter concussão cerebral, ficando com lesão permanente em razão de parada cardiorrespiratória. Ocorre que não foi feito o exame de sensibilidade do paciente e, não sendo intervenção cirúrgica urgente, houve falta de cuidado objetivo e técnico do médico anestesista que, por negligência e também imperícia, tanto pelo ato omissivo e comissivo, não teve atitude correta, pronta, técnica e profissional condizente ao momento e ao paciente, havendo agido com culpa e respondendo pelo dano causado (artigos 159 [atual art186]e 1.145 [atual art5U], c.c.o art. 1.056 [atual art. 389] do Código Civil). Danos morais permanentes a terceiro, além do dano material físico" (TJGO1.8 C. -Ap; 29.966 - Rel. José Soares de Castro - j. 18.05.1993 - RI 231/149 Bol. AASP 2.065/55). · "Dependendo das circunstâncias de cada caso concreto, o médico-chefe pode vir a responder por fato danoso causado ao paciente pelo terceiro que esteja diretamente sob suas ordens. Hipótese em que o cirurgião-chefe não somente escolheu o auxiliar, a quem se imputa o ato de acionar o pedal do bisturi, como ainda deixou de vigiar o procedimento cabível em relação àquele equipamento. Para o reconhecimento do vínculo de preposição, não é preciso que exista um contrato típico de trabalho; é suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviços sob o comando de outrem" (STJ – 4ª T. - REsp 200.831 Rel. Barros Monteiro-j. 08.05.2001 - RSTJI54/381 e RT796/214). 18.14 - Solidariedade passiva entre médico, hospital e plano de saúde Vide estudo doutrinário sobre o tema no Cap. VII, Item 17.10, "b". "Evidenciada a culpa autônoma do médico pelos danos causados em decorrência de erro profissional, não há como invocar a responsabilidade solidária do hospital do qual nem é empregado, serviçal ou preposto, mas sócio-cotista" (TJSP – 1ª C. - Ap. Rel. Roque Komatsu - j.02.12.1988-RT639/52). Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Ajuizamento contra hospital, cirurgião e anestesista. Solidariedade reconhecida. Questionamento de pormenores técnico-científicos complexos. Desnecessidade. Suficiência, para o reconhecimento da culpa, do enfoque do comportamento dos réus, sob a ótica jurídica. Ação procedente. Recursos não providos (TJSP – 4ª C.Ap.-Rel. Ney Almada -j. 24.06.1993-JTJLEX 148/90). "A seqüela de intervenção cirúrgica, por si só não comprova a culpa do médico, devendo antes ficar demonstrada sua imperícia ou negligência para que respondam o nosocômio e o profissional pelo danos físicos, estéticos e psicológicos causados na menor. Recurso provido" (TJSP – 8ª C. Dir. Privado - Ap. 7.174-4 - Rel. Egas Galbiatti - j. 04.08.1999 – JTJ LEX 222/75). Indenização. Responsabilidade civil. Erro 27 médico. Solidariedade de operadora de plano de saúde reconhecida. Inteligência da Lei 8.078, de 1990. Responsabilidade de natureza objetiva do fornecedor de serviços. Apelação do autor provida para afastar a extinção do processo em relação à coré e agravo retido não conhecido. - "A empresa locadora direta de serviços médico-hospitalares, credenciando médicos e nosocômios para suprir as deficiências de seus próprios serviços, compartilha da responsabilidade civil dos profissionais e hospitais que seleciona" (TJSP – 2ª C. Dir. Privado AC67.929-4-Rel. Vasconcellos Pereira j.16.03.1999 -JTJ-LEX218/156). . Denunciação da lide. Plano de saúde. Erro médico. Ação de reembolso de despesas médicas e hospitalares, cumulada com pedido de reparação de dano moral. Denunciação da lide aos hospitais conveniados, acusados de imperícia no diagnóstico. Indeferimento. Existência, porém, de responsabilidade solidária, em tese. Admissibilidade da ação de regresso contra estes. Provimento do recurso, para deferir seu processamento (TJSP – 3ª C. Dir. Privado - AI 190.159-4 Rel. Carlos Roberto Gonça1ves - j. 13.03.2001-JTJLEX2431232). 18.15- Veterinário NOTA DE DOUTRINA: Exigindo a legislação que o médico veterinário tenha formação específica para exercício desse mister, inclusive credenciamento junto Conselho respectivo, a ele se aplicam as considerações feitas nesse Capítulo acerca dos médicos em geral, no que se refere aos fundamentos nucleares da responsabilidade civil. Indenização. Responsabilidade civil. Morte de eqüino estabulado na Sociedade Hípica. Erro médico veterinário inocorrente. Fato de a ré não haver comunicado a enfermidade do animal ao seu dono, bem como não haver realizado a necrópsia que não autoriza o ressarcimento pela morte. Ação improcedente. Embargos recebidos. Votos vencedor e vencido (TJSP - 3." C. EInfrs. - Rel. Alfredo Migliore- j. 16.02.1993 -JTJLEX 145/228). Indenização. Responsabilidade civil. Hospital veterinário. Danos patrimoniais e morais. Morte de animal de estimação nele internado. Culpa do réu não demonstrada. Procedência da reconvenção para que respondam os autores pelo pagamento das despesas. Recurso não provido (TJSP – 4ª C. - Ap. - Rel. Cunha Cintra - j. 09.08.1995 -JTJ-LEX 175/45). Indenização. Veterinário. Erro médico. Cegueira do animal. Culpa de meio e não de fim. Impossibilidade de indenizar a dona do cachorro porque o médico não foi negligente. Conseqüências pós-cirúrgicas. Ausência de culpa médica (TJSP- 3ª C. Férias B de Dir. Privado Ap. 265.282-1/3 - Rel. Toledo Cesar - j. 30.07.1996 Rep. IOB de Jurisp. 23/96, 1ª quinzena de dez./96, caderno 3, p. 397). 18.16 - Entidades privadas de seguro e de assistência médica (convênios médicos, "planos de saúde" ou "seguro-saúde") V. tb. o Item 7.00 (Empresas de Assistência Médica - Convênios Médicos), no Capítulo VII, onde outros aspectos da questão foram abordados. NOTA DE DOUTRINA: Observou com pertinência Ruy Rosado de Aguiar Jr. que "a previdência privada assume a cada dia maior importância no país. As dificuldades encontradas pela Previdência Social para atuação eficaz no âmbito da saúde têm levado grande número de pessoas à proteção complementar na área da previdência privada, que hoje já atinge a 35 milhões de pessoas, das quais 28 milhões são ligadas a empresas" (Responsabilidade civil dos médicos. RT 718/47). Entende esse ilustre autor, com supedâneo na jurisprudência, que a entidade privada de assistência à saúde, que associa interessados através de planos de saúde, e mantém hospitais ou credencia outros para a prestação de serviços que está obrigada, tem responsabilidade solidária pela reparação dos danos decorrentes de serviços médicos ou hospitalares credenciados. E mais, excetua dessa responsabilidade as entidades que, em seus contratos de planos de saúde, dão liberdade para a escolha de médicos e hospitais, assim como os seguros-saúde, que apenas reembolsam as despesas efetuadas pelo paciente, e por isso não respondem pelos erros dos profissionais livremente selecionados e contratados pelo seu segurado (artigo citado, p. 47). Não obstante o abalizado entendimento do ilustre Ministro e a autoridade que se lhe reconhece, discordamos, em minúscula parte. Não nos parece que em qualquer das hipóteses enumeradas se possa afirmar, de pronto, a responsabilidade da entidade de assistência médica, seja quando impõe ao contratante e beneficiário do plano de saúde a utilização de hospitais e médicos por ela mantidos, seja quando o credencia, ou quando lhe dá opção de escolha. Nos comentários por nós expendidos acerca da responsabilidade dos hospitais (Capítulo VII, Item 17.00), deixamos assentado na edição anterior desta obra o entendimento de que estes 28 só respondem objetivamente, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, quando atuam como meros hospedeiros. Quando atuam no exercício de sua atividade específica e típica da área médica há que se perquirir a culpa de seus prepostos para que se possa responsabilizá-los. Agora, contudo, evoluímos e reformulamos, em parte, nosso entendimento, no sentido de que em qualquer hipótese - seja no fornecimento de serviços médicos típicos, seja na atuação como mero hospedeiro - o hospital só poderá responder por culpa e não objetivamente, sendo, nessa quadra, inaplicável o Código de Defesa do Consumidor. Considerações mais aprofundadas encontram-se no referido Capítulo VII, Item 17.00, letra" e" (Atuação do Hospital como Mero Hospedeiro). Ora, embora, em tese, seja possível e nada impeça que se faça o desencadeamento do nexo causal - por força do princípio da equivalência das condições -, há de se perquirir se a empresa agiu com culpa em qualquer das modalidades que a compõe, o que não será nada fácil, nem parece possível prima facie. Suponhamos que o paciente, cujo plano de saúde assegure apenas a utilização de hospital e médico, mantidos pela entidade de assistência médica, sofra lesão decorrente de uma injeção mal aplicada pela enfermeira ou de uma cirurgia malsucedida, em razão de imperícia do médico. A empresa de assistência médica será responsabilizada não em razão de ter firmado contrato de plano de saúde com a vítima, mas porque o patrão responde, objetivamente, pelos atos culposos de seus prepostos, nos termos do art. 932, III, c.c. o art. 933 do Código Civil, no suposto de que o hospital ou médicos por ele mantidos são autênticos prepostos do mantenedor. Colha-se o derradeiro exemplo dentre os possíveis: a empresa de assistência médica assegura aos seus associados a escolha de alguns hospitais (ou médicos) por ela credenciados, em razão de convênio previamente firmado. Desse modo, o beneficiário ou paciente escolhe, dentre os hospitais credenciados, aquele que melhor atende aos seus interesses. Nessa hipótese, não há como inferir responsabilidade senão e apenas do hospital (ou médico), caso o paciente sofra danos por ato culposo de seus prepostos (médicos e funcionários), com direito de regresso contra estes. Não há como estabelecer liame de causalidade entre a empresa que contratou o plano de saúde e o dano sofrido pelo associado. Aliás, credenciar mais de um hospital ou médico é o mesmo que dar direito de escolha ou liberdade de opção, hipótese em que o autor citado entendeu não ser possível a responsabilização. E, efetivamente, responsável não será. Quanto ao mais, tenha-se que os seguros-saúde apenas reembolsam as despesas efetuadas pelo paciente, sem interferir na escolha do segurado, de modo que eventual dano sofrido por atendimento de outros não lhe diz respeito e, portanto, refoge do nexo de causalidade entre este dano e sua atuação. A responsabilidade da empresa de plano de saúde somente nascerá quando ela tenha os seus próprios hospitais, clínicas e atendimentos de urgência, os quais dirige, mantém e por eles responde diretamente. · "Se a empresa de assistência médica é a locadora direta de serviços médico-hospitalares à paciente, na medida em que credencia médicos e nosocômios, a suprir as deficiências de seus próprios serviços (que oferece como assistência médica global), já está a compartilhar, como reus eligens, da responsabilidade dos profissionais e entidades que selecionou" (TJSP – 2ªC. - EInfrs. 106:119-1- Rel. Walter Moraes - j. 06.03.1990). · "A empresa de assistência médica também é responsável solidariamente em decorrência do contrato de assistência médica havido com a autora. Tendo aquela credenciado o réu para a prestação de serviços médicos, assumiu a responsabilidade pela sua perfeita execução, respondendo, então, pelos prejuízos causados pela mesma ao contratante e seus dependentes. Sua escolhida não se desincumbiu a contento dos serviços contratados" (TJSP - 6.' C. - Ap. 140.190-1- Rel. Reis Kuntz - j. 06.12.1990). · "Não há que se indagar se a atividade da "Blue Life" (sociedade privada de assistência médica, através de planos de saúde) se limita ou não, e apenasmente, com o credenciamento de profissionais. Mas, se o faz, resulta óbvia a relação de causa e efeito em termos de responsabilidade. Pergunta-se: não será por confiar nas indicações médico-hospitalares que os pais da vitima se vincularam contratualmente à "Blue Life"? E, fosse qual fosse a amplitude que se queira atribuir à embargada na espécie: Não há como se possa atribuir maior elastério do que aquele estabelecido em contrato. Tanto que a própria lei adjetiva vincula ao mesmo pólo da demanda aqueles que devem responder por atos danosos de seus prepostos. Na hipótese, a enfermeira é preposta da "Imong" (entidade hospitalar), mas esta foi indicada pela embargada, já que ela figura em seus quadros como sociedade vinculada à prestação de serviços profissionais médico-hospitalares a seus conveniados. É o disposto no art. 70, m, do CPC o que revela e alcança a responsabilidade ;11 casu " (TJSP - 6.' C. - EInfrs. 140.190 1- Rel. Munhoz 29 Soares - j. 06.08.1992). . "Pelo contrato firmado, obrigou-se a "Golde1l C1VSS" a prestar serviços a seus associados, por óbvio, adequados e seguros. Infere-se desse instrumento que a responsabilidade solidária com o médico por ela contratado resulta das obrigações nele estabeleci das. O associado, ao recorrer aos serviços médicos prestados pela "Golden Cross", terá de valer-se de médicos por ela credenciados. Portanto, o médico credenciado age como preposto seu" (TAMG-lª C. -Ap. 165.656-2- Rel. Paris Pena - j.14.12.1993). . "A empresa locadora direta de serviços médico hospitalares, credenciando médicos e nosocômios para suprir as deficiências de seus pr6prios serviços, compartilha da responsabilidade civil dos profissionais e hospitais que seleciona. A medida de sua culpa deve ser avaliada no processo e pode responder sozinha pela ação, pois, em matéria de ato ilícito, a responsabilidade dos co-autores do delito é solidária e o credor pode escolher, entre os co-responsáveis, aquele que mais lhe convier. Muitas entidades de prestação de serviços médicos após conquistarem o público com a oferta de atendimento completo e de uma decantada perspectiva de vida despreocupada quanto a essa parte, tudo fazem para se esquivar do compromisso assumido. Assim sendo, aos Juízes cumpre não se deixarem seduzir pelos manejos da retórica insinuante que esses esquemas já têm preparados" (TJSP – 2ª C. - EInfrs. -Rel. Walter Moraes - j. 06.03.1990-RT653/93). . "Se há solidariedade da empresa de assistência médica, do médico por ela credenciado e do hospital, na reparação dos danos, contra qualquer deles pode dirigir-se o pedido" (TJRJ - 2." C. - AI 1.475/92 - "Responsabilidade civil dos médicos", RT118/47). · Indenização. Responsabilidade civil. Plano de ,saúde. Indenização por danos materiais e morais, decorrentes de adimplemento imperfeito do contrato de prestação de serviços médicohospitalares. Erro e indefinição no diagnóstico da real patologia, que obrigaram a associada a buscar profissional particular. Procedência mantida. Recurso da autora provido, para a" elevação do valor da indenização pelos danos morais, de 30 para 200 salários mínimos pleiteados. - "É indiscutível a responsabilidade das entidades de convênio pelos danos causados através de atos de seus prepostos, médico, hospitais e clínicas, e presumida é a sua obrigação" (TJSP - 2." C. Dir. Privado - Ap. 259.592 - Rel. J. Roberto Bedran-j. 24.09.1996-JTJ-LEX 192/123). · "A empresa locadora direta de serviços médico hospitalares, credenciando médicos e nosocômios para suprir as deficiências de seus pr6prios serviços, compartilha da responsabilidade civil dos profissionais e hospitais que seleciona" (TJSP - 2." C. Dir. Privado...:. AC 67.929-4 - Rel. Vasconcellos Pereira - j. 16.03.1999). 18.17 - Esquecimento de objeto cirúrgico no corpo do paciente "A presença de petrecho cirúrgico no corpo de paciente configura grave violação dos deveres impostos ao cirurgião e equipe, assim como ao hospital conveniado, incidindo a reparação civil e reconhecendo-se a negligência médica. A agulha de sutura está onde não devia estar e a sua retirada demanda criteriosa avaliação pelos riscos que encerra. O dano deve ser indenizado também por razões ético-jurídicas, no intuito de alertar para a formação de uma consciência profissional" (TJRJ L' C. - Ap. - Rel. Pedro Américo Rios Gonçalves j. 15.03.1994 - RT7191229). · Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Compressa cirúrgica deixada no corpo do paciente, após cirurgia. Objeto não apresentado. Irrelevância. Verossimilhança da prova testemunhal. Ação procedente. Recurso não provido (TJSP -9ª C. Dir. Privado-Ap. - ReI. Franklin Neiva - j. 07.05.1996-JTJ-LEX 184/114). 18.18 - Nexo de causalidade · "Se a paciente após ter a alta do hospital não procurou mais o médico que a atendeu para comunicar-lhe o agravamento do seu estado de saúde, não pode ela imputar ao profissional comportamento irresponsável. Em síntese, se a vítima sofre dano, mas não evidencia o liame de causalidade com o comportamento do médico, improcede o pleito indenizatório" (TJSP -1.. C. Ap. Rel. Andrade Marques - j. 24.05.1994 RT7121136). 18.19 -Infecção hospitalar NOTA DE DOUTRINA: Fenômeno que vem se acentuando e que assume enorme importância pela sua freqüência e alto poder de nocividade é a chamada "infecção hospitalar". Por razões várias, até mesmo por falta de cuidados com a assepsia e desinfecção em ambiente propício à proliferação de hospedeiros, pode ocorrer a infecção hospitalar. . É a presença, desenvolvimento e multiplicação 30 oportunista de seres inferiores no organismo debilitado do paciente, por decorrência de intervenção cirúrgica ou da ação de medicamentos, que podem resultar em conseqüências nocivas ao paciente, em grau maior ou menor, até mesmo com possibilidade de conduzir ao óbito ou a lesões graves e, ainda, interferir na cirurgia realizada ou no tratamento desenvolvido, visando a cura. O mestre Caio Mário da Silva Pereira escreveu que se a infecção "se deveu a condições de assepsia deficiente ou à ausência de cautelas idôneas a evitar a 'doença nosocômica' , o hospital pode ser responsabilizado. Ocorre a responsabilidade se, em cirurgia estética, a infecção hospitalar obstrui a continuação do tratamento" (Responsabilidade civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Fo~' rense,1992, p. 154). Para nós, a infecção hospitalar é um indício de culpa. A presença de germes (micróbios, protozoários, cogumelos, bactérias, rickéttsias, vírus e microorganismos) no ambiente hospitalar conduz à presunção de culpa por falta de cuidados. Traduz conduta omissiva, desidiosa ou negligente,-que não pode ser suportada ou relevada. Assim, o hospital responde pelos danos causados ao paciente em razão de infecção hospitalar, se não provar a existência de uma das causas de exculpação. Dois os fundamentos que impõem essa responsabilização. Primeiro, porque a presença de bactérias ensejadoras de infecção, em quantidade superior àquela permitida ou razoável (controlada), faz presumir a culpa por desídia. Segundo, porque a presença da infecção no paciente em razão desse desequilíbrio na quantidade de bactérias também induz culpa, pois o hospital ao receber o paciente passa a ter a sua guarda e assume uma obrigação de incolumidade.. Não se afasta a possibilidade de o próprio médico responder solidariamente com o hospital quando dele for preposto ou mesmo - ainda que independente ou autônomo - se. possa demonstrar que sabia das condições impróprias do local e da freqüente ocorrência de infecções em outras pessoas. Nessa hipótese à desídia do hospital soma-se a negligência do médico que, mesmo sabendo que o local não oferecia condições ideais, assumiu o risco de ali internar ou manter o paciente. . Responsabilidade civil. Infecção hospitalar. Condutas culPosas do médico e do hospital. Concausas sucessivas. Indenização devida. - "A fasciíte necrosante é uma grave infecção bacteriana, previsível, entre outros casos, na cesariana. Pode não ser tipicamente uma infecção hospitalar, mas, em a adquirindo a parturiente, em seguida ao parto cirúrgico, no ambiente do nosocômio que aceitou a sua internação, passa a comportar aquela qualificação, servindo para positivar o descumprimento do dever, inerente à prestação do serviço hospitalar, de propiciar à paciente ambiente saudável e promover permanentemente o controle da infecção. E o ginecologista-obstetra,. que assistia a paciente desde o pré-natal e assim permaneceu após realizar o parto cesário, ao descurar-se de investigar, adotando as providências cabíveis, a anormalidade apresentada por ela dois dias após a cirurgia, vindo a lhe dar alta, apesar das queixas e do aparecimento dos primeiros vestígios da enfermidade, ensejando o seu agravamento, com o retardo do diagnóstico, descumpriu igualmente o dever jurídico de cuidado pronto e eficiente. Concausas adequadas e aptas, com igual intensidade, para gerar a obrigação de reparar, com ponderação, os danos sofridos pela paciente, que submetida à laqueadura, cirurgia de emergência, perdeu o ovário e parte do tecido intestinal, necrosados, conseqüência de condutas negligentes do médico e do hospital, solidariamente vinculados à reparação" (TJRJ - 8. a C. Ap. 595/96 - Rel. Laerson Mauro - j. 04.06.1996). . "Não respondem por indenização decorrente de ato ilícito pela morte de paciente por infecção hospitalar os médicos que cuidaram da vítima, e sim o hospital onde permaneceu internada, ainda que os profissionais não sejam subordinados à entidade hospitalar, pois, de acordo com o art. 14, § 4.°, do CDC, o contratante somente se exculpará do evento danoso quando o profissional liberal contratado desempenhar, autonomamente, seu ofício no mercado de trabalho, o que não se aplica aos serviços profissionais prestados pelas pessoas jurídicas, seja sociedade civil, seja associação profissional" (1° TACSP- l1.aC.-Ap. -Rel. Antônio Marson- j. 16.02.1998 -RT755/269). ''A paciente que, após parto cesariano, é acometida por infecção hospitalar, culminando em cirurgia de retirada de útero em função do agravamento do estado infeccioso, tem o direito de ser indenizada pelos danos morais decorrentes de tal conduta, independentemente da prova de concorrência de culpa do corpo hospitalar, pois, nos termos do art. 14 da Lei 8.078/90, a responsabilidade do hospital para com seus pacientes é de cunho objetivo" (TJRJ - 12.a C. Ap. 505/98 - Rela. Leila Mariano - j. 05.05.1998 RT7611367). · "O hospital responde pelos danos materiais e morais decorrentes de infecção hospitalar, se não prova, de maneira clara e conveniente, a ocorrência de caso fortuito" (TJSP - r c. Dir. Privado - Ap. 65.635-4 - Rel. CezarPeluso-j.23.02.1999). 31 · Apelação cível. Responsabilidade civil do Estado. Fazenda do Estado. Paciente submetido a cirurgia em hospital da rede pública. Alegação de ter sido colocada em seu ombro direito prótese de platina infectada, estando o estabelecimento hospitalar em péssimas condições de higiene, causando-lhe grave infecção. Ação julgada improcedente. Manutenção. Reconhecimento da ocorrência de causa excludente. Culpa exclusiva da vítima. Recurso não provido. - "Comprovado que o resultado insatisfatório observado em paciente submetido a cirurgia em hospital da rede pública, não decorreu de ação iatrogênica culposa dos médicos durante o ato cirúrgico, nem da omissão do hospital na mantença das condições de higiene e esterilização do campo de atuação médica, não há falar em responsabilidade objetiva do Estado, máxime quando demonstrado o rompimento do nexo causal por culpa 558 exclusiva da vítima. ou seja. sua condição física anterior e sua predisposição a fatores nocivos no pré e pós-operatório, como a sua condição de cardiopata, com doença pulmonar obstrutiva crônica. tabagismo e hábito etílico acentuado" (TJSP--3."C. Dir. Público-Ap. 100.854-5/4 -ReI. Rui Stoco - j. 27.03.2001- Voto: 2.419/01). Vide os comentários de doutrina na Nota Introdutória de Doutrina do Item 7.00, "b" e a jurisprudência a respeito do tema no Item 7.03, todos do Capítulo IX. · "O uso de bisturi elétrico antes da completa volatização do álcool iodado aplicado na assepsia pré-cirúrgica. produzindo combustão e queimaduras em paciente, configura resultado previsível que evidencia culpa do médico" (TAMG - 2." C. Crim. Ap. - Rel. Herculano Rodrigues - j. 12.03.1996 RT731/634). Danos materiais e morais decorrentes de cirurgia realizada com imprudência. Co-responsabilidade do médico que figurou como primeiro assistente, mas teve participação essencial no ato cirúrgico (TJSP 2. a C. Dir. Privado-Ap. - Rel. Uno Machado - j. 19.11.1996 -JTJ-LEX 196/132). "A obrigação do médico não acaba com a cirurgia mas ele continua juridicamente vinculado ao devido acompanhamento pós-operatória pena de incorrer em negligência" (TJRS - 5." C. - Ap. 595080011- Rel. Clarindo Favretto - j. 30.11.1995, Revista de Direito do Consumidor, edição especial, São Paulo, RT, abril-junho/98, p. 264). NOTA DE DOUTRINA: Outro aspecto que se mostra, no tema em estudo, é o relativo ao chamado erro profissional, isto é, o que resulte da incerteza ou da imperfeição da arte e não da negligência ou incapacidade de quem a exercita, salvo se se tratar de um erro grosseiro. Comentando a disposição do antigo art. 1.545 do Código Civil revogado [atual art. 951 do CC/2002], Carvalho Santos expressou-se no sentido de que "a imperícia no exercício de uma arte, oficio ou profissão constitui uma espécie particular de culpa, assim sendo considerado deste o Direito Romano: imperitia culpae adnumeratur (Gaio, L. 132, D, de r. i., L. 17)" (Código Civil brasileiro interpretado, v. 21, p. 247). Todavia, segundo a melhor doutrina, não se deve considerar como culpa o erro profissional. É que a imperfeição da ciência é uma realidade. Daí a escusa que tolera a falibilidade do profissional. Como ponderava Sourdat, hoje em dia ninguém contesta, em tese, a responsabilidade do médico pelos danos que, por ato culposo seu, resultam para o cliente. Assim, se age com culpa, se por uma imprudência ou negligência manifestas resulta em prejuízo para o seu cliente, tem este contra ele a ação para exigir perdas e danos (Traité de la responsabilité, v. 2, p. 276). Não é possível traçar regras fixas como limite dessa responsabilidade, embora existam princípios gerais a regê-la. O primeiro deles é o de que "não se considera erro profissional o que resulta da imprecisão, incerteza ou imperfeição da arte, sendo objeto de controvérsias e dúvidas". Segundo observação do autor francês por último citado, "é princípio assente que os Tribunais não têm o direito de examinar se o médico afastou-se das regras de sua profissão, abordando a questão de ordem científica, de apreciação e de prática médica, não lhes sendo lícito, tampouco, decidir coisa alguma sobre a oportunidade de uma intervenção cirúrgica, sobre o método preferível a empregar, ou sobre o melhor tratamento a seguir. As questões puramente técnicas escapam à sua competência" (ob. cit., p. 259). O erro de técnica, acentuava Aguiar Dias, "é apreciado com prudente reserva pelos Tribunais. Com efeito, o julgador não deve nem pode entrar em apreciações de ordem técnica quanto aos métodos científicos que, por sua natureza, sejam passíveis de dúvidas e discussões" (Responsabilidade dos médicos. Coad, São Paulo, p. 10). Impõe-se observar que o "erro de técnica", que não se confunde com o "erro médico", é visto com prudência e especial cuidado pelo Poder Judiciário, como já enfatizava Aguiar Dias e os demais juristas de escol no mundo inteiro. Não cabe ao juiz dizer se aquela técnica é boa ou má; se adequada, ou que existe outra melhor. Yussef Cahali enfatiza que "ao juiz é defeso, por não ser de sua competência, pronunciar-se por essa ou aquela escola, optar por esse ou aquele método 32 operatório" (Responsabilidade civil. Coord. Yussef Said Cahali. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 348) Todo aquele que exerce publicamente uma arte, profissão ou ofício presume-se habilitado para o exercício do seu munus. Aliás, algumas atividades dependem de habilitação especial e, ainda, de autorização especial, como ocorre, ad exemplum. com os advogados (devem ter inscrição na OAB); farmacêuticos (Conselho Regional de Farmácia) e médicos, que só podem exercer a profissão após obter registro no Conselho Regional de Medicina. Além disso, nos casos controvertidos ou duvidosos, o erro profissional não pode ser considerado imperícia, imprudência ou negligência. Mostra-se de vital importância anotar e esclarecer que a doutrina faz distinção entre "eITO profissional" e "imperícia", como sinalizado acima. Ocorre o "erro profissional" quando a conduta médica é correta, mas a técnica empregada é incorreta. Significa que o médico aplica corretamente uma técnica ruim ou de resultado duvidoso, embora aceita e preconizada. Há "imperícia" quando a técnica é correta, mas a conduta médica é incorreta, ou seja, o médico aplica mal uma técnica boa. A primeira hipótese ("erro profissional") contém o chamado erro escusável e, portanto, justificável, quando se cuida de técnica conhecida, usual e aceita. A segunda hipótese ("imperícia") contém o erro inescusável, que não se justifica, nem se admite e, portanto, erro punível no plano civil, e que impõe o dever de reparar. Desse modo, se o profissional se mostrar imperito, por inadmissível desconhecimento da arte médica e do próprio mister a que se dedica, raiando esse procedimento ao erro grosseiro - aquele que se diz perfeitamente inescusável-, tal procedimento traduz e se transfunde em proceder culposo e que obriga a que se indenize a vítima. 18.25 - Erro médico e dano moral NOTA DE DOUTRINA: O profissional médico responde, como ficou assentado nos itens precedentes, pelos atos intencionais ou culposos que pratica quando no exercício de sua atividade. Tanto o Código Civil quanto o Código de Defesa do Consumidor deixaram assentada a responsabilidade subjetiva do médico. Mas-dúvida não resta de que tanto esse profissional como qualquer outro, em razão da mesma ofensa ou gravame, podem causar danos a outrem. Esse dano tanto poderá ter expressão patrimonial como extrapatrimonial, ou seja, poderá ser de ordem material como imaterial ou moral, na consideração de que o dano é um só. A Constituição Federal, ao consagrar a proteção da personalidade e da imagem da pessoa, esta como atributo daquela, assegurando o direito à reparação, não fez qualquer distinção, de modo que nem a lei inferior nem o intérprete poderá fazê-lo. . Significa que o médico, quando atua com culpa (em sentido estrito), ou seja, quando comete erro médico inescusável, tanto poderá causar dano de ordem material, lesionando a pessoa sob o aspecto físico ou impondo-lhe perdas materiais (lucro cessante e dano emergente), como poderá atingi-Ia moralmente, seja causando, no próprio ofendido, dor, sofrimento, ofensa à imagem (afeamento, alteração na sua expressão ou aparência), angústia, solidão, depressão, ansiedade e tantos outros sofri mentos anímicos; seja atingindo, ainda, em caso de falecimento da vítima, os sentimentos e outras manifestações internas daqueles que lhe foram próximos. Impõe-se nesses casos o dever de compensara ofensa moral com um valor mais ou menos aleatório, pago de uma só vez, sem prejuízo da reparação por dano material. Por essa razão não se pode esquecer que o dano estético subsume-se no dano moral, sem qualquer ofensa ao art. 949 do Código Civil (STJ, 4ª T., REsp56.101-9, j. 25.04.1995), como deixamos assentado no Item 3.04 do Capítulo XIII quando abordamos, com maior profundidade, a questão relativa à cumulação da indenização por dano moral e por dano estético. Aliás, no caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas de tratamento e lucros cessantes, sem prejuízo de qualquer outro prejuízo que o ofendido possa provar, ou seja, prejuízo de ordem material ou moral. É a exegese mais razoável e consentânea com os princípios constitucionais que se faz do art. 949 do Código Civil. Pode-se afirmar, em reiteração ao que ficou acima exposto, que a lesão.estética- porque se subsume no conceito de dano moral, na medida em que altera a imagem e o próprio vultus da pessoa; causa-lhe sofrimento, angústia, temor, indecisão, vergonha e outros sentimentos - sempre empenha responsabilidade por dano moral, não obstante o art. 950 do atual Código Civil, na esteira do art. 1.539 do revogado Código Civil de 1916, tenha previsto indenização sob a forma de pensão mensal (de natureza material) apenas quando o defeito impeça o exercício de ofício ou profissão ou diminua o valor do trabalho, esquecendo-se da lesão estética causadora de ofensa moral. Como visto, poderá o dano estético, ainda, sujeitar o responsável à reparação por dano material, inclusive cumulada com aquela, quando ficar provado algum prejuízo - seja por lucro cessante, seja por dano emergente -quer dizer, 33 quando a própria lesão imponha despesas e gastos para tratamento e cura ou mesmo para corrigir esteticamente o defeito, além da pensão mensal estabelecida para a hipótese de a vítima não mais poder exercer plenamente sua profissão. · "O erro inescusável na falha de entubação e monitoramento, a ponto de não observar a tempo a mudança de estado da paciente; representam condutas culposas dos médicos, que provocaram dor moral à família" (TAPR-Ap.1l7324800-Rel. Lídio J. R. de Macedo j. 06.10.1998 - DJ 16.10.1998 - Informativo Incijur, Joinville-SC, 13, ago./2000, p. 10). · "A ocorrência de erro médico, mesmo quando comprovada, não gera reparação civil, a título de dano moral (pretium doloris) por não se tratar de ato relacionado com agravo que assegure direito de resposta. nem violação a intimidade à honra ou à imagem das pessoas. Se tanto, em situações especiais, poderia haver ressarcimento à guisa de danos estéticos, não sendo essa a hipótese dos autos" (TAMG - Ap. 02592211-8/00 - Rel. Lauro Bracarense - j. 06.08.1998 - Informativo Incijur, Joinville-SC, 13, ago./2~0, p. 10). . Indenização. Responsabilidade civil. Médico. Dano moral. Negligência.. Paciente de pós-operatório. Queixas mal investigadas. Crise conseqüente que resultou em cirurgia de urgência com outro profissional. Omissão quanto às informações requisitadas ou atendimento médico alternativo, em sua ausência. Negligência caracterizada. Verba devida. Ação procedente. Recurso provido (TJSP – 6ª C. Dir. Privado - Ap. 78.097-4,.... Rel. Munhoz Soares j. 01.07.1999-JTJ-LEX 224/81). · "Conforme dispõe o art. 37, § 6.°, da CF, a responsabilidade civil do Estado é de natureza objetiva. Assim, demonstrado o nexo causal entre a lesão, erro médico ocorrido em uma operação de apendicite em hospital público; que deixou a vítima menor tetraplégica, surda e muda, eo ato do agente público, a União Federal responde pela pensão mensal à vitima e deve reparar, ainda, o dano moral na forma prevista no art. 1.538 do CC [atual art. 949]" (TRF – 2ª Região- 2ªT. -Ap. 97.02.17297-7 - Rel. Paulo Espírito Santo- j. 08.09.1999-RT 775/402). 18.26 - Insucesso em cirurgia de vasectomia · Indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Cirurgia de vasectomia. Insucesso verificado, inclusive diante de gravidez superveniente. Conhecimento do autor de tal possibilidade. Conduta culposa dos réus não demonstrada. Pedido improcedente. Recurso improvido (TJSP _1.8 C. Dir. Privado - Ap. 94.019-4- Rel. Gildo dos Santos - j. 09.05.2000). . Indenização. Fazenda Pública. Responsabilidade civil. Hospital do Estado. Erro médico. Cirurgia de vasectomia. Insucesso verificado inclusive diante de gravidez superveniente. Conhecimento do autor de tal possibilidade. Falha ou deficiência na prestação do serviço médico-hospitalar não demonstrada. Ação improcedente. Recurso não provido (TJSP - 2.a C. Dir. Público-Ap. 86.966-5-Rel. Corrêa Vianna-j. 24.10.2000). 18.27 -Iatrogenia e responsabilidade civil I - A expressão "iatrogenía" e seu significado Questão que ainda suscita controvérsias e impõe dificuldade para o seu completo entendimento no plano da responsabilidade civil do médico é a ocorrência de um dano ao paciente, decorrente da atividade médica, que se convencionou chamar de "iatrogenia". A expressão "iatrogenia" (iatro + geno + ia) é definida como a alteração patológica provocada no paciente por tratamento de qualquer tipo. Qementino Fraga Filho lembrou que "um dos capítulos mais importantes da ciência médica atual é a iatrogenia, que cuida dos males provocados pela ação do médico, ou pelo tratamento por este prescrito" (apud Carlos Drummond de Andrade, Jornal do Brasil, 02.08.1980). Segundo Adolpho Hoirisch os vocábulos "iatropatia", "iatrogenose", iatropatogenia", "psiquiatrogenose" e "iatrogenia" caracterizam um estado ou "prejuízo provocado por atomico em pessoas sadias ou doentes" (Implicações psiquiátricas das iatrogenias, Memória apresentada à Academia Nacional de Medicina, 1988, p. 21). Etimologicamente a expressão deriva de: Iatro = médico, medicina, ou Iatron = local onde os médicos antigos guardavam seus instrumentos, davam consultas, faziam curativos e operações; significando, ainda, as manifestações decorrentes do emprego de medicamentos em geral, atos cirúrgicos ou quaisquer processos de tratamento feitos pelo médico ou por seus auxiliares (cf. Carlos Maldonado de Carvalho, "Iatrogenia e responsabilidade civil médica", Infonnativo Incijur, publicação do Instituto de Ciências Júridicas, Jóinville, Santa Catarina, Ano 2, agoJ2000, n. 13, p. 3); e Genos, Gen ou Gênico: gerar, geração (dano causado pelo médico). 34 No Congresso Brasileiro de Responsabilidade Civil Médica, Hospitalar, Laboratorial, Planos e Seguros de Saúde, realiZado pelo Instituto de Ciências Jurídicas em Florianópolis, no Hotel Cambirela, nos dias 4 e 5 de agosto de 2000, o médico cirurgião plástico Paulo Jatene observou tratar-se de "expressão usada para indicar que é causado pelo médico"-e que "todos os médicos e demais profissionais da área da saúde, em maior ou menor grau, são 'iatrogênicos' ,pois vários dos procedimentos realizados implicam em lesão posterior..." (Iatrogenia em cirurgia plástica. Informativo Incijur, publicação do Instituto de Ciências Jurídicas, Joinville, Santa Catarina, Ano 2, ago./2000, n. 13, p. 3). Lembram os profissionais da área médica que a expressão é considerada como "as manifestações inerentes aos vários procedimentos diagn6sticoterapêuticos adotados na área médica e de enfermagem, principalmente aqueles de caráter invasivo, cujos efeitos danosos podem ser presumíveis, inesperados, controláveis ou não" (Kátia Conceição Guimarães Veiga. Iatrogeniade enfermagem em unidade de emergência. Dissertação de mestrado. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 1993). Mas Élida Sã entende que a iatrogenia "não se confunde com o erro médico, com a simulação ou com a má-fé, que geram inegavelmente, responsabilidade civil, penal e administrativa" (Élida Sã. Inter-relações do direito e das ciências biomédicas. Rio de Janeiro: Dujur-DP, 1998, p. 3). Esse entendimento foi endossado pelo ilustre e culto professor e magistrado no Rio de Janeiro José Carlos Maldonado de Carvalho em exposição feita no Congresso de Responsabilidade Médica, realizado em Florian6polis, em agosto/2000, quando, não obstante, tenha esclarecido que o vocábulo iatrogenia "caracteriza um estado ou prejuízo provocado por ato médico em pessoas sadias ou doentes, cujos transtornos são imprevisíveis e inesperados", afirmou, in verbis, quanto segue: "Iatrogenia e responsabilidade civil, dentro de um universo jurídico eminentemente conflitual, são termos inconciliáveis e excludentes. Inconciliáveis porque a iatrogenia, ou 'erro escusável' - faute du service -, uma vez caracterizada, não gera a responsabilidade em qualquer uma de suas vertentes: civil, penal e administrativa. Aproximase de uma simples imperfeição de conhecimentos científicos, escudada na chamada falibilidade médica. Já a responsabilidade civil, decorrente da violação consciente de um dever ou de uma falta objetiva do dever de cuidado, impõe ao médico, além das sanções penais e administrativas, a obrigação de reparar o dano. A medicina moderna ao conceituar a iatrogenia como todo dano causado ao paciente pela ação médica ou os males provocados pelo tratamento prescrito estanca de forma direta o ingresso no campo da responsabilidade civil, já que os profissionais médicos, que cuidam da saúde alheia, assumem uma obrigação de meio com a finalidade de aplicara arte, perícia e zelo que detêm e que seus pacientes presumem, cuja aferição de eventual desvio não vai além da relação terapêutica" (José Carlos Maldonado de Carvalho. Iatrogenia e responsabilidade civil médica. Informativo Incijur, publicação do Instituto de Ciências Jurídicas, Joinville, Santa Catarina, Ano 2, agosto/2000, n.o 13, p. 3). Com todo o respeito e não obstante a excelência dos trabalhos e dos argumentos expostos, não há como aderir e concordar com esse entendimento, ao qual fazemos restrição, como se verá adiante. 11 - A "iatrogenia" como fato natural A expressão "iatrogenia" busca expressar um dano causado ao paciente pelo médico em razão de ação ou omissão no exercício da sua atividade ou especialização. Tal denominação apenas indica um fato, mas não contém, desde logo, qualquer qualificação nem está afetado de qualquer contingente interno. Não traduz um fazer não permitido, ou um não fazer quando devia (quod debeatur), nem contém uma referência de licitude, de ilicitude ou quinhão ou cota interna de aprovação ou reprovação. Não está, ainda, informado por um juízo de aprovação ou de reprovabilidade. Traduz apenas um acontecimento ou resultado danoso decorrente da atuação médica. Do que se conclui que iatrogenia é fato (lato sensu), enquanto acontecimento no mundo físico. Ou, segundo Washington de Barros Monteiro, "em sentido restrito fato jurídico é acontecimento natural, independente da vontade interna" (Curso de direito civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1.0 v., p. 173). Como fato em sentido lato pode ser qualificado e classificado juridicamente como fato (acontecimento) e ato (manifestação de vontade), pois aque1e"é gênero de que este é espécie. Com a qualificação de ato jurídico, agora com conteúdo de juízo de valor, será sempre lícito e permitido, pois o ato jurídico em sentido estrito "é o que gera conseqüências jurídicas previstas em lei e não pelas partes interessadas" (Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, 1.0 v., p. 271). Mas como ato não permitido, posto que ofenda o ordenamento jurídico, será ilícito, seja na esfera criminal, no âmbito civil ou administrativo (ético). Com efeito, das ações que interessam ao direito, 35 umas são conformes, outras desconformes ao respectivo ordenamento, surgindo, daí, os "atos jurídicos", de um lado, e os "atos ilícitos", de outro, estes produtores apenas de obrigações para os agentes. Portanto, em sendo ocorrência ou conseqüência originada de um comportamento espontâneo e, portanto, livre de ameaça ou coação, deve ser analisado a parte subjectiva para verificar se houve, ou não, conduta culposa do responsável pelo ato iatrogênico (ação ou omissão), de modo a convertêlo de fato ou acontecimento em ato ilícito e não permitido. Os médicos, ao estudar as conseqüências de determinados procedimentos aplicados aos pacientes (cirurgias, tratamentos não invasivos, ministração de medicamentos, procedimentos de enfermagem em unidade de emergência, permanência em UTI etc.), falam em "ocorrência das iatrogenias decorrentes desses procedimentos", querendo mostrar que "iatrogenias" são conseqüências danosas resultantes da atuação médica normal ou anormal. Portanto, impõe-se insistir: quando se fala em "rotura iatrogênica da membrana", "secção iatrogênica do nervo" significa apenas que tal ocorrência foi causada pela atuação do médico. 11I- As várias espécies de "iatrogenia" O cirurgião Paulo Jatene, acima citado, lembrou existir três tipos de iatrogenia: "I) lesões previsíveis, sabendo-se que o procedimento implica em seqüela (Ex.: cirurgias mutiladoras, como amputações de membros (visíveis), gastrectomias, colecistectomias, apendicectomias (não visíveis); 2) lesões previsíveis, porém inesperadas, podendo o procedimento acarretar lesões inerentes à técnica (Ex.: reação alérgica decorrente do uso de contrastes radiológicos); 3) lesões decorrentes de falha do comportamento humano no exercício da profissão, caso em que as falhas são passíveis de suscitar o problema da responsabilidade legal do médico (Ex.: confusão da veia safena com a artéria femural durante cirurgia de varizes, levando à gangrena)" (Paulo Jatene, art. cit., p. 8). IV - "Iatrogenias" legitimadas pelo exercício regular de direito Há, portanto, procedimentos em que a lesão, além de ser prevista, sabida, esperada e até mesmo planejada, constitui O único meio para ministrar o tratamento e buscada cura, não sendo possível a retirada de um tumor das amígdalas ou apêndice inflamados sem um corte no tecido que recobre os órgãos. Embora o corte seja uma lesão, essa lesão é permitida e lícita. Essa iatrogenia caracteriza ato lícito e permitido, pois a lesão é o meio através do qual se busca o tratamento ou a intervenção que objetiva a cura ou o resultado favorável. Sem ela o procedimento, ao menos no atual estágio da medicina, mostra-se impossível. A amputação de uma pema com gangrena causa uma lesão corporal gravíssima, com perda de membro, mas, permitida e necessária, de modo que o objetivo da intervenção cirúrgica é justamente a retirada do órgão ou membro, causando lesão permanente. É como se fora uma relação de "custo-benefício": ou perde o membro e preserva a vida, ou mantém o membro e perde a vida. Também alguns sintomas que causam dor, incômodo e sofrimento são previsíveis e aceitos, como os resultantes das aplicações de quimioterapia, radioterapia ou imunoterapia. Segundo nos parece, é como exercício regular de direito que deve ser encaminhada essa questão da doutrina moderna, retratada nos exemplos acima, ou seja, da intervenção médica ou cirúrgica como ocorre, aliás, nas práticas esportivas violentas. O exercício normal da atividade médica ou cirúrgica justifica-se formalmente porque consiste no exercício regular de uma faculdade legítima e materialmente porque constitui meio justo para um justo fim ou meio adequado para um fim reconhecido pela ordem estatal. O inesquecível mestre Aníbal Bruno ensinava que: "O fundamento da discriminação não é o consentimento do paciente. Mas a ausência de consentimento toma a intervenção ilegítima, porque, então, não haveria exercício regular de uma faculdade, mas constrangimento ilícito, que tiraria desse exercício a sua legitimidade, salvo quando a vontade do paciente não se pode manifestar ou quando ocorrem os extremos do estado de necessidade". E concluiu: "O problema não é do domínio da culpabilidade, mas da antijuridicidade. O fato não é somente não punível, por não culpável; não chega a ser ilícito" (Direito penal- Parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. I, t. 2, p. 13-15). E José Frederico Marques advertia: "Quem está autorizado a praticar um ato, porquanto a ordem jurídica o considera o exercício de um direito, está agindo licitamente: feci sed imo feci. É evidente, por isso, que tal ato não pode ser considerado antijurídico, nem tão pouco delituoso" (Tratado de Direito Penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, p. 134). Há, também, algumas iatrogenias, ou lesões sofridas previsíveis, decorrentes de fatores individuais e próprios dos pacientes; da sua maior 36 sensibilidade e reação a determinados procedimentos ou medicamentos, das idiossincrasias do seu organismo ou do seu psiquismo e da maior demora na recuperação, que, embora previsíveis, não têm qualquer relação de causa e efeito com a atuação do médico, da técnica empregada ou do atual estado da ciência. Também nessas hipóteses não há ato ilícito e punível, caso o paciente tenha sido prévia e adequadamente alertado de possíveis conseqüências ou iatrogenias, considerando que, in casu, o profissional não contribuiu para o resultado danoso, sendo certo que tais manifestações eram previstas e foram devidamente esclareci das antes do procedimento e aceitas pelo paciente. Não é escusado advertir sobre alguns comportamentos que contribuem decisivamente para a eclosão iatrogênica, como quando o paciente, portador de qualquer doença, como diabetes, insuficiência renal, cardiopatia grave, propenso a vômitos constantes, alérgico ou sensível a algum medicamento, esconde ou omite do médico essas informações e essas predisposições, em virtude das quais exsurge então intercorrência ou incidente durante a intervenção médica com resultado danoso. Ressuma evidente que em casos tais o fator de agravamento ou de insucesso decorre tão-só da omissão do paciente, não se podendo carrear ao profissional a culpa pelo resultado. Impõe-se, ainda, admitir a existência de iatrogenias também previsíveis, mas nem sempre esperadas, e que resultam da técnica empregada, ou seja, do atual estado da ciência como o exemplo dado por Paulo Jatene, de reação alérgica grave em razão do anestésico empregado. Nessa hipótese impõe-se relembrar alguns conceitos e fundamentos, sendo pertinente esclarecer, desde logo, que o "erro de técnica", que não se confunde com o "erro médico", é visto com prudência e especial cuidado pelo Poder Judiciário e seus membros, no exercício da atividade de julgar. É que não cabe ao Juiz dizer se aquela técnica é boa ou má; se adequada, ou que existe outra melhor. O notável Yussef Said Cahali, lembrado em passagem deste Capítulo, já alertava que "ao Juiz é defeso, por não ser de sua competência, pronunciarse por essa ou aquela escola, optar por esse ou aquele método operatório" (Responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 348). Isto porque todo aquele que exerce publicamente uma arte, profissão ou ofício presume-se habilitado. E não poderia ser diferente, pois o médico - tal como outros profissionais liberais (advogado, dentista, psicólogo, engenheiro, arquiteto) -, ademais de ter de comprovar a conclusão de curso superior específico, estágio de residência e especialização para determinadas áreas, necessita autorização expressa do Poder Público para atuar e, ainda, de credenciamento especial por parte do órgão de classe, no caso, o Conselho Regional de Medicina. Esse credenciamento, que às vezes é precedido de exigência de prova de capacitação, significa habilitação para o exercício da profissão. Ademais disso, sob outro enfoque, nos casos controvertidos ou duvidosos, o erro profissional não pode ser considerado imperícia, imprudência ou negligência. Mostra-se imperativo fazer nítida distinção entre. "erro profissional" e "imperícia". Ocorre o "erro profissional" (erro de técnica) quando a conduta médica é correta, mas a técnica empregada é incorreta. Significa que o médico aplica corretamente uma técnica ruim para aquele caso. Há "imperícia" (erro médico) quando a técnica é correta e adequada, mas a conduta ou atuação do médico é incorreta ou desastrosa. Quer dizer que o médico aplica mal uma técnica boa. A primeira hipótese ("erro profissional" ou erro de técnica) contém o chamado "erro escusável", ou seja, justificável, quando se cuida de técnica conhecida, usual e aceita. A segunda hipótese ("imperícia" ou erro médico) contém o "erro inescusável", ou não justificável e, portanto, erro punível no plano civil e que impõe o dever de reparar. Diante desse escorço podemos fixar e estabelecer que o erro profissional não pode ser objeto de valoração pelo Juiz, nem pode ser considerado como hipótese de imperícia, imprudência ou negligência. E, como corolário desse escorço, pode-se afirmar que o resultado iatrogênico, decorrente da técnica empregada ou do estado da ciência, não pode ser considerado ilícito. V/II - "Iatrogenia" como resultado. de atuação culposa do profissional da áreél médica Caracterização do ato ilícito e punível Mas, como observado no início dessa análise expositiva, o notável autor citado afirmou peremptoriamente que "iatrogenia e responsabilidade civil, dentro de um universo jurídico eminentemente conflitual, são termos inconciliáveis e exc1udentes" e que a primeira aproxima- . se de .uma simples imperfeição de conhecimentos científicos, escudada- na chamada falibilidade médica (José Carlos Maldonado de Carvalho, art. cit, p. 4). Impõe-se discordar. Restou assentado neste estudo que a "iatrogenia" representa um dano causado ao paciente pelo médico, em razão da sua ação ou omissão no exercício da sua atividade ou especialização, e que iatrogenia é 37 um fato natural que poderá qualificar-se como ato jurídico; e, portanto, lícito, ou ato sem respaldo na lei, e, portanto, ilícito, como, aliás todos os demais atos, praticados no mundo fenomênico. Ora, se a iatrogenia, ou seja o dano consubstanciado em alteração patológica provocada no paciente por tratamento de qualquer tipo -, decorrer de vontade consciente e deliberada de causar o mal, o médico terá agido com dolo, ou seja, vontade dirigida a um fim, comportamento esse reprovado pelo ordenamento jurídico. Poderá ocorrer que a iatrogenia sejadecorrência de sua imprudência, por pressa, excesso de trabalho ou excesso de confiança. Não se descarta a existência de um resultado danoso ou iatrogênico derivado de um agir negligente, quando, por omissão, descaso, indolência ou má vontade, o profissional desempenha mal o seu mister e de forma comprometedora. Por fim, a imperícia, o erro inescusável configurador do erro médico por falta de domínio da técnica exigida, também poderá conduzir à iatrogenia. Em casos tais identifica-se a culpa stricto sensu do profissional e o seu ato será considerado ilícito e, portanto, punível. empenhando sua obrigação de indenizar. Do que se conclui que a iatrogenia como dano à pessoa - quando decorra de uma conduta culposa do agente, e, assim. se possa identificar um nexo etiológico entre essa conduta e o resultado iatrogênico transforma o fato danoso em ato ilícito, insere-se na teoria da culpa e passa a: ser regido pelas regras da responsabilidade civil. 18.28 - Implantação de prótese de silicone possibilidade de rejeição. Inocorrência, destarte, de cerceamento de defesa ou de nulidade pericial. Recurso não provido (TJSP- 1ª C. Dir. Privado-Ap. 113.023-4- Rel. Alfredo Migliore-j.13.02.2001-JTJLEX240/98). 18.29 - Transfusão de sangue em paciente cuja religião não a permite Indenizatória. Reparação de danos. Testemunha de Jeová. Recebimento de transfusão de sangue quando de sua internação. - "Convicções religiosas que não podem prevalecer perante o bem maior tutelado pela Constituição Federal que é a vida. Conduta dos médicos, por outro lado, que se pautou dentro da lei e ética profissional, posto que somente efetuaram as transfusões sangüíneas após esgotados todos os tratamentos alternativos. Inexistência, ademais, de recusa expressa a receber transfusão de sangue quando da internação da autora. Ressarcimento, por outro lado, de despesas efetuadas com exames médicos, entre outras, que não merece acolhida, posto não terem sido os valores despendidos pela apelante. Recurso improvido" (TJSP – 1ª C. Dir. Privado - Ap. 123.430-4/4-00 - Rel. Flávio Pinheiro - j. 07.05.2002 -JTJ-LEX256/125) 18.30 - Cicatriz hipertrófica equetoidiana resultante de intervenção cirúrgica ''A extensa cicatriz cirúrgica no tórax e abdome da vítima, com formação de quelóide, caracteriza o dano estético, principalmente levando-se em conta que a vítima é jovem e fica constrangida em usar as roupas ditadas pela moda, bem como trajes de banho" (TJMG 4ª C. - Ap. 326.867~1 - Rel. Jarbas Ladeira - j. 21.03..2001 RT795/369). . "Em ação indenizatória por danos moral e material em razão da utilização de pró teses de silicone defeituosas, o fabricante é parte legítima para integrar o pólo passivo da lide, ainda que se trate de empresa estrangeira, em face do disposto no art. 12 da Lei 8.078/90" (TJSP – 10ª C. - AI 221.548-4n-00 - Rel. Paulo Dimas Mascaretti - j. 05.02.2002 - RT799/232). Erro médico. Implantação de prótese glútea. Rejeição. Não sendo possível ao médico prevê-la, até porque o erro material implantado e que causou a rejeição no organismo foi adquirida de terceiro pela autora. Inexistência, no caso, de obrigação de indenizar. A rejeição constitui-se em motivo de força maior, excludente de responsabilidade. Inexistência, outrossim, de seqüelas relevantes. Ciência da autora, antes do ato cirúrgico, da 38