02B-Dia12-Conferencia Magna-Fala Valter Correira-FALA

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Desafios à Gestão Pública Contemporânea
Esta Jornada Internacional de Gestão Pública foi concebida
como um espaço de atualização com o estado da arte em
gestão pública e de compartilhamento de experiências e
inovações. Para os servidores públicos brasileiros, é uma
oportunidade de reflexão e avaliação da nossa trajetória,
comparada à dos demais países.
Embora exercendo funções na condução da política de
gestão pública, aqui no governo brasileiro, pretendo abordar
os desafios à gestão pública na perspectiva iberoamericana, falando na condição de presidente deste
importante organismo multilateral que é o CLAD - Centro
Latino-americano de Administração para o
Desenvolvimento.
Não há como abordar cada uma das experiências dos 19
países membros do CLAD, e nem seria apropriado fazê-lo,
mas com certeza há muito que divulgar e discutir sobre as
tendências, avanços e limitações que se podem inferir da
trajetória coletiva que temos percorrido. O
acompanhamento dessa trajetória é parte das atribuições
do CLAD na cooperação internacional em gestão pública e
vou me deter nesse assunto, aqui, hoje.
O CLAD é uma organização de referência no cenário
iberoamericano, atuando na disseminação de inovações,
fomento da pesquisa e do debate em questões de ponta na
área de gestão pública e promoção do intercâmbio e
cooperação técnica nessa área.
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A sua atuação se dá no âmbito de um conjunto diversificado
de países, que, todavia, compartilham uma herança cultural
e histórica e se defrontam com inúmeros desafios da gestão
pública no contexto contemporâneo.
Se entendemos como desejável que se caminhe em
direção a alguma convergência dessas políticas e a certos
objetivos comuns, é importante ressaltar que há
peculiaridades de natureza sócio-econômica e política entre
estes países e que talvez se situem em momentos
diferentes de trajetórias de consolidação das suas políticas
de gestão,.
Acreditamos que uma premissa básica em relação ao papel
e aos desafios da gestão pública no contexto dos países da
América Latina seja a o nosso propósito compartilhado de
construir um estado capaz de viabilizar o desenvolvimento,
não somente em termos econômicos, como também
sociais, políticos e ambientais.
Ao lado disso, cumpre registrar que o campo da gestão
pública se movimenta pelo intercâmbio de experiências e
inovações. Diferentemente do setor privado, nada temos a
esconder e não estamos competindo, mas lutando, cada um
no seu contexto nacional, pela excelência da administração
pública. Trata-se de prestar bons serviços aos cidadãos e
do apoio mútuo na solução de problemas, tomada de
decisões e implementação de projetos e inovações.
O CLAD produziu o documento “Gestão pública iberoamericana para o século XXI”, aprovado em 2010, que traz
um balanço da gestão pública no continente. Este
documento mostra que desde os anos 80 vivemos um
período de grande efervescência nessa área.
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De forma geral, o que se verificou foi a assimilação dos
temas, conceitos, modelos e instrumentos forjados em
várias experiências internacionais de transformações da
burocracia, com a incorporação de importantes ingredientes
locais.
Acompanhando esta trajetória, o CLAD tem se empenhado
na formulação de uma visão atualizada das questões de
gestão pública, em sintonia com a experiência mundial, mas
atenta às características próprias da realidade iberoamericana.
Este esforço levou também à produção de cinco cartas, que
resultaram do processo em construção coletiva, ainda em
curso, de uma doutrina de gestão pública para a realidade
ibero-americana.
Vale observar que não se pretende uma elaboração
puramente teórica ou conceitual, mas a produção de
conhecimento de cunho prescritivo, aplicado a problemas e
questões relevantes, prementes e devidamente
contextualizado em nossa realidade.
Constatamos, com satisfação, que já percorremos uma
trajetória significativa, com o acúmulo de experiências e de
conhecimento sobre o tema.
Gostaria de me estender um pouco na abordagem dessa
trajetória em nossos países, focalizando avanços e
problemas, tomando como referência este primeiro decênio
do século XXI.
Podemos identificar cinco áreas que ganharam importância
nas agendas de gestão pública dos países da América
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Latina, neste período:
A primeira refere-se à democratização da gestão pública
A ampliação da democracia é fenômeno notável em nossa
região, que decorre da superação do ciclo de regimes
autoritários, mas apresenta características inovadoras,
como a pressão da sociedade por maior controle sobre os
governos, em sintonia com o que acontece no resto do
mundo.
Importantes avanços resultam da aplicação dos
instrumentos de governo eletrônico e das leis de
transparência, que permitem o acesso do cidadão a
informações públicas em níveis antes impensáveis.
Além disso, o crescimento do associativismo, impulsionado
pelos movimentos sociais e as experiências
governamentais de planejamento local e de orçamento
participativo, são interessantes ensaios de novos modelos
de gestão participativa.
Cumpre mencionar ainda as demandas sociais, apoiadas
em organizações do Terceiro Setor que levantam os temas
de inclusão e equidade, etnia e outros, com repercussão
sobre a administração pública.
A “Carta Iberoamericana de Participação Cidadã na Gestão
Pública”, aprovada em 2009, aponta para a necessidade de
encarar a participação como direito, voltado para influir
sobre o processo de formulação e implementação das
políticas públicas e sobre a prestação de serviços ao
cidadão.
As experiências de criação de conselhos com
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representação setorial ou regional e de atuação de
associações de usuários de serviços públicos são
manifestações vitais desta nova era de democracia em
processo de consolidação.
As cartas de serviços, com base nas quais a administração
pública se compromete com padrões de desempenho e
metas, são também mecanismos em consolidação para
construir uma institucionalidade que abrigue e promova a
participação e a transparência.
Há certamente limites e dificuldades e podemos destacar a
necessidade de avançar na estruturação mais ampla e
ordenada das instâncias e mecanismos de participação.
Os desafios da abertura das informações em conteúdo
relevante e formatos acessíveis são também temas que
deverão merecer nossa atenção nos próximos anos.
A profissionalização da função pública é uma segunda
área de importância em nossas agendas
A profissionalização da função pública avançou com a
expansão dos concursos e processos de seleção públicos.
Ao mesmo tempo, os governos estão contratando pessoas
mais qualificadas em escolaridade e capacidade técnica.
A “Carta Iberoamericana da Função Pública”, de 2003,
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expressou um compromisso dos governos com a
profissionalização da administração pública, impulsionando
a construção de burocracias capacitadas, dotadas de
autonomia e competência profissional para atuar com a
independência necessária para refrear o patrimonialismo,
de forma compatível com a democracia e o respeito aos
mecanismos de decisão política dos governos.
Esta diretriz, inscrita em documento do CLAD, contribuiu
para o resgate do tema dos recursos humanos e da
profissionalização na agenda das reformas, num momento
em que haviam sido relegadas ao segundo plano, no
contexto das primeiras reações à crise fiscal dos estados.
Outro documento do CLAD, de 2006, o “Código
Iberoamericano de Bom Governo”, acrescentou a ênfase na
responsabilização, transparência e exigência de padrões de
conduta ética pelo alto escalão governamental. No período
recente, aumentou a preocupação da opinião pública com a
responsabilização dos dirigentes públicos e o clamor pelo
controle sobre a corrupção.
A profissionalização da função pública inclui a criação de
um ambiente meritocrático, no qual além do recrutamento é
igualmente importante a capacitação e a responsabilização
do servidor público pelo seu trabalho. Diversas inovações
têm se disseminado nessa direção, particularmente os
incentivos, individuais e coletivos, na forma de mecanismos
de avaliação e reconhecimento do desempenho, a
premiação de melhores práticas e o fortalecimento da
cultura do serviço público.
Sabemos que há uma rica diversidade de projetos e
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iniciativas em política de recursos humanos, mas ainda se
faz necessário aperfeiçoar estes mecanismos e ampliar a
sua abrangência, em especial para atingir também os
servidores da ponta, que atuam diretamente no atendimento
ao público e na implementação das políticas públicas. Eles
são muitas vezes um elo esquecido das reformas
administrativas.
Uma terceira área que ganhou grande importância em
nossas agendas de gestão diz respeito às novas
tecnologias de gestão
As tecnologias de informação e em especial a
disseminação das redes e o surgimento da internet como
espaço onipresente de interações sociais, abre enormes
potencialidades a serem exploradas para a transformação
da administração pública.
A “Carta Iberoamericana de Governo Eletrônico”, de 2007,
situa a incorporação destas novas tecnologias como
instrumento para empoderar o cidadão em seus
relacionamentos com a administração pública.
Estas tecnologias não devem ser encaradas como simples
ferramentas utilitárias, mas como vetores da mudança nas
relações com o cidadão, facilitando a sua participação na
gestão pública e contribuindo para que elas se
desenvolvam com maior eficiência, eficácia e transparência.
Dessa forma, as políticas de governo eletrônico são
também construtoras da cidadania e em perspectiva mais
ampla, do horizonte estratégico da sociedade da
informação e do conhecimento, inclusiva, centrada nas
pessoas e orientada para o desenvolvimento.
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Os avanços nesta área têm sido promissores. A aplicação
da tecnologia da informação está se revelando um
poderoso indutor da racionalização das atividades
administrativas. Isso tem ocorrido, sobretudo, nas áreas
orçamentária e financeira, melhorando a gestão das contas
públicas, que é requisito importante para produzir políticas
públicas com mais qualidade.
A informatização de processos é promissor caminho para a
revisão de estruturas, revertendo as características de
centralismo, hierarquização e formalismo processual que
têm sido um problema persistente das administrações
públicas de nossos países.
Os denominados serviços de governo eletrônico são a
frente com maiores realizações, abrindo novos canais e
formatos de relacionamento com o cidadão. Os centros de
atendimento integrado têm sido a mais amplamente
disseminada inovação nessa área, unificando serviços em
um mesmo espaço físico com informatização e agilização
de procedimentos. Os portais integrados de serviços na
internet são um equivalente virtual dos centros de
atendimento e também têm alcançado expressiva
disseminação na América Latina.
O governo eletrônico contempla ainda ferramentas e
sistemas para o monitoramento de programas e políticas,
possibilitando a aferição sistemática de metas e indicadores
e sua divulgação para a sociedade. Seus potenciais de
aplicação para a promoção da transparência parecem
ilimitados e são uma importante fronteira de inovações a
serem experimentadas.
Apesar dos avanços, o governo eletrônico ainda se depara
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com certas limitações: a administração pública é resistente
às implicações organizacionais da comunicação eletrônica,
que se presta aos formatos de rede, à exploração de
relações transversais e integração entre órgãos, setores e
áreas da administração pública. A fragmentação
administrativa acarreta a convivência entre vários sistemas
e bancos de dados, que representa uma pesada herança a
ser enfrentada com as políticas de interoperabilidade.
Além disso, os condicionamentos da estrutura social trazem
para a área do governo eletrônico o problema da exclusão
digital, que precisa ser enfrentado como política de
construção de cidadania.
A reorganização da gestão pública para a obtenção de
resultados, como quarta área, é um dos temas centrais da
administração pública contemporânea. Trata-se de buscar
resultados definidos na esfera política e, portanto,
revestidos de legitimidade e encarados como prioritários.
Este conceito é uma superação do gerencialismo porque
não se preocupa somente com o desempenho, mas com
resultados das políticas públicas e da ação de governo.
No caso da América Latina, como já mencionamos, estes
resultados devem contemplar o desenvolvimento
sustentável em suas múltiplas dimensões, respeitando as
características nacionais de cada país.
Os avanços na gestão voltada para melhoria da qualidade
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dos serviços prestados à população se verificaram na
expansão da utilização de metas e indicadores nos
programas e políticas públicas. Esse avanço melhora o
monitoramento e o controle das ações de governo. Além
disso, amplia a transparência e facilita a participação da
sociedade, através de seus representantes, em conselhos e
instâncias de controle social.
O desenvolvimento das políticas sociais abriu importantes
espaços de experimentação dos indicadores e do
monitoramento do desempenho associado a novas formas
de organização e controle. A aplicação de modelos de
contratualização é uma forma avançada de controle por
resultados na administração de serviços, seja por órgãos
governamentais, seja por entidades públicas não-estatais.
A contratualização facilita a descentralização e a
participação social na gestão de serviços e atividades de
interesse coletivo. Trata-se de uma frente de
experimentação de novos formatos de organização dos
serviços públicos, com mais autonomia e flexibilidade em
relação à burocracia tradicional.
As limitações das práticas de gestão por resultados se
devem à debilidade dos mecanismos de controle
institucional e social. De forma geral, os modelos de
contratualização dependem de capacidade técnica,
mobilização de setores sociais diretamente relacionados à
atividade e um arranjo institucional adequado.
Outra dificuldade reside em que o estabelecimento de
metas, indicadores e a consequente contratualização
devem se inserir em iniciativas mais abrangentes de
planejamento e coordenação da ação governamental.
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Mecanismos de governança, como quinta e última área de
importância em nossa agendas de gestão
A governança é um dos campos mais importantes nos quais
se constatam significativas transformações em curso na
administração pública. O funcionamento dos governos é
cada vez mais dependente de relações intra e
intergovernamentais e com a sociedade e o mercado.
Como conseqüência, as administrações públicas
atualmente tendem a ser menos centralizadas, com menor
hierarquização e abertas à interação com associações e
outros atores sociais que compõem a esfera pública, mas
não necessariamente integram o estado, de um ponto de
vista formal.
Avanços também aconteceram na disseminação da
perspectiva da intersetorialidade das políticas, alcançando
em especial as políticas sociais. Nas relações entre os
governos, constatam-se experiências de ampliação de
autonomias regionais e por outro lado, o desenvolvimento
dos processos de integração entre países.
Os resultados deste novo cenário de desconcentração,
descentralização e autonomias têm sido propícios para o
aprofundamento da democracia, em especial no âmbito dos
governos locais.
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Dessa forma, os estados contemporâneos exercem um
papel central no desenvolvimento e na produção de
políticas públicas para a correção das desigualdades, mas,
cada vez mais, precisam construir uma vasta rede de
relações que atravessam suas estruturas interna e
externamente. As políticas públicas dependem, para seu
sucesso, de uma cuidadosa consolidação de arranjos para
sua gestão envolvendo múltiplos setores, órgãos, governos
e atores políticos.
As capacidades de governança são atualmente um valioso
ativo a ser consolidado e preservado para o enfrentamento
dos problemas e implementação de políticas que
frequentemente exigem lidar com a coordenação,
articulação, intersetorialidade, contratualização e parcerias,
para sua implementação.
Agenda emergente
Para finalizar, vou me deter agora sobre a agenda de
questões de gestão pública que, creio, representam
desafios atuais a serem enfrentados pelos países da
América Latina, dentro da orientação de alcançar o
desenvolvimento inclusivo e sustentável.
Em primeiro lugar, é importante prosseguir no esforço pelo
fortalecimento do estado e da esfera pública como
promotores da cidadania e da equidade social.
As transformações de caráter estrutural devem continuar
nas agendas governamentais, especialmente as reformas
dos sistemas de previdência social e da função pública.
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A boa gestão das contas públicas é pré-requisito para a
gestão pública de qualidade nas políticas finalísticas
prioritárias: educação, saúde, segurança pública, combate à
pobreza e à desigualdade social.
Há um conjunto de temas emergentes que estão ganhando
atenção e cada vez mais passam a integrar a agenda dos
governos. Dentre estes temas podemos destacar:
- as questões ambientais;
- as desigualdades de gênero e o respeito à diversidade
étnica e cultural;
- o cuidado com o envelhecimento populacional e
consequente crescimento da população da chamada
terceira idade;
-os problemas de segurança relacionados ao tráfico de
drogas;
- a qualidade de vida nos grandes centros urbanos; e
- a prevenção contra catástrofes naturais e acidentes de
infraestrutura.
A recente crise econômica e seu rebatimento como crise
fiscal dos estados se soma a estes temas e adquire uma
importância primordial, devido à amplitude de inter-relações
e impactos que está desencadeando.
Vivemos um momento de turbulências e incertezas.
Precisamos construir capacidade técnica e articular apoio
político e legitimidade, perante a sociedade, para que as
respostas à crise sejam progressivas, ou seja, voltadas para
aproveitar os programas e iniciativas de eficiência de
gestão dos recursos públicos, como oportunidades de
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inovação da gestão pública. Este é um desafio que se
coloca para os países do CLAD e do mundo.
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