JOÃO PAULO LORENZON ESCREVE E ENCENA MONÓLOGO DE VERDADE, INSPIRADO NO LIVRO DE SÁNDOR MARAI Com direção de Antonio Januzelli, peça estreia dia 11 de setembro e inaugura espaço teatral na Livraria da Vila do Shopping Cidade Jardim; esta é a primeira adaptação para o teatro da obra do escritor húngaro no Brasil. De verdade é um espetáculo que busca tocar na solidão como resultado das tragédias humanas, consequente da falta de coragem para uma real entrega. A encenação traz o personagem preso em um aquário de vidro vazio refletindo sobre seus fracassos amorosos. Ao revisitar o passado, antigos amores, a falta de coragem, a importância dada ao supérfluo e as lições da vida que demoramos a aprender compõem o painel que mostra a dificuldade de se encarar a solidão. O tema tem marcado a carreira de João Pauilo Lorenzon, ao ponto de, nesse terceiro solo, afirmar que está concluindo o que chama de Trilogia da solidão. Antes de Marai, em 2008, ele encenou Memória do mundo, de sua autoria, baseada no universo de Jorge Luis Borges, com direção de Élcio Nogueira Seixas, e, no ano passado, teve direção de Joaquim Goulart em O funâmbulo, de Jean Genet. No Memória..., a encenação reforçava o prazer da solidão como estado criativo e como espaço para a memória e divagação. O personagem aparecia entre espelhos em um mundo imaginário. No Funâmbulo, a solidão, aliada do artista livre, que vive sobre um fio de aço, é ponto de partida para a superação. Agora, em De verdade, são três personagens diferentes, todos homens, relacionando-se com um aspecto da solidão. A Livraria da Vila convidou Lorenzon para estrear a primeira temporada teatral no seu espaço de 100 lugares no Shopping Cidade Jardim após conhecer os dois trabalhos anteriores dele e por se tratar de uma adaptação de um livro importante, à venda no local. João Paulo Lorenzon aprecia Sándor Marái desde quando leu As brasas, mas foi logo depois de ler O legado de Esther, que se interessou por trabalhar num texto do autor para teatro. A inspiração aconteceu ao debruçar-se sobre De verdade e ver no tema a possibilidade de completar a trilogia sobre a solidão. João Paulo Lorenzon negociou pessoalmente os direitos do livro com a editora Italiana Delphin e assina a adaptação do romance homônimo de 445 páginas para um roteiro teatral de 10 páginas. Nesse trabalho, contou com a supervisão do filósofo Alan Victor Meyer e do psicanalista José Canelas. O texto teve seu acabamento durante os ensaios com o diretor Januzelli. Sobre o ator João Paulo Lorenzon foi integrante do Núcleo Experimental de Teatro do Sesi, coordenado por Isabel Setti, de 2004 a 2007. Formado pelo Teatro Célia Helena em 2001. Professor do curso de teatro do Colégio Cidade de São Paul. Formou-se em Direito na PUC-SP, em 2003. Como ator, esteve nos seguintes espetáculos: Memória do mundo, direção Élcio Nogueira; O funâmbulo, direção Joaquim Goulart; Quem nunca, direção de Renata Melo, em 2006 e 2007; O quarto e O que eu entendi do que o Tom Zé disse, criação de Isabel Setti, em 2005; Balada para uma ovelha negra, texto e direção de Rony Guilherme, em 2003; Só mais um Instante, de Marta Góes, direção de Elias Andreato, em 2002 e Rei Lear, de William Shakespeare, com Raul Cortez, direção de Ron Daniels, em 2000 e 2001. Em cinema e vídeo o ator participou de Anotando a China, documentário sobre o poeta e psicanalista Fabio Hermann, direção de Laura Taffarel em 2007; Vida de solteiro, seriado para a MTV em 2005; Expresso para Anhanguaba, longa-metragem, com direção: de Tony de Sousa, em 2004; Mário de Andrade, documentário da série Mestres da Literatura, realizado pela TV Cultura, em 2002; De cara limpa, longa-metragem dirigido por Sérgio Daniel Lerrer. Em 2000, fez Cheque de Terceiro, média-metragem dirigido por Thiago Villas Boas. Ganhador de Gramado 2005 e festival de Berlim, “Aflorador”, curta-metragem dirigido por Mauro D`Addio da Silva, 2001 e “A Vida Íntima de Cícero e Clóvis!”, curta-metragem dirigido por Thiago Villas Boas, em 2000. (TRECHO A SER APRIMORADO PELA HELÔ) Sobre o escritor Sándor Márai, escritor húngaro, nascido em 1900, sempre teve enorme reconhecimento na Europa e na América Latina, onde foi comparado a grandes nomes da literatura, como Thomas Mann. Embora tenha três livros publicados aqui pela Cia. das Letras. Ele anda passa despercebido no Brasil. Márai suicidou-se aos 89 anos, em 1989. Sua obra já foi encenada na França e na Itália e em boa parte da Europa. No Brasil será sua primeira montagem teatral. Sobre o diretor Antônio Januzelli é pesquisador das Práticas do Ator, fez Mestrado e tem Doutorado em Teatro pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, respectivamente em 1984 e 1992. Professor da área prática de teatro no Curso de Graduação e Pós Graduação do Departamento de Artes Cênicas da ECA/USP (desde 1977) e de Interpretação e Improvisação na Escola de Arte Dramática da ECA/USP (l977 a 2002), ele ministra cursos de teatro no Brasil e Exterior. É Autor dos livros A aprendizagem do ator e Práticas do ator – Relato de mestres. Eis alguns se seus trabalhos: Coordenação do espetáculo Onishi não sabe dançar, montagem em homenagem a Kazuo Ohno. Apresentado no Studio Kazuo Ohno, Tókio/Japão. Fevereiro de 2009 Direção do espetáculo O porco, texto do dramaturgo catalão Quim Monzó. Indicação ao Prêmio Shell de melhor ator para Henrique Schafer. Eleito também Melhor Ator no Festival Internacional de Teatro de Santa Cruz de La Sierra/Bolívia, 2007. Direção do espetáculo Se eu fosse eu, dramaturgia a partir de texto de Clarice Lispector. Fragmentos do Espetáculo Um dia despertei, sentei na cama e sorri. Nada mais doía. E de súbito compreendi que não existe mulher de verdade. Nem na terra nem no céu. Não existe em lugar nenhum, aquela. Existem apenas pessoas, e em todas elas há um grão da verdadeira, e em nenhuma delas há o que do outro nós esperamos e desejamos. É necessária muita coragem para que alguém aceite o dom do amor. É necessária muita coragem para que alguém aceite ser amado sem resistência. Muita coragem, quase heróica. A maioria das pessoas não sabe dar nem receber amor, por covardia e vaidade receia o fracasso. Tem vergonha de se entregar e mais vergonha ainda de revelar ao outro seu segredo... O segredo humano, íntimo, de que nós precisamos de ternura, que não vivemos sem ela. Porque acho que essa é a verdade. Ao menos eu achei durante muito tempo. Hoje não afirmo mais nada com tanta convicção, porque estou cansado e fracassei. Onde eu fracassei? Estou lhe dizendo, nisso, exatamente nisso. Não fui suficientemente corajoso com a mulher que gostava de mim, não consegui aceitar seu carinho, eu me envergonhava, me incomodava, eu a desprezava um pouco, porque ela era diferente, tinha outros gostos e um ritmo de vida diferente, e também eu temia por mim, pela minha vaidade receava me entregar à chantagem digna e complicada com que ela demandava de mim o dom do amor. Eu ainda não sabia o que sei hoje... não sabia que não há do que nos envergonharmos no mundo. Apenas a covardia é vergonhosa, a covardia em razão da qual não somos capazes de dar e não temos a coragem para acolher os sentimentos. Não sei bem o que senti quando Judit se foi. Temos dificuldade de compreender o significado verdadeiro dos atos e relações humanas. Por exemplo, alguém morre e você não entende. Ele foi enterrado e você continua não sentindo nada. Perante o mundo você veste luto, olha para a frente em público com uma seriedade solene, mas depois, em casa, só, você boceja, coça o nariz, lê um livro, pensa mais em tudo e em todos do que no morto, por quem você veste luto. Você vive aparentemente em determinada condição, sombrio e enlutado, e por dentro você percebe surpreso que não sente nada, a não ser um alívio e uma satisfação culposa. E indiferença. Uma profunda indiferença. Isso dura algum tempo, dias, talvez meses. Você engana o mundo, vive numa manhosa indiferença. Depois um dia, muito mais tarde, passados anos, quando o nariz do morto já caiu, você caminha na rua e fica tonto, se apóia no muro, porque compreende. O quê? O sentimento que o liga ao morto. O significado da morte. O fato, a realidade, a inutilidade de escavar com as unhas na terra tudo o que restou dele, você nunca mais poderá ver seu sorriso, e toda a sabedoria e poder do mundo são impotentes para que ele, o morto, venha na sua direção na rua e sorria para você. Você pode ocupar todas as regiões da Terra com um exército, nada vai ajudar. Então você grita. Ou nem isso, apenas fica parado na rua, pálido, e sente um vazio, como se o sentido do mundo se extinguisse, como se você tivesse ficado só no mundo. Ficha Técnica : Escritor: Sándor Márai Direção: Antônio Januzelli Interpretação e adaptação: João Paulo Lorenzon Música Original: Marcelo Pellegrini Produção executiva: Fernanda Bianco Fotografia e direção de arte: Juliana P. Neummam Assessoria de Imprensa: Textos & Idéias/Heloisa Cintra Serviço: Teatro da Livraria da Vila Cidade Jardim : Avenida Magalhães de Castro, 12000 – Butantã. Telefone - (11) 3755-5811 Temporada de 11 de setembro a 05 de dezembro. Sab às 20h. e dom às 18hs. Ingressos R$ 40,00 e meia R$ 20,00. Vendas antecipadas em todas as Livrarias da Vila de São Paulo, a partir de agosto. Lotação: 100 lugares Duração: 60 minutos