5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE UMUARAMA-PR “É preferível antecipar a esperança da vida do que abreviar o caminho da morte” (Rel. Des. Gaspar Rubik Agravo de Instrumento 9872/TJSC) O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por seu agente ao final subscrito, em exercício junto à 5a Promotoria de Justiça de Umuarama, cujo endereço consta no rodapé desta peça, onde pode ser pessoalmente intimado, agindo na tutela de interesse indisponível de ROZILENI ALVES MORENO, brasileira, auxiliar administrativo, casada, nascida em 27 de abril de 1974, natural de ToledoPR, filha de Luciano Onofre Peres Moreno e Marilene Alves Moreno, residente em uma chácara ao lado do Parque Arco Íris, próximo ao final da rua H, Umuarama, Paraná, telefone: (044) 626 7908 ou 622 1870 comercial, nesta Comarca, vem à presença de Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 1º, inciso III, 5°, caput e incisos XXXV, 6°, caput, 196, caput, 197, caput, da Constituição Federal; 120, inciso II, da Constituição do Estado do Paraná; 1º, 27 e 32, inciso I, da Lei Federal nº 8.625/93; 1º e 67, § 1º, inciso I, da Lei Complementar nº 85/99; 1º, 2º, 5º, 12, inciso XVIII, 38, inciso IV, da Lei Estadual nº 13.331/01; 2°, 4°, 5°, 6º, inciso I, alínea ‘d’, 7°, 15, 43 da Lei Federal n° 8.080/90 e ainda 2º, parágrafo único, alínea ‘d’, da Lei Federal nº 8.212/91, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA E MULTA COMINATÓRIA em face do ESTADO DO PARANÁ, pessoa jurídica de direito público interno ora representado pelo senhor Procurador-Geral do Estado, doutor Sérgio Botto de Lacerda, com endereço na Rua Conselheiro Laurindo, n.º 561, CEP 80.060-100, Centro, Curitiba-PR, pelos motivos de fato e de direito que, a seguir, deduz; ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 1/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA I - LEGITIMIDADE PROCESSUAL ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO I.I Relevância pública dos serviços de saúde A Constituição Federal ampliou o campo de atuação do Ministério Público, atribuindo-lhe, no art. 127, a incumbência da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Em seu art. 129, elencou as funções institucionais do parquet, entre as quais: “Art. 129 São funções institucionais do Ministério Público: I – (...) II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; (...) III – promover o inquérito civil público e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; (...)” O art. 120 da Constituição do Estado do Paraná, por sua vez, reproduz o acima enunciado nos incisos II e III, acrescendo ao rol de atividades do MP o contido no inciso XI: “Art. 120 São funções institucionais do Ministério Público: (...) XI – receber petições, reclamações, representação ou queixas de qualquer pessoa por desrespeito aos direitos assegurados na Constituição Federal e nesta, promovendo as medidas necessárias à sua garantia; (...) No mesmo sentido, tem-se a incumbência conferida ao Parquet pelo art. 57, V, da Lei Complementar n.º 85/99 (Lei Orgânica do Ministério Público do Paraná): ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 2/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA “Além das funções previstas na Constituição Federal, na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, na Constituição Estadual e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público: (...) V – promover a defesa dos direitos constitucionais do cidadão para a garantia do efetivo respeito pelos Poderes Públicos e pelos prestadores de serviços de relevância pública...;” É importantíssimo recordar que a Carta da República faz apenas uma única alusão expressa a serviços de relevância pública, e o faz no art. 197 que trata justamente das ações e serviços públicos de saúde. A Carta Federal não deixa qualquer dúvida, também, a respeito da natureza jurídica da saúde, um direito social (art. 6°), definindo-a expressamente, ainda, como um serviço de relevância pública (art. 197), cujo traço distintivo em face de qualquer outro, sem tal qualificação, repousa basicamente na essencialidade do seu objeto. Em se tratando de saúde, tal objeto liga-se visceralmente à existência e sobrevivência humanas e é daí, precisamente, que exsurge para o Estado, o dever-poder de prestá-lo e garanti-lo, no interesse de cada um e da sociedade como um todo, que lhe atribui importância diferenciada. A análise semântica das palavras que compõem a expressão “relevância pública”, permite afirmar que relevância é a qualidade do que releva, ou seja, indica tudo “aquilo que se destaca em escala comparativa ou de valores; importância ou relevo”; e público, por sua vez, diz-se, entre outras coisas, do que é “relativo ou pertencente a um povo, a uma coletividade”. Logo, da simples combinação gramatical dos termos sob análise, pode-se concluir que relevância pública refere-se, grosso modo, a tudo o que uma determinada comunidade exalta como ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 3/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA sendo algo de extremo significado, com elevado grau de importância e estima para o conjunto de seus membros. Albergando tal raciocínio no contexto constitucional, percebe-se que a CF contém inúmeros princípios jurídicos (implícitos e explícitos) que, sob a perspectiva que aqui interessa, nada mais representam do que a juridicização dos valores considerados mais meritórios pela síntese da vontade nacional, expressa na própria Carta Federal, e que reclamam especial atenção e proteção do Estado, com o intuito de possibilitar a conquista dos objetivos traçados para a República Federativa do Brasil (art. 3°, CF). Muitos dos serviços que visam a dar concretude aos valores destacados pela ordem constitucional não são, entretanto, expressamente qualificados como de relevância pública, mas nem por isso deixam de caracterizar-se como essenciais e determinantes na formulação e execução das denominadas políticas públicas, além do que implicam, por conseguinte, no respectivo dever de zelo que ao Ministério Público foi atribuído pelo art. 129, II da CF. Antonio Augusto Mello de CAMARGO FERRAZ e Antonio Herman de Vasconcelos e BENJAMIN, no artigo intitulado “O conceito de relevância pública na Constituição Federal” (In: Série Direito e Saúde/OPAS/OMS. N. 1, Brasília: OPAS, 1992. P. 29-39) apresentam uma síntese interessante acerca do significado da expressão “relevância pública”, inserta na CF: “... pensamos que seja possível desde logo estabelecer que a expressão “relevância pública” nos arts. 129, II e 197 da Constituição Federal está a significar: a qualidade de “função pública”, como verdadeiro dever-poder, que regra a garantia da saúde pelo Estado; a natureza jurídica de direito público subjetivo da saúde, criando uma série de interesses na sua realização – públicos, difusos, coletivos e individuais homogêneos; o limite da indisponibilidade, tanto pelo prisma do Estado como do próprio indivíduo, do direito à saúde; a idéia de que, em sede do art. 197, o interesse ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 4/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA primário do Estado corresponde à garantia plena do direito à saúde e as suas ações e serviços, sempre secundários, só serão legítimas quando imbuídas de tal espírito; o traço de essencialidade que marca as ações e serviços de saúde.” Vê-se, então, que o fato das ações e serviços de saúde terem sido explicitamente qualificados como de relevância pública na CF, não deixa espaço para qualquer discussão acerca de sua essencialidade e, da mesma forma, impõe aos agentes do Estado que atuem diligentemente na prestação de tais atividades, a fim de que sejam aptas, em quantidade e qualidade, a realizar o direito subjetivo que lhe corresponde. O contexto apresentado permite evidenciar, portanto, que o Ministério Público é o responsável em promover as medidas necessárias para a restauração do respeito dos poderes públicos aos direitos constitucionalmente assegurados, de forma que clara é sua legitimidade postulatória nos casos em que o próprio poder público figura como patrocinador de lesão a interesse social e/ou individual indisponível, o que faz por meio do instrumento processual que se apresente como mais adequado para o caso, dada a redação aberta da norma inserta no art. 127 da Carta Federal. I.II O direito à saúde como interesse indisponível Além de configurar prestação de serviço de relevância pública, o que por si só já justificaria a atuação do Ministério Público, ainda é de se notar que a saúde é direito indisponível do cidadão. A saúde é elemento essencial ao gozo da vida e seria difícil vivê-la na doença. A Magna Carta em vigor, ampliando o campo de atuação do Ministério Público, atribuiu-lhe a incumbência da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 5/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA indisponíveis (art. 127, caput), ao mesmo tempo em que, dentre outras funções institucionais, confiou-lhe o zelo pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos nela assegurados, promovendo as medidas necessárias à sua garantia (art. 129, inciso II). No mesmo sentido é o art. 120, inciso II, da Constituição Estadual. Diante desse contexto constitucional, extrai-se que o parquet, de modo genérico, pode e deve promover todas as medidas necessárias – administrativas e/ou jurídicas - para a restauração do respeito dos poderes públicos aos direitos constitucionalmente assegurados aos cidadãos – mormente os direitos fundamentais – mesmo que no plano individual, desde que se trate de direito indisponível. A vida e a saúde são os direitos mais elementares do ser humano, pressupostos de existência dos demais direitos, adequando-se na categoria de direitos individuais indisponíveis, razão pela qual merece especial cuidado, sobretudo no caso sub judice – quando se trata de recusa de fornecimento de medicamento - que atinge diretamente a saúde do favorecido, até a sua vida, comprometendo-a sobremaneira. Com estas considerações, conclui-se que compete ao Ministério Público a defesa dos interesses individuais indisponíveis. A prestação de saúde ao cidadão é dever do Estado e constitui direito indisponível, sendo pressuposto indissociável ao direito máximo de todo o cidadão, a vida. Mesmo que se entender como interesse disponível, a prestação de meios à manutenção da saúde, incluindo-se aí o fornecimento de remédios, é um serviço público essencial (muito mais do que relevante) assegurado constitucionalmente, e por isto, deve ser tutelado pelo Ministério Público por imposição do artigo 129, inciso II, da Constituição Federal. ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 6/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA II - DA LEGITIMIDADE PASSIVA / DA RESPONSABILIDADE DO GESTOR ESTADUAL NO ÂMBITO DO SUS A Política Nacional de Medicamentos disciplina que a competência para o fornecimento de medicamentos os divide em básicos, excepcionais e especiais. Os primeiros cabem ao Município, que recebe por cada habitante o repasse do Ministério da Saúde para aquisição de uma lista mínima de 40 medicamentos básicos, afetos à atenção básica, porém cabe ao Município, com seus próprios recursos, ampliar a referida lista considerando sua habilitação no sistema e o perfil epidemiológico de seus munícipes. Os medicamentos excepcionais, da competência do Estado, são tidos como medicamentos de uso contínuo e ininterrupto, afetos às clínicas especializadas e evidentemente mais caros. Por fim, os medicamentos especiais, da competência da União, cujo exemplo clássico é a lista de medicamentos para imunodeficiência primária adquirida – AIDS. Os medicamentos excepcionais e especiais são adquiridos pelas instâncias competentes e remetidas aos Municípios e às Delegacias Regionais de Saúde, das Secretarias Estaduais de Saúde, após solicitação planejada e formalizada. Aqueles prescritos ao tratamento do diabetes são todos excepcionais e, conseqüentemente, hão de ser fornecidos pela Secretaria de Estado da Saúde. Especificamente, o fornecimento dos medicamentos relacionados ao diabetes faz parte do programa HIPERDIA do Ministério da Saúde, que se dirige à prevenção e tratamento da hipertensão arterial e ao diabetes. A respeito deste programa juntamos em anexo o Plano de ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 7/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA Reorganização da atenção à hipertensão arterial e ao diabetes mellitus, que constitui verdade protocolo de atuação na prevenção e tratamento destas patologias. É todo irrelevante o fato de os medicamentos reclamados pelo doente não constarem do rol de programa instituído pelo Ministério da Saúde, em especial a Portaria 1318/GM/2002. Se o Estado tem um elenco de medicamentos a fornecer, é porque reconhece seu dever assistencial, não lhe sendo lícito, como é curial, limitar a assistência apenas aos casos antes programados. Surgindo nova necessidade de salvar a espécie, claro está que o Estado tem o dever de atualizar seus programas assistenciais, para inclusão do novo atendimento que se mostre relevante e necessário. Não obstante entender o Ministério Público que o Sistema Único de Saúde é um sistema em construção, com pouco mais de 12 anos de vida, que ocupa posição de vanguarda na estrutura da administração pública e muito aparece nos meios de comunicação pelo que deixa de fazer e não pelo muito que faz e salva, é inexorável que há medidas que não podem esperar: há doentes que esperam medicamentos ainda não existentes (e lutam contra o tempo!) e há aqueles que esperam medicamentos não contemplados em Protocolos. Ademais, conforme disciplinado na Lei n.º 8.080/90, cabe à direção estadual do SUS, em caráter suplementar, formular, executar, acompanhar e avaliar a política de insumos e equipamentos para a saúde. Nesse sentido, a Política Nacional de Medicamentos, aprovada pela Portaria n.º 3.916, de 30 de outubro de 1998 (documento n.º 07), estabelece como responsabilidades da esfera estadual, dentre outras: “assegurar a adequada dispensação dos medicamentos promovendo o treinamentos dos recursos humanos e a aplicação das normas ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 8/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA pertinentes definir elenco de medicamentos que serão adquiridos diretamente pelo estado, inclusive os de dispensação em caráter excepcional, tendo por base critérios técnicos e administrativos referidos no capítulo 3, “ Diretrizes”, tópico 3.3, deste documento, e destinando orçamento adequado a sua aquisição.” Da mesma forma, a Portaria nº 1.318/GM, de 23 de julho de 2.002 prevê em seu art. 7º: “Art. 7º - Determinar que as Secretarias de Saúde dos Estados e do Distrito Federal adotem as providências necessárias ao cumprimento do disposto nesta Portaria, bem como para viabilizar, a contar da competência setembro/2002, o acesso aos pacientes, aos medicamentos cujos procedimentos foram incluídos no Grupo 36 – Medicamentos, da Tabela Descritiva do Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde – SIA/SUS pela presente Portaria.” Portanto, cabe ao Estado do Paraná arcar com o ônus de prestar o atendimento à população na assistência à saúde, fornecendo, pois, todos os medicamentos para tratamento do diabetes, por serem tidos como medicamentos excepcionais. Inegável se torna sua legitimidade passiva ad causam. III – ADEQUAÇÃO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA Poder-se-ia cogitar que a Ação Civil Pública não seria instrumento adequado à tutela de interesse individual indisponível, mas tão somente às questões de cunho coletivo. A ação civil pública não se destina exclusivamente à tutela ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 9/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA de interesses coletivos. A lei 8.625/93, Lei Orgânica do Ministério Público Nacional, preceitua em seu artigo 25, inciso IV, letra “a”que: IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei: a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos; Em comento ao art. 25 da Lei n.º 8.625, de 12.02.1993, que preconiza ser função do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública para proteção a interesses individuais indisponíveis, preleciona o preclaro prof. PEDRO ROBERTO DECOMAIN, in verbis: ... a legitimação do Ministério Público para defesa judicial de interesses individuais indisponíveis, isto é, interesse de cuja satisfação o titular respectivo não está legalmente autorizado a abrir mão, assim como não o está qualquer representante legal seu, resulta até mesmo de dispositivo constitucional. Realmente o artigo 127 da Constituição Federal, ao tempo em que considera o Ministério Público como instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, lhe atribui também a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.1 Afora a subsunção legal, a tese defendida neste capítulo ainda é recepcionada pelo Superior Tribunal de Justiça, órgão constitucionalmente incumbido da pacificação da interpretação infraconstitucional do direito brasileiro, conforme o seguinte arresto, cujo caso concreto tratava exatamente do fornecimento de medicamento a hipossuficiente: PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL 1 DECOMAIN, Pedro Roberto. Comentários à lei orgânica nacional do ministério público. Ed. Obra Jurídica. 1996, p. 150. ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 10/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA PÚBLICA. CASSAÇÃO DE LIMINAR. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ILEGITIMIDADE ATIVA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO, PELO ESTADO, À CRIANÇA HIPOSSUFICIENTE, PORTADORA DE DOENÇA GRAVE. OBRIGATORIEDADE. AFASTAMENTO DAS DELIMITAÇÕES. PROTEÇÃO A DIREITOS FUNDAMENTAIS. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. DEVER CONSTITUCIONAL. ART. 7º, C/C OS ARTS. 98, I, E 101, V, DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ARTS. 5º, CAPUT, 6º, 196 E 227, DA CF/1988. PRECEDENTES DESTA CORTE SUPERIOR E DO COLENDO STF. 1. Recurso especial contra acórdão que extinguiu o processo, sem julgamento do mérito, em face da ilegitimidade ativa do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, o qual ajuizou ação civil pública objetivando a proteção de interesses individuais indisponíveis (direito à vida e à saúde de criança ou adolescente), com pedido liminar para fornecimento de medicação (hormônio do crescimento recombinante TTO) por parte do Estado. 2. O art. 7º, c/c os arts. 98, I, e 101, IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente, dão plena eficácia ao direito consagrado na Carta Magna (arts. 196 e 227), a inibir a omissão do ente público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) em garantir o efetivo tratamento médico a menor necessitado, inclusive com o fornecimento, se necessário, de medicamentos de forma gratuita para o tratamento, cuja medida, no caso dos autos, impõe-se de modo imediato, em face da urgência e conseqüências que possam acarretar a não-realização. 3. Pela peculiaridade do caso e, em face da sua urgência, há que se afastarem delimitações na efetivação da medida sócio-protetiva pleiteada, não padecendo de qualquer ilegalidade a decisão que ordena que a Administração Pública dê continuidade a tratamento médico, psiquiátrico e/ou psicológico de menor. 4. O poder geral de cautela há que ser entendido com uma amplitude compatível com a sua finalidade primeira, que é a de assegurar a perfeita eficácia da função jurisdicional. Insere-se, aí, sem dúvida, a garantia da efetividade da decisão a ser proferida. A adoção de medidas cautelares (inclusive as liminares inaudita altera pars) é crucial para o próprio exercício da função jurisdicional, não devendo encontrar óbices, salvo no ordenamento jurídico. 5. O provimento cautelar tem pressupostos específicos para sua concessão. São eles: o risco de ineficácia do provimento principal e a plausibilidade do direito alegado (periculum in mora e fumus boni iuris), que, presentes, determinam a necessidade da tutela cautelar e a ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 11/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA inexorabilidade de sua concessão, para que se protejam aqueles bens ou direitos de modo a se garantir a produção de efeitos concretos do provimento jurisdicional principal. 6. A verossimilhança faz-se presente (as determinações preconizadas no Estatuto da Criança com o do Adolescente – Lei nº 8.069/90, em seus arts. 7º, 98, I, e 101, V, em combinação com atestado médico indicando a necessidade do tratamento postergado). Constatação, também, da presença do periculum in mora (a manutenção do decisum a quo, determinando-se a suspensão do tratamento (fornecimento do medicamento), com risco de dano irreparável à saúde do menor). Se acaso a presente medida não for outorgada, poderá não mais ter sentido a sua concessão, haja vista a possibilidade de danos irreparáveis e irreversíveis ao menor. 7. Prejuízos irá ter o menor beneficiário se não lhe for concedida a liminar, visto que estará sendo usurpado no direito constitucional à saúde, com a cumplicidade do Poder Judiciário. A busca pela entrega da prestação jurisdicional deve ser prestigiada pelo juiz, de modo que o cidadão tenha, cada vez mais facilitada, com a contribuição do Poder Judiciário, a sua atuação em sociedade, quer nas relações jurídicas de direito privado, quer nas de direito público. 8. Precedentes desta Corte Superior e do colendo STF. 9. Recurso provido.(STJ, RESP 662033 / RS; 1a Turma, rel. Ministro JOSÉ DELGADO, DJ 08.11.2004 p. 191)(grifo nosso) Com estas considerações, denota-se a aptidão da Ação Civil Pública como instrumento para tutelar interesses indisponíveis, ainda que de natureza individual. IV - A SAÚDE COMO COROLÁRIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA A Carta Federal proclama que a República Federativa do Brasil, enquanto Estado Democrático de Direito, tem como fundamento a ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 12/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA dignidade da pessoa humana. A expressão “dignidade da pessoa humana” - princípio jurídico essencial contido no art. 1º, III, da CF - já se encontrava inserta na Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, na qual se assevera que o reconhecimento da “dignidade inerente a todos os membros da família humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”. O art. 1° desse diploma internacional ressalta: “Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”. Karl LARENZ2, instado a pronunciar-se sobre o personalismo ético da pessoa no direito privado, reconhece na dignidade pessoal a prerrogativa de todo ser humano em ser respeitado como pessoa, de não ser prejudicado em sua existência (a vida, o corpo e a saúde) e de fruir de um âmbito existencial próprio. Isso significa dizer, então, que a pessoa humana é um bem, e a dignidade, o seu valor. Mas o direito do século XXI não se contenta com conceitos axiológicos formais, que podem ser usados retoricamente para qualquer tese. Demanda, sim, o aprofundamento dos mesmos e especialmente, neste caso, da idéia que o princípio jurídico da dignidade contempla. Como o próprio nome revela, o princípio da dignidade da pessoa fundamenta-se na essência da pessoa humana e esta, por sua vez, pressupõe, antes de mais nada, na presença de uma condição objetiva: a própria vida. Considerando-se cada indivíduo em si mesmo, tem-se que a vida é condição necessária da própria existência. Logo, a dignidade do ser humano impõe um primeiro dever básico, que é, 2 LARENZ, Karl. Derecho civil: parte general. Madri: Editoriales de Derecho Reunidas, 1978. p. 46. ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 13/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA justamente, o de reconhecer a intangibilidade da vida, e esse pressuposto configura-se como um preceito jurídico absoluto - um imperativo jurídico categórico - do qual decorre, logicamente e como conseqüência do respeito à vida, o fato da dignidade dar embasamento jurídico para se exigir o respeito à integridade física e psíquica (condições naturais) e aos meios mínimos para o exercício da própria vida (condições materiais)3. Como fundamento primeiro da República, o princípio jurídico da dignidade tem, portanto, a proteção e a defesa da vida humana como pressuposto, pois sem vida não há pessoa, e sem pessoa, não há que se falar em dignidade. Trata-se de preceito absoluto, que não comporta exceção e está, de resto, ratificado pelo caput do art. 5º da CF. Essa tese é reconhecida, acima de todas as outras (inclusive as de ordem econômico-financeiras), pelos nossos Tribunais, como se lê no seguinte pronunciamento do STF: “Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendendo — uma vez configurado esse dilema — que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: o respeito indeclinável à vida.” (STF– Petição n.º 1246-1-SC - MIN. CELSO DE MELLO). Ora, se o direito à vida está intrinsecamente ligado à idéia de dignidade humana, como visto, tem-se que o seu corolário necessário o direito à saúde – também o está, uma vez que este (a saúde), na sua essência, cuida da preservação daquela (a vida). AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Caracterização jurídica da dignidade da pessoa humana. RT , v. 797, ano 91, p. 11-26, mar. 2002. 3 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 14/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA A saúde, concebida como o “estado completo de bemestar físico, mental e social e não simplesmente como a ausência de doença ou enfermidade”4 é, pois, direito humano fundamental, oponível ao Estado nos termos do art. 196 da CF, que viabiliza e garante a própria vida, pressuposto da dignidade da pessoa humana e, como tal, deve ser incansavelmente protegido e respeitado, sendo inadmissível qualquer conduta comissiva ou omissiva, especialmente da Administração Pública, tendente a ameaçá-lo ou frustrá-lo. 4 Conceito da Organização Mundial da Saúde ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 15/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA V - A ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA A Lei Orgânica da Saúde (Lei Federal n° 8.080, de 19 de setembro de 1990) estabelece: Art. 2°. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. § 1°. O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doença e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. Art. 6°. Estão incluídas ainda no campo atuação do Sistema Único de Saúde - SUS: de I - a execução de ações: ... (omissis) d) de assistência inclusive farmacêutica. terapêutica integral, Art. 7°. As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde - SUS são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no artigo 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios: I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; II - integralidade de assistência, entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema. Art. 43. A gratuidade das ações e serviços saúde fica preservada nos serviços públicos privados contratados, ressalvando-se cláusulas ou convênios estabelecidos com entidades privadas. de e as as Logo, sendo a saúde um direito público subjetivo do ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 16/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA cidadão e dever do Estado, cuja efetivação constitui interesse primário, há de ser ele satisfeito de modo integral, resolutivo e gratuito (artigos 198, inciso II, da Constituição Federal, artigos 7º, inc. XII e 43, ambos da Lei Orgânica da Saúde), inclusive com a adequada assistência farmacêutica artigo 6º, inciso I, alínea ‘d’, da LOS. A ”integralidade da assistência terapêutica, inclusive farmacêutica” abarca como se sabe, de forma harmônica e igualitária, as ações e serviços de saúde preventivos e curativos (ou assistenciais), implicando em atenção individualizada, para cada caso, segundo as suas exigências, em todos os níveis de complexidade do sistema (federal, estadual, e municipal). Diz-se assistência farmacêutica na lei, pois é evidentemente impossível ao Estado dar saúde diretamente aos seus cidadãos, cabendo-lhe, assim, fornecer-lhes todos os insumos medicamentosos para que seja ela recuperada. Desse princípio é possível confirmar-se, uma vez mais, o direito dos usuários na obtenção de medicamentos das mãos do Estado, medicamentos este adequados à preservação de sua saúde, direito este que encontra guarida, inclusive, na Lei Orgânica da Seguridade Social (Lei Federal nº 8.212/1991): Art. 2º. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Parágrafo único. As atividades de saúde são de relevância pública e sua organização obedecerá aos seguintes princípios e diretrizes: (...) d) atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas; O artigo 7º, inciso XII, da LOS, prevê expressamente o princípio resolutivo, conforme ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 17/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA se vislumbra da transcrição abaixo: Art. 7. As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde – SUS são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no artigo 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios: (...) XII – capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência. Na lição de GUIDO IVAN DE CARVALHO e LENIR SANTOS: “(...) o ‘princípio resolutivo’ das ações e serviços de saúde ‘é aquele que resolve o problema trazido ou apresentado pelo paciente, seja mediante a aplicação, no ato, de um medicamento resolutivo, seja mediante a prescrição terapêutica que vai resolver, gradualmente, o problema, ou seja ainda mediante a indicação de uma cirurgia, a recomendação de uma órtese ou de mudança de estilo de vida’”.5 Vale repisar, portanto, que a saúde não é apenas uma contraprestação de serviços devida pelo Estado ao cidadão, mas sim um direito fundamental do ser humano, devendo, por isso mesmo, ser universal, igualitário e integral, não se podendo prestar soluções parciais, como pretendem alguns, sem com isso negar o direito à saúde. Frise-se, assim, que o direito de Rozileni aqui defendido não se limita simplesmente à obtenção de qualquer remédio. É necessário, portanto, que seja exatamente aquele que venha a solucionar a enfermidade apresentada, ou mesmo a estabilizá-la, proporcionando-lhe uma melhor qualidade de vida. ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 18/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA Desta forma, não só pelo fato dos precários recursos da beneficiada, o que dramatiza, sobremaneira o seu quadro, mas, principalmente, por se tratar de um direito líquido e certo que está sendo violado, expondo sua titular a risco de vida pela evolução da doença da qual é portadora (diabetes tipo I), é que se busca a garantia da devida prestação por parte do Estado, obrigação esta definida no Sistema Único de Saúde, consoante prevê a NOAS – SUS n. 01/2002, n. 57, Responsabilidades, ‘h’ e ‘i’ e reforçada pelo inciso XVIII do art. 12, do Código de Saúde do Estado (Lei Estadual nº 13/331/01). Diante disso, a disponibilização do medicamento INSULINA GLARGINA (LANTUS), adequado ao tratamento da paciente Rozilene Alves Moreno, conforme será relatado no próximo capítulo, deve se dar de modo imediato, sem que seja admitida qualquer espécie de escusa ou justificativa. VI - PATOLOGIA DA CIDADÃ ROZILENI ALVES MORENO A Sra. Rozilene Alves Moreno é portadora de diabetes tipo I – mellitus desde meados de 1999, quando iniciou sua primeira gestação. A patologia é classificada pelo Catálogo Internacional de Doenças – CID 10, sob a sigla E –10. A diabetes gestacional não é rara. Entretanto, na quase totalidade dos casos a patologia desaparece com o parto. Infelizmente, no caso da Sra. Rozilene, após o parto não houve a equalização da saúde e a doença se tornou crônica. Segundo consta no Plano de Reorganização da Atenção à Hipertensão Arterial e ao Diabetes mellitus, elaborado pelo Ministério da 5 in Comentários à Lei Orgânica de Saúde, 2ª edição, atualizada e ampliada. Editora Hucitec - São Paulo, ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 19/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA Saúde através da Secretaria de Políticas de Saúde, em 2001, o diabetes mellitus "é uma síndrome de etiologia múltipla, decorrente da falta de insulina e/ou da incapacidade de a insulina exercer adequadamente seus efeitos. Caracteriza-se por hiperglicemia crônica com distúrbios do metabolismo dos carboidratos, lipídios e proteínas. As conseqüências do DM, a longo prazo, incluem disfunção e falência de vários órgãos, especialmente rins, olhos, nervos, coração e vasos sangüíneos."6 O Diabetes mellitus gestacional, de acordo com o protocolo do Ministério da Saúde, define-se como "a diminuição da tolerância à glicose, de magnitude variável, diagnosticada, pela primeira vez, na gestação, podendo ou não persistir após o parto. Abrange os casos de DM e de tolerância à glicose diminuída, detectados na gravidez. O Estudo Brasileiro de Diabetes Gestacional – EBDG revelou que 7.6% das mulheres em gestação apresentam intolerância à glicose ou diabetes.(grifo nosso)7 Tendo em vista que se trata de diabetes tipo I, a manutenção da vida da paciente não é possível apenas com a administração de medicamentos via oral, sendo indispensável ingestão diária de Insulina através de aplicações subcutâneas. A insulina é um hormônio produzido pelas células beta das ilhotas de Langerhans do pâncreas.8 Os efeitos da insulina consistem em reduzir os níveis sanguíneos de glicose, ácidos graxos e aminoácidos e estimular a conversão destes para compostos de armazenamento, que são o glicogênio, os triglicerídeos e as proteínas.9 1995, pág.88. 6 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas da Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Plano de reorganização da atenção à hipertensão arterial e ao diabetes mellitus. Brasília:Ministério da Saúde, 2001, p. 14 7 idem, p. 15 8 ibidem, p. 63 9 ibidem, p. 63 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 20/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA A administração da insulina para pacientes portadores de diabetes tipo I se dá, ajustando-se às necessidades de cada paciente, à razão de 0,5 a 1,0 Ui/kg/dia.10 O esquema terapêutico mais freqüente é o de duas doses de insulina de ação intermediária, aplicando-se 2/3 da dose, pela manhã, no desjejum, e 1/3 da dose, no jantar.11 Tendo em conta que o diabetes raramente apresenta regressão, os pacientes se tornam dependentes vitalícios da insulina. VII – INVIABILIDADE DE ADMINISTRAÇÃO DA INSULINA REGULAR VII.I Variação dos níveis de glicemia Todo paciente portador de diabetes tipo I que necessite do uso regular da insulina sofre os diários e dolorosos inconvenientes inerentes à aplicação subcutânea do hormônio e do indispensável controle alimentar, da glicemia, etc. A principal complicação da insulinoterapia é a hipoglicemia. Estudos relatados pelo Ministério da Saúde apontam que a hipoglicemia seria a causa primária ou secundária de morte de 4% dos pacientes com diabetes tipo I.12 Na grande maioria dos casos os quadros de hipoglicemia são facilmente controlados com a correta administração da insulina comum13, seja de origem animal ou humana, e a atenção a uma dieta adaptada às características do paciente. Infelizmente, no caso da Sra. Rozilei, a administração 10 op. Cite, p. 65 op. Cite. P. 66 12 loc cit. 13 Utilizamos o termo "comum" para diferenciar da insulina glargina, que é consideravelmente nova em relação às demais. 11 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 21/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA da insulina comum, no caso a NPH humana, não mantém os níveis de glicose regulares durante o dia e a noite, não obstante a paciente siga à risca as prescrições médicas e esteja atenta à dieta recomendada. Segundo os relatos da usuária e o diagrama elaborado pelo médico conveniado do SUS que a atende, Dr. Fabrízio Sakabe, CRM 20335, os níveis de glicose variam em proporções anormais durante o dia e noite. Em poucas horas um quadro de hiperglicemia se torna uma hipoglicemia aguda, que passa a hiperglicemia e assim sucessivamente durante todo dia. O maior perigo reside na noite. Segundo o prontuário elaborado pelo médico, "a insulina NPH pode freqüentemente induzir uma hipoglicemia à noite devido ao pico do nível sanguíneo da insulina à noite. Além disso, os níveis sanguíneos de glicose podem elevar-se de manhã, já que as doses de insulina não podem ser aumentadas." Vale aqui transcrever o relato da Sra. Rozilei a respeito do sofrimento que lhe aflige em razão de tais variações: que ainda aflige a declarante o fato de que a administração de insulina comum gera fortes alterações de glicemia, de modo que em momentos há quadro de hipoglicemia e certo tempo depois há hiperglicemia, que, por sua vez, obriga à administração de insulina que, por sua vez, gera hipoglicemia, e assim por diante; que já fez uso de insulina suína, bovina, mista e atualmente usa a insulina NPH humana; que a insulina NPH humana é fornecida pela Secretaria Estadual de Saúde; que a declarante vem arcando com graves riscos de saúde em razão dos quadros de hiper e, principalmente, hipoglicemia; que embora todo usuário de insulina esteja sujeito a quadros de hipoglicemia, a declarante tem sintomas de hipoglicemia quase todos os dias e, ainda, o nível da hipoglicemia é acentuado; que em razão disto a declarante já entrou em pré-coma, em meados de agosto/setembro de 2004; que isto ocorreu em uma madrugada e nesta oportunidade foi socorrida por seu marido e sua irmã e levada ao hospital Cemil e atendida pelo Dr. Ronaldo de Souza, plantonista da UTI; que em diversas outras situações a declarante ficou muito debilitada em razão da hipoglicemia, chegando a ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 22/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA interromper a jornada de trabalho; que durante a noite o quadro de hipoglicemia é muito perigoso, pois se a declarante não acordar o nível de glicemia cai muito e pode levar a óbito14 (grifo nosso) Segundo a ciência médica contemporânea, não há um tratamento disponível que possa controlar o nível de glicemia da paciente com o uso da insulina comum. Somente uma outra fórmula de insulina poderia amenizar o quadro. Esta nova fórmula surgiu há pouco tempo sob a denominação insulina glargina, comercializada pelo laboratório Aventis com o nome Lantus. Sobre este medicamento dedicaremos atenção em um capítulo específico. O que se busca ressaltar neste capítulo é que, por uma característica pessoal da Sra. Rozileni, que a medicina ainda não pôde explicar, a insulina comum não age da forma esperada.Obviamente tal situação não é absurda. Cada ser vivo é único e não raramente um tratamento se comporta de maneira diferente em relação aos diversos destinatários. Para exemplificar a dificuldade de adaptação de Rozileni à insulinoterapia basta observar que desde a instalação da doença a paciente apresentava reação alérgica aos veículo de administração da insulina comum (conhecido como veículo q.s.p.). Em razão disto, chegou a suspender a administração da insulina o que, por sua vez, provocou cetoacidose e a levou ao internamento em UTI. Sendo insustentável a administração da insulina com a sensibilidade e não podendo ficar sem tal hormônio, a paciente realizou um tratamento para desensibilização junto ao Hospital de Clínicas da Universidade de São Paulo. Tal situação está retratada no Resumo Clínico de Alta, em anexo. Mesmo com a desensibilização Rozilei ainda 14 Declarações prestadas por Rozileni Alves Moreno à Promotoria de Justiça em 31 de janeiro de 2005 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 23/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA faz uso contínuo de anti-histamínico (antialérgico) que adquire com recursos próprios. VII.II - Risco de morte e complicações crônicas causadas pela acentuada variação da glicemia O descontrole dos níveis de glicemia gera duas ordens de conseqüências nefastas à saúde da paciente. Primeiramente destacam-se aqueles advindos da hiperglicemia. Segundo o Protocolo do Ministério da Saúde, uma das complicações agudas advindas da hiperglicemia é a cetociadose, conceituada com uma "acidose metabólica causada por excesso de acetoácidos decorrente da deficiência de insulina."15 Outra complicação pode ser retratada no Coma Hiperosmolar, cujo grau de letalidade varia entre 12 e 42%16. À par das complicações agudas, ainda ocorrem, e com maior intensidade, as complicações denominadas crônicas. Em termos gerais, a hiperglicemia causa a degeneração de vários órgãos, em especial os olhos, rins, sistema cardiovascular e neurológico. A situação é tão preocupante que o próprio Ministério da Saúde adotou como política de prevenção e tratamento das doenças cardiovasculares a atuação conjunta entre hipertensão arterial e diabetes, programa 'hiperdia". Vejase que a própria paciente relata que sofre com náuseas, incontinência urinária e perda da visão. Portanto, a Sra. Rozileni está sofrendo os efeitos do precário controle da hiperglicemia. Precário não por uma má assessoria médica ou displicência do paciente, mas por uma limitação da medicina e da farmacologia. 15 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas da Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Plano de reorganização da atenção à hipertensão arterial e ao diabetes mellitus. Brasília:Ministério da Saúde, 2001, p. 75 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 24/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA De outro lado, quando ocorre hipoglicemia o paciente corre o risco de entrar em coma e, eventualmente, vir a óbito. Não por outro motivo é considerada a principal complicação da insulinoterapia. Segundo o protocolo do Ministério da Saúde em relação ao diabetes, a hipoglicemia é caracterizada por nível de glicemia igual ou inferior a 60 mg/dl. Em casos de hipoglicemia recomenda-se, especialmente em casos de convulsões e coma, o internamento hospitalar.17 Existem estudos que demonstram estar a hipoglicemia envolvida como fator primário ou secundário de morte em 4% dos pacientes com DM tipo 1.18 Em diversas oportunidades a Sra. Rozileni ficou debilitada, principalmente à noite, em razão da hipoglicemia. Na maioria dos casos, felizmente, pôde controlar o quadro com a ingestão rápida de glicose. Entretanto, em ao menos uma oportunidade, durante o sono, de madrugada, a hipoglicemia a levou ao coma. Neste caso, ocorrido em meados do ano de 2004, a paciente teve a sorte de seu marido perceber seu estado e a levar ao hospital. Se estivesse sozinha poderia ter falecido. É este medo diário que assola a usuária que não pode mais continuar. O medo de ir dormir e não saber se acordará. O medo de ingerir muito alimento à noite para evitar a hipoglicemia e sofrer com a hiperglicemia. Tudo depende de como seu corpo irá reagir. Este sofrimento físico e psicológico é que busca ser sanado. VII.III – Complicações extraordinárias De início é importante ressaltar que o descontrole da glicemia inviabiliza a paciente Rozileni de realizar atividades físicas 16 idem, p. 76 ibidem, p. 74 18 ibidem, p. 66 17 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 25/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA regulares, fator de suma importância para a manutenção da boa saúde. O sedentarismo é relacionado como o principal fator de risco para as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), entre elas as cardiovasculares19. Não é necessário trazer a esta peça a noção dos benefícios que a prática de atividade física regular traz à saúde humana. Contudo, a impossibilidade de prever quando e em que grau a paciente poderá sofrer um quadro de hipoglicemia torna a prática de exercícios físicos arriscada20, já que exigem a metabolização de grandes quantidades de açúcares. Permanecendo sedentária, a paciente potencializa o agravamento das complicações crônicas inerentes à doença. Além do sedentarismo, a usuária ainda relata que sofre de candidíase. A candidíase é provocada pela forte alteração de glicemia no sangue da declarante, baixando sua resistência natural. Embora seja uma doença comum, a candidíase geralmente sara após alguns dias, mas, no caso de Rozileni, ela sempre está instalada e apenas melhora por alguns dias, mas nunca desaparece. Por fim, não é desmedido voltar a alertar que os efeitos do diabetes impedem a paciente de levar uma vida feliz. Desestimula-a a ter um outro filho; interrompe freqüentemente sua jornada de trabalho e torna seu emprego algo incerto; prejudica seu relacionamento familiar e conjugal. Enfim, a vida da paciente após a instalação do diabetes deixou de ser prazerosa e passou a constituir uma simples questão de sobrevivência. VIII - INSULINOTERAPIA COM GLARGINA - LANTUS 19 ibidem, p. 35 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 26/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA A insulina glargina, desenvolvida pelo laboratório Aventis, é um hormônio sintético análogo ao humano produzido a partir da recombinação de DNA21. Sua principal característica é a prolongada absorção pelo organismo do usuário, sem picos.22 Com tal propriedade, a glargina minimiza os principais inconvenientes da administração da insulina NPH comum. Primeiramente, exige-se apenas uma dose diária, enquanto a NPH humana em geral exige duas aplicações diárias. Segundo, com a estabilidade de disponibilidade de insulina durante as 24horas evitam-se os picos constatáveis na administração da NPH. Os extremos de disponibilidade da insulina provocam hiperglicemia (nível baixo) e hipoglicemia (nível alto de insulina). Conforme relatado no capítulo acima, a principal complicação da insulinoterapia é a hipoglicemia. Neste particular a insulina glargina representa um considerável avanço. Conforme relatado pelo Prof. Elias Cima, um estudo da Universidade de São Paulo - USP revelou que a insulina glargina reduziu em 44% os episódios de hipoglicemia noturna em relação à NPH. Dos 500 pacientes estudados, 70% atingiram A1c (média de glicose dos últimos 90 dias) menor que 7%, sem hipoglicemia noturna. Com a NPH, foram 17%.23 Para confirmar a eficiência da insulina glargina para o tratamento da paciente Rozileni Alves Moreno é pertinente relatar as conclusões de dois estudos científicos publicados em revistas médicas. Segundo a revista Diabetes Care, em estudo realizado 20 op cite, p. 50 RATNER, Robert E.; et alii. Less hypoglycemia with insulin Glargine in intensive insulin therapy for type 1 diabetes. Diabetes Care, vol 23, nº 5, may 2000; p. 639 22 Idem., p. 640 21 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 27/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA durante um ano, uma quantia significantemente inferior de eventos de hipoglicemia foram constatados em pacientes que fizeram uso de insulina glargina em relação à insulina NPH24. Em estudo realizado na Inglaterra em 2002, dirigido pelo National Institute for Clinical Excellence, relatou que em dos subgrupos do estudo a incidência de hipoglicemia noturna em pacientes usuários de insulina glargina foi de 36%, enquanto que aqueles que receberam insulina NPH apresentaram 56% de relatos de hipoglicemia noturna25. Nas conclusões, o estudo firmou o seguinte: "o comitê conclui que a administração por dose única diária de insulina (glargina) que mantenha constantes os níveis de insulina no sangue melhora a qualidade de vida dos indivíduos. Primeiramente, asseguraria mais flexibilidade no modo de vida pela diminuição das picadas e estabilidade nos níveis de insulina. Segundo, reduziria a probabilidade de quadros de hipoglicemia..."26 É importante destacar que todos os estudos científicos citados acima mencionados foram realizados por institutos independentes da indústria farmacêutica fabricante da insulina Lantus. Outrossim, atestam a segurança na administração da nova droga. Finalmente, é de importância notar que, por recomendação médica e mediante o recebimento de amostras-grátis do laboratório, a paciente fez uso da insulina Lantus© por 10 dias e teve excelentes resultados. Consta no Laudo apresentado pelo médico responsável pelo tratamento que durante o período de uso "apresentou resposta significativa com melhora do controle glicêmico não havendo 23 CIMA, Elias. Novos medicamentos e diferentes variedades de insulina deverão facilitar a vida de diabéticos. Departamento de Pesquisas da Fundação Cimas´s. 24 RATNER, Robert E.; et alii. Less hypoglycemia with insulin Glargine in intensive insulin therapy for type 1 diabetes. Diabetes Care, vol 23, nº 5, may 2000; p. 641 25 NATIONAL INSTITUTE FOR CLINICAL EXCELLENCE. Guidance on the use of long-acting insulin analogues for the treatment of diabetes – insulin glargine. Nº 53, December 2002, p. 5, disponível em <http://Nice.org.uk/pdf/53_insulin_analogues_full_guidance.pdf>, acesso em 01/02/205. ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 28/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA hipoglicemias e hiperglicemias, mantendo níveis basais entre 100 a 150 mg/dl; outro fator importante foi que a paciente não apresentou reação alérgica aos componentes da insulina não havendo portanto, necessidade de anti-histamínico." Com estes dados é possível concluir que a usuária do Sistema Único de Saúde Rozileni Alves Moreno se enquadra em todos os critérios administrativos, científicos e lógicos que determinam a dispensação do medicamento excepcional insulina glargina, ainda que não relacionado nos protocolos do Ministério da Saúde e disponível de imediato nos estoques do CEMEPAR. São eles: a) Usuária do Sistema Único de Saúde; b) Médico responsável pelo tratamento é do SUS; c) Receita que prescreveu o medicamento é de tratamento pelo SUS; d) Medicamento caracterizado como excepcional pela natureza da doença; e) Inviabilidade de administração do medicamento disponível no CEMEPAR - insulina NPH; f) Degradação da saúde e risco de vida com a administração da Insulina NPH; g) Comprovação científica da proficiência do medicamento indicado, insulina glargina – Lantus©; h) Comprovação de eficiência da insulina glargina no trato específico da paciente Rozileni; i) Alto custo do medicamento que inviabiliza a aquisição pela paciente com recursos próprios; j) Baixo impacto orçamentário da aquisição do medicamento Lantus© se considerar o custo atual de aquisição da insulina NPH, dos anti- 26 Idem, p. 10 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 29/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA histamínicos, das fitas necessárias ao monitoramento da glicemia e dos reméidos para candidíase (tudo relacionado ao descontrole do diabetes). Com base nestas premissas, conclui-se que a usuária tem direito a lhe ser fornecido pelo Estado do Paraná o medicamento necessário à manutenção de sua saúde, no caso a insulina glargina. IX – NEGATIVA DE FORNECIMENTO DA INSULINA LANTUS E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS O Estado do Paraná, através do Centro de Medicamentos do Paraná – CEMEPAR, se nega a fornecer a insulina glargina à paciente Rozileni Alves Moreno. Conforme se nota no MEMO 62/2005, o Diretor do CEMEPAR alega que o Estado já disponibiliza aos usuários do SUS dois tipos de insulina NPH que "atendem as necessidades dos pacientes insulino-dependentes" e que a insulina Lantus não está "padronizada nos Programas do Ministério da Saúde e do Estado". As vias administrativas foram esgotadas da seguinte forma. Após receber a prescrição médica a usuária se dirigiu à 12a Regional de Saúde a fim de solicitar a dispensação do medicamento. Informalmente, os servidores daquela unidade lhe informaram que não havia disponibilidade da insulina Lantus© e que não seria possível atender o pedido. Em seguida, orientada por esta Promotoria de Justiça, a usuária fez uma solicitação por escrito ao diretor da Regional de Saúde, juntando a documentação que demonstrava a necessidade da insulina Lantus e a impossibilidade de continuar utilizando a NPH. Da mesma ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 30/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA forma, o pedido foi negado. Costa cópia do procedimento em anexo. Finalmente, após interpelar a intervenção do Ministério Público, foi enviado ofício ao diretor da Regional de Saúde, solicitando a dispensação do medicamento e informações a respeito da negativa. Tal expediente foi remetido ao diretor do CEMEPAR que, sem analisar a necessidade da usuária e a impossibilidade de continuidade da administração da insulina NPH, restringiu-se a informar a indisponibilidade do medicamento necessário à paciente, conforme consta no memorando anexo. Após esgotar as vias administrativas e verificando que o Estado do Paraná não se dispõe a adquirir o medicamento em caráter extraordinário, resta ao Ministério Público, na defesa de interesse indisponível de usuário do SUS, buscar a via judicial. Primeiramente, quer-se deixar claro que a presente ação não tem como objetivo a obrigação do Estado em fornecer insulina Lantus a todos os diabéticos tipo 1. Outrossim, o Ministério Público está ciente das repercussões que um acréscimo de custos na política farmacêutica representa à administração do Estado. Em especial, sabe-se perfeitamente que o acréscimo de gastos leva inexoravelmente à redução da gama de atendimentos. Em valores de comércio varejista, a aquisição de insulina Lantus custa cerca de R$ 300,00 ao mês. Tal valor é substancialmente superior àquele relativo à insulina NPH comum. Por tais razões, há que se reservar o fornecimento da Lantus pelo poder público a situações excepcionais. No caso em apreço, demonstrou-se nos parágrafos anteriores que a usuária do SUS Rozileni Alves Moreno tem drásticos problemas com a administração da insulina NPH comum e a Lantus ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 31/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA comprovadamente lhe conferiria substancial melhora na qualidade de vida e reduziria o risco à saúde inerente aos quadros de hipoglicemia. É, portanto, uma situação peculiar que merece a atenção do poder público. A insulina Lantus surgiu no mercado internacional em meados do ano 2000 e, até agora, não faz parte dos protocolos clínicos dos órgãos públicos de saúde. O usuário não pode ser penalizado por esta desatualização. Mesmo com as vantagens da administração única diária, o custo-benefício, em termos de administração pública, para fornecimento da insulina Lantus aos usuários do SUS seria alto. Em geral, a administração da insulina NPH controla a diabetes e as variações de glicemia se mantêm em valores razoáveis. Infelizmente, este não é o caso da Sra. Rozilene. Ela é um indivíduo, com suas características particulares e merece a atenção e respeito do poder público. Não há nenhuma pertinência eventual alegação do Poder Público de insuficiência de recursos. Até porque, em um país onde a carga tributária supera 35% do PIB27, número equivalente ao do Reino Unido e 50% superior ao dos Estados Unidos da América, o Poder Público não conta com qualquer escusa. Também não mereceria acolhida o argumento de que o Judiciário não pode se imiscuir na administração pública. Tal argumento não pode ser aplicado à tutela dos direitos do cidadão, ainda mais aqueles relativos à vida. Outrossim, sempre é importante lembrar que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito", artigo 5o, inciso XXXV da Constituição Federal. Por fim, os critérios de razoabilidade se mostram 27 FOLHA DE SÃO PAULO, caderno folha dinheiro, página B1, 30 de janeiro de 2005 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 32/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA justificados na presente ação. Primeiramente, a aquisição da insulina Lantus representará apenas um acréscimo em relação àquilo que já é gasto com a aquisição da Insulina NPH. Também, por uma postura pessoal da usuária, as despesas relativas ao monitoramento do diabetes 28 e ao tratamento da candidíase e à alergia (todos inerentes ao uso da insulina NPH) estão sendo suportados pela própria usuária e alcançam cerca de R$ 150,00. Ora, a usuária pode simplesmente cessar tais gastos e exigir que o Estado o faça, o que seria administrativamente deferido. Mas, com a administração da Lantus tais gastos extraordinários praticamente desaparecem. Inserindo tal fator no custo geral do tratamento conclui-se que o efetivo acréscimo de despesa é praticamente nulo. A soma da aquisição da insulina NPH com a dos demais medicamentos e fitas de medição seria equivalente ao gasto com a Lantus. Com a evidente vantagem da qualidade de vida e redução do risco de vida. X – INVIABILIDADE DE AQUISIÇÃO PELA PRÓPRIA USUÁRIA Em capítulo apropriado foi ressaltada a obrigação do Estado em garantir a saúde de seus cidadãos, inclusive através do fornecimento dos medicamentos necessários ao tratamento. Tal situação, em princípio, independe da condição sócio-econômica do paciente. Em um país onde a carga tributária consome mais de 1/3 da riqueza produzida pelos cidadãos, não há justificativa para diferenciar classes sociais. Não obstante tal advertência, é importante destacar que 28 kit formado pelo aparelho medidos de glicose e fitas descartáveis apropriadas ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 33/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA que a Sra. Rozilene Alves Moreno não possui condições financeiras de arcar com o custeio da insulina Lantus sem prejuízo da subsistência própria e de sua família. Conforme se nota em sua carteira de trabalho e nas declarações prestadas a esta Promotoria de Justiça, Rozilene é atendente de clínica médica e recebe cerca de R$ 390,00 mensalmente. Atualmente, apenas com a aquisição regular de medicamentos inerentes aos seus problemas ela já gasta cerca de R$ 150,00. É inviável a ela despender mais cerca de R$ 300,00 com a insulina glargina. A renda familiar é complementada pela atividade do marido. Não obstante, felizmente, não seja uma família em condição de pobreza, a renda do marido é apenas a suficiente para manter as demais despesas da residência, sem espaço para qualquer outro investimento. Outrossim, Hermes Pimentel da Silva, marido de Rozileni, é proprietário de uma pequena mercearia e a renda auferida varia muito conforme a situação econômica do país e o consumo da população. Por isto, não é uma renda estável e que pode se contar todos os meses. Tanto assim que a paciente somente fez uso da insulina Lantus por dez dias, através de amostras-grátis fornecidas pelo Laboratório fabricante. Finalizadas as amostras, a usuária voltou a usar a insulina NPH comum fornecida pelo Estado. É óbvio que se tivesse condições financeiras Rozileni adquiriria por si mesma a Lantus e minimizaria seu sofrimento. Nestes termos, é sensato que o Estado venha a assumir seu papel de redistribuidor de rendas e promova o fornecimento de medicamentos àqueles que não têm condições de adquiri-lo por meios próprios. ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 34/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA XI - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA A assistência e o atendimento de saúde, por guardarem estreita relação coma manutenção da vida humana, são sempre relevantes e urgentes. Diante da urgência reclamada pela espécie, requer-se a concessão liminar da antecipação dos efeitos da tutela pretendida, nos termos do dispostos nos artigos 273, inciso I, e 461 do Código de Processo Civil. O acolhimento liminar dos efeitos da tutela urge e impera, porquanto o provimento da pretensão, somente ao final, poderá ser inócuo para prevenir os danos à saúde da Sra. Rozileni Alves Moreno ou mesmo para evitar sua morte. Ela há muito vem suportando sofrimento devido à omissão do Poder Público Estadual, que lhe nega, sob argumento ilegais, o atendimento integral e prioritário a que faz jus por força de Lei. Não é possível aquilatar o alcance dos danos à saúde física e psíquica da usuária do SUS, podendo ser afirmado, porém, que eles são grandiosos, dramáticos, presentes e contínuos, os quais devem ser rapidamente afastados pelo Poder Judiciário. Relevante é o fundamento da lide, pois pretende-se, em última análise, a manutenção da vida e da saúde de um ser humano, uma trabalhadora e mãe de família. O fumus boni juris está presente, haja vista a existência de preceito constitucional obrigando o atendimento, somado à comprovação, médico-técnica do risco de vida por que passa a paciente, conforme analisado em capítulos específicos. Da mesma forma, vê-se presente o periculum in mora, talvez mais gritante ainda, já que o perigo maior a um ser humano é a ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 35/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA perda de sua vida. Tendo em conta que após a oitiva preliminar do Estado do Paraná não cabe oportunidade ao Ministério Público se manifestar, até porque o trâmite frustraria os critérios de urgência, por questões de oportunidade cogita-se desde já que o Estado do Paraná possa alegar que não há urgência na concessão da antecipação em vista do tempo que a usuária já convive com a doença. O argumento, se levantado pela Procuradoria do Estado, não é pertinente a questões de saúde. O fato de Rozileni conviver com o diabetes desde 1999 não significa que sua saúde não se degenera e que não há risco de, subitamente, vir a falecer. Como se ressaltou em capítulo próprio, os picos de hipoglicemia podem levar a morte a qualquer momento. Pode ocorrer hoje, como poderia ter ocorrido em meados de 2004, quando Rozileni entrou em coma. Além do risco da hipoglicemia, a hiperglicemia dia-a-dia degenera seus órgãos e abrevia sua vitalidade. Por estas razões, cada dia que passa é de suma importância à paciente. Cada dia de administração da insulina NPH representa um risco de vida e uma certeza de degeneração da saúde. Via de conseqüência, cada dia fazendo o uso da insulina glargina representa menos riscos e mais vida. Consoante o art. 273 do Código de Processo Civil, “o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e (... haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ...” No presente caso o serviço relevante de saúde – dispensação de medicamentos – não está sendo prestado, ferindo ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 36/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA dispositivos constitucional e legais com grande prejuízo a direito fundamental – a vida, consubstanciado pela saúde. Sustenta o Professor José Afonso da Silva: “A garantia das garantias consiste na eficácia e aplicabilidade imediata das normas constitucionais. Os direitos, liberdades e prerrogativas consubstanciados no Título II, caracterizados como direitos fundamentais só cumprem sua finalidade se as normas que os expressem tiverem efetividade. (...) Sua existência só por si, contudo, estabelece uma ordem aos aplicadores da Constituição no sentido de que o princípio é o da eficácia plena e aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos fundamentais: individuais, coletivos, sociais (...) Por isso, revela-se, por seu alto sentido político, como eminente garantia política de defesa da eficácia jurídica e social da Constituição” (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros) Assim sendo, o Ministério Público requer seja o Estado do Paraná determinado a fornecer, in limine, observado o prazo de 72 horas, conforme artigo 2º da Lei n.º 8.437/92, para compelir o requerido, durante o transcorrer da ação e no prazo de 15 dias, a fornecer à Sra. Rozileni Alves Moreno insulina glargina, comercializada com o nome de Lantus, sob pena de multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia de atraso no fornecimento, nos termos do artigo 11 da Lei n.º 7.347/85, em caso de descumprimento, a ser revertida em prol da paciente, sem prejuízo de outras providências tendentes ao cumprimento da ordem judicial, inclusive a responsabilização por ato de improbidade administrativa. O prazo estabelecido no pedido, para cumprimento da obrigação de fazer, não deve iludir o julgado quanto ao perigo da demora. É facilmente perceptível que as providências reclamadas nesta inicial não se resolvem da noite para o dia. A administração pública estadual terá de ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 37/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA tomar medidas de caráter financeiro e contábil para viabilizar a aquisição. Talvez necessite adquiri-los emergentes num primeiro momento e, depois, mediante procedimentos licitatórios. Todavia, é perfeitamente justificado o receio de ineficácia do provimento final, caso a Administração não seja obrigada, desde já, a tomar as providências que ensejarão a observância da ordem Judicial no prazo estabelecido na respectiva Decisão. Esta a razão da necessidade da concessão liminar dos afeitos da tutela pleiteada. Há risco à vida e à saúde da usuária, facilmente evitável se o Poder Público Estadual for compelido a atuar desde agora, com tempo razoável para alcançar o resultado consubstanciado no pedido desta ação civil pública. XI.I Tutela Antecipada contra o Poder Público Embora a nefasta e descomprometida lei 9.494/97 tenha buscado restringir sensivelmente a possibilidade de concessão de antecipação de tutela contra o poder público, em uma nítida manobra corporativista, verfica-se que tal diploma, independente de sua inconstitucionalidade, não se aplica ao caso em apreço. Isto porque a vedação alcança basicamente a concessão de benefícios a servidores públicos, já que faz referência ao artigo 5º 29, e seu parágrafo único30, e 7º31 da Lei nº 4.348, de 26 de junho de 1964, ao art. 1º32, e seu § 4º33, da Lei nº 5.021, de 9 de junho de 1966, e arts. 1º 34, “não será concedida a medida liminar de mandados de segurança impetrados visando à reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de aumento ou extensão de vantagens.” (grifo nosso) 30 “os mandados de segurança a que se refere este artigo serão executados depois de transitada em julgado a respectiva sentença” (grifo nosso) 31 “o recurso voluntário ou ex officio, interposto de decisão concessiva de mandado se segurança que importe outorga ou adição de vencimento ou ainda reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.” (grifo nosso) 32 “O pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias asseguradas, em sentença concessiva de mandado de segurança, a servidor público federal, da administração direta ou autárquica, e a 29 ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 38/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA 3º35 e 4º36 da Lei nº 8.437, de 30 de junho de 1992. Mesmo a vedação prevista no artigo 1o da lei 8.437/92, que se refere exclusivamente a ações de natureza cautelar, que não é o caso em tela, tem como exceção o parágrafo 2o do próprio artigo que narra: "O disposto no parágrafo anterior não se aplica aos processos de ação popular e de ação civil pública." Tanto assim que a decisão do Supremo Tribunal Federal proferida nos autos de ADC nº 4-DF se refere exclusivamente à concessão de liminares em favor de servidores públicos nos feitos que envolvam questões remuneratórias. Não é o caso dos autos. Aqui, discute-se a obrigação do Estado em fornecer um medicamento que é essencial à manutenção da vida de uma usuária do SUS. Analisando a extensão da decisão proferida na ADC nº 4DF, o próprio Supremo Tribunal Federal decidiu que o efeito vinculante de sua decisão se restringe aos feitos que envolvam questões remuneratórias de servidores. É o que se extrai do seguinte julgado: EMENTA: ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. ALEGADO DESRESPEITO AO DECIDIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE N.º 4. Tratando-se de decisão antecipatória proferida em ação de cobrança ajuizada por pessoa jurídica privada contra o Estado do Piauí, evidente não estar caracterizado atentado contra a mencionada decisão do STF, que, reconhecendo cautelarmente servidor público estadual e municipal, somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial” (grifo nosso) 33 “Não se concederá medida liminar para efeito de pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias” 34 “Não será cabível medida liminar contra atos do Poder Público, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, toda vez que providência semelhante não puder ser concedida em ações de mandado de segurança, em virtude de vedação legal.” (grifo nosso) 35 “O recurso voluntário ou ex officio , interposto contra sentença em processo cautelar, proferida contra pessoa jurídica de direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de vencimentos ou de reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.” (grifo nosso) 36 “Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas” ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 39/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA a constitucionalidade do art. 1.º da Lei n.º 9.494/97, se restringiu a vedar a concessão de antecipação de tutela, em favor de servidores, nos feitos que envolvam questões remuneratórias. Reclamação julgada improcedente. (Rcl1073/PE RECLAMAÇÃO; Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO; Julgamento: 25/09/2002 Orgão Julgador: Tribunal Pleno; Publicação: DJ DATA-31-10-2002) Com base neste entendimento, conclui-se que ao magistrado, em qualquer instância do Poder Judiciário, salvo em se tratando de matéria referente à remuneração de servidores, é dado conferir antecipação da tutela pretendida pelo autor. A única ressalva que se pode fazer é em relação à condição prevista no artigo 2o da lei 8.437/92 que estabelece a audiência prévia do Poder Público, no prazo de 72 horas. Tal providência, embora não seja razoável, está sendo respeitada nesta peça. XI.II Precedentes judiciais O caso em tela não representa nenhuma inovação no direito brasileiro, constatando-se inclusive precedentes na própria comarca de Umuarama. A título de ilustração, juntamos cópia da petição inicial e despacho concessivo da antecipação da tutela pelo juízo da comarca de Bandeirantes-Pr em caso onde se compele o Estado a fornecer Insulina Lantus a uma usuária do SUS. Outrossim, juntamos cópia do despacho do Dr. Frederico Mendes Júnior, então Juiz de Direito da 1a Vara Cível da comarca de Umuara, que concedeu a tutela antecipada contra o Estado em Ação Civil Pública que busca compelir o requerido a fornecer medicamento contra câncer a um idoso. Também é oportuno destacar que o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná não vem conferindo efeito suspensivo ou cassando as tutelas antecipadas conferidas pelos juízos de ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 40/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA primeira instância, conforme se nota no despacho do Juiz Convocado Eduardo Sarrão, em anexo. Estes precedentes demonstram a pertinência da tutela ora pleiteada e a postura do Judiciário paranaense na garantia da vida dos seus jurisdicionados. ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 41/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA XII - PEDIDO Diante de todo o exposto, o Ministério Público do Estado do Paraná requer: a) o recebimento e autuação da presente Ação Civil Pública, independente do depósito de custas judiciais, conforme prevê o artigo 18 da lei 7.347/85; b) a intimação do Estado do Paraná, através da Procuradoria do Estado, em sua unidade sediada em Umuarama, para que, no prazo de 72 horas, conforme artigo 2º da Lei n.º 8.437/92, se manifeste acerca da antecipação de tutela ora pretendida; c) a atencipação da tutela jurisdicional, para compelir o Estado do Paraná, durante o transcorrer da ação e no prazo máximo de 15 dias, a fornecer à Sra. Rozileni Alves Moreno insulina glargina, comercializada com o nome de Lantus, em quantidade compatível com a prescrição médica, atualmente 900UI/mês; d) a cominação ao requerido, em liminar, de multa diária, nos termos do art. 11 da Lei n° 7.347/85, no valor de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia de atraso no fornecimento, nos termos do artigo 11 da Lei n.º 7.347/85, a ser revertida em prol da paciente, sem prejuízo de cumprimento outras da providências ordem judicial, tendentes inclusive ao a ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 42/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA responsabilização por ato de improbidade administrativa; e) a citação do ESTADO DO PARANÁ, na pessoa do Excelentíssimo Procurador-Geral do Estado para, querendo, contestar no prazo legal a presente ação, sob pena de suportar os efeitos da revelia; f) após a instrução, seja julgada procedente o pedido, para condenar o Estado do Paraná a fornecer à Sra. Rozileni Alves Moreno insulina glargina, comercializada com o nome de Lantus, em quantidade compatível com a prescrição médica e pelo período em que perdurar a prescrição médica de tal medicamento; g) a produção de provas, por todos os meios admitidos em direito, sobretudo pela juntada de novos documentos e perícias, além de oitiva de testemunho e peritos, caso se faça necessário. Independente de futuro aditamento, desde já se apresentam três testemunhas. Dá-se à causa o valor de R$3.600 (três mil e seiscentos reais), ainda que inestimável o objeto tutelado. Umuarama, 17 de junho de 2017 WILLIAN LIRA DE SOUZA 5° Promotor de Justiça ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 43/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA Rol de testemunhas: Hermes Pimentel da Silva, marido da usuária, residente em uma chácara ao lado do Parque Arco Íris, próximo ao final da rua H, Umuarama, Paraná, telefone: (044) 626 7908; Rosângela Moreno Silva, irmã da usuária, residente na rua Marcos Moreno Cabeção, nº 755, bairro Alto Boa Vista, Umuarama-PR; Ronaldo de Souza, médico, crm 2.247, podendo ser encontrado no Hospital Cemil, situado na Av. Ângelo Moreira da Fonseca, nº 3415, Umuarama-PR Fabrizio Sakabe, médico, crm 20.335, podendo ser localizado na Secretaria de Saúde do Município de Umuarama, centro de especialidades Endocrinologia, neste município e comarca. ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. Fórum, CEP 87501-200, Umuarama-PR – (44) 622-8302 - [email protected] - pág: 44/45 5ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE UMUARAMA RELAÇÃO DE DOCUMENTOS ANEXADOS À INICIAL 1) DOCUMENTOS RELATIVOS À USUÁRIA DO SUS ROZILENI ALVES MORENO a. Termo de declarações prestadas perante esta Promotoria de Justiça; b. Prontuário elaborado pelo médico Fabrízio Sakabe c. Resumo clínico do tratamento para desensibilização realizado no HC da USP; d. Carteira de Trabalho 2) REQUERIMENTO DO MEDICAMENTO FORMULADO À 12A REGIONAL DE SAÚDE; 3) OFÍCIO ENVIADO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO; 4) RESPOSTA DO CEMEPAR NEGANDO O MEDICAMENTO; 5) PLANO DE REORGANIZAÇÃO DA ATENÇÃO À HIPERTENSÃO ARTERIAL E AO DIABETES MELLITUS – MINISTÉRIO DA SAÚDE; 6) ARTIGOS CIENTÍFICOS A RESPEITO DA INSULINA LANTUS© a. Departamento de pesquisas da Fundação Cima's; b. Diabetes Care – Washigton-DC, USA; c. National Institute for Clinical Excellence – Londres, Inglaterra. 7) REPORTAGEM DO JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO; 8) PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS: a. Petição inicial e decisão concessiva de antecipação de tutela em trâmite na comarca de Bandeirantes-PR; b. Decisão concessiva de antecipação de tutela nos autos 260/2004, em trâmite na 1a Vara Cível da Comarca de Umuarama e decisão do relator do Agravo de Instrumento mantendo a decisão liminar; ______________________________________________________________________ Rua Des. Antonio F. da Costa, s/n, ed. 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