Universidade Federal Fluminense Disciplina: Dispositivos Semicondutores Prof.: Wainer Assunto: Junção p-n Capítulo I 1 - A Junção p-n O fato de se poder dopar diversas regiões de um mesmo material semicondutor com diferentes materiais doadores e aceitadores possibilita a fabricação de uma grande variedade de dispositivos eletrônicos. A transição brusca de uma região tipo p para outra tipo n é chamada junção p-n. Em quase todos os dispositivos semicondutores existe pelo menos uma junção p-n. Por esta razão, este capítulo é iniciado com o estudo estudo detalhado da junção p-n. Ele servirá de base para compreensão da operação dos dispositivos semicondutores. 1.1 – Fabricação da Junção p-n A tecnologia de fabricação de junções evoluiu muito desde que o transistor de junção foi inventado em 1948. Os métodos mais empregados atualmente são a difusão e a implantação iônica. Abordaremos aqui apenas o método da difusão. A figura 1 mostra as etapas mais importantes na fabricação da Junção p-n. O primeiro passo consiste na obtenção da pastilha de silício. A pastilha, com espessura de alguns décimos de mm, é obtida pelo corte em fatias de um bastão de Si. Este bastão é obtido através do método vertical, conhecido também como método de Czochralski. Posteriormente esta pastilha é dopada com material doador (Fósforo) tornando o material semicondutor (Si) num material tipo n. A pastilha é então levada ao forno numa atmosfera de oxigênio puro para formação de uma fina camada de óxido SiO2(fig.1b). A etapa seguinte é a da fotolitografia, que é utilizada para remover seletivamente o óxido de algumas regiões nas quais deseja-se fazer a difusão. Uma película de resina foto-resistiva, um líquido orgânico polimérico, é espalhada sobre a camada de óxido e levada a um forno para secar. A resina é solúvel em certos solventes, a não ser que esteja polimerizada. A polimerização é feita por luz ultravioleta que passa pelas aberturas de uma máscara colocada sobre a resina e contendo o desenho desejado. A fig.1c mostra a parte opaca da máscara evitando que a área na qual se deseja fazer a difusão seja exposta à radiação ultravioleta. Em seguida usa-se solvente para remover a resina da região não exposta e depois coloca-se a pastilha num banho de ácido, que corrói a camada de óxido na região onde a resina foi removida. Este processo abre uma janela na camada de óxido através da qual é feita a difusão de material tipo p(fig.1d) num forno a alta temperatura(da ordem de 1000ºC). Finalmente, a estrutura é completada com a deposição de filmes metálicos para contato externo(fig.1e). Figura 1 - Etapas de fabricação de uma Junção p-n : (a)pastilha de Si dopada com material doador; (b) camada óxida sobre o Si; (c)ilustração do processo de fotolitografia para polimerizar certas regiões da resina fotoresistiva; (d) difusão de material tipo p através da janela aberta no óxido; (e) estrutura completa da junção com contatos metálicos. 1.2 – Junção p-n em equilíbrio Para entender o que ocorre na junção em equilíbrio, vamos supor que as regiões p e n do semicondutor estão fisicamente separadas antes da junção ser formada. Nesta situação o nível de Fermi está próximo da banda de condução do lado n e próximo da banda de valência do lado p, como ilustrado na fig.2a. Suponhamos agora que os dois materiais são postos em contato para formar a junção de modo que o nível de Fermi seja constante. Como há excesso de elétrons em relação as lacunas no lado n, há uma difusão de elétrons do lado n para o lado p. Do mesmo modo, ocorre difusão de lacunas do lado p para o lado n. Esta difusão de cargas de um lado para outro produz duas camadas de carga, ilustrada no topo da fig.2b. Estas camadas de cargas criam um campo elétrico E dirigido do lado n para o lado p, que se opõe a continuação do movimento de cargas causado pela difusão. O campo E empurra as lacunas de volta ao lado p e os elétrons de volta ao lado n, através de uma corrente de deriva(corrente de drift) que se opõe a corrente de difusão. No regime de equilíbrio as correntes de deriva e de difusão se anulam, tanto para elétrons quanto para lacunas, de modo que a corrente total é nula. Nesta situação, a distribuição de cargas e o campo elétrico adquirem uma configuração estacionária. Figura 2 : (a) Semicondutores p e n separados; (b) Carga, campo elétrico, potencial e níveis de energia na região de depleção da junção p-n. A região nas proximidades da junção onde há cargas não compensadas, mostrada na fig.2b, é chamada de região de transição ou de região de depleção. Esta região possui um tamanho(w) que pode ser obtido pela fórmula abaixo: O campo elétrico E criado nesta região corresponde a uma diferença de potencial Vo entre o lado p e o lado n. Esta diferença de potencial tende a impedir a passagem de portadores majoritários do lado p (lacunas) para o lado n e dos portadores majoritários do lado n (elétrons) para o lado p. Por este motivo o potencial é chamado de barreira de potencial(também conhecido como potencial de contato). Como só há variação na direção x, o campo elétrico pode ser obtido por: Onde V é o potencial e pode ser dado pela seguinte fórmula: 1.3 – Junção p-n Polarizada Consideremos um dispositivo semicondutor constituído de regiões p e n contíguas, ao qual seja conectado um terminal em cada extremidade, conforme indicado na figura abaixo: Quando uma junção é polarizada, isto é, submetida a uma diferença de potencial externa, o equilíbrio é alterado resultando numa corrente. Entretanto, a característica essencial da junção p-n é sua assimetria em relação ao sentido de aplicação da tensão externa. Tensões em sentidos diferentes produzem correntes de intensidades diferentes. Isto pode ser compreendido examinando o efeito da tensão externa na barreira de potencial. Além disso, a concentração de partículas portadoras em cada um dos lados da junção p-n varia de acordo com a tensão aplicada, devido à variação da difusão de partículas portadoras através da junção. Poderemos, por aproximação, considerar que uma tensão externa V aplicada nos terminais da junção, aparece quase inteiramente através da região de transição. Isto ocorre porque as perdas nas regiões neutras p e n podem ser desprezadas, uma vez que na maioria dos dispositivos a dopagem é alta e o comprimento de cada região é pequeno em relação à seção reta. Assim, a resistência em cada uma das regiões neutra é muito pequena. Logo a tensão externa soma-se ou subtrai-se do potencial Vo da barreira em equilíbrio, dependendo de seu sentido, como ilustrado na fig.3. Figura 3 - Efeito de tensão externa na região de transição e na altura da barreira de potencial: (a) situação em equilíbrio; (b) polarização direta; (c) polarização reversa. Quando a tensão V é aplicada no sentido do lado p para o lado n, ou seja, aplicamos uma tensão de polarização direta Vf, a barreira de potencial eletrostático é reduzida e passa a ter um valor menor igual a Vo - Vf (fig.3b). Por outro lado, se V tem o sentido de n para p, ou seja, aplicamos uma tensão reversa Vr, a barreira de potencial aumenta, passando a ter um valor maior igual a Vo + Vr (fig.3c). É fácil verificar que o campo elétrico E e a largura da região de transição w também variam com a tensão externa aplicada. Quando a tensão V tem o sentido direto a diferença de potencial na barreira diminui, portanto o campo E também diminui. Da mesma forma, a largura da região de transição diminui. Podemos calcular os valores de E e w substituindose Vo por Vo – Vf nas equações (1) e (2). Por outro lado, quando a junção é polarizada no sentido reverso, a altura da barreira, o campo elétrico e a largura da região de transição aumentam. Os valores de E e w são encontrados substituindo-se Vo por Vo + Vr nas equações (1) e (2). Os diagramas de banda de energia são mostrados na figura 4: Figura 4 - Efeito de tensão externa no diagrama de banda de energia: (a) situação em equilíbrio; (b) polarização direta; (c) polarização reversa. 1.4 – Injeção de Portadores É o processo pelo qual introduzimos no material semicondutor um excesso de partículas. Temos dois tipos de injeção de partículas portadoras, que são : de alto nível e de baixo nível. Nos restringiremos a estudar injeção de baixo nível. Na injeção de baixo nível a introdução de partículas portadoras vai provocar variação na densidade de partículas portadoras minoritárias, pois a ordem de grandeza do excesso será intermediária em relação às densidades de partículas portadoras minoritárias e majoritárias. Após a injeção, a ordem de grandeza da densidade de partículas portadoras minoritárias será a mesma do excesso. A injeção não afetará a densidade de partículas portadoras majoritárias, uma vez que a ordem de grandeza é maior que a do excesso. Logo sua ordem de grandeza será mantida. Analisaremos agora como a injeção de portadores afetará junção p-n. Primeiramente, vamos convencionar que no equilíbrio a densidade de lacunas do lado p seja pp e que a densidade de lacunas do lado n seja pn. Para os elétrons temos, a densidade de elétrons do lado p seja np e a densidade de elétrons do lado n seja nn. Podemos relacionar a concentração de lacunas nos dois lados da junção p-n através da equação abaixo: Também podemos relacionar a concentração de elétrons nos dois lados da junção pn através da seguinte equação: Observando as equações acima, pode-se perceber que a aplicação de uma tensão externa influenciará diretamente nas concentrações, devido a mudança de Vo (potencial de contato no equilíbrio) para Vo – Vf, no caso de polarização direta, ou para Vo + Vr, no caso de polarização reversa. Agora, para relaciona a concentração de lacunas dos dois lados usaremos a seguinte equação: Onde V é a tensão externa, seja ela referente a polarização direta Vf ou polarização reversa Vr. Para encontrarmos a variação da concentração de partículas portadoras no dispositivo, podemos dividir a equação (3) pela equação (5). Como visto no início da seção, quando trabalhamos com injeção de baixo nível as mudanças na concentração de partículas majoritárias são desprezíveis, isto implica que, Logo, Então temos, A equação (6) indica que, com a aplicação de uma tensão de polarização direta, a densidade de partículas portadoras minoritárias, no caso de lacunas, aumenta muito na região neutra do lado n próximo à região de transição. Havendo portanto uma forte injeção de lacunas naquela área. A figura abaixo indica a densidade de lacunas do lado p e do lado n devido à injeção de partículas portadoras pela aplicação de uma tensão de polarização direta: Considerando que, à medida que as lacunas são injetadas na região n elas não conseguem penetrar muito sem se recombinarem, havendo um número cada vez menor de lacunas à medida que x aumenta, como podemos observar na figura acima. Podemos calcular o excesso de lacunas existentes na área correspondente a região xno, ou seja, logo no início da região neutra tipo n, subtraindo a densidade de lacunas que existiriam naquela área em condições de equilíbrio (pn) a partir da equação (6), onde p(xno) dá a densidade de lacunas existentes na região, quando uma tensão direta Vf é aplicada ao dispositivo. Para calcular este excesso utilizamos as equações abaixo: Deixamos a cargo do leitor desenvolver o mesmo procedimento para o caso dos elétrons injetados na região p. Você deverá chegar a equação (9) que dá o excesso de elétrons na área correspondente a região –xpo. Voltando à análise das lacunas. Considerando que as lacunas injetadas em excesso na região n tendem a se recombinarem com os elétrons à medida que se difundem no material tipo n, podemos definir a distribuição de lacunas na região n (partículas minoritárias) pela solução da equação de difusão em função do comprimento de difusão de lacunas Lp, isto é , em função do coeficiente de difusão Dp e do tempo de vida médio das partículas minoritárias.