Quando se fala em "Ganfei", imperativamente terá que se falar em S. Teotônio, aquele que foi o 1º Santo Português, amigo e conselheiro do Rei Afonso I, mais conhecido por Dom Afonso Henrique (o 1º rei de Portugal). Teotónio era filho de ricos e nobres Senhores do Alto Minho, onde nasceu no ano de 1082 no Lugar de Tardinha de, freguesia de Ganfei, conselho de Valença. Menino ainda, tinha 10 anos apenas, quando foi estudar em Coimbra na companhia de seu tio que fora eleito Bispo da Diocese. E desde os primeiros estudos que o jovem D. Teotónio começou a distinguir-se entre os demais estudantes pelo brilho da sua inteligência e pelo valor das suas virtudes. Por morte de seu tio passa para Viseu a continuar os estudos junto de um outro que era o Prior da Colegiada que ali tinha os Cônegos Regrantes de Santo Agostinho. Lá continuou a estudar até receber as sagradas ordens, e de cada vez mais crescia o brilho e a fama da sua inteligência e das suas virtudes. A sua vida é um alto exemplo para todos os fiéis. Sempre alegre como quem anda na graça de Deus, vivia com a maior sobriedade longe dos prazeres do mundo. Não havia quem melhor do que ele pudesse servir de modelo no cumprimento rigoroso dos seus deveres, que o cumprir cada um as obrigações do seu ofício é o primeiro passo no caminho da santidade. Afastava-se de todos os prazeres que não fossem da mais pura ordem espiritual. Contam os cronistas que ele reduzia ao mínimo as refeições pelo gozo de passar fome e sede por amor da justiça. Não havia em sua casa nem mesa onde comer nem leito em que repousasse. Para dormir bastavam-lhe uns palmos de terra. E com muito poucas horas se contentava, que todo o tempo achava pouco para rezar a Deus, consolar os aflitos, tratar carinhosamente os enfermos, e conduzir os homens pelo caminho da virtude. Realizava, enfim, com sublime dedicação todas as Obras de Misericórdia. Ao ver o seu rosto onde a pureza e a bondade transpareciam em claro sorriso, ninguém diria que sob as vestes do hábito o corpo lhe sangrava espicaçado pelos ferros dos cilícios. Tanta bondade e tanta virtude rodeiam-no de veneração e simpatia. O clero respeita-o e admira-o. E não há dignidade que lhe não pretendam conceder. Para evitar ser nomeado Bispo de Viseu, foge de Portugal como um pobre e humilde peregrino a caminho da Terra Santa de Jerusalém. Ali se demora durante um ano a seguir os últimos passos da vida de Cristo desde a varanda de Pilatos até ao monte do calvário. Regressa a Portugal. Mas as saudades daqueles santos lugares em que sentia mais de perto a presença do,Senhor e as suas divinas dores, não se apartam do seu coração. Abala de novo para a Terra Santa e é nesta viagem que se dá o seu primeiro milagre. O navio em que seguia foi assaltado por uma grande tempestade no mar Egeu, lá para as bandas da Turquia, terra de inimigos e infiéis. A ameaça dum naufrágio em tão perigosas paragens enchia os olhos de pranto e punha as almas em susto. É então que o Santo se dirige aos pobres aflitos de tão atormentada viagem e lhes promete que se todos se arrependessem dos seus pecados e, devidamente confessados, se preparassem para ter a morte dos justos, a tempestade amainaria e as suas vidas seriam salvas. Ouviram os navegantes as suas palavras e ouviu-as também o Senhor dos Céus. E agora começa ele a ouvir todos em confissão. Conforta-lhes as almas. com a esperança na vida eterna. A sua absolvição derrama a tranquilidade nos corações aflitos. E é depois disto que se dá o divino milagre! Em meio da cerração, um Sol brilhante esfarrapa o negrume das nuvens. O vento deixa de soprar e de assobiar nas cordas e nos mastros. As ondas encrespadas amansam como por encanto, e o mar faz-se chão e tranquilo como espelho dum lago. Depois desta nova visita à Cidade Santa, regressa Teotónio à sua Pátria, que nesse tempo era ainda o Condado de Portugal, com intenção de preparar as suas coisas para voltar de novo e para sempre a Jerusalém. Mas o homem põe e Deus dispõe. E foi nessa altura que os Cônegos de Santo Agostinho resolveram fundar uma pequena comunidade em Coimbra. Reunidos em capítulo para elegerem o seu Prior, logo por voto de todos, e bem contra a vontade do Santo, foi D. Teotônio eleito Prior-Mor de Santa Cruz. Nessa altura andava D. Afonso Henriques nas suas grandes batalhas contra os Moiros. E tanta amizade e dedicação dedicava o jovem Rei de Portugal àquele sábio e Santo D. Teotónio, ( que já era grande amigo de seus pais e a quem conhecia desde pequenino ) que o escolheu para seu Conselheiro e Diretor Espiritual. Não empreendia EI-Rei nenhuma das batalhas, cercos e assaltos às terras e castelos que ia conquistando para aumentar e firmar o Reino, sem que antes disso se fosse aconselhar com S. Teotónio. Só a ele confiava os segredos que não descobria a mais ninguém, porque pensava EI-Rei que não podia conseguir maior ajuda para si e para os seus guerreiros do que aquela que lhe viesse da mão de Deus. E não via ninguém que mais do que o bom Santo pudesse ter valimento para conseguir o auxílio do Céu. Por isso é que à mesma hora em que o Rei tomava Leiria, Óbidos, Santarém e outros lugares fortes e bem acastelados, estava S. Teotônio com os seus religiosos no Claustro de Santa Cruz pedindo a Deus que estivesse com os Portugueses no bom combate, porque eram para grandeza do Senhor as terras que o Rei conquistava. A fé que D. Afonso Henriques tinha no valor destas orações enchia de ânimo o seu coração e dava forças de gigante às suas cutiladas. De tal maneira se sentia forte com esta capacidade espiritual de D. Teotónio que por toda a parte gostava de afirmar que o conselho e as orações do Santo valiam mais do que a força do seu braço para alcançar as suas extraordinárias vitórias. Quando seu filho, o Príncipe D. Sancho, chegou à idade de aprender, logo El-Rei se dirigiu ao sábio e santo Prior-Mor de Santa Cruz para que ele dirigisse a educação do futuro Rei de Portugal. Passam os anos; e o bondoso sempre a esquivar-se das honrarias e dignidades com que pretendiam honrá-lo o Rei, os Bispos e o Papa. Até que em 18 de Fevereiro de 1162 e com oitenta anos de idade foi chamado à presença do Senhor. Em volta do seu catre recebem a sua despedida e a sua bênção os Religiosos de Santo Agostinho e entre eles EI-Rei D. Afonso que não desampara o seu amigo durante os últimos momentos da sua vida. E com as lágrimas a rolar pelas faces exclamava ao vê-lo dar o último suspiro.- "Primeiro sua alma há de entrar no Céu que o corpo na sepultura." E logo naquela hora começa El-Rei a tratar de promover a canonização do seu querido Santo. Os milagres que depois da sua morte se vão sucedendo são tantos que logo no primeiro aniversário de sua morte subia a sua imagem aos altares. E assim é que, por diligência do nosso primeiro Rei, foi contado no número dos eleitos aquele D. Teotónio que foi verdadeiramente o nosso primeiro Santo, o primeiro que houve no Reino de Portugal. 22/02/ 2010