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Propaganda
Transtornos alimentares na
adolescência
Do que se tratam?
Dra. Beatriz Espírito Santo
Médica pediatra com título de especialização em endocrinologia pela SBEM E SBP
Psicanalista (Escola Brasileira de Psicanálise)
Membro do NIAB (Núcleo de Investigação em Anorexia e Bulimia do HC-UFMG) entre
1999 a 2008
Tese de doutorado neste tema defendida em julho 2008 na UFMG
Anorexia nervosa
Critérios Diagnósticos / DSM-IV
1) Perda de peso levando a manutenção do peso corporal abaixo
dos 85% do esperado; ou fracasso em atingir o ganho de peso
esperado durante o período de crescimento, levando a um peso
corporal abaixo de 85% do esperado).
Na prática IMC < 17,5
2) Medo intenso de engordar, mesmo estando com o peso abaixo
do normal.
3) Perturbação no modo de vivenciar o peso ou a forma do corpo.
4) Nas mulheres pós-menarca, ausência de pelo menos três ciclos
menstruais consecutivos.
Tipo restritivo: apenas restrição alimentar
Tipo compulsão periódica / Purgativo: restrição com períodos de
compulsão ou métodos purgativos
Bulimia nervosa
Critérios diagnósticos / DSM-IV
1) Episódios recorrentes de compulsão periódica. Ingestão, em um período
limitado de tempo (2 horas) de uma grande quantidade de alimentos; e
sentimento de falta de controle;
2) Comportamento compensatório inadequado e recorrente, para prevenir o
aumento de peso, auto-indução de vômitos, laxantes, diuréticos, enemas
ou outros medicamentos, jejuns e exercícios excessivos.
3) Ocorrem, em média, pelo menos duas vezes por semana, por três
meses.
4) A auto-avaliação é indevidamente influenciada pela forma e peso do
corpo.
5) O distúrbio não ocorre exclusivamente durante episódios de anorexia
nervosa.
Tipo purgativo
Tipo sem purgação: outros comportamentos compensatórios inadequados,
tais como jejuns ou exercícios excessivos.
Quadro clínico / fenômenos
O que o médico vê na anorexia?
- assunto comida, mas atenção à falta de apetite geral
- distorção da imagem corporal
- “inferno” familiar, todos de olho!
- amenorréia (antes ou depois). Atenção para desenvolvimento
puberal arrastado = anorexia velada?
- exercícios físicos excessivos
- sensações de fome são ignoradas ou negadas no início
- negam o problema, a resistência ao tratamento é profunda.
Geralmente são levadas ao médico, contrariadas, até mesmo
agressivas.
Quadro clínico / fenômenos
O que o médico vê na bulimia?
- Geralmente desorganizadas, queixosas, vergonha do sintoma
- Procuram o médico ou são trazidas
- Sensação de perda de controle
- Peso próximo da normalidade, sobrepeso, obesidade ou desnutrição
- A bulimia pode se seguir a um quadro de anorexia
- Padrão tudo ou nada
- No início provocam os vômitos
- Nas crises bulímicas: milhares de calorias
- A questão se mostra também em outras áreas: promiscuidade
sexual, entram e saem de curso, vomitam o médico e sua prescrição...
Sinais e sintomas / o que se vê
Anorexia
- dependem da
quantidade de peso
perdido, do tempo
decorrido e da
velocidade desta perda
- quanto mais cedo a
intervenção maior a
possibilidade de
sucesso e menor a
chance de seqüelas
Constipação intestinal
Distúrbios de sono
Saciedade precoce
Frequência cardíaca e
pressão arterial baixas
Dor abdominal
(esvaziamento gástrico lento)
Prolapso válvula mitral,
ventrículo esquerdo,
arritmias, alterações ECG
em 75%, parada cardíaca
Ruptura gástrica
Taxa metabolismo basal
diminuída
Intolerância ao frio (tireóide/
hipotálamo/ tecido adiposo)
Edema periférico
Vasoconstrição excessiva,
cianose
Fraqueza muscular,
dormência
Pele seca, escura,
descamativa, e com rugas
Lanugo
Sinais e sintomas / o que se vê
Bulimia
- dependem do grau de desnutrição e do mecanismo compensador
 distúrbios hidroeletrolíticos, desidratação, erosões dentárias,
lesões nos dorsos das mãos e unhas, parótidas aumentadas. Eritema
de palato e gengiva, candidíase oral...
- dor epigástrica, vômitos sanguinolentos, náuseas
- Amenorréia e osteoporose são menos comuns
Diagnóstico diferencial
-
Não é difícil em razão do discurso
-
Na anorexia:
malignidade oculta, tumores hipotalâmicos,
insuficiência
pancreática, doenças intestinais,
hipertireoidismo, diabetes
mellitus tipo 1...
-
Na bulimia:
síndrome de Prader-Willi...
Exames
Não espere alterações na anorexia!
Após seis meses de amenorréia sinais de osteoporose à densitometria
Na bulimia: hipopotassemia, que pode ser grave
Vários exames podem se mostrar alterados, mas sem muito significado
clínico: perfil tireoidiano e lipidograma, perfil hepático, amilase, cortisol
basal, hemoconcentração...
Atenção ao eletrocardiograma na perda aguda de peso (complementar à
avaliação clínica).
De que se trata?
O que pode um médico?
O médico deve escutar atentamente, observar o que se
passa em torno do problema e tratar os agravos clínicos:
as complicações decorrentes da desnutrição ou dos
vômitos
Pode o médico curar seu paciente de sua anorexia
ou de sua bulimia?
Lasègue, 1873
“... ai do médico que, desconhecendo o perigo, tratar
como um capricho passageiro e sem significado essa
obstinação que ele espera resolver através de
medicamentos, de conselhos amigáveis ou do recurso
ainda mais ineficaz da intimidação”.
Hipócrates, séc. V a.C.
Tratado Arte
“De fato, pedir à arte o que não é da arte ou à natureza o que não é da
natureza é ser ignorante e ser de uma ignorância que está mais ligada
à loucura do que à falta de instrução. Sobre as coisas nas quais nos é
dado ter capacidade da ajuda pelos instrumentos fornecidos, pela
natureza e pelas artes nós podemos operar; nas outras nós não o
podemos. Então, quando um homem sofre um mal mais forte que os
instrumentos da medicina, não se pode sem dúvidas esperar que ela
triunfe. (...) Neste caso, com efeito, onde o fogo fracassa, como não
ver que o que ele não consome pede, indubitavelmente, o emprego de
uma arte outra que não seja aquela cujo fogo é um instrumento?”
RECONHECER O LIMITE DA MEDICINA!
De que se trata?
Trata-se de algo que o médico não vê,
mas, porque ele não vê, significa que não exista?
“Não vou fazer a dieta mesmo,
porque minha boca ninguém controla!”
Entretanto, é praticamente impossível ao médico
não sofrer com aquilo que ele vê!
De que se trata?
Trata-se de um sofrimento psíquico que, colocado no corpo,
provoca angústia nos outros. De forma inconsciente o
sujeito provoca o sofrimento dos que o rodeiam para nada
saber do sofrimento que é seu.
Esse sofrimento é singular, ninguém pode falar dele, exceto
o próprio sujeito que o tem.
De certa forma, para não falar o sujeito não abre a boca
para comer. Para não falar ele se entope de comida e
vomita um sofrimento.
Colocado no corpo...
Como não reagir diante da imagem da morte?
O que pode o médico?
“Sobre as coisas nas quais nos é dado ter capacidade da
ajuda pelos instrumentos fornecidos, pela natureza e pelas
artes nós podemos operar; nas outras nós não o podemos.”
Por essa razão o tratamento em equipe.
Médico deve se ater a tratar as complicações orgânicas.
Vários tipos de abordagem, taxa de mortalidade variando entre 10 e
20% na anorexia.
Sendo uma questão de que “minha boca ninguém controla”, como pode
o médico entrar nesse embate achando que irá vencê-lo??
Entretanto, é essa a forma de tratamento mais disseminada na
literatura...
Uma equipe
-
NIAB (Núcleo de Investigação em Anorexia e Bulimia do HC-UFMG),
Hospital das Clínicas, Anexo Bias Fortes
-
Equipe do SUS com médicos clínicos, psiquiatras e psicanalistas,
mas também com suas dificuldades em atender as demandas...
-
De modo simplificado
- Objeto de estudo da medicina: a doença
- Objeto de estudo da psicanálise: a dor de existir
-
O objetivo é deslocar o sofrimento que foi colocado no corpo para
seu devido lugar, de volta para o sujeito, cuidando ao mesmo tempo
das complicações orgânicas, mas SEM QUERER ENGORDAR O
PACIENTE
Como fazer estando no
interior de Minas?
-
O médico não é totalmente impotente
-
Pode observar e escutar seu paciente atento aos agravos orgânicos,
mas sabendo que a questão não está na comida, não está no
comportamento alimentar, é consequência de algo que não se vê,
algo não se mede e que, apesar de pesado, não se pesa...
-
Paciência, não julgar, não usar de intimidação para forçar o paciente
a se alimentar, pois todo o esforço nesse sentido reforça a crença de
que tudo se resuma ao comportamento alimentar. Ao mesmo tempo,
não deixá-lo desassistido.
-
A alta mortalidade reflete a inadequação da abordagem moral para
algo não orgânico = paciente tenta enganar o médico
Como fazer estando no
interior de Minas?
-
Encaminhar os casos graves, IMC < 13
-
Nos outros casos tentar saber do paciente sobre sua vida, suas
expectativas, suas dúvidas, sua dor de viver. Não forçá-lo a se
alimentar e não acreditar que esse problema possa ser tratado com
antidepressivos. Estes podem ser coadjuvantes no tratamento de
alguns casos, mas não são efetivos na sua resolução.
-
Acompanhar a evolução clínica do paciente dando-lhe tempo para
refletir a partir do encontro com o médico ou com um psicólogo,
onde isso for possível, sobre isso que lhe acontece.
-
Caso não se considere apto para esse tipo de atendimento seja
honesto consigo e não o faça, pois se o fizer isso pode ser
prejudicial à si mesmo e ao paciente.
Aspectos clínicos importantes
-
Na anorexia: após perda inicial de peso os pacientes podem manter o
peso corporal no IMC entre 15 e 12 durante longo período.
-
O IMC de 12 é, aproximadamente, o limite da sobrevivência. Parece que
a sobrevivência não é possível com IMC < 10...
-
Os mecanismos de adaptação e a composição corporal na anorexia
nervosa durante a perda de peso são muito similares aos da
desnutrição crônica e diferentes da desnutrição secundária à infecções
(caquexia), pois na anorexia há uma certa proteção dos estoques
protéicos às custas do consumo da gordura corporal, exceto na fase
final.
Daniel Rigaud.Am J Clin Nutr 2000;72:355–60
Henry CJK. Body mass index and the limits of human survival. Eur J Clin Nutr 1990;44:329–35
Melchior, Jean-Claude. Curr Op Blin Nutr Metab Care 1998; 1(6):481
Aspectos clínicos importantes
-
Se IMC < 13: cuidado!
-
O paciente precisa de um profissional que se responsabilize pelo
caso, que seja para ele uma referência. Algumas vezes o trabalho
de muitos (equipe) pode significar trabalho de nenhum!
-
Casos muito difíceis causando muita angústia nos profissionais – a
recusa anoréxica é radical!
-
Nos pacientes muito desnutridos a sobrevivência pode depender da
realimentação. Complicada se não for negociada. SNG ou nutrição
parenteral?
-
Hidratação venosa, potássio, fósforo, vitaminas (tiamina), sódio,
glicose em baixa infusão no primeiro dia.
Aspectos clínicos importantes
Caso seja necessário a realimentação:
cuidado com a síndrome de recuperação nutricional!
Risco nos primeiros dias, mas sinais podem passar desapercebidos, pois são
inespecíficos: rabdomiólise, disfunção leucocitária, falência respiratória e
cardíaca, hipotensão, arritmias, convulsão, coma e morte súbita.
Para evitá-la realimentação deve ser bem lenta e aumento gradual
se fósforo sérico < 1,0 mg/dl: imediata reposição parenteral de fósforo!
sempre repor tiamina (Benerva®, vo, meio comp./dia)
cuidado com sódio e água
Obrigada!
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