Sobre a morte e a morte encefálica

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Sobre a morte e a morte de uma
criança
Eduardo Hecht
Hospital Regional da Asa Sul
SES/DF
www.paulomargotto.com.br
Brasília, 13 de julho de 2011
Henri Cartier Bresson
“Ficar ao lado da família e de um paciente que morreu
ou está morrendo não deve ser assustador ou
doloroso, mas acompanhar um cessar em paz do
funcionamento do corpo. Devemos conscientizar-nos
da singularidade de cada indivíduo dentro da
humanidade. É uma tomada de consciência da nossa
finitude, do nosso limitado período de vida. Ainda
assim neste curto espaço de tempo muitos dentre
nós criam e vivem uma biografia única e nós mesmos
tecemos a trama da história humana.”
Elizabeth Kubler Ross
(Sobre a morte e o morrer)
Considerações sobre a morte

MORTE(Dicionário Houaiss)
◦ Fim da vida, interrupção definitiva da vida humana, animal
ou vegetal. Fim da existência de qualquer ser ou ente da
natureza

Morte Clínica
◦ Cardíaca:Insuficiência das contrações cardíacas devido a
falência ventricular, após o fracasso de todas as manobras
de RCP. Diagnosticada eletrocardiograficamente por
assistolia.
◦ Cerebral(Encefálica):Parada definitiva de toda a atividade
cerebral com a cessação de toda a atividade respiratória
espontânea e presença de exames complementares e testes
físico-químicos confirmando esta falta de atividade, o que
vai definir a morte para fins da lei
Considerações sobre a morte
A morte constitui ainda um medo universal, um
acontecimento inexorável, um tabu, onde se evita
debater e as crianças afastadas destas conversas
 Do ponto de vista psiquiátrico em nosso inconsciente
a morte nunca é possível quando se trata de nós
mesmos. É inconcebível para o nosso inconsciente
imaginar um fim real para a nossa vida na terra.
Durante boa parte de nossa vida acreditamos em
nossa imortalidade. Podemos até aceitar a morte do
próximo, o que só reforça a confirmação inconsciente
da nossa imortalidade. (“ainda bem que não fui eu”)

Elizabeth K Ross Sobre a morte e o morrer
O que mudou no mundo?
Diminuição considerável da mortalidade e
aumento da expectativa de vida
 Mortes passaram a ocorrer mais nos
hospitais
 Maior aparato tecnológico. Menos
contato físico e mais distanciamento
 Mudou o nosso modo de conviver e lidar
com a morte, com o morrer e com os
pacientes moribundos

O que mais mudou ?

Hoje em dia morrer pode se tornar triste
demais, tornando-se um ato mecânico,
solitário e desumano, o paciente não raro é
deslocado de seu ambiente familiar e levado
as pressas para uma UTI
O que mudou com os médicos?





Em era de alta tecnologia estamos encarando cada vez
menos os pacientes como seres humanos, não sabemos seu
nome, chamamos pela sua patologia
Tendemos a nos afastar dos pacientes “condenados”. “Não há
mais nada a fazer”. Prestamos mais atenção aos
equipamentos e exames do que na expressão facial do
paciente
Impedimos que familiares e filhos permaneçam ao lado
daquele que está morrendo dentro de um hospital
Sustentamos longas discussões sobre dizer ou não a verdade
ao paciente
Buscamos alta eficiência, correndo atrás de exames
complementares, ficamos em computadores digitando Ctrl-C
e Ctrl-V e esquecemos de conversar com a criança segurar a
sua mão, sorrir e prestar atenção em uma pergunta
Estamos nos tornando mais ou
menos humanos ?
MÉDICOS
INFUSÕES
VENOSAS
ENFERMEIROS
Criança na
Sala de
Reanimação
PROCEDIME
NTOS
DOLOROSO
S
SEDATIVOS
APARELHOS
Nós Médicos

Fomos formados e preparados para salvar
vidas. Devemos:
◦ Detectar e tratar condições pré-PCR
◦ Ressuscitar e salvar vidas das crianças
Estamos preparados ??
Até que ponto a faculdade nos prepara:
Para confrontar com a morte do seu paciente
Dar suporte aos membros da familia
Para lidar com este nosso “fracasso”
Nossa realidade
Emergência: Morte por quadro agudo (Doenças
respiratórias, Sepse, SMSL, estado de mal, Comas)
 Enfermarias:Paciente Oncológicos, neuropatas, Doenças
metabólicas, nefropatias, hepatopatias

Morte aguda
Contato foi menos íntimo e o envolvimento foi
mais superficial. Fica mais fácil?


A maioria relata que a família principalmente
deseja do profissional médico empatia e
franqueza
O ideal é que o médico que assistiu a morte seja
a pessoa a iniciar o suporte para a família
Durante a reanimação

Pais fora do ambiente de reanimação de preferência,
sendo que de tempo em tempo sendo informado da
evolução clinica e do prognóstico
Decisões de iniciar e interromper
manobras de RCP

Inicie sempre RCP até vir à tona prova em
contrário de que esta não é necessária;
◦ Não iniciar se já existe declaração legal para não
ressuscitar
◦ O paciente tem sinais de morte irreversível como
rigidez cadavérica e lividez permanente
◦ Tentativas de RCP podem colocar em risco a vida do
médico

A decisão de suspender as manobras de RCP em
ambiente hospitalar é sempre da competência do
médico
Timerman, Sérgio Suporte Básico e
Avançado de Vida em Emergências
Quando interromper?
Dentre os vários critérios, o mais significativo é o tempo de
duração dos esforços de RCP
 Se uma criança falha às manobras de RCP após o mínimo de 3
doses de adrenalina sem o retorno da circulação espontânea é
improvável a sobrevivência da mesma, o que leva a um espaço de
tempo de 20-30 minutos
 NÃO INTERROMPER AINDA SE

◦ FV e TV sem pulso ainda não tratada com eletroterapia
◦ Intoxicação por drogas de longo tempo de absorção e metabolismo
◦ Hipotermia

No RN estima-se que a não resposta em 15 minutos de uma RCP
bem administrada permite a decisão da interrupção da mesma
Suporte para a família

Suporte emocional
◦ Privacidade :Sala em que não haja riscos de interrupções,
tenha se possível lenços de papel, copo de água e telefone
◦ Comunicação imediata: palavras claras, precisas, sem termos
técnicos. Diga morte, morreu. Evite expressões faleceu, foi a
óbito
Número mínimo de profissionais e consistência dos
mesmos
◦ Identifique-se,assim como qualquer outro profissional que
ficar no recinto junto com você.
◦ Pergunte ou já previamente saiba o nome dos pais
◦ Sempre utilize o nome da criança
◦ Sente-se junto com a família. Nunca fique de pé. Olhar nos
olhos
Coping with death and dying - PALS Instructor Manual 2005
◦
◦
◦
◦
◦
Evitar pedidos de desculpas. Expresse solidariedade
Disponibilidade
Escutar em silêncio
Empatia
Respeito
Copíng with death and dying- PALS
Instructor Manual - AHA 2005
Suporte para a família

Espere o inesperado
◦ Reações inesperadas podem ocorrer como raiva,
negação, surtos psicóticos ou mesmo estado de
choque
◦ Após todas comunicações, assegure que alguém
ficará disponível, mas permita a privacidade da
família para ela lidar com a dor da perda neste
momento.
◦ Evite fornecimento de sedativos: prejudicam a
memória e a compreensão das informações
◦ Intervenção psiquiátrica: surtos psicóticos agudos
ou ideação suicida
Coping with death and dying- PALS
Provider Manual AHA 2005
Suporte para a família

Suporte técnico
◦ Planejamento: Atestado de óbito, necropsia,
funerária, preservação do corpo, informação para
outros familiares
◦ Orientar priorização de tarefas
◦ Discutir sobre doação de órgãos
Frases que são micos
“Vocês têm outros filhos. Pense neles”
 “Você tem que ser forte”
 “Vocês ainda são jovens e podem ter
outros filhos”
 “Descansou”
 “Foi a vontade de Deus”

Do profissional médico



Não encarar a morte como uma falha
pessoal e profissional. Não ter sentimentos
de culpa e remorso . Profissional procura na
família atitude de aceitação e suporte
quando ele é que deve ser o indivíduo a
fornecer suporte
Evitar comportamentos defensivos
Se você se sente a vontade não tema
expressar seu pesar, choro, mas nunca
inverta o papel de que a família passe a te
dar suporte na intenção de você se sentir
menos culpado pela sua “falha”
Estágios sobre a morte e o morrer
(pacientes crônicos terminais)
Negação
 Raiva
 Barganha
 Depressão
 Aceitação

Do profissional médico
Necessidades emocionais: Podemos sentir
tristeza, raiva, ansiedade, irritabilidade e
exaustão. Dividir com outros profissionais ou
a família
 Necessidades físicas: alimentação, sono,
repouso e um tempo sem envolvimento com
tarefas estressantes diárias

Do profissional médico

Saber reconhecer o quanto seus próprios
sentimentos comprometem na sua habilidade
de conduzir a situação
◦ Se necessário dispense alguns minutos para você
se recompor (sala isolada, lanchonete)
Cuidados paliativos
Cuidados paliativos (OMS) 2002:
“Uma abordagem que aprimora a qualidade de vida dos
pacientes e família que enfrentam problemas associados
com doenças ameaçadoras de vida, através da prevenção e
alívio do sofrimento, por meios de identificação precoce,
avaliação correta e tratamento da dor e outros problemas
de ordem física, psicossocial e espiritual.”
“Quero que você sinta que me importo pelo fato de você ser
você, que me importo até o último momento da sua vida e
faremos tudo que estiver ao nosso alcance, não somente
para ajudá-lo a morrer em paz,mas também para você viver
até o dia da sua morte”.
(Dra Cecily Saunders- Mestre em cuidados paliativos)
Pessini, Leonardo - Humanização e Cuidados Paliativos 3ª edição Edições
Loyola 2006 SP
Cuidados paliativos






Não confundir como desistência, não resolução,
eutanásia ou suspensão das medicações
CP não apressa a morte, apenas a aceita como parte
inexorável do processo
Evitar prolongamento indevido do sofrimento
(distanasia)
Menos tecnologia e mais integração multidisciplinar
Cura da morte versus “não há mais nada a fazer”
Não matar versus não prolongar a agonia, o sofrimento
e a morte
Cuidados paliativos
Humanização do cuidar: O desafio do
cuidar do ser com competência humana e
científica
 Cuidado da dor e do sofrimento
 A não maleficência: em primeiro lugar não
faça mal
 Resgatar a comunicação da equipe de
profissionais de saúde, o paciente e a
família diante deste momento de
fragilidade

Cuidados paliativos






Cuidado integral
Trabalhar com a família do doente
Promover autonomia e dignidade do doente:
elaborar com a família da criança objetivos
terapêuticos
Conceito ativo de terapia. O cuidar continua
quando não se pode mais curar
Proporcionar em torno do doente uma
atmosfera de respeito, apoio e comunicação
Trabalho multidisciplinar
Cuidado Paliativos- Indicações
Enfermidade avançada, progressiva e
incurável
 Falta de possibilidades razoáveis ao
tratamento específico
 Numerosos sintomas, intensos,
multifatoriais e mutantes
 Prognóstico de vida inferior a 6 meses

Doação de órgãos
Pode ser difícil colocar inicialmente este tema no
meio da crise e separar discussões sobre a doença da
criança e o seu prognóstico e a discussão sobre a
doação de órgãos. A família pode associar que sua
conduta na ressuscitação pode ser influenciada pela
decisão ou não de doar órgãos. Dê tempo para a
família para absorver a informação sobre o
prognóstico da criança antes de mencionar o tema
doação de órgãos
 As vezes é necessário um especialista para dar mais
informações
 Reforçar que este processo não adia os preparativos
do funeral

Robert Doisneau
Referências Bibliográficas
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
Kubler-Ross, Elizabeth- Sobre a morte e o morrer, Editora
Martins Fontes 7ª Edição 1996
Kubler-Ross, Elizabeth – A roda da vida, Editora Sextante1ª
Edição 1998
Duda, Deborah – Voltar para casa. Editora Nova Fronteira
PALS Provider Manual- Capítulo Coping with death and dying
– American Heart Association 2005
Timerman, Sergio Suporte Básico e Avançado de Vida em
Emergências. Editora Câmara dos Deputados- Brasilia-DF
Fotos: Henri Cartier Bresson e Robert Doisneau
Pessini, Leo e Bertachini, Luciana- Humanização e Cuidados
Paliativos- Sociedade Brasileira de Bioética, Edições Loyola
São Paulo 2006
Nota do Editor do site
www.paulomargotto.com.br
Dr. Paulo R. Margotto.
Na Neonatologia: Consultem:
Limites de viabilidade e legalidade (XX
Congresso Brasileiro de Perinatologia,
22-24/11/2010)
Autor(es): Jaques Belik (Canadá). Realizado
por Paulo R. Margotto
Quando não iniciar a reanimação em
sala de parto?
Autor(es): J. Goldsmith (EUA). Realizado
por Paulo R. Margotto
Eutanásia, distanásia e ortotanásia
Autor(es): Márcia Pimentel de Castro
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