Ambulatório de Cefaléia Acadêmica Lívia M.B. Tamai 4º ANO FAMEMA - 2010 Prof.Dr. Milton Marchioli Referência: MARTINS, I.P. Enxaqueca: da clínica para a etiopatogenia. Acta MédicaPortuguesa.Portugal, v.22, n.5, p.589-598, 2009. Introdução • Enxaqueca: uma das doenças neurológicas mais frequentes e com maior impacto social e econômico nos países industrializados • Avanços através da biologia molecular e das técnicas de imagem • Contudo,ainda há dúvidas: um marcador biológico fidedigno e terapêuticas eficazes para todas as suas manifestações. • O diagnóstico continua a ser essencialmente clínico. Epidemiologia, comorbidades e impacto social • Afeta 6 a 20% dos adultos nos países industrializados • Estudo longitudinal (EUA): sua prevalência tem-se mantido estável ao longo da última década. • Inicia-se na infância, na juventude ou no início da vida adulta • Na infância afeta cerca de 6 % das crianças até aos 15 anos de idade. Epidemiologia, comorbidades e impacto social • A prevalência aumenta partir da adolescência • Pico pelos 40 anos • Depois dos 50 anos ocorre uma diminuição progressiva da prevalência • Atinge, aproximadamente, 20% das mulheres e 10% dos homens com 40 anos de idade. • Pouco habitual em idosos. Epidemiologia, comorbidades e impacto social • Crises muito incapacitantes: pela dor e pelos sintomas associados • Incapacidade + elevada prevalência = OMS: enxaqueca em 19º lugar na lista de doenças que condicionam maior número de anos vividos com incapacidade. • Abstenção no trabalho + diminuição da produtividade + consumo de cuidados de saúde = elevados custos econômicos Epidemiologia, comorbidades e impacto social Doenças frequentes entre pacientes com enxaqueca: • Doença cerebrovascular (a enxaqueca com aura) • Tremor essencial • Perturbações da ansiedade • Depressão • Doença bipolar • Epilepsia (enxaqueca com aura visual) • Síndromes vertiginosas • Perturbações do sono Epidemiologia, comorbidades e impacto social Os mecanismos para essas associações são vários: • Partilha de fatores genéticos ou de risco • Mecanismos patogénicos comuns (a enxaqueca e a epilepsia, por exemplo, podem partilhar uma maior excitabilidade cortical) • Relações causa-efeito Manifestações clínicas • • • • Cefaléia Intolerância aos estímulos sensoriais Náuseas ou vômitos Sintomas neurológicos transitórios ou aura. • Manifestações têm grandes variações individuais e podem modificar-se ao longo da vida Manifestações clínicas Crise completa de enxaqueca inclui quatro fases: • Pródromos • Aura • Cefaléia • Pósdromos. Manifestações clínicas Pródromos (ou sintomas premonitórios) • Antecedem a crise em horas ou 2-3 dias. • Ocorrem em 20-60% dos doentes • Sensação de fadiga • Dificuldade de concentração • Sonolência • Bocejo incoercívelAlterações do humor • Rigidez cervical Manifestações clínicas Pródromos (ou sintomas premonitórios) • Apetência por determinados alimentos • Retenção hídrica. • Sugerem uma disfunção neuro-endócrina (hipotalâmica) ou cerebral difusa • Demonstram que a crise se inicia muito antes da fase álgica. Manifestações clínicas Aura • Definição: sintomas neurológicos focais, progressivos com duração média de 20 min. • Ocorrem em cerca de 20% dos doentes. • Podem ser visuais (80%), somato-sensoriais, perturbações da linguagem e da articulação verbal e sintomas motores (hemiparesia raros). • Podem começar por fenômenos positivos (fotopsia, espectro de fortificação) que dão lugar a fenômenos negativos (escotomas, ou perda de visão) Manifestações clínicas Aura • Sintomas visuais tipicamente do centro para a periferia do campo visual • Sintomas sensitivos um tropismo particular para a região queixo-oral. • Mais frequente: aura cognitiva envolvendo afasia (com anosmia, parafasias). • Raras: auras cognitivas do hemisfério direito como a amnésia topográfica, a mão alienígena ou o neglect (unilaterais, se instalam em cerca de 5 min e duram menos de1h). Manifestações clínicas Aura • Sintomas motores (hemiparesia ou hemiplegia) duram habitualmente mais tempo e caracterizam a enxaqueca hemiplégica, familiar ou esporádica. Manifestações clínicas Fase álgica • Cefaléia tipicamente unilateral, sobretudo à região temporo-orbitária ou hemicraniana, muda de lado nas diferentes crises. • Forte intensidade, pulsátil • Intolerância aos estímulos sensoriais • Sintomas autonômicos gastrointestinais (náuseas e vômitos) • Sintomas vaso motores (palidez, vasoconstrição periférica, sensação intensa de frio). Manifestações clínicas Fase álgica • Sintomas vasomotores (palidez, vasoconstrição periférica, sensação intensa de frio). • Sintomas cognitivos: dificuldades de atenção, planejamento, monitorização ou outras funções executivas e irritabilidade. • Mudança no comportamento: isolamento, imobilidade, evita estímulos sensoriais, aplicação de frio, compressão local e ingestão de bebidas com cafeína. Manifestações clínicas Fase álgica • Alguns referem alodínia = sensibilização cutânea extrema, a transformação de estímulos táteis em dor • Pele que fica sensível • Estruturas intracranianas desencadeiam dor em resposta a estímulos que habitualmente a não provocam (movimentos bruscos da cabeça) Manifestações clínicas Fase posdrômica ou de resolução • Ausência de dor • Manutenção: queixas cognitivas e intolerância aos estímulos. • Adultos: crises duram entre 4 a 72 horas • Crianças: as crises aliviam frequentemente após o vômito e o sono • ??? O que leva à resolução??? Etiopatogenia Fatores genéticos • Explicam cerca de 50% da vulnerabilidade • Risco de enxaqueca entre os familiares de primeiro grau é 1,9 vezes superior (sem aura) e 3,8 vezes superior (com aura) ao da população em geral Etiopatogenia Mecanismos desencadeantes Principais desencadeantes: • Variações hormonais • Bebidas alcoólicas • Estímulos visuais • Alterações do sono • Estresse Hipótese da modulação do limiar: estímulos suficientemente intensos desencadeiam a crise em qualquer pessoa. Etiopatogenia Marcadores da predisposição Perturbações neurofisiológicas: • Maior excitabilidade do córtex cerebral a vários tipos de estímulos (estímulos visuais, estimulação magnética) • Menor habituação à estimulação • Resultado: menor tolerância aos estímulos sensoriais ou cognitivos Fisiopatologia Terapêutica Medidas gerais • Relação médico-doente: esclarecimento e educação do doente, identificação dos fatores desencadeantes e na prevenção dos fatores de cronicidade. • Antidepressivos, higiene e tratamento das perturbações do sono, perda de peso e exercício regular. • Terapêutica farmacológica individualizada de acordo com frequência e o grau de incapacidade. Terapêutica Terapêutica aguda da crise Fármacos com eficácia comprovada: • Analgésicos • Anti-eméticos • AINES Fármacos específicos para a enxaqueca: • Triptanos • Ergotamina e derivados Terapêutica Analgésicos e AINES • Inibição da inflamação neurogênica e ao efeito analgésico. • Vantagens: podem ser usados no início ou em antecipação da crise (na enxaqueca menstrual); diferentes formas de administração Terapêutica Opiáceos alcalóides • Não se recomenda o uso de opiáceos • Tartarato de ergotamina era o fármaco de eleição no passado • Efeitos adversos que limitam o seu uso: náuseas, vómitos, diarreia, mal estar geral, dores abdominais, cãibras musculares, e vasoconstrição periférica Terapêutica Triptanos • Agonistas parciais dos receptores da serotonina (5HT1B/1D) (central e periférico), com efeito vasoconstritor • Provocam efeitos adversos: queixas précordiais, sensação de tontura, ou rubor e calor cefálicos, parestesias nas extremidades e sensação de fraqueza. • Risco de causar dependência. Terapêutica Triptanos • Efeito vasoconstritor: contra-indicados quando há patologia vascular isquêmica, na hipertensão não controlada e nas formas complicadas de enxaqueca. • Não associar à ergotamina pela potenciação do efeito vasoconstritor. Terapêutica Tratamento para aura • Não existe ainda nenhum fármaco eficaz para a aura • Utiliza-se inibidores dos canais do cálcio e antiepilépticos, na terapêutica de auras prolongadas. Terapêutica Terapia profilática • Aconselhável quando crises são frequentes, prolongadas, incapacitantes ou quando não respondem à terapêutica aguda. • Medicação deve ser mantida, de forma contínua, durante alguns meses. • Muitos doentes mantêm o benefício mesmo depois de interromperem a terapêutica. Terapêutica Terapia profilática Escolha da medicação depende: • Perfil do doente • Existência de patologia associada (indicar ou contra-indicar) • Efeitos adversos Terapêutica Terapia profilática Fármacos com maior eficácia e menos efeitos adversos: • Antiepilépticos devido a maior excitabilidade cortical dos indivíduos com enxaqueca (divalproato de sódio e o topiramato) • Betabloqueantes • Antidepressivos tricíclicos. Terapêutica Terapia profilática Fármacos de segunda linha: • Antagonistas dos canais de cálcio • Outros fármacos