A inserção da Ciência da Informação no âmbito das ciências humanas e sociais Ana Luisa de Vasconcelos Terto Iandara Reis de Oliveira Janicy Aparecida Pereira Rocha Luiz Fernando Campos de Andrade Júnior Marcus Vinicius Rodrigues Martins Serafim B. Santos Filho La ciencia de la información en el contexto de las ciencias sociales y humanas. Ontología, epistemología, metodología e interdisciplina. Miguel Ángel Rendón Rojas RENDÓN ROJAS, Miguel Angel. La ciencia de la información en el contexto de las ciencias sociales y humanas. Ontología, epistemología, metodología e interdisciplina. DataGramaZero Revista de Ciência da Informação, v. 9, n. 4, ago. 2008. (neste link: http://www.dgz.org.br/ago08/Art_06.htm) Miguel Ángel Rendón Rojas Doutor em Filosofia. Pesquisador do Centro Universitário de Investigações Biblioteconômicas da Universidade Nacional Autônoma do México. Área de investigação: Fundamentos da Biblioteconomia e da Informação Principais características do conhecimento científico Sistema de conhecimento sobre uma parte da realidade; A concepção clássica de conhecimento vem de Platão que expressa o conhecimento como uma crença verdadeira e justificada, o que significa que, como crença é um estado do sujeito, este afirma ou nega algo sobre a realidade. Objeto de estudo determinado; A ciência investiga parte da realidade e essa parte constitui seu objeto de estudo. Cada ciência possui um só objeto de estudo e o analisa de uma perspectiva particular. Conhecimentos são verdadeiros; Aristóteles e Tarsky: a verdade é uma característica dos enunciados e consiste na correspondência do enunciado com a realidade. Aplicando a dialética proposta por Hegel e Marx: devemos distinguir entre a verdade absoluta e a verdade relativa Principais características do conhecimento científico Conhecimento são justificáveis (metodologia); A verdade relativa tem lugar quando um enunciado só é verdadeiro em determinadas condições e pode não sê-lo em outras condições. Corpo teórico; Conhecimento científico tem uma estrutura teórica composta por conceitos, enunciados gerais e uma interrelação entre eles. Função epistemológica: compreender a realidade. explicar, predizer e Hempel: a explicação científica consiste em deduzir um fenômeno a partir de leis gerais e condições iniciais. Predição: mesmo processo, porém sem a presença do fenômeno que se deduz. Permite manipular e transformar a realidade para obter ou impedir os fenômenos previstos de acordo com a teoria. Principais características do conhecimento científico Função epistemológica: explicar, predizer e compreender a realidade. (...) Compreensão tem lugar principalmente nas ciências sociais e humanas, onde não é possível descobrir leis gerais que permitam a explicação e a predição científica, já que o mesmo objeto de estudo é um sujeito que tem variáveis difíceis de controlar Metodologia Metodologia é um fator essencial na construção do conhecimento científico. “Una ciencia es una disciplina que utiliza el método científico con la finalidad de hallar estructuras generales (leyes)”. Bunge “Las disciplinas que no pueden utilizar el método científico no son ciencias, ni tampoco las doctrinas prácticas que, como el psicoanálisis, se niegan a utilizar el método científico”. Bunge Metodologia “Los fenómenos de las ciencias sociales también son fenómenos naturales y pueden estudiarse con el mismo método científico que ha resultado tan útil en las ciencias naturales y físicas”. Goldhor Feyerabend (1989): anarquismo metodológico. Defende criatividade, liberdade, imaginação do científico. Rendón Rojas: necessidade de um método para justificar o conhecimento e a existência de uma comunidade científica X método não é único e absoluto. Ciências sociais e humanas São um conjunto de conhecimentos; Tem uma estrutura teórica; Cumprem com a função de compreender seu objeto (sujeito) de estudo; Utilizam metodologia para justificar o conhecimento. Particularidade: estudam a realidade humana - o que obriga a tratar o “objeto” de estudo, que na realidade é o sujeito de estudo, de determinada maneira. A especificidade do sujeito se encontra no fato de que não é um objeto e tem certas características. Ciências sociais e humanas Desafio das Ciências Sociais e Humanas: alcançar o conhecimento evitando a mera descrição e a tentação de converter o sujeito em objeto e, ao mesmo tempo, propor a justificativa de seu conhecimento com uma metodologia que fundamente a verdade de seus enunciados. Metodologia e epistemologia utilizadas nas Ciências Sociais e Humanas: variada; busca contínua e discussão a respeito. Ciência da Informação Objeto de estudo: sistema informativo documental (SID), formado pela interação entre informação, documento, usuário e instituição informativa documental. A inclusão do profissional da ciência documental no sistema informativo documental reflete a natureza social e humana da ciência da informação. Programas de Investigação Científica – Lakatos: concebe o SID como núcleo central do programa científico da ciência da informação. Ciência da Informação SID diferentes teorias para explicar o fenômeno informativo diversidade de propostas teóricas; aparição, transformação e desaparecimento de teorias. Principais categorias do núcleo central do programa de investigação científica: Informação Documento Usuário Instituição informativa documental Profissional da informação documental Considerações finais Epistemologia Filosofia Metodologia Ontologia Em Ciências Sociais e Humanas sempre existirá uma discussão sobre qual marco filosófico será o adequado, o que, longe de ser uma característica negativa, reflete a natureza complexa do fenômeno humano e social. Kuhn: comunidade científica = paradigma científico X Comunidade científica = diversidade de escolas e correntes (Diversidade de enfoques ≠ vale tudo) É a ciência da informação um saber humano ou social? Carlos Fernando Gomes Galvão de Queirós Mestrado em Ciência da Informação – UFRJ Professor UFF In: PINHEIRO, L. V. R. (Org.). Ciência da Informação, Ciências Sociais e Interdisciplinaridade. Brasília; Rio de Janeiro: IBICT, 1999, p. 33- 49. A ciência e as humanidades A Ciência da Informação é uma ciência social? Existe diferença entre uma ciência social e uma ciência humana? Podemos definir a Ciência da Informação como ciência? Linguagem, interdisciplinaridade e a Ciência da Informação A Ciência da Informação é uma “ciência” humana ou uma “ciência” social? A linguagem como instrumento que, por excelência, usamos para transmitir informação e a interdisciplinaridade, base de saberes modernos, tais como a Ciência da Informação. (p. 40) Cada saber é função, em maior ou menor grau, de sua interação com a realidade e, neste ponto, aparece a linguagem como elemento vital da construção de (novos) saberes humanos e sociais. (p. 42) Sendo a informação um instrumento de poder, a linguagem não pode ficar de fora de nenhuma análise que se diga humana e/ou social. (p. 42) Através das linguagens potencialmente universais que podemos transmitir com maior eficiência os conhecimentos acumulados por gerações; é justamente para este campo que mais se devem voltar os estudiosos da informação. (p. 42-43) O homem não é compartimentado, donde concluímos pela impossibilidade de as “ciências” humanas e sociais adotarem métodos e olhares compartimentados para entender as pessoas e as sociedades. (p. 43) Japiassú (1976, p. 61) sugere que recorramos “a métodos menos explicativos e mais compreensivos dos fenômenos humanos” e sociais, complementaríamos. (p. 43) O papel e a função da Ciência da Informação. “A informação é um conhecimento gravado sob a forma escrita (impressa e numérica). A informação comporta um sentido, e, por isso, possui um significado que pode ser transmitido a um ser consciente, por meio de uma mensagem inscrita em um suporte espaço-tempo”. (Le coadic, 1996, p.5 apud Queiros, 1999, p. 44) Desde os anos 80, assistimos a uma explosão(...) louca das ciências. A bioquímica explodiu(...). As ciências humanas patinam um pouco (...). O que mudou dinamicamente a sociedade, na modernidade, foram as ciências exatas. As ciências humanas não foram mais do que um olhar sobre a sociedade. É a diferença que existe entre alimentar uma pessoa ou tirar um fotografia dela. As ciências humanas são uma fotografia de um estado de coisas, enquanto a transformação passa pelas ciências exatas. (Michel Serres, 1997 apud Queiros, 1999, p. 45) Cada vez que resolvo um problema de informática, desemprego 200 trabalhadores, porque melhoro os rôbos. (Michel Serres, Folha de São Paulo, 1997) Organizar a informação disponível talvez seja a principal função do estudioso da informação e dos processos informacionais. (p. 46) A Ciência da Informação pode ser encaixada no ramo das ciências sociais porque tem a preocupação de esclarecer um problema social concreto, o da informação, e voltada para o ser social que procura a informação. (Le Coadic apud Queiros, 1999) Todas as técnicas eletrônicas de informação possuem em comum o fato de emitir, receber, veicular e memorizar ou processar sinais elétricos, isto é, fluxo de elétrons. (...) É informação tudo o que pode ser objeto de processamento digital. (LE COADIC, 1996 apud QUEIRÓS, 1999, p.46) Como digitalizar a essência da dor, do amor, da ansiedade, da felicidade, da inteligência?(p. 46) A CI tem amplo campo de estudo e importância real no mundo dos saberes, pois ela deve, no nosso entender, organizar a informação e seus processos, a base de todo saber, seja ele científico ou não. (p. 47) O processo de comunicação gera um produto – a informação – que é o elemento decisivo na construção do conhecimento humano e social. (p. 47) A ciência da informação não é uma ciência, mas sim um saber humano e social. Vale ressaltar que o saber pode ser entendido como a produção e organização de nosso conhecimento, e que ao ser exteriorizado e trocado com outros indivíduos, gera um novo saber ou, no mínimo, ratifica o antigo saber, reforçando-o. Trabalhamos com a ideia de que a informação é um produto de nosso processo cognitivo (...) está inserida no processo de comunicação, necessitando, desse modo, de um emissor e de um receptor. (QUEIRÓS, 1999, p. 48) Ciência da Informação: nem ciência social, nem humana, apenas uma ciência diferente. José Mauro Matheus Loureiro In: PINHEIRO, L. V. R. (Org.). Ciência da Informação, Ciências Sociais e Interdisciplinaridade. Brasília; Rio de Janeiro: IBICT, 1999, p. 65-78. José Mauro Matheus Loureiro Pós-doutor em Antropologia – UFRJ Doutor em Ciência da Informação – UFRJ Professor – UNIRIO Pesquisador – UFPB e IBICT Consultor – CNPq Histórico CI Gênese: Documentação e recuperação da informação Década de 1940 (após a Segunda Guerra Mundial): Desenvolvimento da CI, com estudos para a solução de problemas informacionais. Histórico CI 1967: Conferência Association da Special Libraries REES e SARACEVIC: “…um ramo de pesquisa que toma sua substância, seus métodos e suas técnicas de diversas disciplinas para chegar à compreensão das propriedades, comportamento e circulação da informação”. Novas conceituações Décadas de 1980/1990: Multiplicidade de visões WERSIG (1993): “…a mesma não deve ser entendida como uma disciplina nos moldes clássicos, mas na qualidade de protótipo de um novo tipo de ciência”. Novas conceituações GOMEZ (1995): “A Ciência da Informação não estaria circunscrita ao território das ‘qualificações do fenômeno’, mas inserida em uma ‘zona transdisciplinar’ que consideraria aspectos físicos, comunicacionais, cognitivos e sociais ou antropológicos”. SARACEVIC (1991): “…a Ciência da Informação é dotada de uma função social e permeada por vigorosa dimensão que ultrapassa sua vertente tecnológica”. Ciências Sociais RIOS (1986): “Elenco de disciplinas que buscam estudar de modo objetivo os sistemas e estruturas sociais, os processos políticos e econômicos, as interações de grupos ou indivíduos diferentes”. TOURRAINE (1994): “…a desconfiança para com o social”. Ciências Sociais Distinção metodológica em relação às Ciências Naturais Sofrem críticas e questionamentos quanto a seus métodos e sua cientificidade Consideradas uma ideologia legitimadora de grupos dominantes Ciências Humanas FREUND (1977): “…pesquisa das múltiplas ações humanas, na medida em que implicam relações dos homens entre si e dos homens com as coisas, bem como as obras, instituições e relações que dela resultam”. FOUCAULT (1995): “A gênese desse conjuntos de disciplinas se dá (…) com a instituição do homem na cultura ocidental, e aquilo que ele deve pensar e saber”. Ciências Humanas As Ciências Humanas têm, disciplinas, as Ciências Sociais entre suas As Ciências Naturais estariam vinculadas ao modo explicativo, enquanto que, as humanas, ao modo compreensivo. Atualmente se tornaram objetos de consumo, empregadas como conhecimento objetivo. CI x Ciências Sociais e Humanas A CI não seria parte das Ciências Humanas ou Sociais devido a: Singularidade de seu objetos de pesquisa; Seus postulados teórico-metodológicos e epistemológicos; Sua estruturação interdisciplinar. CI x Ciências Sociais e Humanas Faz-se necessário o pertencimento da CI ao universo da Ciência tal como a mesma se apresenta hoje ou ela pode representar um modo de transgressão aos paradigmas instituídos pelo panorama científico tradicional? Pode a CI tornar-se instituinte e não somente instituída? CI x Ciências Sociais e Humanas WERSIG (1993): “…não seria a Ciência da Informação um novo tipo de ciência surgida no bojo daquilo que denominam pósmodernidade? Ela não poderia se constituir em uma nova modalidade de produção de conhecimento? Nem ciência humana, nem social, mas heterológica, plural e interrelacional quanto à multidimensionalidade dos saberes”. Considerações finais LOUREIRO (1999): “Que tipo de ciência é a CI é de difícil resposta, o que sabemos é que aqueles que a ela se dedicam, constroem caminhos, demarcam fronteiras e buscam sempre novos desafios”. REIS, Alcenir S.; CABRAL, Ana Maria R. (Org.). Informação, cultura e sociedade: interlocuções e perspectivas. Belo Horizonte: Novatus, 2007. 114 p. RESGATE DA HISTÓRIA DA CI E SUA RELAÇÃO COM OUTRAS CIÊNCIAS Década de 70: CI como ciência social Entra em cena um personagem que redireciona o enfoque da CI: o usuário No início Aproximações seguindo a ótica positivista e funcionalista (mais próximas às ciências exatas que pretendiam a informação reduzida em leis universais e modelos matemáticos) Estudos de ordem quantitativa e estatística RESGATE DA HISTÓRIA DA CI E SUA RELAÇÃO COM OUTRAS CIÊNCIAS Posteriormente Abordagens na dialética marxista (informação e cidadania, ação cultural, democratização da informação, etc.) Entretanto, poucos estudos com atenção aos aspectos sociais da informação. Abordagens cognitivas: centradas no cognitivismo (de referenciais limitados para compreender o fenômeno informacional e o conhecimento) Em suma, informação como algo “objetivo, fixo, imutável e igual para todos, com aplicação universal e de convivência numa relação sem conflitos de poder na sociedade” Década de 80 e 90 “Paradigma alternativo”: a informação não é algo fixo e o sujeito “constrói ativamente o significado da informação em sua interação com outros indivíduos” (num processo de produção de sentido e conhecimento). “Produção de sentido”, que é social e coletiva. Recomendação de ampliação dos métodos de estudo da informação e conhecimento com foco em contextos históricos e culturais (informação como fenômeno social construído coletivamente). A Linha de ICS “Estudos visando compreender os aspectos antropológicos, sócio-culturais e políticoeconômicos da informação e do conhecimento na sociedade contemporânea”. Amplo espectro de temas, sendo que o que lhes dá unidade é o “compromisso de buscar entender em profundidade os problemas que impedem uma verdadeira democratização da informação e dificultam o acesso aos recursos informacionais em igualdade de condições”. CULTURA NA PERSPECTIVA ANTROPOLÓGICA E COMO “OBJETO” DA CI “Sistemas culturais” com duas dimensões básicas: Cultura material. “Cultura simbólica, com símbolos e sinais, a que se atribuem sentidos” (nessa dimensão se incluem o conhecimento e informação). “Cultura como complexo simbólico, uma estrutura coletiva de significados onde se dão as práticas de comunicação, informação e conhecimento” CULTURA NA PERSPECTIVA ANTROPOLÓGICA E COMO “OBJETO” DA CI Pesquisas em CI com enfoque cultural: “Visa compreender como a informação adquire sentido para os sujeitos”, considerando que não tem “significado homogêneo, fixo ou imutável, mas que é conferido pelos sujeitos, que a absorvem de modos diferentes, conforme sua posição na sociedade”; Incorpora a questão do “poder”, dos conflitos de interesses envolvidos na luta por informar, produzir, acumular e distribuir informação”; Conhecimento, nesses sentidos, “assume característica de fator de mudança social”. Marco Teórico Eixo norteador de análise Fenômeno da Informação só pode ser Essas categorias permitem a compreensão apreendido considerando as seguintes dialética da realidade social (na qual se categorias: insere a informação) Historicidade Abordagem da problemática informacional Tensionalidade numa visão dialética. Totalidade Perspectivas de abordagem: Informação como produto social Sociedade brasileira, modo de produção capitalista e incorporação de tecnologias de informação (e suas contradições) Produção, organização e uso da informação considerando-se o contexto histórico da realidade social Informação e interdisciplinaridade: contradições no âmbito do discurso e prática concreta Informação, papel na legitimação de status social ou como possibilidade de mudança de status Compreensão de “usuários”: inserção, produção de significados, interações... O fenômeno informacional só é passível de interpretação e compreensão em um contexto histórico-político, no qual se configuram as relações sociais e a construção da realidade social. Dimensões de análise da informação na ICS: histórica, sociológica, política e ideológica. Referências LOUREIRO, José M. M. Ciência da Informação: nem ciência social, nem humana, apenas uma ciência diferente. In: PINHEIRO, Lena V. R. (Org.). Ciência da Informação, Ciências Sociais e interdisciplinaridade. Brasília: IBICT, 1999. p. 33-49 e 65-77. QUEIRÓS, C.F.G.G. de. É a ciência da informação um saber humano ou social? PINHEIRO, Lena Vânia Ribeiro. Ciência da informação, ciências sociais e interdisciplinaridade. Brasília; Rio de Janeiro: IBICT/DDI/DEP, 1999. REIS, Alcenir S.; CABRAL, Ana Maria R. (Org.). Informação, cultura e sociedade: interlocuções e perspectivas. Belo Horizonte: Novatus, 2007. 114 p. RENDÓN ROJAS, Miguel Angel. La ciencia de la información en el contexto de las ciencias sociales y humanas. Ontología, epistemología, metodología e interdisciplina. DataGramaZero - Revista de Ciência da Informação, v. 9, n. 4, ago. 2008. (Disponível em: http://www.dgz.org.br/ago08/Art_06.htm)