Universidade de Coimbra Faculdade de Medicina 2010 Enfarte do Miocárdio Unidade Curricular de Bioquímica II Seminário Orientado 24 Realizado por: Tiago Duarte Tomás Carvalho Vera Seara Vítor Silva Vítor Rodrigues Xavier Ferreira Zélia Monteiro Caso Clínico Motivo de internamento: Dor pré-cordial (forte suspeita de enfarte do miocárdio) História Clínica: O G.D. é um doente de 54 anos, sexo masculino, 89 Kg de peso, 1,70 m de altura Na sequência de uma discussão com um vizinho refere sensação de “aperto” no peito, “dificuldade em inspirar o ar”, sudorese e “dor de cabeça” (cefaleias). Recorre ao Serviço de Urgência (SU) dos HUC após 7 horas de dor aguda e intermitente no peito, ficado internado na Unidade de Cardiologia. Caso Clínico Antecedentes Pessoais: Hipertensão arterial e hipercolesterolémia, documentadas desde há cerca de 5 anos. Antecedentes Familiares: Mãe – Hipertensão arterial; Pai Falecido por enfarte do miocárdio. Caso Clínico Exame Objectivo: • Doente consciente, orientado no tempo e no espaço. • Auscultação cardiopulmonar - sem alterações evidentes • TA – 130/60 mmHg • Sem edemas dos membros inferiores Hipótese Diagnóstica: Isquémia do miocárdio (Angina de peito/Enfarte do miocárdio) Enfarte do Miocárdio “No enfarte do miocárdio o fluxo sanguíneo que chega ao coração é reduzido ou interrompido de forma brusca e grave e, consequentemente ocorre a necrose de uma região do músculo cardíaco por falta de nutrientes e oxigénio.” In Manual Merck Enfarte do Miocárdio - Sintomas • Dor espontânea provocada por esforço, emoções ou stress; • Dor no meio do peito que se estende na direcção das costas, do queixo ou do braço esquerdo; • Arritmia; • Suor frio, enjoo, vómito, ansiedade ou dificuldade na respiração podem acompanhar a dor. Apesar de todos estes possíveis sintomas, um em cada cinco doentes que sofrem um enfarte têm apenas sintomas ligeiros ou não apresentam nenhum tipo de sintoma. Enfarte do Miocárdio - Causas •O enfarte do miocárdio ocorre geralmente quando a obstrução de uma artéria coronária restringe gravemente ou interrompe o fornecimento de sangue a uma região do coração. • Se a isquémia (deficiência de oxigénio) persistir mais do que alguns minutos, o tecido cardíaco é destruído. • A capacidade do coração para continuar a bombear depois de um ataque cardíaco depende directamente da extensão e da localização do tecido lesionado. Enfarte do Miocárdio - Causas • A causa mais frequente de obstrução de uma artéria coronária é um coágulo sanguíneo. Geralmente, a artéria já está parcialmente obstruída por ateromas. Um ateroma pode rebentar ou rasgar-se e criar uma maior obstrução, o que provoca a formação de um coágulo. Enfarte do Miocárdio - Epidemiologia • O enfarte miocárdio é uma doença que na Europa afecta por ano quase um milhão de pessoas e em 1/3 dos casos leva à morte. • É a principal causa de morte nos países industrializados. Das mortes consequentes a um enfarte, cerca de 60% acontecem na primeira hora após início dos sintomas, em geral por uma arritmia severa chamada de Fibrilhação ventricular. • A mortalidade pós enfarte é diferente conforme a faixa etária, sendo maior nas faixas etárias mais avançadas. Enfarte do Miocárdio - Diagnóstico Segundo a OMS, o diagnóstico é feito a partir de 3 áreas: • Clínica • Electrocardiográfica - Electrocardiograma (ECG) - Ecocardiograma ou um estudo radioisotópico (exames complementares) • Bioquímica - Medição das concentrações sanguíneas de determinadas enzimas (CK-MB); Caso Clínico Exames Complementares de Diagnóstico: • Electrocardiograma: Elevação do segmento ST (compatível com enfarte agudo do miocárdio). • Análises bioquímicas: doseamento da creatina Cinase (CK), total e isoenzima CK-MB, lactato desidrogenase (LDH), transaminases (TGO e TGP) e troponina I. 1. Interpretar as alterações nos níveis de Creatinina Cinase (CK) 1. Interpretar as alterações nos níveis de Creatinina Cinase (CK) • A creatina cinase catalisa biossíntese de creatina fosfato, segundo uma reacção reversível a partir da creatina e do ATP. • A creatina fosfato é um composto altamente eficiente no armazenamento de energia, cujo catabolismo muscular vai permitir regenerar, de forma imediata, os níveis de ATP enquanto a glicogenólise é activada. (situações de esforço físico intenso e de curta duração). • A creatina cinase é uma enzima composta pela união de duas subunidades do tipo B e/M. • No nosso organismo existem três isoenzimas da creatina cinase, presentes maioritariamente em tecidos distintos: -CK BB – próstata, útero, tiróide, cérebro e musculatura esquelética lisa; -CK MB – músculo cardíaco -CK MM – músculo esquelético • A ampla distribuição da creatina cinase nos vários tecidos do nosso organismo, torna o doseamento sérico da creatina cinase total um método insuficiente para o diagnóstico do enfarte do miocárdio visto ter baixa especificidade. • Somente no miocárdio se encontra a isoenzima contendo as subunidades M e B, pelo que esta só incrementa a sua concentração no plasma em caso de lesão do miocárdio. Caso Clínico Exames Complementares de Diagnóstico: • Resultados dos doseamentos enzimáticos: CK total (N=38-134) CK-MB (N=<5%) Troponina I (N= não doseável) Admissão 182 U/I 6,8 % 76 ng/ml Após 12h de internamento 228 U/l 8% 71 ng/ml 24h após internamento 286 U/l 10,8% 60 ng/ml Caso Clínico Exames Complementares de Diagnóstico: • Electrocardiograma: Elevação do segmento ST (compatível com enfarte agudo do miocárdio). • Análises bioquímicas: doseamento da creatina Cinase (CK), total e isoenzima CK-MB, lactato desidrogenase (LDH), transaminases (TGO e TGP) e troponina I. 2. Seria de esperar alguma alteração nos níveis de LDH ou das transaminases, TGO e TGP? Porquê? 2. Seria de esperar alguma alteração nos níveis de LDH ou das transaminases, TGO e TGP? Porquê? • A LDH é um tetrâmero constituído por 4 subunidades. Existem 2 tipos diferentes de subunidades, o que permite a formação de 5 tipos de isoenzimas. • Em caso de enfarte do miocárdio, há um grande aumento de LDH-1 no plasma, enquanto que a concentração de LDH-5 não sofre grandes alterações. • As transaminases catalisam a transferência de grupos amina de aminoácidos para α-cetoácidos. • No enfarte do miocárdio, é de esperar um aumento dos níveis de TGO. • Os níveis de TGO aumentam a partir das 8-12 horas após a lesão, atingindo os seus valores máximos entre as 24-48 horas subsequentes. Entre o 4º e o 6º dias, os seus valores tornam-se normais. Caso Clínico Exames Complementares de Diagnóstico: • Electrocardiograma: Elevação do segmento ST (compatível com enfarte agudo do miocárdio). • Análises bioquímicas: doseamento da creatina Cinase (CK), total e isoenzima CKMB, lactato desidrogenase (LDH), transaminases (TGO e TGP) e troponina I. Troponina I • As troponinas são componentes proteicos que fazem parte da musculatura estriada cardíaca. • Existem em três tipos: a Troponina C, a Troponina T e a Troponina I ligadas entre si e a tropomiosina. •A Troponina C possui a mesma estrutura no músculo esquelético e no músculo cardíaco, ao contrário da Troponia T e I. •A Troponina T e I apenas são encontradas no plasma em caso de necrose do músculo cardíaco. 3. Quais os efeitos da terapêutica colestiramina e prevastatina? com - Colestiramina • A Colestiramina é uma resina de troca iónica. Ao actuar sobre os ácidos biliares, impede a sua reabsorção, interrompendo seu ciclo entero-hepático, causando assim o aumento da eliminação destes nas fezes. O seu efeito (indirecto) a nível hepático traduz-se: - Aumento da conversão de colesterol em sais biliares - Aumento da síntese de colesterol e de VLDL. - Aumenta também a expressão de receptores B-E de grande afinidade por LDL. O resultado final é: - Redução do colesterol total e do LDL-colesterol de até 30% - Aumento da HDL de até 8% - Aumento de triglicerídeos na ordem de 10 a 20%. • A colestiramina deve ser utilizada em pacientes que não tenham respondido adequadamente a dieta, exercício e outras medidas, nas doses 16-24 g/dia, com o objectivo de reduzir o LDL-C (1530%) e, consequentemente o risco de eventos coronários. • Efeitos adversos: ― Obstipação , náuseas, vómitos e meteorismo. ― O uso de Colestiramina pode causar acidose metabólica hiperclorémica, em particular entre idosos, crianças ou pessoas com doenças renais. ―Diminui a absorção de vitaminas lipossolúveis (A,D e K) e ácido fólico. ― Interfere na absorção da digoxina, tiroxina, tiazídicos, vastatinas e fibratos, devendo estas drogas ser administradas com intervalos de 1 hora antes ou 4 horas depois do uso da colestiramina. ―Pode ocorrer aumento das enzimas hepáticas, principalmente se usada de forma associada com as estatinas. - Prevastatina • Pertence ao grupo das estatinas, que são inibidoras reversíveis da HMG-CoA reductase. • É absorvida no intestino e metabolizada no fígado pelo citocromo P450, originando metabolitos activos e inactivos. Prevastatina Colesterol • Inibe a síntese de colesterol na célula, por inibição da enzima HMG-CoA reductase, impedindo transformação de HMG-CoA em Mevalonato. Ao diminuir a concentração intracelular de colesterol, é estimulada a formação de LDLreceptores na membrana celular. • Da diminuição da síntese do Mevalonato, resulta também uma diminuição da síntese de Farnesil pirifosfato e do seu produto, a Ubiquinona. • A Ubiquinona é essencial na cadeia respiratória mitocôndrial, para a produção de ATP, por isso, as pessoas tratadas com estatinas podem sentir cãimbras ou fraqueza muscular. 4. Qual o papel do ácido acetilsalicílico? Uma vez que as dores no peito desapareceram, poderia suspender a toma deste fármaco? Porquê? - Ácido acetilsalicílico • Pertence ao grupo dos anti-inflamatórios não esteróides. Tem propriedades anti-inflamatórias, antipiréticas, analgésicas e antiagregantes plaquetares. • Inibe irreversivelmente a actividade da COX através do bloqueio do centro activo enzimático e da acetilação de um resíduo de serina. • O ácido acetilsalicílico ao inibir irreversivelmente a enzima COX, impede a formação de prostaglandinas, tromboxanos e prostociclinas, impedindo a agregação plaquetar. • Embora as dores no peito tenham desaparecido, não se poderia suspender a toma deste fármaco, pois este reduz o risco de se vir a sofrer de um segundo EM ou de um AVC. • Devido ao facto de a terapia trombolítica poder causar hemorragias, não se administra, às pessoas que têm problemas de coagulação ou às que se submeteram a uma operação cirúrgica durante o mês anterior ao enfarte. Bibliografia •http://www.manualmerck.net/?id=53&cn=666 •http://www.medicinenet.com/heart_attack/article.htm •http://www.bancodesaude.com.br/infarto-miocardio/sintomas-infarto-agudomiocardio •http://www.emedicinehealth.com/heart_attack/article_em.htm •http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2537993/ •Gavina, Cristina; Pinho, Teresa – “Enfarte Agudo do Miocárdio” – O Essencial da Saúde – Volume 9 • Koolman, J; Roehm, K.H – “Color Atlas of Biochemistry” – 2nd edition, Thieme • Stryer, Lubert; Tymoczko, John L. – Bioquímica – 5ª edição. Guanabara Koogan Editores • Aulas Teóricas e Práticas