Universidade Nova de Lisboa Faculdade de Ciências Médicas Medicina 1 Tutora: Dra. Paula Peixe O DOENTE COM DIARREIA Diogo Marques Joana Carvalho Turma 3 – Outubro de 2009 DIARREIA Eliminação de fezes não moldadas ou anormalmente líquidas, com maior frequência que o habitual ( > 3 vezes/dia). Nos adultos com dieta ocidental: peso fezes > 200 g/dia. In Harrison Sintomas associados Febre Dor abdominal Urgência Tenesmo Vómitos Distensão abdominal Flatulência Falsas Vontades D. Diferencial Pseudodiarreia Incontinência Fecal Classificação Duração Aguda < 2 semanas Persistente 2 - 4 semanas Crónica > 4 semanas Etiologia Fisiopatologia Secretória Osmótica Má Absorção Inflamatória Alterações da Motilidade Factícia Quero lá saber da classificação!!! DIARREIA AGUDA • Etiologia Patogénios mais frequentes Bactérias Salmonella, Campylobacter jejuni Vírus Rotavírus Parasitas Giardia, Cryptosporidium Agentes Infecciosos Transmissão Fecal-oral Ingestão de alimentos ou água contaminados Mecanismos Patogénicos Defesas do Hospedeiro Tamanho do inóculo Flora indígena Aderência Acidez gástrica Produção de toxinas Motilidade intestinal Invasão Imunidade Determinantes genéticos Infecção aguda quando o agente ingerido supera as defesas do hospedeiro Associações clínicas com patogénios específicos podem orientar o diagnóstico Agentes Infecciosos 5 Grupos de Risco Viajantes A. Latina, África, Ásia ETEC; EAEC; Campylobacter; Shigella; Aeromonas; Norovírus; Coronavírus; Salmonella Rússia (S. Petersburgo) Giardia Nepal Cyclospora Áreas selvagens Giardia Cruzeiros Vírus Norwalk Frango Salmonella, Campylobacter, Shigella Hamburguers mal cozinhados EHEC Arroz frito B. cereus Maionese / patês S. aureus; Salmonella Ovos Salmonella Frutos do mar crus Vibrio, Salmonella, HAV ID Primárias; ID Secundárias Enteropatogénios comuns - quadro mais grave HIV Mycobacterium • 5 grupos de risco Consumo de certos alimentos Imunocomprometi dos Infecções oportunistas CMV, Adenovírus, HSV Cryptosporidium, Isospora belli, Blastocystis hominis VR Hemocromatose Creches Instituições de longa permanência Proctocolite – N. gonorrhoeae, T. pallidum, Chlamydia Vibrio, Yersinia (peixe cru) Shigella, Giardia, Cryptosporidium, Rotavírus Hospitais; Lares; Clínicas C. difficile Agentes Infecciosos • Manifestações Clínicas Agentes Infecciosos Manifestações Sistémicas Síndrome de Reiter Salmonella, Campylobacter, Shigella e Yersinia Tiroidite auto-imune, pericardite, GN Yersinia Síndrome Hemolítico-Urémico Shigella, EHEC (O157:H7) SCI – Complicação da diarreia infecciosa DIARREIA AGUDA - sintoma importante em várias infecções sistémicas (hepatite viral, listeriose, infecção por Legionella , Síndrome do Choque Tóxico) Outras Causas Outras Causas Fármacos AB, AINES, antiarrítmicos, anti-HTA, antidepressivos, quimioterapia, broncodilatadores, antiácidos e laxantes Colite isquémica Diverticulite GVHD Ingestão de toxinas Insecticidas, cogumelos, arsénio, toxinas ambientais pré-formadas em frutos do mar Distúrbios que causam diarreia crónica podem ser confundidos com diarreia aguda, no início da sua evolução DII Abordagem ao Paciente Anamnese Paciente insere-se nos 5 grupos de risco? Duração Tenesmo Febre Vómitos Aspecto das fezes Fonte comum Frequencia de evacuação Antibioterapia Dor abdominal Viagens Factores que permitam ponderar causa não inflamatória? Exame Objectivo - DESIDRATAÇÃO Desidratação leve Sede, boca seca, ↓ sudorese axilar, ↓ débito urinário, perda ponderal ligeira Desidratação moderada Hipotensão ortostática, sinal de prega cutânea, olhos encovados (lactentes depressão das fontanelas) Desidratação grave Hipotensão, taquicárdia, confusão mental, choque Abordagem ao Paciente Maioria leve e auto-limitada Sem necessidade intervenção diagnóstica nem farmacológica Indicações para avaliação Diarreia profusa com desidratação Fezes sanguinolentas Febre ≥ 38,5 ºC Duração > 48 h sem melhoria Antibioterapia recente Novos surtos na comunidade Dor abdominal em indivíduos > 50 anos Idosos ( > 70 anos) e IC Colheita de fezes para análise Diagnóstico EXAME MICROBIOLÓGICO DAS FEZES Culturas para bactérias e vírus Exame parasitológico Imunoensaios para toxinas bacterianas (C. difficile), Ag’s virais (rotavírus) e de protozoários (Giardia e E. histolytica) … quando os exames são inconclusivos… Identificação de sequências de DNA Outros Exames Sigmoidoscopia com biópsia EDA com aspirado e biópsia duodenal Tratamento Reposição Hidroelectrolítica Todas as formas diarreia aguda Reposição hídrica isolada Casos mais leves Soluções orais glicose e electrólitos Casos desidratação grave Hidratação EV Pacientes profundamente desidratados (lactentes e idosos) Agentes anti-secretórios e antimotilidade Antibioterapia Diarreia moderadamente grave, afebril, não sanguinolenta Terapêutica empírica (sem avaliação diagnóstica) Casos de disenteria febril moderada a grave Cobertura independente identificação agente Pacientes IC; com válvulas cardíacas mecânicas; enxertos de vasos recentes; idosos Profilaxia Viagens para países de risco (indivíduos IC, hemocromatose, DII, acloridria) DIARREIA CRÓNICA Avaliação cuidadosa para excluir patologia subjacente Duração > 4 semanas • Maioria não tem causa infecciosa • Identificação mecanismo fisiopatológico Classificação Fisiopatológica Diarreias Secretória Inflamatória Osmótica Alterações motilidade Má Absorção Fictícia Diarreia Secretória • Desequilíbrio no transporte hidro-electrolítico através da mucosa intestinal Clinicamente Fezes aquosas de grande volume (> 500 mL) Geralmente indolores Persistem com o jejum (*) Isotónicas com o plasma ↑ Na+ e K+ fezes Diarreia Secretória Causas Exemplos Xenobióticos Medicamentos (laxantes), Álcool, Toxinas ambientais, Infecções bacterianas Superfície de reabsorção Ressecção intestinal, doenças da inadequada mucosa (D. Crohn), fístula enterocólica Hormonas e Tumores carcinóides Neurotransmissores gastrointestinais metastáticos, TC (*) (secretagogos intestinais) brônquicos primários, gastrinoma, vipoma, carcinoma medular tiróide Defeitos congénitos absorção de iões na Cl-/HCO3-; Na+/H+ Diarreia Osmótica • Devido à ingestão de solutos pouco absorvíveis e osmoticamente activos Causas Exemplos Medicamentos Osmóticos Antiácidos com Mg2+, suplementos vitamínicos, laxantes Má absorção de HC Deficiência de lactase, ingestão ↑ de HC pouco absorvíveis Clinicamente Perda de fezes >500 mL Alivia com jejum / suspensão do agente causador Débito hídrico fecal directamente proporcional à quantidade de soluto ingerida Distensão abdominal, flatulência (*) Diarreia por Má Absorção • Deficiências na absorção de lípidos, aminoácidos e vitaminas • ↑ débito fecal devido ao efeito osmótico dos AG hidroxilados pelas bactérias intestinais Diarreia por Má Absorção Causas Exemplos Má digestão intraluminal Insuficiência pancreática exócrina, proliferação bacteriana ID, cirrose/obstrução biliar Má absorção na mucosa D. Celíaca, Sprue Tropical, D. Whipple, Abetalipoproteinémia Obstrução linfática Linfagiectasia intestinal congénita, obstrução linfática adquirida Clinicamente Esteatorreia – gordura fecal > 7 g/dia Fezes gordurosas, pastosas, claras, brilho oleoso, flutuantes, cheiro fétido Défices nutricionais (↓ absorção vitaminas e AA) – osteomalácia (↓ vit. D); défices de coagulação (↓ vit. K) Perda ponderal Aumento do débito fecal com alimentação Diarreia Inflamatória • Mecanismo pode não estar apenas associado a exsudação (↓ absorção lípidos, hidroelectrolítica, hipersecreção e hipermotilidade) Indivíduos de meia idade ou idosos – AVALIAÇÃO CUIDADOSA (DD tumor colorrectal) Clinicamente Diarreia associada a febre, dor, hemorragia e outras manifestações inflamatórias Persiste no jejum Volume das dejecções pode ou não estar aumentado Fezes mucosas / mucopurulentas Inflamação grave – anasarca Análise fecal – presença de leucócitos ou produtos derivados Diarreia Inflamatória Causas Exemplos Doença Inflamatória Intestinal Idiopática Doença de Crohn, Colite Ulcerativa Crónica Imunodeficiências Primárias ou Secundárias Giardíase associada a Hipogamaglobulinémia Outras Etiologias Gastroenterite eosinofílica, GVHD crónica, S. de Behçet Diarreia por alterações da motilidade Causas Exemplos Aumento da motilidade intestinal Hipertiroidismo, S. Carcinóide, Fármacos Diminuição da motilidade intestinal Diabetes, neuromiopatias viscerais primárias, pseudoobstrução intestinal adquirida idiopática Síndrome do Cólon Irritável Episódios de aumento da frequência fecal Cessam à noite e alternam com períodos de prisão de ventre Acompanhados por dor abdominal que alivia com a defecação Perda ponderal muito rara Diarreia Fictícia • Até 15% dos casos de diarreias inexplicadas Causas Síndrome de Munchausen Bulimia Clinicamente Hipotensão e hipocaliémia Osmolaridade fecal ↑ ou ↓ - contaminação fezes com urina ou água Abordagem ao Paciente Anamnese Início Incontinência fecal Duração Febre Padrão Dor abdominal Factores agravamento (dieta) Perda ponderal Factores alívio Exposições (viagens, medicamentos, contactos) Características fezes Manifestações extraintestinais comuns (alterações cutâneas, artralgias, aftas orais) Exame Objectivo Massa tiroideia, sibilos, edema, hepatomegália, massas / sensibilidade abdominal, linfadenopatias, fístulas peri-anais, alterações mucosa rectal, flacidez esfíncter anal, alterações cutâneas como dermatite (D. Celíaca), eritema nodoso (RCU), úlceras orais Abordagem ao Paciente Abordagem ao Paciente CASO CLÍNICO Caso Clínico CV, 18 anos, sexo feminino Recorre ao SU por hematemese e diarreia sanguinolenta, desde há 10 dias Diarreia aquosa, profusa, com sangue escuro, persistente no jejum, frequência de cerca de 3 / 4 vezes por dia, associada a dor na região umbilical muito intensa, 41ºC de febre, agravava com ingestão de alimentos Primeiro episódio de sangue nas fezes ocorreu há cerca de 10 anos; desde então, refere diarreia contínua, não sanguinolenta; há 6 anos --> crise de diarreia sanguinolenta, com perda de grande quantidade de sangue, associada a dor intestinal Refere o aparecimento, desde há 3 anos, de pápulas nas ancas e região sagrada. Há 1 ano atrás, refere o aparecimento de pápulas nos MI, sendo que, desde há uma semana, notou aumento das dimensões das mesmas, purulação e sangramento abundantes, com dor muito intensa Exame Objectivo: úlceras em toda a extensão dos MI, com cerca de 2 centímetros de diâmetro, bordo e centro necrótico, não purulentas, hemorrágicas, dolorosas ao toque Doença de Crohn Pioderma Gangrenoso BIBLIOGRAFIA • BICKLEY, Lynn, et al, Bates Propedêutica Médica, 8ª Ed, Guanabara Koogan, 2005 • BRAUNWALD, Eugene, et al, Harrison’s Principles of Internal Medicine, 17th ed., McGrawHill, USA, 2007. • KUMAR et al, Robbins&Cotran Pathologic Basis of Disease, 7th ed., Saunders, 2005; • MIMS, C., Dockrell, H.M. et al, Medical Microbiology, 3rd edition, Mosby, 2004 • SILBERNAGL, S. et al, Color Atlas of Pathophysiology, Thieme, 2000