As Escolas Criminológicas A Escola Clássica caracteriza-se por ter projetado sobre o problema do crime os ideais filosóficos e o ethos político do humanismo racionalista. Pressuposta a racionalidade do homem, haveria de se indagar quanto à racionalidade da lei. Pela sua índole e impacto histórico, sobressai naturalmente, a obra de Beccaria “Dos Delitos e das Penas” (1764), que foi crismada como o manifesto da abordagem liberal ao direito criminal. Beccaria procurou fundamentar a legitimidade do direito de punir, bem como definir os critérios de sua utilidade, a partir do postulado do contrato social. É difícil afirmar que uma disciplina nasça do dia para a noite, ou que seja obra de algum pensador “iluminado”, ou ainda produto de uma publicação específica. Pode-se afirmar que a busca do conhecimento científico sobre o fenômeno criminal é gestada por meio da concorrência de três circunstâncias que, habitualmente, acompanham o processo de investigação: -A colocação em dúvida das idéias antes dominantes; -A crítica da situação dos sistemas processuais; - A necessidade crescente de comprovação do surgimento do novo paradigma da ciência: a RACIONALIDADE; O livro que abre as portas desse período é o de Beccaria. A exigência política de querer limitar o arbítrio e a opressão de um poder centralizado e autoritário somam-se às exigências filosóficas do jusnaturalismo de Grócio e do contratualismo de Rousseau. Naturalmente, nem todas as representações de Beccaria suportariam uma análise rigorosa à luz do estado atual da teoria criminológica. A começar pelo postulado da “racionalidade pura”, capaz de homogeneizar todos os homens, tanto no que toca aos processos psicológicos da motivação, como no que respeita à eficácia dos contra-estímulos das cominações legais. A ambiguidade ideológica na construção de Beccaria: - o contrato social originaria o solidariedade de todos os cidadãos em torno dos valores fundamentais; - o consenso assim criado determinaria uma “igualdade de deveres”, presente na pressuposta “igualdade de interesses”, mas a que corresponderia uma “desigualdade de oportunidades”. Correspondente a ideologia da burguesia em ascensão, simultaneamente em conflito com o soberano e com os não-possidentes, nunca a escola clássica poderia ser susceptível de uma interpretação unilateral. Viu-se por isso compelida a reforçar as garantias face ao perigo do arbítrio e a definir, ao mesmo tempo, uma nova estratégia do poder punitivo,reforçando a luta contra o crime e cobrindo as lacunas deixadas pelo velho poder punitivo, tanto mais quanto a criminalidade se convertia progressivamente em criminalidade patrimonial. Nesse contexto, se a tônica da obra de Beccaria a coloca na primeira vertente, não faltam, como Foucault demonstra, contemporâneos daquele a privilegiar o segundo aspecto, reclamando a inflexibilidade contra o criminoso, frequentemente apontado ainda como “monstro”, “traidor”, ou “inimigo”. Em 1876, cerca de um século depois do aparecimentodo livro de Beccaria foi publicada a primeira edição de “O Homem Delinqüente” de Cesare Lobroso, basicamente inaugurando com ele a Escola Positiva Italiana. Durante este século o estudo do crime havia transformado-se profundamente em face do ambiente político-intelectual. Assistiu-se à falência das perspectivas otimistas depositadas na reforma penal e do sistema penitenciário que o iluminismo estimulara. Não só elas não haviam conseguido reduzir a dimensão da criminalidade, como esta aumentara e se diversificara, revelando taxas altas de reincidência, situação que obrigou a uma mudança total de tônica: Do sistema legal para o delinqüente e a penitenciária, a qual por sua vez conduziu a que se inquirisse agora da natureza e das causas do crime. Por outro lado, mas de forma convergente, fazia-se sentir o domínio das Ciências do Homem e a atração da filosofia, da lógica e da metodologia, próprias do positivismo, cujo êxito das ciências empíricas não parecia conhecer limites. Foi nesse clima que a Escola Positiva surgiu, independente da validade intrínseca de suas hipóteses explicativas, muitas delas parecendo hoje, pelo menos, bizarras, a verdade é que tal escola representou um salto qualitativo no tratamento do crime. Com ela nasceu a Criminologia Científica, como disciplina construída segundo os métodos e os instrumentos das “verdadeiras ciências” Positivista é toda investigação criminológica conduzida segundo a grelha teórica e metodológica do positivismo (independente de conteúdo antropológico, psicológico ou sociológico das suas hipóteses.Tudo dependerá do respeito pelas exigências fundamentais do positivismo: a negação do livre-arbítrio e a crença no determinismo e no postulado da previsibilidade dos fenômenos humanos.