o aquecimento global na imprensa especializada e

Propaganda
O AQUECIMENTO GLOBAL NA IMPRENSA ESPECIALIZADA E NÃOESPECIALIZADA: ESTUDO COMPARATIVO DAS REVISTAS PESQUISA
FAPESP, SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL, VEJA E CARTA CAPITAL
Erik Stein Bernardes, Flavia Elnestina Varão, Cilene Victor da Silva
Universidade Nove de Julho, Rua Vergueiro, 235 – São Paulo – SP, [email protected]
Resumo- A cobertura jornalística do aquecimento global elevou o tema a um dos mais populares do
mundo. O IPCC (International Panel on Climate Change), criado em 1988, tem conseguido cada vez mais
chamar a atenção para as causas do aquecimento global, de forma que o assunto entrou na agenda da
mídia especializada e não-especializada. O amadurecimento do jornalismo especializado em ciência no
Brasil fez pressupor que estivesse mais preparado para a cobertura de temas polêmicos. Entretanto, foi
constatado durante a pesquisa que as principais diferenças entre as mídias especializadas e não
especializadas analisadas são os tipos de fontes consultadas para a elaboração da reportagem e a
abordagem dada ao tema. Enquanto as revistas Pesquisa Fapesp e Scientific American Brasil consulta
especialistas e documentos, como os relatórios do IPCC e o Relatório Stern, por exemplo, Veja e Carta
Capital se atêm à consulta de fontes oficiais, como representantes do governo.
Palavras-chave: Jornalismo Científico, Jornalismo Especializado, Análise do Discurso, Divulgação
Científica e Aquecimento Global.
Área do Conhecimento: Ciências Sociais Aplicadas
Introdução
A cobertura jornalística sobre o aquecimento
global, sem dúvida, fez do tema um dos mais
populares do universo, até então, restrito aos
gabinetes científicos.
Criado em 1988, o IPCC, com os seus alertas
sobre os impactos das mudanças climáticas,
provocado pelo aquecimento global, tem
conquistado espaço significativo na imprensa, seja
especializada ou não na cobertura de temas
científicos (IPCC, 2008).
Desde a história recente do jornalismo
brasileiro não se via um tema científico ganhar
tanto apelo midiático quanto o aquecimento global.
Mas qual o nível dessa cobertura jornalística sobre
o aquecimento global?
O amadurecimento do jornalismo especializado
em ciência pressupõe que este esteja mais
preparado para cobrir temas polêmicos, complexo
e de tantas incertezas, diferentemente da
imprensa não especializada, que tende a repetir o
discurso origem e, portanto, não promove o
debate que o tema demanda.
Sendo assim, a pesquisa tem o objetivo de
analisar comparativamente a cobertura jornalística
em mídias especializadas e não especializadas,
sobre os temas relacionados ao aquecimento
global. Para tanto, foram escolhidas as revistas
Pesquisa Fapesp, Scientific American Brasil, Veja
e Carta Capital.
Metodologia
Tendo como base as três principais correntes
da análise do discurso, pós-marxista, pósestruturalista e pós-moderna, a proposta foi
analisar o período de 12 meses antecedentes ao
início da pesquisa, compreendido entre agosto de
2007 e julho de 2008.
Os trabalhos foram iniciados com o
levantamento bibliográfico nas áreas de jornalismo
científico, análise do discurso e divulgação
científica. Etapa cumprida nos meses de agosto,
setembro e outubro de 2008.
A partir da base bibliográfica definida, passouse então para o levantamento das reportagens
sobre o tema. A biblioteca da Secretaria Estadual
do Meio Ambiente do Estado de São Paulo foi
escolhida, mas ao ser constatado que não havia
coleções completas naquele local, a busca foi feita
também
nas
bibliotecas
da
Escola
de
Comunicação e Artes da Universidade de São
Paulo e do Centro Cultural São Paulo, onde os
números faltantes foram encontrados. Etapa
executada em outubro, novembro e dezembro de
2008, e em janeiro de 2009. Ao todo foram
analisadas 134 edições dos quatro veículos em
busca de textos com as expressões-chave
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
1
“aquecimento global” e “mudanças climáticas”,
sendo 55 edições de Veja, 55 de Carta Capital, 12
de Scientific American Brasil e 12 de Pesquisa
Fapesp.
Em seguida, os pesquisadores partiram para a
análise das reportagens, etapa que se iniciou em
dezembro de 2008 e seguiu em janeiro, fevereiro e
março de 2009.
Para concluir a pesquisa, enfim, durante o mês
de março e a primeira quinzena de abril, os
pesquisadores se dedicaram a analisar os
resultados da pesquisa sob o ponto de vista das
escolas da comunicação citadas. Para atender a
essa demanda, foram observados os seguintes
aspectos: quantidade de material publicado nos
veículos; o gênero dos textos, classificados em
reportagem, notícia e nota; o tipo de fonte, se
foram consultados documentos, fontes oficiais ou
especialistas; além de análise do discurso
reproduzido pelos veículos.
Resultados
Foi constatado, durante a pesquisa que as
principais
diferenças
entre
as
mídias
especializadas e não especializadas analisadas,
além da discrepante quantidade de material
encontrado em cada uma delas, é a abordagem
dada ao tema. Enquanto as revistas Pesquisa
Fapesp e Scientific American Brasil apontam para
pesquisas que mostram como o planeta se
comportará com o avanço das emissões dos
gases de efeito estufa e da temperatura global e
relacionam as problemáticas levantadas com o
cotidiano, com meio ambiente e com economia,
por exemplo, Veja e Carta Capital se atêm à
consulta de fontes oficiais, além de reproduzir o
discurso contido em alguns poucos documentos,
como os relatórios do IPCC e o Relatório Stern,
por exemplo. Quando apontam para soluções, as
não-especializadas se atêm a publicar catálogos
de produtos com “selos verdes”, expressão
comumente grafada em Veja.
Entre as 134 edições analisadas, apenas 33,5%
delas, ou 45, continham textos com as
expressões-chave buscadas, sendo que 20
estavam contidas no universo das 24 edições de
revistas especializadas. Carta Capital, com o
índice mais baixo, apresentou textos com as
expressões-chave em apenas 10,9% das edições.
Veja, por sua vez, abordou o tema em 34,5% do
material analisado. Já as especializadas
apresentaram índices mais altos, com 100% para
Pesquisa Fapesp e 66,6% para Scientific
American Brasil.
Na questão da abordagem, o tratamento dado
pela mídia especializada ao tema também é mais
amplo. A discussão não se restringe apenas à
divulgação dos relatórios, como acontece na
imprensa não especializada. Enquanto as
especializadas trabalham os desdobramentos e
contemplam temáticas multidisciplinares em textos
específicos, como consequências para animais,
plantas
e
sociedades,
não-especializadas
divulgam os relatórios e se limitam à reprodução
do discurso contido nos mesmos.
Na análise do discurso emitido pelo material
analisado, constatou-se uma diferença muito
tênue. Tanto a mídia não-especializada quanto os
veículos especializados publicaram material em
que entendem como certa a existência de um
aquecimento global com causas antropogênicas.
Em nenhum momento, no período analisado, os
veículos
não-especializados citaram
fontes
contrárias à ideia de aquecimento global, como
por exemplo o pesquisador Luis Carlos Molion,
autor, entre outros estudos, da pesquisa
“Aquecimento global: fato ou ficção“, em que
questiona a existência do aumento da temperatura
do planeta e sugere, inclusive, que o globo
terrestre pode estar migrando para mais uma de
suas inúmeras eras glaciais (MOLION, 2001).
É importante ressaltar, porém, que no caso das
especializadas, mesmo com o predomínio
hegemônico do discurso emitido pelo IPCC, há
trechos de textos onde pode-se observar o
questionamento das causas do aquecimento
global, o que pode ser considerado insuficiente,
uma vez que a ciência moderna não pretende
encerrar o debate sobre tema algum, mas levanta
novas hipóteses para o conhecimento já adquirido
(PRIGOGINE, 1996). Isso demonstra apenas uma
leve consideração sobre a existência de
divergência científica sobre o tema.
Conclusão
De acordo com os dados levantados, é possível
compreender que há, tanto na imprensa
especializada como não-especializada, a limitação
no uso de fontes, além de abrangência limitada no
debate sobre o tema aquecimento global. Mesmo
as revistas de ciência não abriram espaço, no
período
analisado,
para
pesquisas
com
considerações contrárias aos resultados obtidos
no conjunto do IPCC. A ideia de aquecimento
global antrópico é hegemônica em todos os
veículos analisados, especializados ou não.
Nesse ponto, especialmente quando isolados os
dois veículos não-especializados, podemos notar
uma falha no posicionamento da imprensa como
guardião do meio ambiente e do bem-estar social,
uma vez que o tema é tido como verdade e coloca
a má conduta da sociedade moderna como vilã na
história ambiental do planeta, sem considerar
outras questões imprescindíveis para o debate
aberto na sociedade.
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
2
Entretanto, foi possível detectar diferença no trato
jornalístico dado ao tema entre veículos
especializados e não-especializados. As revistas
Pesquisa Fapesp e Scientific American Brasil
exploraram de forma mais abrangente as
consequências do aquecimento global e, no caso
da
Scientific
American
Brasil,
mesmo
representando uma porcentagem baixa, há
reportagens onde se questiona as causas desse
aquecimento, sem deixar de entender a existência
do mesmo.
Na mídia não-especializada o discurso existente é
o do último relatório divulgado pelo IPCC, em
2007, de que há aquecimento global e esse é
causado basicamente pela emissão humana de
gases de efeito estufa, principalmente o dióxido de
carbono (CO2).
As regras de conduta apontadas, principalmente
em Veja e Carta Capital, sugerem um
posicionamento funcionalista da imprensa nas
relações do homem com o meio ambiente, uma
vez que essa escola sugere que os meios de
comunicação são responsáveis pela doutrinação
da sociedade em relação à manutenção dessa do
bom funcionamento dessa sociedade (WOLF,
1999).
- Vizeu, A. A produção de sentidos no jornalismo:
da teoria da enunciação a enunciação jornalística.
Revista
FAMECOS:
mídia,
cultura
e
tecnologia, Vol. 1, No 22 (2003).
Referências
- PRIGOGINE, Ilya. O Fim das Certezas: Tempo
Caos e as Leis da Natureza. São Paulo, Editora da
UNESP, 1996.
- Wolf, Mauro. Teorias da Comunicação. Lisboa,
Editorial Presença, 1999.
- Molion, L. C. B., Aquecimento global: fato ou
ficção. Revista do Instituto Brasileiro de Edições
Pedagógicas, 2001.
- Oliveira, Fabiola de, Jornalismo Científico,
Contexto: São Paulo, 2000.
- Sponholz, Liriam, O que o jornalismo pode
aprender com a ciência: Objetividade na
perspectiva do racionalismo crítico de Karl Popper,
Actas do III SOPCOM, VI Lusocom e II Ibérico,
Vol. IV.
- Ramos, Roberto e Zamberlan, Liège, Mídia e
Previsão
do
Tempo:
Uma
questão
de
Interpretação, Intexto, Porto Alegre: UFRGS, v. 2,
n. 13, p. 1-11, julho/dezembro 2005.
- Coracini, Maria Jose. Um fazer persuasivo: O
discurso subjetivo da ciencia. Campinas: Pontes,
1991.
- Climate Change 2007: Synthesis Report.
Summary for Polcymakers. An Assessment of the
Intergovernamental Panel on Climate Change.
IPCC, 2007.
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
3
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
4
Download