O HOMEM É AQUILO QUE COME O HOMEM É AQUILO QUE

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O HOMEM É AQUILO QUE COME
O HOMEM É AQUILO QUE COME Eucaristia (Daniel Lifschitz) O filósofo alemão
Ludwig Feuerbach (1804 - 1872) inicialmente foi reconhecido pela elaboração de uma
teologia humanista e depois passou à filosofia materialista. Em sua obra
«Pensamentos sobre Morte e Imortalidade», negou toda possibilidade de imortalidade
e resume o homem no conhecido ditado: «O homem é aquilo que come». Após a
morte, as qualidades humanas são absorvidas pela natureza, afirma. Essa definição de
Feuerbach em sentido materialista é assumida como estritamente bíblica e cristã pelo
teólogo ortodoxo Alexandre Schmemann (1921-1983), cujo estudo centrou-se na
Liturgia: «Quem se alimenta com a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida
eterna, e eu o ressuscitarei no último dia» (Jo 6,54). Se a tentação de comer o fruto da
árvore da Vida trouxe a morte, o comer da Carne e Sangue do Filho de Deus traz a
vida. O mundo é um banquete, e a imagem do banquete aparece em toda a Bíblia. O
último encontro de Jesus com os seus foi numa Ceia, os Evangelhos situam grandes
encontros de Jesus em banquetes (Zaqueu, Levi, Simão, Marta e Maria,…), a
ponto de fariseus o acusarem de glutão e beberrão. Banquete é alegria, festa.O
Senhor se apresenta como o noivo que chegou para o casamento com seu povo e o
grande encontro final será à Mesa do Reino. Deus não criou o ser humano somente
para dar-lhe glória, o que diminuiria sua bondade, mas também para ser feliz aqui na
terra: Deus quer tudo repartir conosco e nos entrega tudo. Nicu Steinhardt
(1912-1989), judeu romeno convertido, lembra que o banquete é o único lugar em que
o homem se alegra com a alegria alheia (Diário da Felicidade, p. 207). Quanto mais os
convivas estão contentes, mais o homem é feliz. Isso pressupõe a capacidade de se
alegrar com a alegria de outros, de reparti-la. Nos Anjos acolhidos por Abraão com um
banquete está simbolizada a vontade de Deus de banquetear conosco (cf. Gn
18,1-15). O povo bíblico, povo do deserto, tinha em conta especialíssima a
hospitalidade e o banquete. O homem é o que come e o que come revela o homem.
Se come na fraternidade, gera a festa; se come na exclusão dos pobres, gera
condenação, caso do Rico banqueteiro e o pobre Lázaro. Mas, o homem é o que come
também espiritualmente. A Escritura judaica e cristã é rica no chamar o Livro e a
Palavra de comida. Jeremias: «Quando encontrei tuas palavras, alimentei-me; elas se
tornaram para mim uma delícia e a alegria do coração» (15,16). Ezequiel:
«’Abre a boca e come o que te dou’. Eu olhei e vi uma mão estendida
para mim, e nela um livro enrolado. … Ele me disse: ‘Filho do homem,
come o que tens diante de ti! Come este rolo e vai falar à casa de Israel’» (2, 8;
3, 1). O Apocalipse: «Eu fui até o anjo e pedi que me entregasse o livrinho. Ele me
falou: ‘Pega e devora. Será amargo no estômago, mas na tua boca será doce
como o mel’» (10,9). João Crisóstomo afirma que na Palavra comemos a Carne
e o Sangue do Senhor! No amor entre as pessoas, o ato de comer é extremamente
rico de simbolismo. A mãe, encantada com seu filhinho, diz com ternura: «É tão fofinho
que dá vontade de comer». Quantas crianças mordiscam seus brinquedos prediletos!
Mesmo que hoje confundida na vulgaridade, a relação sexual, sinal máximo da
unidade entre o homem e a mulher, pode ser expressa pelo verbo comer: no momento
do êxtase um se torna alimento do outro, literalmente se comem e se tornam uma só
carne. É nesse ato de «comer» que homem e mulher demonstram ser alimento um do
outro ou apenas exploração carnal. Todo verdadeiro relacionamento humano, de
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amizade, de namoro, se reveste do desejo de ser comida e de recebê-la. É de nossa
natureza, porque é da natureza divina. A Eucaristia – comer a Vida O
sacramento da Eucaristia é o sacramento do irmão, afirmou João Crisóstomo,
indicando que o alimento eucarístico nos faz portadores de alimento físico e espiritual
para os irmãos. A Ceia eucarística dos primeiros cristãos era precedida pela ceia
fraterna que distribuía alimento, sem acepção de pessoas. O rito eucarístico nos
oferece duas Mesas fartas: a da Palavra (comer a Palavra) e da Eucaristia (comer o
Senhor no Pão e no Vinho). Para escândalo dos ouvintes, Jesus afirmou: «Quem come
minha Carne e bebe meu Sangue permanece em mim e eu nele» (Jo 6, 56). Carne e
Sangue significam Pessoa: Jesus quer ser comido por nós para nos transfigurar:
seremos o que comemos. Se comemos Cristo, nos tornaremos divinos; se o
rejeitarmos, permaneceremos humanidade fragmentada. A cada Comunhão nos
tornamos mais divinos e Deus se torna mais humano. O Cântico dos Cânticos, grande
Hino ao amor matrimonial, revela-nos Deus como o noivo à procura da noiva, para
consumar o matrimônio. A Comunhão eucarística torna possível sermos divinos porque
nos alimentamos do divino e nos prepara, pouco a pouco, dia por dia, para
degustarmos as alegrias do banquete celeste na eternidade. Feuerbach se equivoca
ao concluir que na morte as qualidades humanas são absorvidas pela natureza. Na
verdade, na morte, o que é verdadeiramente humano é assumido pelo divino, pelo
eterno. Aqui na penumbra e lá, na Luz, viveremos na realidade expressa por uma
antífona proclamada antes da Comunhão: «Felizes os convidados para o banquete das
núpcias do Cordeiro» (Apc 19, 9). Pe. José Artulino Besen
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