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Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
PLANTAS TÓXICAS: “BRINCANDO COM O PERIGO”
Ana Paula Melila Gomes (Mestranda PPGEAS/ FFP/ UERJ)
Marcelo Guerra Santos (Professor Adjunto PPGEAS/ FFP/ UERJ)
Resumo
As crianças são as mais acometidas por intoxicações com plantas. O presente trabalho
teve como objetivo registrar o conhecimento que os alunos do Ensino Fundamental possuem
sobre plantas tóxicas. Responderam aos questionários 75 alunos com idade entre oito e 14
anos, de uma escola pública de São Gonçalo, Rio de Janeiro. A maioria dos alunos utiliza
plantas em suas brincadeiras, a roseira, “mato” e a comigo-ninguém-pode são as mais
frequentes. As brincadeiras que mais utilizam plantas são “comidinha”, “bandeirinha”,
“casinha”, “chicotinho-queimado” e em todas são citadas plantas tóxicas: comigo-ninguémpode, copo-de-leite e mamona. Metade dos alunos não soube explicar e dar exemplos de
plantas tóxicas. Os resultados apontam para a maior difusão do conhecimento sobre as plantas
tóxicas.
Palavras-chave: etnobotânica, ensino de fundamental, brincadeiras infantis.
Introdução
As plantas estão cercadas por inúmeros inimigos potenciais. Os ecossistemas estão
cobertos por uma infinidade de seus predadores, em especial os animais herbívoros, além dos
microrganismos patogênicos. Por sua condição fixa, as plantas tiveram que desenvolver
defesas específicas contra os consumidores primários. As substâncias produzidas pelas
plantas, os metabólitos secundários (ou especiais), possibilitam uma maneira mais elaborada e
eficaz de defesa contra os herbívoros e microrganismos patogênicos. Algumas destas
substâncias são tóxicas aos animais (RICKLEFS, 1996).
Intoxicação é a capacidade de um determinado composto químico provocar danos ao
organismo vivo, acompanhada, geralmente, de sinais e sintomas dos efeitos maléficos da
substância (AMORA, 2008). Registros do Sistema Nacional de Toxicologia (SINITOX), com
sede na Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), apontam que foram notificados no Brasil no
ano de 2013, 441 casos de intoxicação de pessoas por plantas, sendo 321 casos com crianças e
adolescente de até 14 anos de idade. O único óbito registrado encontra-se dentro da faixa
etária de cinco a nove anos de idade e a vítima era do sexo masculino. O caso de óbito foi
registrado, quanto à circunstância, como acidente individual (SINITOX, 2013).
As intoxicações podem ocorrer de forma acidental, principalmente envolvendo
crianças. Em adultos, as intoxicações podem ocorrer de modo acidental e intencional com uso
de plantas alucinógenas ou ainda em tentativas de aborto. Segundo o SINITOX (2013), dos
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441 casos de intoxicações por plantas registradas para o Brasil no ano de 2013, 357 foram
acidentais, 14 acidentes coletivos e os outros 70 casos foram por outras circunstâncias.
Estudos realizados por Oliveira (2007) relatam dados colhidos na Unidade de
Emergência do Hospital das Clinicas de Ribeirão Preto, entre os anos de 1995 e 2005, sobre
intoxicações por plantas envolvendo pacientes com idade de três a 14 anos. Todos os casos
foram acidentais, durante brincadeiras individuais ou em grupo nas calçadas, praças ou
terrenos baldios. Dos 269 casos de intoxicação, 59 (22%) ocorreram com plantas da família
Euphorbiaceae. O pinhão-paraguaio (Jatropha curcas L.) foi a espécie com o maior número
de casos registrados para a família, sendo responsável por 68% dos relatos, seguido pela
mamona (Ricinus communus L.) com 20% e a coroa-de-cristo (Euphorbia milii Des Moul.)
com 12% dos casos.
Segundo o SINITOX (2013), a frequência dos gêneros envolvidos nas intoxicações no
ano de 2013 foi de 234 (53,06%) casos com pessoas do sexo masculino e 191 (43,31%) casos
com pessoas do sexo feminino, 16 (3,63%) casos não informaram o gênero. O maior número
de registros ocorreu para a região urbana com 295 casos. Por outro lado, de acordo com Fook
et al. (2014) existe a possibilidade de subnotificação no meio rural, pelo fato de os centros de
informações toxicológicas estarem localizados na zona urbana.
Culturalmente, as pessoas têm o hábito de cultivar e consumir plantas em suas
residências, porém, a falta de conhecimento sobre o potencial tóxico de algumas delas é um
fator agravante para os casos de intoxicação por plantas envolvendo principalmente as
crianças (CUADRA et al., 2012).
A presença dessas plantas também é comum em ambientes públicos, tais como
canteiros, praças, pátios de escolas entre outros logradouros. Bochner (2006) apud
Vasconcello et al. (2009) afirma que as plantas não devem ser removidas de locais públicos,
Esse autor aponta que uma solução para a prevenção de acidentes, seria a identificação das
espécies com placas informando sobre os riscos, além de atividades educativas que informem
as crianças sobre os riscos de brincarem ou colocarem as plantas na boca.
Pesquisa realizada por Fook et al. (2014) em escolas estaduais de Campina Grande,
Paraíba, constatou que a maioria (85%) dos estabelecimentos educacionais visitados possuíam
exemplares de vegetais tóxicos em suas dependências. O conhecimento das espécies mais
frequentes nas escolas pode, em muito, auxiliar os educadores na tomada de decisões que
visem a prevenção de acidentes.
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A tendência dos estudos etnobotânicos, segundo Oliveira et al. (2009), evidencia que a
maior parte das pesquisas atua no tema “plantas medicinais”, fator que demonstra a
importância de investigações sobre a relação humana com as plantas tóxicas.
O total de casos de intoxicação envolvendo menores de 15 anos aponta para a
vulnerabilidade deste público para intoxicações por plantas. As plantas exercem atração sobre
as crianças por conterem flores, cores, odores, látex, que eventualmente seriam utilizados em
brincadeiras infantis que imitam o cotidiano. As crianças durante alguns passatempos podem
colocar as plantas na boca, nos olhos ou diretamente na pele, ocasionando intoxicações.
O presente trabalho teve como objetivo registrar o conhecimento que os alunos do
Ensino Fundamental de uma escola pública do município de São Gonçalo, estado do Rio de
Janeiro possuem sobre plantas tóxicas, como estratégia para a difusão do conhecimento acerca
da toxicidade que certas espécies apresentam e a prevenção de acidentes.
Metodologia
O trabalho foi desenvolvido no Centro Integrado de Educação Pública Dr. Armando
Leão Ferreira (CIEP 411), sob o endereço Rua Acácio Raposo, s/nº, Engenho Pequeno, São
Gonçalo, Rio de Janeiro, Brasil. O CIEP foi escolhido para o desenvolvimento deste trabalho
visto que se encontra bem próximo da Área de Preservação Ambiental (APA) do Engenho
Pequeno e Morro do Castro. Esta peculiaridade torna a escola uma instituição diferenciada do
ponto de vista da educação ambiental. A proximidade entre o CIEP e a APA, teoricamente,
proporcionaria uma maior interação entre a comunidade local e as espécies vegetais existentes
na reserva, o que poderia facilitar o maior conhecimento das plantas por parte dos moradores.
O público alvo do trabalho foi de estudantes do 3º, 4º e 5º anos do Ensino
Fundamental. As idades recomendadas para as séries variam de oito a dez anos e seriam
compatíveis com as idades dos casos mais expressivos de intoxicações por crianças e jovens
de até 14 anos levantados pelo SINITOX.
O questionário foi o método de coleta de dados utilizado e foi subdividido em três
etapas que foram aplicadas em dois dias consecutivos durante o mês de setembro de 2010,
sendo a segunda etapa realizada em casa com auxílio dos responsáveis. O questionário
utilizado foi do tipo estruturado, onde o participante é levado a responder perguntas
previamente estabelecidas. As vantagens do questionário dentre outras, são: a economia de
tempo; atingir maior número de pessoas simultaneamente; maior liberdade nas respostas, em
razão do anonimato; obtenção de respostas que materialmente seriam inacessíveis. As
desvantagens são: a porcentagem pequena de questionários que retorna; a impossibilidade de
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ajudar o informante em questões mal compreendidas; a devolução tardia; exige um universo
mais homogêneo, entre outros fatores (MARKOMI, M. A; LAKATOS, E. M., 2003, p. 201 –
202). As respostas foram limitadas pelo direcionamento das questões, com perguntas abertas
que permitiram maior liberdade como: “Que plantas você usa nas suas brincadeiras?” e
fechadas e dicotômicas como: “Na sua casa tem quintal?” (sim/não) (ALBUQUERQUE, U.
P.; LUCENA, R. F. P., 2004). O questionário objetivou estabelecer o tipo de relação que as
crianças desta comunidade tinham com plantas e quais conhecimentos sobre plantas tóxicas
elas detinham.
A primeira parte do questionário procurou conhecer o público alvo trabalhado a partir
da coleta de informações como o sexo (fator que interfere na escolha das brincadeiras), idade
e série predominantes. Buscou-se também, verificar que vivências, conhecimentos, que
contatos o público alvo teria com as plantas de modo geral. Também, se utilizariam as plantas
em seus passatempos, os tipos de brincadeiras e se haveriam plantas que não poderiam usar
para brincar, por orientação dos responsáveis (Apêndice 1). A segunda etapa buscou fazer um
levantamento das plantas existentes nas residências das crianças, bem como, a sua utilização.
Nesta etapa, realizada em casa, os alunos foram orientados a solicitar o auxílio dos
responsáveis, pois, muitas crianças poderiam omitir ou confundir os nomes populares das
plantas (Apêndice 2). O terceiro passo objetivou verificar o que os estudantes realmente
pensavam sobre a existência e perigos que algumas plantas representam à saúde. Para isso, foi
perguntado se as crianças conheciam casos de pessoas próximas que tiveram contato com
plantas e passaram mal, o que seriam plantas tóxicas e se conheciam o nome de algumas delas
(Apêndice 3).
Mediante aos resultados obtidos com a pesquisa e com o levantamento das plantas
tóxicas e/ou perigosas, de acordo com o imaginário dos participantes, foi elaborado um livreto
como um meio de devolução do conhecimento à comunidade trabalhada. Retornar com os
resultados para o público trabalhado mostra, além de respeito pela comunidade e
compromisso ético do pesquisador, a preocupação de transmitir os conhecimentos sobre
plantas tóxicas, neste caso em especial, evitando assim, possíveis casos de intoxicações por
plantas envolvendo adultos, jovens e, sobretudo, as crianças.
Resultados e Discussão
Ao todo, participaram da pesquisa 75 alunos dos 3º, 4º e 5º anos do Ensino
Fundamental, com idade entre oito e 14 anos. Desse total, 38 estudantes eram do sexo
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masculino e 37 do sexo feminino. Todos afirmaram morar em casa e 72 crianças relataram ter
quintal em casa, o que poderia facilitar o cultivo de plantas para diversas finalidades.
Mais da metade dos alunos (48) já brincaram com plantas, desse total, apenas nove
não souberam citar os nomes das plantas mais utilizadas durante as brincadeiras, e 39
participantes citaram 18 espécies de plantas (Tabela 1).
Tabela 1- Plantas utilizadas em brincadeiras infantis por alunos do 3º ao 5º ano do Ensino
Fundamental do CIEP Dr. Armando Leão Ferreira, São Gonçalo, RJ.
Nomes populares das plantas
Citações
Roseira
12
Mato
7
Comigo-ninguém-pode
5
Girassol
4
Beijo, margarida, maria-sem-vergonha e samambaia.
2 (cada)
Abacateiro, aceroleira, amoreira, bananeira, copo-de-leite, dente-de-leão, 1 (cada)
dormideira, espada-de-são-jorge, mamona e mangueira.
Dados semelhantes foram encontrados por Melila e Santos (2010) em uma escola
particular no município de São Gonçalo, onde 19 crianças (de um total de 38) declararam usar
plantas para brincadeiras como: “bandeirinha”, “piques”, “médico”, “estudo de plantas”,
“casinha”, “subir” (nas plantas, provavelmente em árvores) e “jardineira”. As plantas mais
comuns durante as brincadeiras foram o coqueiro aparecendo, com três citações, bananeira,
goiabeira e roseira em duas citações cada, mostarda, mangueira, girassol e margaridas em
uma citação cada. A outra metade das crianças apontou não usar plantas em brincadeiras. As
brincadeiras em que as plantas são usadas podem ser visualizadas na Tabela 2.
Algumas plantas citadas são descritas como tóxicas: comigo-ninguém-pode
(Dieffenbachia spp. – Araceae), copo-de-leite (Brugmansia spp. – Solanaceae) e mamona
(Ricinus communis L. – Euphorbiaceae) (MATOS et al., 2011). As plantas descritas como
mato são plantas herbáceas sem utilidade ou usadas pelo homem como alimento para animais
(MERHY; SANTOS, 2014).
Na tabela 3 pode-se verificar que as brincadeiras que mais utilizam plantas são
“comidinha”, “bandeirinha”, “casinha” e “chicotinho-queimado”. Novamente houve citações
de plantas tóxicas: comigo-ninguém-pode, copo-de-leite e mamona. Esta informação
demonstra que a falta de conhecimento sobre a toxicidade de algumas plantas utilizadas em
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brincadeiras infantis podem ocasionar casos de intoxicação em crianças (CUADRA et al.,
2012).
Tabela 2- Brincadeiras em que são utilizadas plantas pelos alunos do 3º ao 5º ano do Ensino
Fundamental do CIEP Dr. Armando Leão Ferreira, São Gonçalo, RJ.
Brincadeiras
Citações
Comidinha
20
Bandeirinha
12
Casinha
6
Chicotinho-queimado
3
Subir (em árvores)
2
Assoprar, estourar as sementes, fazer perfume, floricultura, imitar cobra, 1 (cada)
jardinagem (replantando-as) e mal-me-quer-bem-me-quer.
Tabela 3- Relação das brincadeiras e plantas utilizadas pelos alunos do 3º ao 5º ano do Ensino
Fundamental do CIEP Dr. Armando Leão Ferreira, São Gonçalo, RJ.
Brincadeiras
Plantas
Comidinha
Casinha
Aceroleira, beijo, comigo-ninguém-pode, girassol,
margarida, maria-sem-vergonha, mato e roseira.
Amoreira,
bananeira,
comigo-ninguém-pode,
dormideira, mamona, mato (possivelmente alguma
gramínea) e samambaia.
Comigo-ninguém-pode, margarida e roseira.
Chicotinho-queimado
Copo-de-leite, girassol e roseira.
Subir (em árvores)
Abacateiro e mangueira.
Assoprar
Dente-de-leão
Estourar as sementes
Mamona e maria-sem-vergonha .
Fazer perfume
Rosa
Floricultura
Roseira e aceroleira.
Imitar cobra
Espada-de-são-jorge
Jardinagem (replantando-as)
Roseira
Mal-me-quer-bem-me-quer
Girassol
Bandeirinha
A falta de conhecimentos sobre as espécies vegetais tóxicas é apontada pelos
especialistas como o principal fator para ocorrência de casos de intoxicação, portanto, a
melhor forma de prevenir é o conhecimento e a divulgação das espécies tóxicas, assim como a
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prevenção para a diminuição dos acidentes envolvendo plantas tóxicas em programas
educativos junto à população (VASCONCELOS, 2009).
A relação entre gênero e brincadeiras (Tabela 4) revela ainda que as meninas brincam
mais com plantas que os meninos. Entretanto, segundo dados do SINITOX (2013), no ano de
2013, houve um número maior de ocorrências de intoxicação por plantas para o gênero
masculino (53,06%) em relação ao feminino (43,31%). Apenas 11 meninas (das 37) não
brincaram com plantas e as demais utilizaram plantas em brincadeiras que lembram as
atividades domésticas. Entre os meninos, 16 afirmaram não brincar com plantas e o restante
teve contato com plantas na brincadeira chamada de “bandeirinha”.
Tabela 4- Brincadeiras realizadas com plantas de acordo com o gênero dos alunos do 3º ao 5º ano do
Ensino Fundamental do CIEP Dr. Armando Leão Ferreira, São Gonçalo, RJ.
Sexo feminino
Sexo masculino
Brincadeiras
Citações
Brincadeiras
Citações
Comidinha
17
Bandeirinha
10
Casinha
3
Casinha e comidinha.
3 (cada)
Chicotinho-queimado
e subir.
2 (cada)
Bandeirinha
e 2 (cada)
chicotinhoqueimado.
Apertar,
assoprar, 1 (cada)
mal-me-quer-bemme-quer, perfume e
floricultura.
Imitar
cobra
jardinagem.
e 1 (cada)
Para Silva et al. (2006), estudos apontam diferenças de estilos e preferências de
brincadeiras, os meninos brincam em grupos maiores e são mais preocupados com status e
reputação dentro dos grupos, são mais rígidos com seus papéis de gênero e mais preocupados
em rejeitar a feminilidade, enquanto as meninas são mais intimistas nas interações, mais
cooperativas, fazem mais trocas de confidências e são mais flexíveis.
Apenas 39 crianças afirmaram receber algum tipo de orientação de seus responsáveis
para não mexerem em plantas ao brincar. Porém, as orientações vindas por parte dos adultos
nem sempre estão relacionadas aos cuidados de prevenção de acidentes de intoxicação. Na
maioria dos casos, as crianças não sabem o motivo da orientação ou há cuidados com algumas
plantas específicas que seriam utilizadas como ornamentais ou por serem comestíveis, como
mostra a tabela 5.
O cuidado dos responsáveis para com as crianças, em não manipularem as plantas,
está relacionado desde o cuidado com a própria planta, por provavelmente representar beleza
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e adorno, até o fato de possuírem estruturas perfurantes e toxinas causadoras de danos à saúde
infantil (MELILA, A. P. S. S.; SANTOS, M. G., 2010).
Tabela 5- Plantas que os alunos seriam orientados a não mexer, os motivos para a orientação dada
pelos responsáveis e citações. Alunos do 3º ao 5º ano do Ensino Fundamental do CIEP Dr. Armando
Leão Ferreira, São Gonçalo, RJ.
Plantas
Motivos, apontados pelas crianças, para não poder
Citações
mexer nas plantas
Roseira
Tem espinho, serve para enfeitar ou não sabem.
9
Comigo-ninguémpode
Urtiga
Samambaia
Venenosa, dá alergia ou faz passar mal.
5
Pinica ou não sabem.
Para não quebrar
4
3
Espada-de-são-jorge
Pimenta
Carinho pela planta ou não sabem.
Arde a boca.
2
2
Abacateiro
Para comer.
1
Alface
Para não matá-la.
1
Babosa
Dá alergia.
1
Espinheira-santa
Espeta
1
Aceroleira, coqueiro, Não sabe.
dormideira,
espirradeira e girassol.
1 (cada)
Quando os alunos foram questionados sobre quais plantas possuem em casa e para que
elas são utilizadas, eles relataram 73 nomes populares, que são usadas para diversas
finalidades: comestível (31 plantas), ornamental (23), medicinal (19), religioso (2) e
cosmético (1) (Tabela 6). O quintal é o espaço onde são cultivadas espécies frutíferas e
hortaliças, plantas para enfeitar e para tratar doenças.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que cerca de 80% da população
mundial depende de plantas para cuidados com a saúde, relatam ainda, que 85% da medicina
tradicional utiliza as plantas medicinais, seus extratos vegetais e seus princípios ativos.
Entretanto, a sua prescrição e utilização devem ser acompanhados por um especialista, para
evitar o uso indevido e, até mesmo, a utilização de plantas tóxicas.
Do total de participantes (75), 35 não souberam explicar o que seriam plantas tóxicas e
não escreveram exemplo. Os outros 40 alunos explicaram e desses, seis alunos não souberam
citar quais são as plantas tóxicas. As plantas mais citadas pelas crianças como sendo perigosas
nem sempre estão relacionadas às substâncias tóxicas (metabólitos secundários) que elas
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podem produzir. Em algumas respostas apareceram plantas com espinhos, roseiras e plantas
“carnívoras” como exemplos que representam perigo para o público infantil (Tabela 7).
Tabela 6- Plantas que seriam cultivadas nas casas dos alunos, suas utilidades e citações. Alunos do 3º
ao 5º ano do Ensino Fundamental do CIEP Dr. Armando Leão Ferreira, São Gonçalo, RJ.
Planta
Utilização
Citações
Planta
Utilização
Citações
Roseira
Enfeite e remédio 19
Erva-de-santa-maria Chá
2
Erva-cidreira
Chá calmante
13
Espada-de-são-jorge Enfeite
2
Samambaia
Enfeite
13
Hortelã
Tempero
2
Coqueiro
Enfeite e comer
11
Laranja da terra
Chá (gripe)
2
Boldo
Chá
9
Morango
Comer
2
Acerola
Chá e comer
9
Pimentão
Comer
2
Capim-limão
Chá
7
Romã
Garganta
2
Mangueira
Comer
7
Violeta
Enfeite
2
Saião
Inflamação
7
Abacaxi
Comer
1
Alfavaca
Tempero
6
Arnica
Dor muscular
1
Girassol
Enfeitar
6
Beijo
Enfeite
1
Alface
Comer
5
Cana-do-brejo
Chá
1
Babosa
Cabelo
5
Capim
Enfeite
1
Limão
Comer
5
Dama-da-noite
Enfeite
1
Mamão
Comer
5
Dente-de-leão
Enfeite
1
Abacate
Comer
4
Dormideira
Chá
1
ComigoEnfeite e tirar 4
Feijão
Comer
1
ninguém-pode
olho gordo.
Erva-doce
Chá
4
Graviola
Comer
1
Hortelã-pimenta Tempero
4
Ingá
Comer
1
Orquídea
Enfeite
4
Ipê-amarelo
Enfeite
1
Margarida
Enfeite
4
Ipê-rosa
Enfeite
1
Camomila
Chá
3
Lírio
Enfeite
1
Banana
Comer
3
Louro
Tempero
1
Pimenta
Comer
3
Mandioca
Comer
1
Alecrim
Chá
2
Manjericão
Tempero
1
Amora
Chá (pressão alta) 2
Maracujá
Comer
1
Amor-do-campo Purificar o corpo
2
Oliveira
Abençoa (sagrada) 1
Aroeira
Enfeite
2
Papoula
Enfeite
1
Antúrio
Enfeite
2
Quiabo
Comer
1
Goiaba
Chá
(prender 2
Raio-do-sol
Enfeite
1
intestino)
Café
Chá
2
Salsa
Comer
1
Cana
Comer
2
Tinhorão
Enfeite
1
Canela
Comer
2
Tomate
Comer
1
Cebolinha
Comer
2
Urucum
Tempero
1
Coentro
Tempero
2
Vinácia
Enfeite
1
Copo-de-leite
Enfeite
2
Onze-horas
Enfeite
1
Couve
Comer
2
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Tabela 7- Plantas tóxicas segundo a concepção dos participantes e citações. Alunos do 3º ao 5º ano do
Ensino Fundamental do CIEP Dr. Armando Leão Ferreira, São Gonçalo, RJ.
Plantas
Citações
Plantas
Citações
Carnívora
12
Limoeiro e maconha
4 (cada)
Comigo-ninguém-pode
8
Urtiga
3
Roseira
7
Alecrim e samambaia
2 (cada)
Plantas com espinhos
5
Aroeira, azaleia, beijo, cactos, 1 (cada)
camomila, capim, carrapicheira,
copo-de-leite,
dente-de-leão,
dormideira, erva-doce, espada-desão-jorge, espinheira-santa, girassol,
laranjeira, mamona, margarida,
saião e onze-horas.
A informação anterior avigora a necessidade de divulgar os conhecimentos sobre
plantas tóxicas para as crianças, principais vítimas dos acidentes de intoxicação por plantas.
Pesquisadores enfatizam ainda a necessidade urgente de atividades interdisciplinares de
prevenção pela educação para reduzir o número de acidentes envolvendo plantas tóxicas.
Essas ações devem priorizar os lugares frequentados pelo maior grupo de risco, ou seja, as
crianças, entre os lugares públicos estão as praças, parques, jardins e as escolas (CUADRA et
al., 2012).
Considerações Finais
A partir deste trabalho foi possível chegar a algumas considerações importantes a
respeito da relação entre os participantes e as plantas.
Muitas crianças utilizam plantas em suas brincadeiras cotidianas, inclusive, aquelas
que são reconhecidamente tóxicas. As meninas são as que mais utilizariam plantas para
brincadeiras que imitam as tarefas domésticas. Uma parte significativa dos participantes não
recebe informações ou orientações de seus responsáveis para não brincar ou mexer em plantas
e quando está orientação acontece, em muitos casos envolve o cuidado com as próprias
plantas. As brincadeiras desorientadas podem ser um dos motivos que levam as crianças a
serem as mais acometidas pelas intoxicações por plantas.
A disponibilidade das plantas tóxicas nas residências dos participantes, relacionada à
falta de informação, também pode contribuir para a ocorrência de intoxicação. Algumas
plantas tóxicas são utilizadas para enfeitar o ambiente e para uso simbólico, e em vários
casos, são desconhecidas como contendo substâncias tóxicas. Uma expressiva parcela dos
participantes não soube conceituar e exemplificar plantas tóxicas.
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Outro ponto que merece destaque seria a falta de orientação nos meios de
comunicação, em geral, há diversos programas que ressaltam a toxidade de animais enquanto
que sobre plantas, poucas são as informações de caráter preventivo. O não reconhecimento
das plantas tóxicas que estão ao redor das pessoas também facilitam os acidentes de
intoxicação por plantas.
Enfim, fica evidente a necessidade de ações na área da saúde articulada com a área da
educação, visando maior divulgação das plantas tóxicas e consequentemente a prevenção de
casos intoxicação por plantas.
Agradecimentos
Agradecemos a FAPERJ, CNPq e PROCIÊNCIA (UERJ) pelo suporte financeiro.
Aos professores, alunos, responsáveis dos alunos, funcionários e direção do CIEP 411 pela
disponibilidade para a realização desta pesquisa.
Referências Bibliográficas
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Apêndice 1:
Nome Completo:
Data de nascimento:
Série:
Sexo:
( ) Masculino ( )Feminino
Tipo de moradia:
( ) Casa ( ) Apartamento (prédio)
1-Sua residência possui quintal?
( ) Sim
(
) Não
2- Já brincou com alguma planta? Escreva o nome da planta:
3- Que brincadeiras eram essas?
4- Existe alguma planta que seus responsáveis (ou pessoas mais velhas) não deixe você
mexer? Diga o nome desta planta?
5-Você sabe por que não pode mexer nessas plantas?
Apêndice 2:
Nome Completo:
Série:
1-Que plantas você possui em casa? Cite todos os nomes que puder preenchendo o quadro:
Nome da planta
Para que elas são utilizadas em sua casa?
2-Desenhe e escreva o nome de alguma planta que você conhece:
Apêndice 3:
Nome Completo:
Série:
1-Você conhece alguma pessoa que já tenha passado mal ao mexer, comer ou tomar chá de
alguma planta? Explique como foi e escreva o nome dessa planta?
2-O que são plantas tóxicas?
3-Quais plantas tóxicas você conhece?
Nome da planta
Por que são tóxicas?
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