“FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS SANTO TOMÁS DE AQUINO: UM MARCO REFERENCIAL NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA” Maria de Lourdes Leal dos Santos1/UFU Geraldo Inácio Filho2/UFU INTRODUÇÃO Origem do Problema A Faculdade de Filosofia , Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino, de Uberaba, foi a única instituição de ensino superior no Brasil, criada e administrada pelas Irmãs Dominicanas. É uma instituição confessional que representou grandes conquistas para a cidade de Uberaba e diversas regiões considerando sua filosofia de educação, as aspirações e necessidades de determinados grupos da comunidade uberabense. Sua implantação e consolidação como centro de irradiação de cultura é fundamentada na atuação da Igreja Católica que tinha um papel preponderante no sistema educacional. O processo de criação da faculdade em 1948, até sua consolidação em 1961, foi objeto de pesquisa da tese de Mestrado em Educação, pelo Centro Universitário do Triângulo – UNIT-, defendida em agosto de 2003. Tal estudo revela aspectos históricos de sua gênese que a torna um marco referencial para o desenvolvimento sócio-político- econômico e cultural da região. A pesquisa despertou-me para um novo olhar da história das instituições escolares que é construída com a participação de sujeitos sociais, que não são figurantes, mas atores que empreenderam um fazer histórico. As instituições permanecem ou não, na história, a partir das relações com as pessoas, com os valores que perpetuam, com o conhecimento que é construído historicamente. É necessário evidenciar que o interesse pela História das Instituições Escolares surge a partir da experiência acumulada como aluna egressa do Colégio Nossa Senhora das Dores,importante instituição fundada pelas Irmãs Dominicanas, em 1885; dedicado à educação feminina, onde estudei desde o Ensino Primário até o término do Ensino Médio. Como inúmeras alunas , dei continuidade aos estudos na FISTA, no período de 1977 a 1981.Entretanto em 1980, a faculdade foi “transferida” para a Universidade de 1 2 - Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFU- Universidade Federal de Uberlândia Professor do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação/ UFU - Universidade Federal de Uberlândia Uberaba, sem que, nós, alunos tivéssemos clareza das razões de seu fechamento. São vários os vínculos familiares e afetivos que me entrelaçam com a congregação dominicana. Laços que me oportunizam como membro efetivo da família dominicana, aprofundar as fontes primárias e secundárias que retratam inúmeras peculiaridades da trajetória histórica da ordem. Durante minha caminhada como educadora, tanto no setor público como privado, percebo a escola como um espaço privilegiado enquanto instituição social: lugar de aprendizagem de conhecimentos, de posturas e de valores. supletivos no país. Neste sentido, investigo a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino enquanto espaço social destinado à formação docente procurando compreender os elementos que a torna marco de referência local, regional e nacional, garantindo reflexos até nossos dias. DESENVOLVIMENTO A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino foi criada em 1948, em Uberaba, pela Congregação das Irmãs Dominicanas vindas de Monteils, França, da Província Nossa Senhora do Rosário. Nos cenários local e regional, a elite sócio-econômica e cultural de Uberaba ansiava pela criação de uma instituição de ensino superior que viesse proporcionar aos jovens a continuidade de seus estudos sem necessidade de sair de seu convívio familiar. Muitos destes alunos realizavam seus estudos nos cursos primário e secundário nos mais importantes colégios confessionais da cidade: Colégios Nossa Senhora das Dores e Marista Diocesano. Com o apoio da Igreja local, através do bispo Dom Alexandre Gonçalves do Amaral, que unindo padres, irmãos maristas e irmãs dominicanas, juntamente com a imprescindível influência de Alceu Amoroso Lima, principal interlocutor da Igreja Católica com o Ministério da Educação e Saúde Pública, a FISTA instalou-se no cenário educacional, com uma grande preocupação em dar uma formação humanista aos jovens. Os documentos da imprensa local, os registros da Secretaria de Educação, Arquivo Público Municipal, do Museu do Colégio Nossa Senhora das Dores e relatos dos ex-alunos revelam que todos seus processos educacionais eram norteados por uma postura firme, com bases sólidas que confirmava os preceitos básicos da filosofia dominicana: a comunhão, a verdade e a solidariedade. Primavam por uma educação que valorizasse e respeitasse o ser humano na sua integralidade, frente ao espírito tecnicista que ameaçava dominar a sociedade. As concepções de homem, de sociedade, de mundo e educação eram evidenciadas na ação evangelizadora e no currículo onde a pesquisa já se colocava como princípio fundamental. Paulo Freire (1978) também escreve sobre a concepção de homem como ser plural, estando no mundo, “ enraizados em condições tempo-espaciais que os marcam e a eles igualmente marcam” . Concepção que vai sendo lapidada ao longo do seu trabalho, tomando corpo no trabalho docente, mostrando a importância da relação homem-mundo e destacando o lugar da relação na pedagogia crítica. Vemos a concepção de homem como “ser de relações e não só de contatos, não apenas está no mundo, mas com o mundo. Estar como mundo resulta de sua abertura à realidade, que o faz ser o ente de relações que é” . Assim, busco uma teoria que sinalize as entrelinhas da história das instituições. A questão básica que orienta o presente trabalho é compreender a instituição escolar enquanto espaço de formação. A faculdade foi espaço de consciência histórica, no âmbito da Doutrina Social da Igreja Católica, comprometida com a transformação social, articulada com a diversidade e a pesquisa acadêmica? De que maneira que a proposta pedagógica da FISTA influenciou na trajetória de vida dos alunos e no sistema de ensino da região? Como marco referencial na formação dos professores, o que provocou seu fechamento, em 1980? Ao realizar essa investigação, com certeza, contribuo com as pesquisas que valorizam as interpretações históricas fundamentadas na especificidade e singularidade, estabelecendo uma relação do objeto de pesquisa em níveis local, regional e nacional. A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino , objeto dessa pesquisa, iniciou suas atividades acadêmicas, em 1948, com três cursos: Filosofia, Geografia e História e Letras Clássicas, com 23 alunos efetivamente matriculados. Funcionou em dois prédios distintos até 1954, quando houve sua unificação. Em 1961, instala-se em sede definitiva, efetivando a sua fase de consolidação. Nesse período, constataram-se os rigorosos critérios de fiscalização impostos pelos órgãos governamentais, em todas as atividades ali desenvolvidas pela administração, corpo docente e discente, registrando, ainda, que a preocupação fundamental da Instituição era propiciar aos alunos não só um sólido conhecimento como também uma sólida formação dentro dos princípios cristãos. Em 1973, eram 1.173 alunos matriculados. Em Assembléia Extraordinária, no dia 21 de setembro de 1980, seus cursos são acampados pela FIUBE, Faculdades Integradas de Uberaba. Assim, enfoco o recorte temporal de 1961 a 1980, delineando uma trajetória da faculdade em questão. Resultados Esperados Ao investigar uma instituição escolar, com certeza, realiza-se um estudo de filosofia e história da educação brasileira, pois as instituições escolares expressam valores e idéias educacionais. As investigações abrem possibilidades de novos olhares sobre as políticas educacionais, colaboram na superação da dicotomia entre o particular e o universal, o específico e o geral, o concreto e o conceito. Assim, é fundamental a elaboração de uma história não apenas descritiva, narrativa, mas interpretativa desta instituição. A partir da análise do acervo documental (atas, relatórios, livros de matrícula, livro de ponto, fotografias, depoimentos de ex-alunos, programas de disciplinas) aliada a leituras sobre educação oportuniza-se um estudo sobre as diferentes informações referentes à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino. Procuro traçar um retrato da faculdade, sua organização, seu cotidiano, sua cultura e sua relevância histórica para a cidade de Uberaba e região. O presente estudo irá resgatar o período dos anos sessenta e setenta na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino numa abordagem que trará elementos que confirmem sua identidade, revele seus conflitos, avanços e retrocessos e preencha a lacuna existente no campo da historiografia regional. Pretende-se superar o desafio de investigar nas particularidades da faculdade, características gerais da sociedade e da educação. Ao mesmo tempo, ampliará a compreensão da Doutrina Social da Igreja no processo de formação docente, à luz da filosofia dominicana. OBJETIVOS: Objetivos intrínsecos: a) Apreender o ciclo de vida dessa instituição de ensino superior, no período de 1961 a 1980, com a finalidade de identificar elementos que lhe conferem identidade e resgatar sua memória através de fontes orais, documentos escritos e fontes iconográficas. b) Compreender como se configuram os processos de gestão, organização e avaliação da instituição escolar em questão, enquanto formadora e propagadora de concepções educacionais. c) Construir interpretações a respeito da instituição de ensino superior em questão, focalizando seu sentido histórico no contexto social de sua época, bem como suas Procedimentos Metodológicos Fundamentação Teórica As instituições educacionais são fontes inesgotáveis para a apreensão de uma cultura, pois as mesmas estão impregnadas de valores e idéias educacionais. Investigar uma instituição escolar é uma das formas de se estudar filosofia e história da educação brasileira visto que explicitam os vários atores envolvidos no processo educativo, revela o que se passa no interior das escolas, suas experiências, avanços, contradições, suas relações com o saber, enfim, sua identidade histórica. As inovações no campo da historiografia da educação têm possibilitado novos olhares para essas investigações. Alguns historiadores e educadores elaboram uma história não apenas descritiva, mas interpretativa, usando princípios teórico-metodológicos, de categorias de análise e procedimentos técnicos ligados às fontes de pesquisa. Esta abordagem permite uma visão mais profunda dos espaços sociais destinados aos processos de ensino-aprendizagem, pois levam em conta as especificidades regionais e as singularidades locais e institucionais. Justino Magalhães, um dos teóricos da nova modalidade nos esclarece que Compreender e explicar a existência histórica de uma instituição educativa é, sem deixar de integrá-la na realidade mais ampla que é o sistema educativo, contextualizá-la, implicando-a no quadro de evolução de uma comunidade e de uma região,é por fim sistematizar e (re)escrever-lhe o itinerário de vida na sua multidimensionalidade, conferindo um sentido histórico [MAGALHÃES,1196,p.1]. Nesse sentido, é fundamental considerar nesta investigação a relação da instituição com o contexto social no qual se insere, observando os fatores organizacionais, políticos, religiosos e econômicos que se influenciam mutuamente. Pensar a história dentro de condições particulares e específicas, com as suas múltiplas atividades, necessidades e interesses diferenciados. Será relevante integrar todas estas dimensões no processo de construção das interpretações históricas sobre o passado. Neste aspecto, Ester Buffa ( 1994, p.61) afirma que: “escrever a história de uma escola hegemônica é, de certa forma, escrever a história da escolarização geral do município”.Assim, diante da complexidade desta proposta, buscaremos respaldo teórico em autores como Antônio Nóvoa que valoriza os estudos ligados às singularidades educacionais: É fundamental valorizar os trabalhos produzidos a partir das realidades e dos contextos educacionais. A compreensão histórica dos fenômenos educativos é uma condição essencial à definição de estratégias de inovação. Mas para que esta inovação seja possível é necessário renovar o campo da História da Educação. Ela não é importante apenas porque nos fornece a memória dos percursos educacionais, mas sobretudo porque nos permite compreender que não há nenhum determinismo na evolução dos sistemas educativos, das idéias pedagógicas ou das práticas escolares: tudo é produto de uma construção social. Nessa perspectiva, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino, inserida num contexto da Escola Nova, preocupou-se com uma formação docente pautada nos valores evangélicos e padrões sociais vigentes na época, dentro de suas condições particulares e específicas. Assim, à luz da observação de Antônio Nóvoa (1995, p.22) procura-se a resolução da problemática levantada: Imaginamos que a história é a experiência humana e que esta experiência, por ser contraditória,não tem um sentido único, homogêneo, linear, nem um único significado. Desta forma, fazer história como conhecimento e como vivência é recuperar a ação dos diferentes grupos que nela atuam, procurando entender por que o processo tomou um dado rumo e não outro; significa resgatar as injunções que permitiram a concretização de uma possibilidade e não de outras. Elenco das fontes e etapas Na primeira etapa da investigação as interpretações são através dos anos sessenta a oitenta, tendo como ponta de partida o levantamento bibliográfico da fase de criação e consolidação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino, bem como o levantamento de ex-professores, ex-diretores e ex-alunos , suas respectivas profissões e atuações na sociedade. Na segunda etapa subsidiada pela bibliografia disponível no Centro de Estudos e Documentação Santo Tomás de Aquino, no Arquivo Público Municipal, Secretaria de Educação e Museu do Colégio Nossa Senhora das Dores obtenho respaldo teórico necessário para compreender a relação entre a educação, a formação docente e as esferas sociais, políticas e econômicas. Na terceira etapa através da análise de documentos tais como: atas de reunião pedagógica, de assembléias, regimento interno, reuniões administrativas, relatórios de inspeção, pareceres, livros de matrículas, diários, atas de resultados finais, dentre outros, é feito um estudo exploratório buscando o entendimento da instituição de ensino superior como espaço de formação docente. Para maior aprofundamento da pesquisa, faço um estudo das fontes iconográficas disponíveis no Centro de Estudos e Documentação Santo Tomás de Aquino (CEDSTA). Na quarta etapa, realizarei algumas entrevistas com ex-diretoras, ex-professores, exalunas para atribuir um sentido social às experiências vividas sob diferentes aspectos.Este recurso contribuirá para projetar o passado no presente imediato e trará dados para a elaboração de hipóteses e interpretações dos processos históricos. Na quinta etapa da investigação será a fase de elaboração do texto final, isto é, a apresentação dos resultados através da monografia. Referências Bibliográficas ARQUIVO PÚBLICO MUNICIPAL DE UBERABA. Uberaba, Matriz do Brasil Central, Uberaba, MG.1995 ARAÚJO,José Carlos,GATTI JÚNIOR, Décio (orgs). Novos temas em história da educação brasileira: Instituições escolares e educação na imprensa. São Paulo: Autores Associados; Uberlândia, MG:EDUFU, vol.1,n°1, já.-dez.2002 BUFFA, Éster e NOSELLA,Paolo. Scholla Mater: A Antiga Escola Normal (19111933). São Carlos, UFSCar, 1996. _________Industrialização e educação: a Escola Profissional de São Carlos, 19321971.São Carlos. UFSCar, 1996 (mimeo). FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981,12a Ed. GATTI JR, Décio e outros. História e Memória Educacional: gênese e consolidação do ensino escolar no Triângulo Mineiro, Revista História da Educação. 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