Recursos do mar profundo: potencialidades e ameaças

Propaganda
Ricardo Serrão Santos
Director do Departamento
de Oceanografia e Pescas da
Universidade dos Açores.
Presidente do IMAR-Instituto
do Mar.
Recursos do mar profundo:
potencialidades e ameaças
89
As dificuldades e as adversidades relacionadas com o estudo do oceano profundo não aparecem reflectidas, de
forma equivalente às de outros ambientes, no que respeita aos impactos criados pelas actividades antropogénicas.
Invisível porque oculto sob as águas, o mar profundo e o oceano ao largo foram durante muito tempo considerados como menos impactados pelo uso humano. Contudo, recentemente, a percepção dos prejuízos e a sua
extensão começaram a ser realmente tomados em consideração.
O oceano profundo está reconhecidamente sob ameaça devido a um conjunto de actividade humanas donde sobressaem a exploração pesqueira e a poluição causada pela deposição de resíduos. O actual ou futuro surgimento de
actividades como a mineração, extracção de gases e de petróleo, a sequestração de CO2, deverão ser avaliados de forma
antecipada tendo em vista prever e minimizar os impactos que as mesmas poderão vir a ter. Destas apenas a
extracção de petróleo e de gás é actualmente económica e comercialmente activa, enquanto as outras estão ainda
numa fase de avaliação e de experimentação, mas serão certamente viáveis num futuro muito próximo.
Dia após dia cresce a evidência das ameaças sobre espécies e habitats do oceano profundo. Isto reflecte-se no
número crescente de espécies e de habitats que estão incluídos em listas prioritárias que estabelecem o imperativo
de acções urgentes e os incluem em listas vermelhas. Um outro aspecto relevante é o reconhecimento de que as
espécies e os habitats do mar profundo são em geral mais vulneráveis e menos resilientes do que as espécies e os
habitats de zona menos profundas devido à combinação de factores biológicos e ecológicos: e.g. crescimento lento,
maturidade tardia, longevidade, descontinuidade de populações, etc.
Existe a necessidade de novos instrumentos de gestão e de novas perspectivas quando nos reportamos ao oceano
profundo. Em particular há que ter em consideração que a maioria destes habitats e espécies que lhes estão
associadas estão localizadas no alto mar onde as capacidades de intervenção e a base jurídica ou não existem ou
estão muito além das necessidades (Probert et al. 2007).
90
The difficulties and adversities related with the study of the deep ocean do not appear to be reflected in an
equivalent manner in other environments with regard to the impact created by anthropogenic activities. Invisibly
hidden under the waters, the deep sea and the wide ocean were for a long time considered to be the least affected
by human use. However, recently, the perception of the damage and its extent began to be really taken into
consideration.
The deep ocean is recognisably under threat due to a number of human activities, with special mention for the
fishing industry and pollution caused by waste deposits. The current or future appearance of activities such as
mining, the extraction of gases and petrol, the sequestration of CO2, should be evaluated beforehand to take
into account the forecasting and minimisation of the impact that these may have. Of these, only the extraction of petrol and gas are currently economically and commercially active, while the others are still in an
evaluation and experimentation stage, but which will certainly be viable in the very near future.
Day after day there is growing evidence of the threats to species and habitats of the ocean. This is reflected in
the growing number of species and habitats which are included in priority lists which establish the imperative
of urgent action and includes them in red lists. Another relevant aspect is the recognition that the species and
habitats of the deep sea are in general more vulnerable and less resilient than the species and habitats of more
shallow zones due to the combination of biological and ecological factors: e.g. slow growth, late maturity,
longevity, discontinuity of populations, etc.
There is a need for new management instruments and new perspectives when we speak of the deep ocean. In
particular one has to take into consideration that the majority of these habitats and species associated with
them are located on the high sea where the capacity for intervention and the legal basis either do not exist or fall
far short of what is needed (Probert et al. 2007).
Introdução
Profundo, escuro, vasto e sujeito a tremenda
pressão barométrica, o fundo dos oceanos é a
maior componente do nosso planeta e, também por isso, a mais desconhecida. Os satélites, novos instrumentos introduzidos no século XX, são incapazes de o descortinar. As
observações visuais são apenas possíveis com
câmaras acopladas a robots e através de submersíveis tripulados operados por grandes navios
oceânicos extremamente caros em termos de
operação. Devido a isto apenas uma pequena
parcela do oceano profundo foi de facto cientificamente estudada.
Grande parte deste grande “ecossistema” é
constituído por planícies abissais e fundos arenosos e lodosos, geralmente caracterizados por
baixa produtividade (e dependente da matéria orgânica que cai da superfície), baixa energia física,
baixa macrodiversidade biológica e baixas taxas
biológicas. Outras importantes componentes do
mar profundo são as estruturas topográficas sólidas, i.e. de rocha ou aglomerados duros, como
as cristas atlânticas, os montes e os canhões submarinos e os campos hidrotermais.
As “cristas” ou dorsais laceram de forma contínua todos os oceanos do nosso planeta. Os
montes submarinos, canhões e campos de maciços hidrotermais distribuem-se no espaço de
forma discreta, por vezes organizados em clusters. Em contraste com as planícies abissais, os
habitats que compõem estas áreas são geralmente
muito produtivos, apresentando biomassas de
até 20 kg/m2 nas fontes hidrotermais, comparados com o cerca de 1 g/m2 que se observa nos
fundos moles das planícies abissais.
A importância dos oceanos
Imenso: 70% da superfície do planeta Terra e
90% do volume que está ocupado por vida: 170
vezes mais espaço disponível para a vida do que
todos os outros ecossistemas combinados.
Desconhecido: no mar profundo apenas uma área
correspondente a alguns campos de futebol foi
de facto amostrada do ponto de vista científico.
Diverso: supõe-se que o fundo dos oceanos
contenha mais de 10 milhões de macroespécies
bênticas e 100 milhões de espécies do meio-bentos (comparado com 1,7 milhões de espécies
descritas para o conjunto dos ecossistemas do
nosso planeta).
Variado: o oceano profundo é um mosaico com
vários níveis de produtividade e biomassa. Por
exemplo nas planícies abissais encontramos em
regra baixas biomassas, mas elevada biodiversidade, sobretudo de pequenos organismos e bactérias que vivem enterrados nos seus fundos
moles, enquanto que nos ecossistemas hidrotermais encontramos biomassas elevadíssimas
mas diversidade biológica baixa.
Rico: no solo e subsolo marinhos são abundantes os depósitos minerais. O mar profundo
alberga cerca de 100 milhões de toneladas de depósitos de sulfuretos polimetálicos maciços, que
contêm em proporções variadas um conjunto
de minerais nobres como o ouro, a prata, o cobre, o zinco, o titânio, o cobalto, entre outros.
Pescas de profundidade
Os recursos vivos marinhos são uma das
componentes mais problemáticas no âmbito
da gestão do mar profundo. Note-se que a exploração pesqueira passa por uma crise assinalável já que mais de 50% dos mananciais estão
no limite máximo de exploração, enquanto 25%
do restante está sobre-explorado.
A crise nos recursos vivos das plataformas
continentais conduziu à descoberta de agregações de peixes nos montes submarinos para
onde emigraram muitos elementos de frotas
pesqueiras em crise nos anos 1980 e 1990. A
parte fundamental desta frota era/é constituída por arrastões de alto mar, que rapidamente
reduziram os novos mananciais de pescado
donde se destaca o peixe-relógio e os oreos do
largo da Nova Zelândia e do Sudeste Australiano nos anos 1980 e, subsequentemente, no
Atlântico Norte. A exploração dos montes submarinos rapidamente se estendeu a todo os oceanos. Em todos os casos observou-se uma depauperação rápida dos mananciais.
Por outro lado a técnica de arrasto intensivo
introduzida nas pescas de profundidade acabou por produzir uma pesca acessória de organismos bentónicos (i.e. que vivem presos ou
91
92
associados ao substrato dos fundos marinhos).
Nestas pescarias estão devidamente reportados
a degradação de habitats e a depauperação da
biodiversidade local e da biomassa das espécies
bênticas. Algumas das espécies mais afectadas
são os recifes de corais frios e as esponjas de
profundidade, cuja longevidade pode atingir os
mil anos de idade.
As pescas de profundidade, particularmente
as que utilizam redes de arrasto e de emalhar,
constituem a ameaça actual mais premente e
perniciosa para o mar profundo. No entanto,
como desenvolverei adiante, as perfurações para
a extracção de hidrocarbonetos e a mineração
do solo e subsolo marinhos poderão ser uma
ameaça futura também importante (vd. secção
seguinte). Como aquelas, estas actividades podem afectar de modo particular os corais frios e
as esponjas de profundidade que formam recifes orgânicos (Roberts 2002, 2006, Hall Spencer et al. 2002). A recuperação destes ambientes
pode levar milhares de anos, mas pensa-se que
nalguns casos nunca cheguem a recuperar (Murray et al. 2006). A resiliência pode ser impossível nestes habitats altamente estruturados, baseados em construtores de recifes de elevada
longevidade. Pelo menos não são comparáveis
a tudo o que conhecemos dos habitats de baixa
profundidade e costeiros.
A pergunta que se coloca é se é possível gerir
de forma sustentável os recursos vivos do mar
profundo? As descargas de recursos vivos do
mar deslocaram-se nos últimos anos para as
espécies de profundidade (Morato et al. 2006b).
Grande parte dessa biomassa extraída do mar
profundo é constituída por peixes. É conhecido que os peixes de profundidade têm uma
vulnerabilidade intrínseca acrescida (Morato et
al. 2006a) devido a um conjunto de características únicas do seu ciclo vital, como sejam o crescimento lento, longevidade (e.g. o peixe-relógio pode atingir os 150 anos de idade), a
maturidade tardia (e.g. aos 40 anos também no
peixe-relógio), o crescimento lento, etc. Estes
factores tornam as espécies de profundidade
mais sensíveis à exploração. É do entendimento geral que o arrasto de profundidade e as redes de emalhar são equivalentes a uma “mineração” de pescado, e que conduzem à extinção
comercial das espécies. A sustentabilidade dos
recursos vivos de grande profundidade só parece ser viável onde se praticam pescas tradicionais, como em algumas zonas arquipelágicas.
Em termos de investigação existe pois a necessidade de comparar a dinâmica das populações de mananciais de pescado onde se exerce
exploração com métodos tradicionais (i.e. com
linha e anzol e long-line de fundo a partir de
embarcações até 30 metros) e os mananciais
das mesmas espécies ou espécies equivalentes
e que são explorados por métodos industriais
que incluem os arrastos de fundo e o long-line
automatizado.
A pesca de profundidade industrial é considerada como não renovável (Glover & Smith
2003). Para além dos efeitos directos nas espécies alvo e nas espécies acessórias de peixe e invertebrados, na maioria das vezes não aproveitados, provoca também perturbação extensiva
e excessiva dos habitats (Gianni 2004). As consequências necessitam ser avaliadas e estudadas
de perto. Do ponto de vista futuro da investigação vão ser necessários estudos compreensivos baseados na monitorização das áreas afectadas, a par de observações em áreas virgens e
áreas protegidas a estabelecer em alto mar. Por
outro lado será necessário proceder a estudos
experimentais de pequena escala envolvendo a
remoção de organismos e seguir a sucessão de
colonização no tempo e no espaço. Estes estudos deveriam ser lançados a nível europeu.
A questão que se põe não é se já afectámos os
recursos bióticos do mar profundo, mas se será
possível restabelecê-los. Alguns habitats do mar
profundo, como os fundos móveis das planícies
abissais, quando perturbados pela actividade
humana como o arrasto de pesca e a mineração
podem eventualmente restabelecer-se num período mais ou menos curto de tempo. Outros
como os montes submarinos, oásis de vida onde
os organismos filtrados como os corais e as esponjas formam agregações podem levar milhares de anos a fazê-lo, se é que se restabelecem.
Extracção de petróleo,
gases e minerais
A extracção de petróleo e de gás do subsolo
marinho são importantes e complexas activi-
dades económicas e comerciais, há longo tempo estabelecidas e que por isso hoje têm regras
bem constituídas que têm em vista avaliar e
minimizar impactos negativos nos ambientes
e ecossistemas da zona de influência da exploração (Glover & Smith 2003). Em contraste, a
exploração mineral encontra-se ainda numa fase
inicial e, em muitos casos experimental, e de
prospecção da viabilidade. No entanto, espera-se que cresça o interesse e a viabilidade da exploração mineira do mar profundo num futuro muito próximo.
Crostas e nódulos de manganês
Uma das potenciais actividades de exploração
mineral de que mais se fala e que mais interesse
económico parece despertar está relacionada
como os nódulos de manganês. Estes nódulos
encontram-se a grande profundidade sobre o
solo marinho. Todos os nódulos contêm um
nucelo composto de um material central que
pode ser espinha de peixe, dente de tubarão,
espinho de ouriço, fragmento de rocha vulcânica. As crostas e os nódulos de manganês estão
entre os depósitos minerais de mais lenta formação: de 1 a 20 mm em cada milhão de anos.
A espessura de uma crosta varia entre menos de
1 mm até 240 mm (comummente entre 20 e 40
mm de espessura) (Verlaan 1992). Os nódulos
são compostos polimetálicos onde se incluem
o níquel, o cobalto, o manganês, o cobre, para
além da presença de ouro, prata, titânio e zinco.
As quantidades de níquel, cobalto e manganês
nos depósitos oceânicos de nódulos devem exceder as das reservas terrestres.
O impacto na vida bentónica dos fundos marinhos de actividades mineiras como a exploração de nódulo de manganês tem sido objecto
de vários estudos (e.g. Anhert & Schriever 2001,
Borowski 2001, Vopel & Thiel 2001) na sequência de centenas de cruzeiros de prospecção liderados por consórcios internacionais. No entanto nenhum destes estudos avaliou o impacto
das plumas produzidas durante o processo de
extracção e que se disseminam pela coluna de
água. Não existem estudos de impacto de confiança relativos à exploração das crostas de manganês ou de maciços polimetálicos.
Hidratos de metano
Outro recurso potencial do oceano profundo é o hidrato de metano. Os hidratos de metano têm o aspecto de gelo e ocorrem nos fundos de diversos mares e oceanos. Têm origem
em moléculas de metano libertadas durante a
digestão de matéria orgânica por parte de bactérias. O metano fica aprisionado em cristais de
água que acabam por formar os hidratos. Os
cristais de hidrato de metano podem distribuir-se por centenas de metros abaixo do solo marinho. Para além do seu grande potencial como
combustível primário, os hidratos de metano,
no seu conjunto, albergam habitats bacterianos
únicos. Sabe-se que 60% das bactérias que vivem na Terra estão em sedimentos no subsolo
marinho. Calcula-se que o volume de gás nos
reservatórios mundiais de hidratos de metano
exceda o volume das reservas terrestres.
Sulfuretos polimetálicos
dos campos hidrotermais
As crostas de sulfuretos polimetálicos ocorrem nos centros de separação das dorsais médias oceânicas. Formam-se aí chaminés de depósitos minerais que são trazidos ao nível do solo
marinho pela água que tendo penetrado no
subsolo se misturou com diversos minerais e
ressurge novamente ao nível do solo extremamente aquecida. Estas crostas podem conter os
mesmos metais nobres que referimos para as
crostas de manganês. Ao mesmo tempo estes
sítios albergam comunidades quimossintéticas
de grande interesse biotecnológico.
Impactos potenciais da
extracção mineral e de gás
Uma coisa é certa, a extracção mineral irá crescer de importância no futuro, atingindo interesse comercial. A extracção de petróleo e gás a
níveis mais profundo no subsolo marinho terá
grande procura num futuro muito próximo.
Esperam-se novas soluções tecnológicas para a
exploração (Wiltshire 2001). Por isso vão ser
também necessários mais estudos sobre o im-
93
94
pacto nos organismos e habitats, quer dos ambientes bentónicos, quer pelágicos.
Está comprovada a existência de 3000 vezes
mais metano no mar profundo do que em qualquer outra parte da Terra. A extracção é inevitável como substituto dos combustíveis fósseis.
Contudo, o metano tem implicações significativas no clima. As principais preocupações ambientais relacionadas com a sua exploração estarão focalizadas neste aspecto. Para além disso
a extracção de metano terá efeitos nas comunidades microbiológicas e bacterianas que vivem
nestes ambientes. Desconhece-se, e é difícil de
prever, a relevância e extensão deste impacto.
A extracção mineral no mar profundo que,
como disse atrás, está ainda numa fase de desenvolvimento, utiliza a tecnologia de máquinas
autopropulsionadas com vibradores que esmagam as crostas para elevação hidráulica a partir de
profundidades de 800 a 3000 m. Quando os
nódulos de manganês são colhidos o sedimento fino também aspirado é espalhado à superfície espalhando-se como plumas na coluna de
água podendo assim afectar extensas áreas dos
oceanos, para além da perturbação directa nos
organismos bênticos no local da exploração.
cas oceânicas. O plano parece incontornável e
decorrem experiências nesse sentido. A solução
pode levantar alguns problemas ou efeitos laterais como a indução de mudanças no pH e
modificações na bioquímica local, o que pode
provocar transformações concomitantes nas
comunidades biológicas locais.
No entanto, dada a imensidão do mar profundo os seus solo e subsolo estão de facto
menos impactados do que zonas costeiras equivalentes. Espera-se que muitos países venham
a requerer a eliminação de CO2 através da sua
sequestração nos fundos marinhos. Os impactos sobre a fauna local podem não ser negligenciáveis (Glover & Smith 2003).
Os poucos estudos disponíveis (Grassle &
Morse-Porteous 1987, Shirayama 1997, Watanabe et al. 2006) e o conhecimento de desastres
naturais que tenham ocorrido com alguma equivalência aos processos em causa (Masson et al.
1992) aparentam conclusões desconjuntas. No
entanto há que reconhecer que os organismos
do oceano profundo reagem de forma distinta
dos seus congéneres das zonas costeiras e são
geralmente mais tolerantes a exposições, como
no caso do CO2.
O mar profundo
enquanto depósito
Habitats e ecossistemas
prioritários
Os oceanos, em particular o mar profundo,
foram considerados com capacidade infinita
para diluir e reciclar quaisquer substâncias tornando-as inofensivas. Neste sentido o mar
profundo tornou-se no século XX o local eleito para a eliminação de uma gama de substâncias, e.g. radioactivas, metais pesados, carbono, etc. As ameaças para a vida marinha são
bem conhecidas, o que conduziu a mudanças
significativas nos procedimentos de eliminação deste tipo de desperdícios. Basta lembrar
que o depósito de substâncias radioactivas no
mar profundo foi praticamente abandonado.
Actualmente o maior desafio coloca-se na “teoria” da sequestração de carbono no subsolo em
mar profundo.
Há já alguns anos que se pensa na eliminação
por depósito do CO2 produzido por diversas
actividades industriais em formações geológi-
Várias convenções, comités, conselhos e directivas (e.g. OSPAR, ICES, IUCN, BDC, NATURA
2000, etc.) definiram recentemente um conjunto
de habitats e de espécies que necessitam de acções urgentes, e.g. os montes submarinos, os
recifes de corais frios, as agregações de esponjas,
as dorsais oceânicas com sistemas hidrotermais,
etc. Existe também um interesse crescente na criação de Áreas Marinhas Protegidas. Estes processos resultam do reconhecimento de ameaças reais
e actuais sobre os recursos, a biodiversidade e os
habitats do mar profundo.
Considerações finais
As pescarias são a actividade humana de exploração de recursos marinhos que está melhor documentada. O efeito negativo em rela-
ção a espécies-alvo, espécies acessórias e os habitats (ou efeitos colaterais) não levanta grandes dúvidas tendo atingido os recursos do mar
profundo (Morato et al. 2006b). Aliás, as pescas
de profundidade são consideradas equivalentes a “mineração de recursos vivos”. É muito
provável que alguns mananciais de pescado de
profundidade já não recuperem dos efeitos de
sobre-exploração, ao mesmo tempo que os danos causados aos habitats pelos arrastos de
profundidade sejam também irreversíveis no
local onde até à data ocorreram.
Quanto às actividades de exploração mineral, ou estão no início ou ainda numa fase conceptual. No entanto elas serão incontornáveis,
dado o esgotamento previsto dos recursos das
jazidas mais tradicionais. A exploração petrolífera em ambiente marinho é já uma realidade com vários anos e a tecnologia tem assegurado desenvolvimentos que garantem uma
exploração a níveis cada vez mais profundos.
A gestão ambiental dos procedimentos de exploração e minimização de impactos, apesar
de alguns acidentes e impactos inevitáveis,
tem, no entanto, melhorado ao longo dos
anos. Os impactos negativos para o ambiente, que se podem antecipar, relacionados com
a exploração mineral nos fundos oceânicos são
difíceis de predizer com base nas experiências
realizadas até à data.
Quanto à contaminação por eliminação de
detritos no solo ou no subsolo marinhos, incluindo depósito de substâncias radioactivas e
metais pesados, é conhecida desde longa data e
existem esforços internacionais para os controlar. Os efeitos da sequestração de CO2 necessitam ser avaliados e antecipados.
A comunidade científica internacional e as
organizações internacionais governamentais e
não-governamentais estão cada vez mais empenhadas no debate relativo aos critérios de
exploração dos fundos oceânicos, em especial
nas zonas fora das jurisdições nacionais onde o
quadro jurídico é mais frágil e incerto. Como o
futuro ao homem pertence, a discussão e as
soluções encontradas devem servir a sustentabilidade e o equilíbrio do planeta e dos seus
oceanos, acautelando que as acções a desenvolver no futuro se baseiem num conhecimento
científico rigoroso dos processos em causa.
Referências
Ahnert A, Schriever G, 2001. Response of
abyssal Copepoda Harpacticoida (Crustacea)
and other meiobenthos to an artificial disturbance and its bearing on future mining for polymetallic nodules. Deep-Sea Research II 48:
3779-3794.
Borowski C, 2001. Physically disturbed deepsea macrofauna in the Peru Basin, southeast
Pacific, revisited 7 years after the experimental
impact. Deep-Sea Research II 55: 55-81.
Glover AG, Smith CR, 2003. The deep-sea
floor ecosystem: current status and prospects
of anthropogenic change by the year 2025. Environmental Conservation 30 (3): 219-241.
Gianni M, 2004. High seas bottom trawl fisheries and their impacts on the biodiversity
of vulnerable deep-sea ecosystems. IUCN,
Gland, Switzerland: 90 pp.
Gjerde K, 2006. Ecosystems and biodiversity in deep waters and high seas. UNEP Regional Seas Report and Studies 178: 58 pp.
Grassle JF, Morse-Porteous LS, 1987. Macrofaunal colonization of disturbed deep-sea environments and the structure of deep-sea benthic communities. Deep-Sea Research II 34:
1911-1950.
Hall-Spencer J, Allain V, Fossa JH, 2002. Trawling damage to Northeast Atlantic ancient coral
reefs. Proceedings of the Royal Society of London
Series B-Biological Sciences 269 (1490): 507-511.
Morato T, Cheung WWL, Pitcher TJ, 2006a:
Vulnerability of seamount fish to fishing: fuzzy analysis of life-history attributes. Journal
of Fish Biology 68 (1): 209-221.
Morato T, Watson R, Pitcher TJ, Pauly D,
2006b Fishing down the deep. Fish and Fisheries 7 (1): 24-34.
Probert PK, Christiansen S, Gjerde KJ, Gubbay S, Santos RS, 2007. Management and conservation of seamounts (Chapter 20). T. Pitcher, P. Hart. T. Morato, M. Clark , R.S. Santos
(Eds.). Seamounts: Ecology, Fisheries and Conservation. Blackwell Publishing (in press).
Roberts CM, 2002. Deep impact: the rising
toll of fishing in the deep sea. Trends in Ecology and Evolution, 17: 242–245.
Roberts JM, Wheeler AJ, Freiwald A, 2006.
Reefs of the deep: The biology and geology
95
of cold-water coral ecosystems. Science, 312:
543-547.
Shirayama Y, 1997. Biodiversity and biological impact of ocean disposal of carbon dioxide. Waste Management 17 (5-6): 381-384.
Tyler PA, 2003 Disposal in the deep sea: analogue of nature or faux ami? Environmental
Conservation 30 (1): 26-39.
Vopel K, Thiel H, 2001. Abyssal nematode
assemblages in physically disturbed and adajacent sites of the eastern equatorial Pacific. DeepSea Research II 48: 3795-3808.
96
Watanabe Y, Yamaguchi A, Ishidai H, Harimoto T, Suzuki S, Sekido Y, Ikeda T, Shirayama Y, Mac Takashi M, Ohsumi T, Ishizaka J,
2006 Lethality of increasing CO2 levels on deepsea copepods in the western North Pacific. Journal of Oceanography 62 (2): 185-196.
Wiltshire J, 2001. Future prospects for the
marine minerals industry. Underwater 13: 40-44.
Young TR, 2003. Developing a legal strategy
for high seas marine protected areas. Workshop:
High Seas Marine Protected Areas, Malaga:
36 pp.
Download