Ricardo Serrão Santos Director do Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores. Presidente do IMAR-Instituto do Mar. Recursos do mar profundo: potencialidades e ameaças 89 As dificuldades e as adversidades relacionadas com o estudo do oceano profundo não aparecem reflectidas, de forma equivalente às de outros ambientes, no que respeita aos impactos criados pelas actividades antropogénicas. Invisível porque oculto sob as águas, o mar profundo e o oceano ao largo foram durante muito tempo considerados como menos impactados pelo uso humano. Contudo, recentemente, a percepção dos prejuízos e a sua extensão começaram a ser realmente tomados em consideração. O oceano profundo está reconhecidamente sob ameaça devido a um conjunto de actividade humanas donde sobressaem a exploração pesqueira e a poluição causada pela deposição de resíduos. O actual ou futuro surgimento de actividades como a mineração, extracção de gases e de petróleo, a sequestração de CO2, deverão ser avaliados de forma antecipada tendo em vista prever e minimizar os impactos que as mesmas poderão vir a ter. Destas apenas a extracção de petróleo e de gás é actualmente económica e comercialmente activa, enquanto as outras estão ainda numa fase de avaliação e de experimentação, mas serão certamente viáveis num futuro muito próximo. Dia após dia cresce a evidência das ameaças sobre espécies e habitats do oceano profundo. Isto reflecte-se no número crescente de espécies e de habitats que estão incluídos em listas prioritárias que estabelecem o imperativo de acções urgentes e os incluem em listas vermelhas. Um outro aspecto relevante é o reconhecimento de que as espécies e os habitats do mar profundo são em geral mais vulneráveis e menos resilientes do que as espécies e os habitats de zona menos profundas devido à combinação de factores biológicos e ecológicos: e.g. crescimento lento, maturidade tardia, longevidade, descontinuidade de populações, etc. Existe a necessidade de novos instrumentos de gestão e de novas perspectivas quando nos reportamos ao oceano profundo. Em particular há que ter em consideração que a maioria destes habitats e espécies que lhes estão associadas estão localizadas no alto mar onde as capacidades de intervenção e a base jurídica ou não existem ou estão muito além das necessidades (Probert et al. 2007). 90 The difficulties and adversities related with the study of the deep ocean do not appear to be reflected in an equivalent manner in other environments with regard to the impact created by anthropogenic activities. Invisibly hidden under the waters, the deep sea and the wide ocean were for a long time considered to be the least affected by human use. However, recently, the perception of the damage and its extent began to be really taken into consideration. The deep ocean is recognisably under threat due to a number of human activities, with special mention for the fishing industry and pollution caused by waste deposits. The current or future appearance of activities such as mining, the extraction of gases and petrol, the sequestration of CO2, should be evaluated beforehand to take into account the forecasting and minimisation of the impact that these may have. Of these, only the extraction of petrol and gas are currently economically and commercially active, while the others are still in an evaluation and experimentation stage, but which will certainly be viable in the very near future. Day after day there is growing evidence of the threats to species and habitats of the ocean. This is reflected in the growing number of species and habitats which are included in priority lists which establish the imperative of urgent action and includes them in red lists. Another relevant aspect is the recognition that the species and habitats of the deep sea are in general more vulnerable and less resilient than the species and habitats of more shallow zones due to the combination of biological and ecological factors: e.g. slow growth, late maturity, longevity, discontinuity of populations, etc. There is a need for new management instruments and new perspectives when we speak of the deep ocean. In particular one has to take into consideration that the majority of these habitats and species associated with them are located on the high sea where the capacity for intervention and the legal basis either do not exist or fall far short of what is needed (Probert et al. 2007). Introdução Profundo, escuro, vasto e sujeito a tremenda pressão barométrica, o fundo dos oceanos é a maior componente do nosso planeta e, também por isso, a mais desconhecida. Os satélites, novos instrumentos introduzidos no século XX, são incapazes de o descortinar. As observações visuais são apenas possíveis com câmaras acopladas a robots e através de submersíveis tripulados operados por grandes navios oceânicos extremamente caros em termos de operação. Devido a isto apenas uma pequena parcela do oceano profundo foi de facto cientificamente estudada. Grande parte deste grande “ecossistema” é constituído por planícies abissais e fundos arenosos e lodosos, geralmente caracterizados por baixa produtividade (e dependente da matéria orgânica que cai da superfície), baixa energia física, baixa macrodiversidade biológica e baixas taxas biológicas. Outras importantes componentes do mar profundo são as estruturas topográficas sólidas, i.e. de rocha ou aglomerados duros, como as cristas atlânticas, os montes e os canhões submarinos e os campos hidrotermais. As “cristas” ou dorsais laceram de forma contínua todos os oceanos do nosso planeta. Os montes submarinos, canhões e campos de maciços hidrotermais distribuem-se no espaço de forma discreta, por vezes organizados em clusters. Em contraste com as planícies abissais, os habitats que compõem estas áreas são geralmente muito produtivos, apresentando biomassas de até 20 kg/m2 nas fontes hidrotermais, comparados com o cerca de 1 g/m2 que se observa nos fundos moles das planícies abissais. A importância dos oceanos Imenso: 70% da superfície do planeta Terra e 90% do volume que está ocupado por vida: 170 vezes mais espaço disponível para a vida do que todos os outros ecossistemas combinados. Desconhecido: no mar profundo apenas uma área correspondente a alguns campos de futebol foi de facto amostrada do ponto de vista científico. Diverso: supõe-se que o fundo dos oceanos contenha mais de 10 milhões de macroespécies bênticas e 100 milhões de espécies do meio-bentos (comparado com 1,7 milhões de espécies descritas para o conjunto dos ecossistemas do nosso planeta). Variado: o oceano profundo é um mosaico com vários níveis de produtividade e biomassa. Por exemplo nas planícies abissais encontramos em regra baixas biomassas, mas elevada biodiversidade, sobretudo de pequenos organismos e bactérias que vivem enterrados nos seus fundos moles, enquanto que nos ecossistemas hidrotermais encontramos biomassas elevadíssimas mas diversidade biológica baixa. Rico: no solo e subsolo marinhos são abundantes os depósitos minerais. O mar profundo alberga cerca de 100 milhões de toneladas de depósitos de sulfuretos polimetálicos maciços, que contêm em proporções variadas um conjunto de minerais nobres como o ouro, a prata, o cobre, o zinco, o titânio, o cobalto, entre outros. Pescas de profundidade Os recursos vivos marinhos são uma das componentes mais problemáticas no âmbito da gestão do mar profundo. Note-se que a exploração pesqueira passa por uma crise assinalável já que mais de 50% dos mananciais estão no limite máximo de exploração, enquanto 25% do restante está sobre-explorado. A crise nos recursos vivos das plataformas continentais conduziu à descoberta de agregações de peixes nos montes submarinos para onde emigraram muitos elementos de frotas pesqueiras em crise nos anos 1980 e 1990. A parte fundamental desta frota era/é constituída por arrastões de alto mar, que rapidamente reduziram os novos mananciais de pescado donde se destaca o peixe-relógio e os oreos do largo da Nova Zelândia e do Sudeste Australiano nos anos 1980 e, subsequentemente, no Atlântico Norte. A exploração dos montes submarinos rapidamente se estendeu a todo os oceanos. Em todos os casos observou-se uma depauperação rápida dos mananciais. Por outro lado a técnica de arrasto intensivo introduzida nas pescas de profundidade acabou por produzir uma pesca acessória de organismos bentónicos (i.e. que vivem presos ou 91 92 associados ao substrato dos fundos marinhos). Nestas pescarias estão devidamente reportados a degradação de habitats e a depauperação da biodiversidade local e da biomassa das espécies bênticas. Algumas das espécies mais afectadas são os recifes de corais frios e as esponjas de profundidade, cuja longevidade pode atingir os mil anos de idade. As pescas de profundidade, particularmente as que utilizam redes de arrasto e de emalhar, constituem a ameaça actual mais premente e perniciosa para o mar profundo. No entanto, como desenvolverei adiante, as perfurações para a extracção de hidrocarbonetos e a mineração do solo e subsolo marinhos poderão ser uma ameaça futura também importante (vd. secção seguinte). Como aquelas, estas actividades podem afectar de modo particular os corais frios e as esponjas de profundidade que formam recifes orgânicos (Roberts 2002, 2006, Hall Spencer et al. 2002). A recuperação destes ambientes pode levar milhares de anos, mas pensa-se que nalguns casos nunca cheguem a recuperar (Murray et al. 2006). A resiliência pode ser impossível nestes habitats altamente estruturados, baseados em construtores de recifes de elevada longevidade. Pelo menos não são comparáveis a tudo o que conhecemos dos habitats de baixa profundidade e costeiros. A pergunta que se coloca é se é possível gerir de forma sustentável os recursos vivos do mar profundo? As descargas de recursos vivos do mar deslocaram-se nos últimos anos para as espécies de profundidade (Morato et al. 2006b). Grande parte dessa biomassa extraída do mar profundo é constituída por peixes. É conhecido que os peixes de profundidade têm uma vulnerabilidade intrínseca acrescida (Morato et al. 2006a) devido a um conjunto de características únicas do seu ciclo vital, como sejam o crescimento lento, longevidade (e.g. o peixe-relógio pode atingir os 150 anos de idade), a maturidade tardia (e.g. aos 40 anos também no peixe-relógio), o crescimento lento, etc. Estes factores tornam as espécies de profundidade mais sensíveis à exploração. É do entendimento geral que o arrasto de profundidade e as redes de emalhar são equivalentes a uma “mineração” de pescado, e que conduzem à extinção comercial das espécies. A sustentabilidade dos recursos vivos de grande profundidade só parece ser viável onde se praticam pescas tradicionais, como em algumas zonas arquipelágicas. Em termos de investigação existe pois a necessidade de comparar a dinâmica das populações de mananciais de pescado onde se exerce exploração com métodos tradicionais (i.e. com linha e anzol e long-line de fundo a partir de embarcações até 30 metros) e os mananciais das mesmas espécies ou espécies equivalentes e que são explorados por métodos industriais que incluem os arrastos de fundo e o long-line automatizado. A pesca de profundidade industrial é considerada como não renovável (Glover & Smith 2003). Para além dos efeitos directos nas espécies alvo e nas espécies acessórias de peixe e invertebrados, na maioria das vezes não aproveitados, provoca também perturbação extensiva e excessiva dos habitats (Gianni 2004). As consequências necessitam ser avaliadas e estudadas de perto. Do ponto de vista futuro da investigação vão ser necessários estudos compreensivos baseados na monitorização das áreas afectadas, a par de observações em áreas virgens e áreas protegidas a estabelecer em alto mar. Por outro lado será necessário proceder a estudos experimentais de pequena escala envolvendo a remoção de organismos e seguir a sucessão de colonização no tempo e no espaço. Estes estudos deveriam ser lançados a nível europeu. A questão que se põe não é se já afectámos os recursos bióticos do mar profundo, mas se será possível restabelecê-los. Alguns habitats do mar profundo, como os fundos móveis das planícies abissais, quando perturbados pela actividade humana como o arrasto de pesca e a mineração podem eventualmente restabelecer-se num período mais ou menos curto de tempo. Outros como os montes submarinos, oásis de vida onde os organismos filtrados como os corais e as esponjas formam agregações podem levar milhares de anos a fazê-lo, se é que se restabelecem. Extracção de petróleo, gases e minerais A extracção de petróleo e de gás do subsolo marinho são importantes e complexas activi- dades económicas e comerciais, há longo tempo estabelecidas e que por isso hoje têm regras bem constituídas que têm em vista avaliar e minimizar impactos negativos nos ambientes e ecossistemas da zona de influência da exploração (Glover & Smith 2003). Em contraste, a exploração mineral encontra-se ainda numa fase inicial e, em muitos casos experimental, e de prospecção da viabilidade. No entanto, espera-se que cresça o interesse e a viabilidade da exploração mineira do mar profundo num futuro muito próximo. Crostas e nódulos de manganês Uma das potenciais actividades de exploração mineral de que mais se fala e que mais interesse económico parece despertar está relacionada como os nódulos de manganês. Estes nódulos encontram-se a grande profundidade sobre o solo marinho. Todos os nódulos contêm um nucelo composto de um material central que pode ser espinha de peixe, dente de tubarão, espinho de ouriço, fragmento de rocha vulcânica. As crostas e os nódulos de manganês estão entre os depósitos minerais de mais lenta formação: de 1 a 20 mm em cada milhão de anos. A espessura de uma crosta varia entre menos de 1 mm até 240 mm (comummente entre 20 e 40 mm de espessura) (Verlaan 1992). Os nódulos são compostos polimetálicos onde se incluem o níquel, o cobalto, o manganês, o cobre, para além da presença de ouro, prata, titânio e zinco. As quantidades de níquel, cobalto e manganês nos depósitos oceânicos de nódulos devem exceder as das reservas terrestres. O impacto na vida bentónica dos fundos marinhos de actividades mineiras como a exploração de nódulo de manganês tem sido objecto de vários estudos (e.g. Anhert & Schriever 2001, Borowski 2001, Vopel & Thiel 2001) na sequência de centenas de cruzeiros de prospecção liderados por consórcios internacionais. No entanto nenhum destes estudos avaliou o impacto das plumas produzidas durante o processo de extracção e que se disseminam pela coluna de água. Não existem estudos de impacto de confiança relativos à exploração das crostas de manganês ou de maciços polimetálicos. Hidratos de metano Outro recurso potencial do oceano profundo é o hidrato de metano. Os hidratos de metano têm o aspecto de gelo e ocorrem nos fundos de diversos mares e oceanos. Têm origem em moléculas de metano libertadas durante a digestão de matéria orgânica por parte de bactérias. O metano fica aprisionado em cristais de água que acabam por formar os hidratos. Os cristais de hidrato de metano podem distribuir-se por centenas de metros abaixo do solo marinho. Para além do seu grande potencial como combustível primário, os hidratos de metano, no seu conjunto, albergam habitats bacterianos únicos. Sabe-se que 60% das bactérias que vivem na Terra estão em sedimentos no subsolo marinho. Calcula-se que o volume de gás nos reservatórios mundiais de hidratos de metano exceda o volume das reservas terrestres. Sulfuretos polimetálicos dos campos hidrotermais As crostas de sulfuretos polimetálicos ocorrem nos centros de separação das dorsais médias oceânicas. Formam-se aí chaminés de depósitos minerais que são trazidos ao nível do solo marinho pela água que tendo penetrado no subsolo se misturou com diversos minerais e ressurge novamente ao nível do solo extremamente aquecida. Estas crostas podem conter os mesmos metais nobres que referimos para as crostas de manganês. Ao mesmo tempo estes sítios albergam comunidades quimossintéticas de grande interesse biotecnológico. Impactos potenciais da extracção mineral e de gás Uma coisa é certa, a extracção mineral irá crescer de importância no futuro, atingindo interesse comercial. A extracção de petróleo e gás a níveis mais profundo no subsolo marinho terá grande procura num futuro muito próximo. Esperam-se novas soluções tecnológicas para a exploração (Wiltshire 2001). Por isso vão ser também necessários mais estudos sobre o im- 93 94 pacto nos organismos e habitats, quer dos ambientes bentónicos, quer pelágicos. Está comprovada a existência de 3000 vezes mais metano no mar profundo do que em qualquer outra parte da Terra. A extracção é inevitável como substituto dos combustíveis fósseis. Contudo, o metano tem implicações significativas no clima. As principais preocupações ambientais relacionadas com a sua exploração estarão focalizadas neste aspecto. Para além disso a extracção de metano terá efeitos nas comunidades microbiológicas e bacterianas que vivem nestes ambientes. Desconhece-se, e é difícil de prever, a relevância e extensão deste impacto. A extracção mineral no mar profundo que, como disse atrás, está ainda numa fase de desenvolvimento, utiliza a tecnologia de máquinas autopropulsionadas com vibradores que esmagam as crostas para elevação hidráulica a partir de profundidades de 800 a 3000 m. Quando os nódulos de manganês são colhidos o sedimento fino também aspirado é espalhado à superfície espalhando-se como plumas na coluna de água podendo assim afectar extensas áreas dos oceanos, para além da perturbação directa nos organismos bênticos no local da exploração. cas oceânicas. O plano parece incontornável e decorrem experiências nesse sentido. A solução pode levantar alguns problemas ou efeitos laterais como a indução de mudanças no pH e modificações na bioquímica local, o que pode provocar transformações concomitantes nas comunidades biológicas locais. No entanto, dada a imensidão do mar profundo os seus solo e subsolo estão de facto menos impactados do que zonas costeiras equivalentes. Espera-se que muitos países venham a requerer a eliminação de CO2 através da sua sequestração nos fundos marinhos. Os impactos sobre a fauna local podem não ser negligenciáveis (Glover & Smith 2003). Os poucos estudos disponíveis (Grassle & Morse-Porteous 1987, Shirayama 1997, Watanabe et al. 2006) e o conhecimento de desastres naturais que tenham ocorrido com alguma equivalência aos processos em causa (Masson et al. 1992) aparentam conclusões desconjuntas. No entanto há que reconhecer que os organismos do oceano profundo reagem de forma distinta dos seus congéneres das zonas costeiras e são geralmente mais tolerantes a exposições, como no caso do CO2. O mar profundo enquanto depósito Habitats e ecossistemas prioritários Os oceanos, em particular o mar profundo, foram considerados com capacidade infinita para diluir e reciclar quaisquer substâncias tornando-as inofensivas. Neste sentido o mar profundo tornou-se no século XX o local eleito para a eliminação de uma gama de substâncias, e.g. radioactivas, metais pesados, carbono, etc. As ameaças para a vida marinha são bem conhecidas, o que conduziu a mudanças significativas nos procedimentos de eliminação deste tipo de desperdícios. Basta lembrar que o depósito de substâncias radioactivas no mar profundo foi praticamente abandonado. Actualmente o maior desafio coloca-se na “teoria” da sequestração de carbono no subsolo em mar profundo. Há já alguns anos que se pensa na eliminação por depósito do CO2 produzido por diversas actividades industriais em formações geológi- Várias convenções, comités, conselhos e directivas (e.g. OSPAR, ICES, IUCN, BDC, NATURA 2000, etc.) definiram recentemente um conjunto de habitats e de espécies que necessitam de acções urgentes, e.g. os montes submarinos, os recifes de corais frios, as agregações de esponjas, as dorsais oceânicas com sistemas hidrotermais, etc. Existe também um interesse crescente na criação de Áreas Marinhas Protegidas. Estes processos resultam do reconhecimento de ameaças reais e actuais sobre os recursos, a biodiversidade e os habitats do mar profundo. Considerações finais As pescarias são a actividade humana de exploração de recursos marinhos que está melhor documentada. O efeito negativo em rela- ção a espécies-alvo, espécies acessórias e os habitats (ou efeitos colaterais) não levanta grandes dúvidas tendo atingido os recursos do mar profundo (Morato et al. 2006b). Aliás, as pescas de profundidade são consideradas equivalentes a “mineração de recursos vivos”. É muito provável que alguns mananciais de pescado de profundidade já não recuperem dos efeitos de sobre-exploração, ao mesmo tempo que os danos causados aos habitats pelos arrastos de profundidade sejam também irreversíveis no local onde até à data ocorreram. Quanto às actividades de exploração mineral, ou estão no início ou ainda numa fase conceptual. No entanto elas serão incontornáveis, dado o esgotamento previsto dos recursos das jazidas mais tradicionais. A exploração petrolífera em ambiente marinho é já uma realidade com vários anos e a tecnologia tem assegurado desenvolvimentos que garantem uma exploração a níveis cada vez mais profundos. A gestão ambiental dos procedimentos de exploração e minimização de impactos, apesar de alguns acidentes e impactos inevitáveis, tem, no entanto, melhorado ao longo dos anos. Os impactos negativos para o ambiente, que se podem antecipar, relacionados com a exploração mineral nos fundos oceânicos são difíceis de predizer com base nas experiências realizadas até à data. Quanto à contaminação por eliminação de detritos no solo ou no subsolo marinhos, incluindo depósito de substâncias radioactivas e metais pesados, é conhecida desde longa data e existem esforços internacionais para os controlar. Os efeitos da sequestração de CO2 necessitam ser avaliados e antecipados. A comunidade científica internacional e as organizações internacionais governamentais e não-governamentais estão cada vez mais empenhadas no debate relativo aos critérios de exploração dos fundos oceânicos, em especial nas zonas fora das jurisdições nacionais onde o quadro jurídico é mais frágil e incerto. Como o futuro ao homem pertence, a discussão e as soluções encontradas devem servir a sustentabilidade e o equilíbrio do planeta e dos seus oceanos, acautelando que as acções a desenvolver no futuro se baseiem num conhecimento científico rigoroso dos processos em causa. Referências Ahnert A, Schriever G, 2001. Response of abyssal Copepoda Harpacticoida (Crustacea) and other meiobenthos to an artificial disturbance and its bearing on future mining for polymetallic nodules. Deep-Sea Research II 48: 3779-3794. Borowski C, 2001. Physically disturbed deepsea macrofauna in the Peru Basin, southeast Pacific, revisited 7 years after the experimental impact. Deep-Sea Research II 55: 55-81. Glover AG, Smith CR, 2003. The deep-sea floor ecosystem: current status and prospects of anthropogenic change by the year 2025. Environmental Conservation 30 (3): 219-241. Gianni M, 2004. High seas bottom trawl fisheries and their impacts on the biodiversity of vulnerable deep-sea ecosystems. 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