Marketing não existe sem informação Revista Marketing - nº 290, março 1997, p. 34-35 Fauze Najib Mattar Um dos principais especialistas sobre pesquisa no País, Fauze Najib Mattar é professor doutor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), onde coordena o Programa de Educação Continuada em Administração de Executivos, e autor do livro Pesquisas de Marketing, dois volumes, editado pela Atlas. Além disso, gerencia os projetos da Fundação Instituto de Administração, em São Paulo, e presta serviços de consultoria nas áreas de marketing e pesquisa de marketing. Nesta entrevista, ele esclarece conceitos, fala de assuntos que norteiam o projeto de pesquisa e aponta para o fato de se ter um profissional que entenda do assunto na organização. Em sua opinião, fatores como o grau de importância do marketing nas empresas e o avanço tecnológico têm possibilitado o desenvolvimento desse campo: "A tecnologia tem possibilitado a agilidade em obter as informações. Além disso, diminui a margem de erro e reduz custos." Qual a diferença entre pesquisa de mercado e pesquisa de marketing? Fauze – A pesquisa de marketing é mais abrangente e envolve, inclusive, a pesquisa de mercado. Ela investiga o público, o preço, o produto, os canais de distribuição, a concorrência, entre outros. Por sua vez, a pesquisa de mercado é muito restrita, por exemplo, vou investigar o mercado de um certo produto – seu volume de vendas, sua participação etc. Para o profissional de marketing é mais importante trabalhar com o conceito de pesquisa de marketing, devido às suas inúmeras aplicações. Relacione as principais etapas de uma pesquisa. Fauze – A primeira é a identificação do problema, saber para que vai ser feita a pesquisa. Exemplo: Por que estamos perdendo vendas em determinada região? A Segunda, o planejamento da pesquisa – que métodos usar, formas de coleta de dados, como captar, tabular, analisar e interpretar para chegar aos resultados. A terceira é a execução, ir a campo, recolher as informações, processálas e tabulá-las. Após a execução, vem a parte final que é a da análise – interpretar, emitir relatórios e publicar as conclusões. Dessas etapas, qual a que não sendo bem-feita oferece maior interferência nos resultados? Fauze – Admitindo que o problema foi devidamente identificado e que a pesquisa foi bem-planejada, a parte que oferece maior risco é a de execução. Isso porque, às vezes, você manda o entrevistador realizar uma entrevista em certo local, ele vai em outro, em vez de fazer com uma pessoa, é capaz de preencher o questionário em casa, ou então, ele não foi treinado e vai ter procedimento durante a entrevista que vai gerar erros, os quais não se consegue identificar. Também pode ser cometido erro no momento de definição da amostra ao se usar um processo equivocado. No que se refere aos entrevistadores, como uma empresa que contrata um instituto de pesquisa, por exemplo, pode contornar esse problema? Ela pode exigir a ficha dessas pessoas? Fauze – Existe um código de ética de pesquisa que diz claramente quais são os deveres e obrigações de cada parte numa relação de contratante e contratado de pesquisa. Então, se eu estou contratando uma pesquisa com uma agência, por exemplo, tenho total liberdade de opinar e dizer se gostei ou não de qualquer parte da execução do trabalho. A metodologia, o questionário, a forma de determinar o número de elementos de uma amostra, entre outras coisas, precisam ser aprovados por mim. Para você fazer esse acompanhamento é necessário Ter um conhecimento de todo o processo da pesquisa. Agora, quando não existe alguém na empresa que entende do assunto, confia-se todo o processo à agência. Já a agência não tem a obrigação de dar informações sobre as pessoas as quais ela entrevistou, tem de manter em sigilo. Destaque os principais cuidados a serem tomados ao se contratar uma empresa de pesquisas. Fauze – Na hora de se contratar uma empresa de pesquisa, o erro que se comete é solicitar cerca de dez propostas e optar pela mais barata. Isso é padrão no mercado, Primeiro, você tem de fazer uma pré-seleção dos institutos idôneos e que trabalham bem. A partir das empresas pré-qualificadas em termos de qualidade, faz-se o pedido de proposta a cada uma delas. A competência de um instituto vai desde a parte estatística, passando pelo profissional que entende de metodologia, e se entende até a equipe de entrevistadores de ponto, que devem ser pessoas selecionadas, o que garante toda a qualidade do processo. Quando optar por uma pesquisa qualitativa ou quantitativa? Fauze – Normalmente, você opta por uma pesquisa qualitativa quando você está interessado em conhecer o processo como acontece determinada coisa. Por exemplo, quando quero saber como é o processo de compra de uma geladeira. Às vezes, você faz um levantamento quantitativo e obtém o resultado: produto A tem 45% de mercado e os outros 5% cada um. A partir daí, realiza-se uma qualitativa para as pessoas dizerem por que preferem aquele produto. Na verdade, elas acabam se complementando. Uma das etapas da quantitativa é a pesquisa de campo. Muitos consideram como principal problema dessa parte o questionário. Que dicas o senhor dá para a sua elaboração? Fauze – O questionário precisa estar amarrado com o objetivo da pesquisa, que, por sua vez, deve estar amarrado com o problema da pesquisa. Nessa etapa é preciso considerar o tempo da entrevista. As perguntas devem ser elaboradas usando a linguagem do público que se vai entrevistar, obedecendo seqüência lógica. Deve-se começar com as perguntas mais fáceis, que não ofereçam objeção, até para ganhar a empatia do entrevistado e, depois, colocar as mais complexas. Por isso da importância do pré-teste? Fauze – Com certeza. O pré-teste serve para muitas coisas. Entre elas para saber se as perguntas estão sendo bem-entendidas, se a forma pela qual foram elaboradas está correta, se a seqüência delas tem lógica e se as opções de respostas estão todas ali. Com relação às técnicas de seleção de amostra qual é a mais segura? Fauze – Isso é muito complicado de se explicar numa entrevista, pois entra numa parte técnica de estatística. Metodologicamente falando, a técnica é que todo mundo devia utilizar é da amostra probabilística – aquela que todos os elementos da população possuem a mesma chance de fazer parte da amostra. Isso pode ser feito pelo sorteio, tabela de números aleatórios, pelo computador etc. Não é o entrevistador que escolhe, é o método que diz quem vai ser entrevistado. Isso pela teoria estatística garante que a amostra vai ser probabilística. Só que para fazer isso é muito caro, exige aqueles estágios da população que às vezes não temos. Por isso que em 90% dos casos em pesquisas de marketing a amostra é não-probabilística. O que está errado são empresas que fazem todo o trabalho com amostra não-probabilística e a divulgam como se fosse probabilística. Isso é antiético. O marketing seguiu para a segmentação; a pesquisa foi pelo mesmo caminho? Fauze – O avanço tecnológico possibilitou o desenvolvimento da área de pesquisa, principalmente na parte estatística. Hoje, você tem a pesquisa de segmentação, onde o mercado é dividido por meio de sua utilização. A pesquisa evoluiu tanto, que ela é capaz de criar segmentos por meio de trabalho conjunto de "n" variáveis, um processo de análise multivariada. Eu posso pegar uma variável sexo, por exemplo, e descrever como o mercado se distribui em torno dela. Posso pegar sexo e idade e Ter uma distribuição bivariada. Como o senhor analisa o crescimento do número de empresas de pesquisa no País? Fauze – Eu diria que não é só de pesquisa, mas de marketing também. A importância da pesquisa aumenta a partir do momento que a do marketing também cresce. Devido ao Brasil estar numa fase de economia estável, as empresas estão mudando. Antes desse período, elas ganhavam dinheiro com as aplicações financeiras. Agora, a realidade é outra e elas têm de ganhar dinheiro baseadas na qualidade de suas operações – produtos e serviços oferecidos ao público. Caso contrário, a concorrência ganha espaço. É esta a hora do marketing. E o marketing não existe sem informação de mercado. E o que gera essas informações é a pesquisa.