Subsunção formal e real do trabalho ao capital e suas implicações

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Subsunção formal e real do trabalho ao capital e suas implicações nas
relações sociais
Bárbara Cristhinny G.Zeferino 1
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Eje temático:
Palabras claves:
Resultado de Investigação
Trabalho na contemporaneidade, questão social, serviço
social
subsunção do trabalho ao capital, relações sociais e serviço
social
1. Introdução
As implicações da subsunção formal e real do trabalho ao capital nas relações
sociais têm origem na base material e são condição sine qua non para o acúmulo e
expansão do capital. Assim, analisando a subsunção do trabalho ao capital de forma geral
e em seus momentos históricos, encontramos os nexos causais que decorrem desse
processo e que o sustenta nas diversas mediações das relações sociais.
A subsunção formal, a qual Marx se refere, é a primeira forma de subordinação
do trabalho ao capital para valorização deste e que tem como pressuposto a separação
do produtor direto de seus meios de produção e subsistência e a sua transformação em
trabalhador assalariado, condição esta que impõe a subordinação deste ao capitalista que
se apropria desses meios, monopolizando e transformando-os em capital, em forças de
coerção contra os trabalhadores. Nesse processo dá-se início à contradição essencial do
sistema capitalista, a produção social da riqueza e sua a apropriação privada. A partir daí,
tem-se a desigualdade social como uma das principais implicações da subordinação
formal do trabalho ao capital nas relações sociais.
A subordinação formal do trabalho ao capital é o processo em que acontece a
subsunção do trabalho ao processo de valorização do capital por meio da extração
predominante da mais-valia absoluta. Dá-se, primeiramente, na cooperação, que é a
forma de organização do trabalho em que muitos trabalham em processos combinados, o
que permite um aumento da força produtiva social e uma maior exploração do maistrabalho para reprodução e acúmulo do capital. E em seguida na manufatura que é a
forma clássica da cooperação e da qual a subsunção formal é característica.
1
Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo. Estudante de pós-graduação do mestrado da Faculdade
de Serviço Social - Universidade Federal de Alagoas – Brasil. Ponencia presentada en el XIX Seminario Latinoamericano de
Escuelas de Trabajo Social. Universidad Católica Santiago de Guayaquil. Guayaquil, Ecuador. 4-8 de octubre 2009.
1
Com o desenvolvimento das forças produtivas, tem-se a subsunção real, como
resultado do incremento da maquinaria e ciência no modo de produção capitalista. Tendo
como expressão material a produção de mais-valia relativa e como uma das implicações,
a intensa alienação do trabalho, pois na grande indústria o trabalhador passa a servir a
máquina, seu trabalho é determinado por ela, a quem ele está subordinado. É a
coisificação do trabalhador e personificação da máquina.
Nesse momento histórico, consolidam-se algumas das implicações basilares de
sustentação do sistema capitalista, como: a concentração de riqueza, o pauperismo, a
exploração generalizada do trabalho assalariado, o aumento do exército industrial de
reserva e o conseqüente rebaixamento de salários.
As implicações socioeconômicas decorrentes do processo de subsunção real do
trabalho ao capital colocaram em proeminência as contradições e mazelas do sistema
capitalista.
Ao longo desse processo histórico, os trabalhadores se uniram de diversas
formas para encontrar saídas para garantir a própria sobrevivência. E quando a reação
desses trabalhadores se constituiu numa ameaça a ordem burguesa, o Estado foi
acionado para enfrentar as expressões da “questão social”.
Porém, só quando há um acirramento destas contradições, no estágio do
capitalismo monopolista, é que surge o Serviço Social, como atividade profissional com a
função de contribuir com a subsunção
real
do
trabalho
ao
capital. Sendo
instrumentalizada pelo Estado para enfrentar as manifestações da “questão social”, por
meio de políticas sociais.
Nesses termos, buscaremos refletir sobre as implicações sociais decorrentes da
subordinação do trabalho ao capital e os rebatimentos no Serviço Social. Para que cientes
do funcionamento da sociedade capitalista e dos limites e funções impostos a profissão
pela lógica do capital possamos pensar estratégias que venham a contribuir com a luta da
classe trabalhadora na superação do capital.
2. Subsunção formal do trabalho ao capital: a produção social da riqueza e sua
apropriação privada e a desigualdade social
A relação antagônica e contraditória entre capital e trabalho tem sua gênese com
a acumulação primitiva do capital, na qual os produtores diretos expulsos violentamente
de suas terras e expropriados de suas condições de trabalho são convertidos em
2
trabalhadores assalariados, obrigados assim a vender a única coisa que lhes resta, a
força de trabalho, para comprar os meios de sua subsistência.
Esse movimento histórico de acumulação primitiva, período que antecede a
consolidação do modo de produção capitalista, é marcado pelo processo de separação
entre o produtor direto e seus meios de produção. Desse modo, sua efetivação criou duas
classes principais 2, antagônicas, possuidoras de mercadorias distintas que se completam
e se defrontam. Para Marx, “[...] Com essa polarização do mercado estão dadas as
condições fundamentais para produção capitalista. A relação-capital pressupõe a
separação entre os trabalhadores e a propriedade das condições da realização do
trabalho” (1984:262).
No entanto, essas duas mercadorias entram em contato e se defrontam numa
aparente relação de igualdade, pois, reduzem a relação entre o possuidor3 das condições
de trabalho e subsistência e o trabalhador 4 a uma simples relação de compra e venda sob
a qual se mascara a exploração fundamentada no trabalho assalariado, na propriedade
privada e na extração da mais-valia.
É nesse momento histórico que se dá a subsunção formal, quando a produção
social torna-se capitalista e o valor de uso é subjugado ao valor de troca. Sendo o
processo de trabalho subordinado ao capital o processo de valorização deste, no qual o
capitalista passa a ser o dirigente, quem conduz e define a exploração do trabalho alheio.
Para Marx, a subsunção formal do trabalho ao capital, “[...] É a forma geral de todo
processo capitalista de produção; mas é ao mesmo tempo uma forma particular, a par do
modo de produção especificamente capitalista, desenvolvido [...]” (1978:51). Ele também
denomina a subsunção formal, como:
Á forma que se funda no sobrevalor absoluto, posto que só se diferencia
formalmente dos modos de produção anteriores, sobre cuja base surge
(ou é introduzida) diretamente, seja porque o produtor (producer) atue
como empregador de si mesmo (self-employing) seja porque o produtor
direto deva proporcionar trabalho excedente a outros. (ibid:56)
Assim, para a subsunção do trabalho ao capital é fundamental o estabelecimento
de uma “relação puramente monetária” (p.56) entre quem compra a força de trabalho e
quem a vende, ou seja, uma relação de dependência econômica, na qual o produtor com
2
Classe trabalhadora e a classe dominante, os capitalistas.
Capitalista que detém o monopólio dos meios de produção e subsistência e compra o trabalho alheio para que este
transforme esses meios em capital, em mais-valia.
4
Que vende a única coisa que possui, a força de trabalho, em troca de sua subsistência que no modo de produção
capitalista é paga em salário.
3
3
o trabalho está subordinado ao capitalista e este precisa do trabalho para gerar maisvalor. Essa subordinação é determinada pela expropriação das condições materiais de
produção e subsistência do operário pelo capitalista.
Tais condições aparecem para o vendedor (operário) como propriedade alheia,
como forças monopolizadas pelo comprador (capitalista), que controla o operário.
Segundo Marx, “[...] Quanto mais plenamente se lhe defrontam tais condições de trabalho
como propriedade alheia, tanto mais plenamente se estabelece como formal a relação
entre capital e o trabalho assalariado, o que vale dizer: dá-se a subsunção formal do
trabalho ao capital, condição e premissa da subsunção real” (p.57).
É importante apontar que a subsunção formal como forma geral de extração da
mais-valia por meio do trabalho excedente, presente em todo processo do modo de
produção capitalista, é também específica, pois é resultado de um dado momento
histórico, no qual o capitalismo ainda não era hegemônico e o processo de trabalho
continuava o mesmo do modo de produção anterior5, no qual predominava a extração da
mais-valia absoluta 6. Pois, o capital variável (força de trabalho) prevalecia fortemente
sobre o constante (meios de trabalho). As bases materiais e o modo de trabalho neste
primeiro momento de subsunção formal ainda são limitados tecnicamente, pois a
produção se dá no mesmo espaço da oficina do mestre-artesão, “só que agora no sentido
de trabalho subordinado ao capital” (p.57).
Porém, já neste momento de subsunção formal, surgem diversas implicações
sociais que são resultados e ao mesmo tempo sustentam o modo de produção capitalista,
como a desigualdade social decorrente da contradição principal do sistema: a produção
cada vez mais social da riqueza e sua apropriação cada vez mais privada.
Com o desenvolvimento das forças produtivas e a possibilidade de inserir
tecnologia, ou seja, ciência e maquinaria no processo de produção, tem-se um
revolucionamento no modo de produção e nas relações sociais que emergem deste.
Assim, “com a subsunção real do trabalho ao capital, dá-se uma revolução total (que
prossegue e se repete continuamente)ª no próprio modo de produção, na produtividade
do trabalho e na relação entre o capitalista e o operário” (p.66).
5
Produção nas oficinas de mestre-artesão, sem o uso de maquinaria.
Extração da mais-valia por meio do prolongamento da jornada de trabalho e da organização de uma grande quantidade
trabalhadores em processos combinados de trabalho, a exemplo da cooperação.
6
4
3. Subsunção real do trabalho ao capital: concentração da riqueza, pauperismo e
alienação do trabalhador
Com a hegemonia e expansão do modo de produção capitalista consolidada
pelo desenvolvimento das forças produtivas que tem como expressão material uma maior
extração do trabalho excedente, agora com o uso de máquinas que permite também a
extração de mais-valia relativa 7, tem-se a real subsunção do trabalho ao capital e com
isso os aspectos negativos (as implicações nas relações sociais) desta subordinação
tornam-se cada vez mais antagônicos e contraditórios.
Pois, a contradição essencial do sistema capitalista está na produção de riqueza
cada vez mais social, enquanto a apropriação desta é cada vez mais privada e com isso
tem-se a desigualdade social, na qual se encontra a concentração da propriedade privada
e da riqueza num pólo e no outro pólo o pauperismo, com uma intensa exploração do
trabalho assalariado e a alienação do trabalho, já que quanto mais riqueza o trabalhador
produz, mais miséria acumula para si. Segundo Marx, “[...] A acumulação da riqueza num
pólo é, portanto, ao mesmo tempo, acumulação de miséria, tormento de trabalho,
escravidão, ignorância, brutalização, degradação moral no pólo oposto, isto é, do lado da
classe que produz seu próprio produto como capital” (1984:210).
Essa
desigualdade
social
e
o
pauperismo
se
intensificaram com
o
desenvolvimento da grande indústria, pois apenas uma parte da população expulsa do
campo foi absolvida pelo mercado de trabalho, convertidos em trabalhadores
assalariados, a outra grande parte passou a constituir o exército industrial de reserva,
condição fundamental para o modo de produção capitalista, pois este exército permite a
desvalorização da força de trabalho (rebaixamento dos salários) e sua profunda
exploração tendo em vista a acumulação de capital. Sobre isso, Marx afirma:
7
Para Marx: “Do mesmo modo porque se pode considerar a produção da mais-valia absoluta como expressão material da
subsunção formal do trabalho ao capital, a produção da mais-valia relativa pode ser considerada como a de subsunção real
do trabalho ao capital. De qualquer modo, as duas formas de mais-valia – a absoluta e a relativa – se consideradas
isoladamente, como existências separadas (e a mais-valia absoluta precede sempre a relativa) –, correspondem as duas
formas separadas no interior da produção capitalista, das quais a primeira é sempre precursora da segunda, embora a mais
desenvolvida, a segunda, possa constituir, por sua vez, a base para introdução da primeira em novos ramos da produção.”
(pg.56)
5
Mas, se uma população trabalhadora excedente é produto necessário da
acumulação capitalista, essa superpopulação torna-se, por sua vez, a
alavanca da acumulação capitalista, até uma condição de existência do
modo de produção capitalista. [...] Ela proporciona às suas mutáveis
necessidades de valorização o material humano sempre pronto para ser
explorado, independente dos limites do verdadeiro acréscimo populacional
(p.200).
Assim, uma parcela da classe trabalhadora é obrigada à ociosidade devido ao
excesso de trabalho ao qual a outra parte é condenada, sendo tal condição fundamental
para manutenção do exército industrial de reserva e este para a acumulação capitalista.
Com isso, tem-se de um lado o enriquecimento dos capitalistas e de outro o
empobrecimento da classe trabalhadora. Como assevera Marx, “Quanto maior,
finalmente, a camada lazarenta da classe trabalhadora e o exército industrial de reserva,
tanto maior o pauperismo oficial. Essa é a lei absoluta geral, da acumulação capitalista”
(ibid:209).
O uso da maquinaria no processo de trabalho possibilitou e impôs aos
trabalhadores a inserção de mulheres e crianças na indústria e assim, a maquinaria (sob
o comando do capital) aumentou o número de assalariados e de mais trabalho excedente
para a valorização do capital e consequentemente desvalorização e exploração maior da
força de trabalho. Como assevera Marx:
O valor da força de trabalho era determinado pelo tempo de trabalho não
só necessário a manutenção do trabalhador individual adulto, mas para a
manutenção da família do trabalhador. A maquinaria, ao lançar todos os
membros da família do trabalhador no mercado de trabalho, reparte o valor
da força de trabalho do homem por toda sua família. Ela desvaloriza,
portanto, sua força de trabalho. [...] Assim, a maquinaria desde o início
amplia o material humano de exploração, o campo propriamente de
exploração do capital, assim como ao mesmo tempo o grau de exploração
(p.23).
A grande indústria não só aumentou o grau de exploração como também o de
alienação do trabalhador em sua atividade produtiva, no trabalho. Pois, com a substituição
de ferramentas e do ofício (destreza do trabalhador no manuseio das ferramentas) na
manufatura pela indústria baseada na maquinaria, é a máquina que determina as
condições de trabalho às quais o trabalhador deve se subordinar, pois é ela agora que diz
o que e como ele deve produzir (ritmo, movimentos, tempo etc.). Assim, para Marx:
6
Enquanto o trabalho em máquinas agride o sistema nervoso ao máximo,
ele reprime o jogo polivalente dos músculos e confisca toda a livre
atividade corpórea e espiritual. Mesmo a facilitação do trabalho torna-se
um meio de tortura, já que a máquina não livra o trabalhador do trabalho,
mas seu trabalho de conteúdo. Toda produção capitalista, à medida que
ela não é apenas processo de trabalho, mas ao mesmo tempo processo
de valorização do capital, tem em comum o fato de que não é o trabalho
quem usa as condições de trabalho, mas, que, pelo contrário, são as
condições de trabalho que usam o trabalhador: só, porém, com a
maquinaria que essa inversão ganha realidade tecnicamente palpável
(p.43).
Com a maquinaria sob o comando do capital o trabalhador antes sujeito a
exercer uma função unilateral e permanente, agora está condenado a servir por toda a
vida à máquina, como se fosse um apêndice desta. Pois, “[...] mediante sua
transformação em autômato, o próprio meio de trabalho se confronta, durante o processo
de trabalho, com o trabalhador como capital, como trabalho morto que domina e suga a
força de trabalho viva” (p.44). Visto que, a indústria erguida sobre a maquinaria impõe
uma divisão do trabalho que exige um trabalhador capaz de manusear várias máquinas,
não mais atrelado a uma única tarefa, porém facilmente substituível. Já que, é a máquina
quem decide a dinâmica e o tempo da produção e não o trabalhador.
Porém, convém ressaltar que o caráter negativo do uso da maquinaria e suas
implicações antagônicas e alienantes para o trabalhador decorrem de seu comando sob a
regência do capital e não de suas próprias qualidades, pois como afirma Marx:
As contradições e os antagonismos inseparáveis da utilização capitalista
da maquinaria não existem porque decorrem da própria maquinaria, mas
de sua utilização capitalista! Já que, portanto, considerada em si, a
maquinaria encurta o tempo de trabalho, enquanto utilizada como capital
aumenta a jornada de trabalho; em si, facilita o trabalho, utilizada como
capital aumenta sua intensidade; em si, é uma vitória do homem sobre as
forças da Natureza, utilizada como capital submete o homem por meio da
força da Natureza; em si, aumenta a riqueza do produtor, utilizada como
capital o pauperiza etc. (p.57)
Assim, a subsunção real do trabalho ao capital marcada pelo desenvolvimento
da grande indústria na sociedade capitalista apresenta entre as principais implicações nas
relações sociais: uma intensa exploração do trabalho para extração da mais-valia; a
exploração de toda a família, contraditoriamente um aumento do exército industrial de
reserva; a desigualdade social com uma generalização do pauperismo entre a classe
trabalhadora em contraste com a concentração da riqueza produzida, por esta mesma
classe, nas mãos dos capitalistas; a alienação do trabalho e do trabalhador por meio do
trabalho assalariado e da apropriação privada da riqueza socialmente produzida.
7
4. Subsunção do trabalho ao capital, questão social e serviço social
Em direção a um debate mais contemporâneo convém expor a relação
contraditória e antagônica entre a subordinação do trabalho ao capital e suas implicações
na “questão social”
8
e na atividade profissional do Serviço Social. Pois, entre as
conseqüências decorrentes desta relação, encontramos como uma das mais gritantes o
pauperismo da classe trabalhadora, considerado como uma das formas de expressão da
“questão social” que tem sua raiz material na acumulação capitalista.
O pauperismo é, portanto, conseqüência da acumulação do capital e ao mesmo
tempo uma necessidade para manutenção dessa lógica capitalista. Mas, só se constituiu
num problema para a classe dominante, no século XIX, quando houve uma reação da
classe trabalhadora face às precárias condições de vida e de trabalho em que se
encontravam, pondo em evidência as mazelas da exploração capitalista. Neste momento,
a partir das primeiras décadas do século XIX, tal fenômeno adquire caráter político, pois a
reação dos trabalhadores se constitui numa ameaça a ordem burguesa, sendo assim
denominada de “questão social”.
Porém, é no estágio monopólico do capital, quando há um acirramento das
contradições do capital que o Serviço Social enquanto profissão surge para responder às
expressões da “questão social”, por meio do controle da força de trabalho para garantir a
reprodução e acúmulo do capital. Como assevera Netto, “[...] A emergência profissional
do Serviço Social é, em termos histórico-universais, uma variável da idade do monopólio;
enquanto profissão, o Serviço Social é indivorciável da ordem monopólica – ela cria e
funda a profissionalidade do Serviço Social” (2007:74).
O Serviço Social emerge assim, atrelada ao Estado, “comitê administrativo da
burguesia” 9, que passa a enfrentar as manifestações da “questão social” por meio de
políticas sociais, para as quais são necessários agentes profissionais que possam
implementá-las. Segundo Netto:
O processo pelo qual a ordem monopólica instaura o espaço determinado
que, na divisão social (e técnica) do trabalho a ela pertinente, propicia a
profissionalização do Serviço Social tem sua base nas modalidades
através das quais o Estado burguês se enfrenta com a “questão social”,
tipificadas nas políticas sociais (ibidem).
8
Segundo Santos e Costa, “questão social”: “é “[...] um termo utilizado mais comumente pelo pensamento conservador, que
incorporou inúmeras acepções em sua interpretação, mas sempre associado a expressão da precariedade de vida das
classes populares e aos riscos que a luta dos trabalhadores contra a exploração representava para a sociedade” (2006,
p.3).
9
Expressão resumida da frase de Marx encontrada no Manifesto Comunista (2007:47)
8
Assim, o Serviço Social origina-se como uma profissão que contribui para legitimar
a ordem burguesa, controlando e subordinando as demandas da classe trabalhadora à
lógica de acúmulo e reprodução do capital, aos interesses da classe dominante. Como
aponta Iamamoto:
Poder-se-ia afirmar que o Serviço Social, como profissão inscrita na
divisão social do trabalho, situa-se no processo da reprodução das
relações sociais, fundamentalmente como uma atividade auxiliar e
subsidiária no exercício do controle social e na difusão da ideologia
dominante junto à classe trabalhadora. Assim, contribui como um dos
mecanismos institucionais mobilizados pela burguesia e inserido no
aparato burocrático do Estado, das empresas e outras entidades privadas,
na criação de bases políticas que legitimem o exercício do poder de
classe, contrapondo-se às iniciativas autônomas de organização e
representação dos trabalhadores (2005: 93-4).
Atualmente, as práticas do Serviço Social estão permeadas não só por idéias e
ações conservadoras, mas também por um conteúdo crítico, questionador da ordem,
capaz de problematizar a atividade profissional diante dos nexos causais da subsunção
real do trabalho ao capital. Pois, ainda que, a profissão se constitua em um instrumento
utilizado pela classe dominante em prol de seus interesses, o Serviço Social não se
resume a isso, mas também, mesmo dentro de limites contraditórios, responde às
necessidades de sobrevivência da classe dominada em suas determinadas condições
históricas.
5. Conclusão
Diante do exposto, verificamos que a subsunção do trabalho ao capital marca a
consolidação do modo de produção capitalista, em que o trabalho é apropriado como
meio de valorização e autovalorização do capital, com a extração de mais-valia.
Na subsunção formal do trabalho ao capital já predominava o impulso à
produção como meio de extrair o mais-trabalho e cada vez maior, mas dentro de seus
limites técnicos, a forma de extração de trabalho excedente predominante era por meio da
jornada de trabalho e da combinação desta em processos de trabalho, a exemplo da
cooperação. Assim, tinha como expressão material, a mais-valia absoluta. Mas, essa
característica inerente do sistema capitalista só se expande com o desenvolvimento das
forças produtivas que permitem a extração da mais-valia relativa e a conseqüente
subordinação real do trabalho ao capital.
9
Assim, ao longo das décadas o impulso à acumulação e expansão do capital tem
intensificado, desenvolvido ou reestruturado formas de exploração que permitam não só
uma maior extração de mais-valia, bem como a mercantilização de atividades que estão
inseridas no âmbito da reprodução social.
Com isso, as implicações socioeconômicas do processo de industrialização
consolidaram e colocaram em evidência as contradições que sustentam o sistema
capitalista. De um lado tem-se o desenvolvimento da capacidade produtiva e acúmulo de
riqueza nas mãos de poucos, os capitalistas; e do outro lado, tem-se a exploração do
trabalho e o acúmulo da miséria nas mãos de quem produz a riqueza, os trabalhadores.
Portanto, a ofensiva do capital nos últimos 30 anos tem implicado num
retrocesso social, pois para garantir a expansão e acúmulo do capital diante das crises
estruturais do próprio sistema, diversas formas de exploração são aprofundadas e outras
resgatadas de períodos pré-capitalistas. Como, o aumento da jornada de trabalho,
trabalhos análogos ao trabalho escravo, trabalho infantil etc. Estas são características que
nos remete ao passado pré-capitalista, mas que são parte, hoje, das relações de trabalho
precarizado e informal que se encontram não só nos países periféricos, mas também,
ainda que em menor medida, nas grandes potências.
Assim, com a atual crise, uma das implicações nas relações sociais mais
decorrentes dessa ofensiva do capital sobre o trabalho tem sido o desemprego e a
intensa precarização do trabalho com o rebaixamento de salários e a flexibilização dos
diretos trabalhistas.
Portanto, para manter a ordem vigente, sendo o trabalho cada vez mais
subordinado a uma intensa e expansiva exploração; para impedir a organização e a
reação da classe trabalhadora em face de suas precárias condições de vida e de trabalho
contra os ditames do capital, atividades profissionais como o Serviço Social, que
contribuem com a subsunção real do trabalho ao capital, atuando no controle e
reprodução da força de trabalho, são crescentemente demandadas nesse momento, pois
as contradições intrínsecas ao sistema capitalista estão se aprofundando, acirrando,
assim, os conflitos sociais. É para apaziguar esses conflitos que o Serviço Social é
chamado a agir com a implementação de políticas sociais (fragmentadas e focalizadas)
que surgem com a função de atenuar os conflitos e contribuir com legitimação da ordem
burguesa.
Mas, não podemos ignorar que embora os interesses da classe dominante
predominem e decidam sobre as ações que devem ser implementadas pelos agentes
10
profissionais, não se pode negar que estes, dependendo de suas perspectivas políticas
podem também configurar-se como mediadores dos interesses da classe trabalhadora,
apoiando e reforçando a organização dos trabalhadores contra os ditames do capital e em
prol de um projeto de superação do mesmo, ainda que sua atividade seja limitada pelo
domínio do capital.
Referências Bibliográficas
IAMAMOTO, Marilda. Renovação e conservadorismo no serviço social. São Paulo,
Cortez, 2004.
MARX, Karl. Capítulos XIII Maquinaria e Grande Indústria; XXIII A Lei Geral da
Acumulação Capitalista; XXIV A Assim Chamada Acumulação Primitiva. In: O Capital –
Crítica da economia política. Livro Primeiro, Tomo 2. São Paulo: Abril Cultural, 1984.
___________. Livro I, Capítulo VI (inédito) In: O Capital. São Paulo: Ciências Humanas
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NETTO, José Paulo. Capitalismo Monopolista e serviço social. São Paulo, Cortez, 2007.
SANTOS, E.P. & COSTA, G.M. da Questão Social e desigualdade: novas formas, velhas
raízes. In: Revista Ágora: Políticas Públicas e Serviço Social, Ano 2, nº 4, julho de 2006 –
ISSN – 1807 – 698X. Disponível em http: www.assistentesocial.com.br
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