GBETH Newsletter Volume 05 Número 27 16 de setembro de 2007 GBETH Newsletter é uma publicação semanal distribuída aos sócios do Grupo Brasileiro de Estudos de Tumores Hereditários Sede R José Getúlio, 579 cjs 42/43 Aclimação São Paulo - SP CEP 01503-001 E-mail [email protected] Genética Molecular dos Meningiomas: da Pesquisa Básica a Potenciais Aplicações Clínicas Fernanda Teresa de Lima Universidade Federal de São Paulo/Hospital Israelita Albert Einstein Simon M, Boström JP, Hartmann. Molecular genetics of meningiomas: from basic research to potential clinical application. Neurosurgery 2007;60:787-98. Os meningiomas são tumores comuns do SNC, ocorrendo em cerca de 2 Editores Erika Maria M Santos Ligia P Oliveira a 3 a cada 100.000 indivíduos/ano, acometendo principalmente adultos e idosos Diretoria Presidente Benedito Mauro Rossi Vice-Presidente Erika Maria Monteiro Santos Diretor Científico Gilles Landman Secretário Geral Fábio de Oliveira Ferreira Primeira Secretária Ligia Petrolini de Oliveira Tesoureiro Wilson T Nakagawa craniais, há um espinhal e a localização espinhal é mais freqüente em mulheres. e sendo 1,4 a 2,8 vezes mais freqüentes em mulheres. Para cada 10 meningiomas São derivados das células do capuz da aracnóide e na sua maioria são benignos. São classificados pela Organização Mundal da Saúde (OMS) em: grau I (80%), que inclui as variantes menigoteliais, fibroblásticas, transicionais, psammomatosa, angiomatosa, microcística, secretória, rica em linfoplasmócitos, metaplásica; grau II atípico (5% a 20%) e grau III anaplásico ou maligno (1% a 2%). Observam-se alterações cromossômicas consistentes na maioria dos meningiomas, o que despertou o interesse pelo estudo da genética envolvida. Genética da Formação dos Meningiomas A neurofibromatose tipo 2 (NF2) é uma doença autossômica dominante que, frequentemente, cursa com meningiomas causada por mutações no gene NF2, gene supressor tumoral localizado em 22q12.2, codificador da proteína merlin. Cerca de 40% a 70% dos meningiomas esporádicos apresentam perda Genética Molecular dos Meningiomas de heterozigose na região 22q12.2 e 30% a 60% dos ocorrem em síndromes de predisposição hereditária tumores apresentam mutações no gene NF2. Este ao câncer. Observam-se meningiomas nas seguintes gene pode ser inativado no tecido tumoral também síndromes: NF2, NF1, Gorlin, Rubinstein-Taybi, Li- de duas outras maneiras: por metilação aberrante Fraumeni, Von Hippel-Lindau, Werner, Gardner, da região 5´, que flanqueia o gene, e por aumento da Melanoma-astrocitoma, Cowden e MEN tipo 1. A proteólise mediada por calpaína da proteína merlin. detecção de alterações moleculares no gene da NF2 Observa-se uma freqüência de alterações no gene em tumores esporádicos desencadeou a busca por NF2 similar em todos os graus de meningiomas, alterações nos genes associados às outras síndromes o que indica que este gene tem um papel no início que cursam com meningiomas. da formação tumoral, mas sugere que não tem mutações revelou alterações nos genes TP53, INK4A, um papel importante na progressão tumoral. No PTEN e PTCH associadas a tumores não benignos, entanto, as alterações no gene NF2 variam em e diminuição da expressão e alterações de emenda freqüência de acordo com os subtipos tumorais e a no gene NF1 em alguns tumores. Famílias com localização tumoral. A inativação do NF2 é menos descrição de meningiomas múltiplos hereditários são freqüente em tumores meningoteliais, as mutações descritas, mas muito raras, e o estudo destas famílias são mais freqüentes em tumores psammomatosos e pode permitir a detecção de novos genes. alterações mais importantes são vistas em variantes A triagem de Além do estudo dos meningiomas familiares, mensenquimais. Tumores localizados na base do o estudo de meningiomas induzidos por radiação crânio retêm mais freqüentemente a heterozigose também pode fornecer informações importantes sobre em 22q e são do subtipo meningotelial, e tumores na a biologia da formação tumoral. Os meningiomas convexidade do crânio apresentam maior perda de induzidos por radiação são tumores geralmente heterozigose em 22q e são do subtipos fibroblásticos múltiplos, com características histológicas mais ou transicionais. Isto sugere mecanismos diferentes agressivas e um comportamento não muito favorável. de formação em diferentes populações celulares Não existem genes ou assinaturas genéticas específicas precursoras. relacionadas a estes tumores, mas observam-se alterações em menos mutações e perda de heterozigose em 22q, outras proteínas da família das proteínas 4.1, a qual e mais perdas nos cromossomos 1p, 6q e 7p, além pertence a proteína merlim encontraram alterações de cariótipos mais complexos. somente na proteína 4.1B, codificada pelo gene genética suscitou a busca por alterações em genes EPB41L3 ou DAL1, localizado em 18p11.32, de modo envolvidos no reconhecimento e no reparo do DNA. inconsistente. Foi observada perda alélica em 19% Foram encontrados polimorfismos no gene ERCC2, a 71% dos meningiomas, e perda da expressão envolvido no reparo do DNA, que modificam o protéica em até 76% dos casos, sem, no entanto, risco de desenvolver meningiomas pós-radiação terem sido detectadas mutações genéticas. e polimorfismos em CCND1 e INK4A que estão Estudos que investigaram Meningiomas são tumores que também Esta instabilidade associados com meningioma induzido por radiação. GBETH Newsletter 2007 Volume 05 Número 27 Genética Molecular dos Meningiomas Genética Tumoral do Crescimento e Progressão benignos comportam somente perdas em 22q e que os tumores malignos apresentam cariótipos complexos, com perdas em 1p, 9p, 10q, 14q e ganho O primeiro grupo de fatores associados com o crescimento e a progressão de meningiomas são os hormônios esteróides e seus receptores. Estes hormônios suscitaram o interesse frente à observação de um aumento da incidência destes tumores em mulheres e o relato de crescimento tumoral acelerado durante as gestações. Observouse que até 30% dos tumores apresentam receptores de estrogênio em baixas concentrações e dois terços dos meningiomas esporádicos possuem receptores de progesterona, cuja expressão diminui com a progressão maligna. Também foram encontrados receptores de androgênio. O segundo grupo de fatores associados ao crescimento dos meningiomas são fatores de crescimento autócrinos secretados pelos tumores, que possibilita o crescimento sem estímulos externos. Foram detectados fatores de crescimento derivados de plaquetas e seus receptores (PDGF/PDGFR), fatores de crescimento epidérmicos e seus receptores e ligantes (EGF/EGFR), fatores de crescimento semelhantes à insulina e seus receptores (IGF/IGFR), fatores de crescimento do endotélio vascular e seu receptor, estes últimos associados à neoangiogênese tumoral e ao edema perifocal relacionado a estes tumores. A ativação dos receptores membranosos dos fatores de crescimento está associada à transdução de sinal de diversas vias, inclusive da cascata de transdução de sinal do PTEN, que tem um papel na expressão do fenótipo maligno. O estudo da anatomia patológica do genoma de material em 12q, 17p, 17q, 20q, além de alterações epigenéticas. Estas alterações sugerem locais nos quais se devem realizar busca por genes candidatos associados ao crescimento e progressão tumoral, busca esta em curso, com resultados ainda não muito claros. Os meningiomas apresentam durante seu crescimento uma desregulação do controle do ciclo celular, desregulação esta associada à perda dos produtos p16, p15, p14arf, codificados pelos genes INK4A/INK4B; perda de RB e amplificação de CK4 e superexpressão do gene TP53, esta última correlacionada com malignidade. A ativação da telomerase é muito rara em meningiomas benignos, mas é um achado comum durante a progressão maligna. Cerca de metade dos meningiomas atípicos e a maioria dos anaplásicos/malignos apresentam atividade da telomerase. A instabilidade genética, demonstrada pelo número aumentado de alterações cromossômicas, que sugere alterações nos mecanismos de reconhecimento e reparo de danos ao DNA, pode também estar associada à disfunção telomérica. Cerca de 8% dos pacientes com meningiomas apresentam sincrônicos. tumores múltiplos, muitas vezes Através de análises genéticas, foi demonstrado que estes tumores sincrônicos são também clonais e dois mecanismos diferentes emergiram para explicar esta situação: disseminação aracnóide ou subdural ou predisposição genética para a formação de meningiomas. Não na progressão tumoral observou que os tumores GBETH Newsletter 2007 Volume 05 Número 27 Genética Molecular dos Meningiomas necessariamente a multiplicidade está correlacionada um marcador genético potencial para meningioma com pior prognóstico, mas a invasão cerebral atípico grau II. A análise genética também é útil no tem uma correlação positiva com curso menos diagnóstico diferencial: os hemangiopericitomas, por favorável. A expressão de ativadores e inibidores exemplo, não apresentam mutações no gene NF2, do plasminogênio, metaloproteases e inibidores mas, no entanto, cursam com muitas alterações nos teciduais de metaloproteases correlacionam-se com o genes INK4A/INK4B. fenótipo invasor. Atualmente a imagem obtida por ressonância nuclear magnética é padrão ouro para o diagnóstico Aplicações Diagnósticas e Prognósticas e avaliação da progressão dos meningiomas. No entanto, técnicas que somam as alterações moleculares Uma vez que a recorrência dos tumores depende às alterações de imagem recebem pouca atenção e do grau histopatológico, as indicações de terapêutica devem ser melhor investigadas. e seguimento dependem desta gradação. Iniciou-se O que vem ganhado cada vez mais espaço então uma busca por marcadores moleculares que em pesquisa são os alvos moleculares para a terapia. pudessem auxiliar a graduação histopatológica. A Abordagens possíveis, conhecimento este derivado perda do cromossomo 14q detectada por exame do entendimento da biologia molecular da iniciação de FISH é um marcador independente para de do crescimento tumoral, incluem interferência prognóstico. Estudos retrospectivos confirmaram com a função da proteína merlin ou com a sinalização papel prognóstico para perdas dos cromossomos 1p, hormonal ou interrupção das vias mediadas pelos 9p, 10q e ativação de telomerase, que serviriam com receptores de fatores de crescimento. GBETH Newsletter 2007 Volume 05 Número 27