24 Planalto das Araucárias - um ecossistema em perigo de extinção?

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A rtigo
Planalto das Araucárias - um ecossistema
em perigo de extinção?
Bristot, A.*
Resumo
Este artigo aborda alguns aspectos relativos às queimadas de campos praticadas no
Planalto das Araucárias. As observações e
posicionamento da população local são detalhadas, visando principalmente a oferecer o
contraditório para os ecologistas, cientistas e
técnicos que não convivem com os problemas
da região. A expansão de grandes áreas
florestadas com as diversas espécies de pinus,
é apresentada como uma séria ameaça ao
ecossistema formado pelos Campos de Cima
da Serra. Também é discutida a sustentabili-
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* Ph.D., Professor do Programa de Pós-Graduação em
Engenharia: Energia, Ambiente e Materiais. PPGEAM/
ULBRA, Canoas - RS. E-mail: [email protected]
Agroecol.e Desenv.Rur.Sustent.,Porto Alegre, v.2, n.4, out./dez.2001
dade sob três enfoques: econômico, social e
ambiental para a região em apreço.
Palavras-Chaves: Ecossistema; Planalto
das Araucárias; queimadas controladas;
florestamento uniforme; desenvolvimento
sustentável; economia social; economia
ambiental.
1 Introdução
Entre os grandes ecossistemas brasileiros:
Floresta Amazônica, Mata Atlântica, Pantanal, Caatinga, Cerrado e Planalto das Araucárias, este último é o menor de todos em
extensão. Também chamado de Campos de
Cima da Serra, uma superfície elevada, com
altitudes em torno de mil metros, relativamente plana, e levemente inclinada para os
quadrantes do oeste. Sua maior área encon-
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tra-se no Estado do Rio Grande do Sul, constituída pelos
municípios da
Associação de
Cima da Serra
(Vacaria, Esmeralda, Lagoa
Vermelha, etc.)
e parte da Associação dos
Municípios do
Turismo
da
Serra (parte de
Canela, São Francisco de Paula, Cambará do
Sul, Jaquirana, Bom Jesus e São José dos Ausentes). Em Santa Catarina, ocupa uma área
menor do que a gaúcha (Lages, São Joaquim,
Curitibanos etc) e termina numa estreita faixa no estado do Paraná entre Curitiba e Ponta Grossa.
Uma paisagem típica serrana é constituída por centenas de coxilhas, entrecortadas por
banhados, capões e numerosos cursos d'água,
cujas matas ciliares, quando existentes, recebem a denominação de restingas. Na área
gaúcha encontra-se parte das nascentes da
Bacia do Uruguai, da Bacia do Litoral Norte,
do Mampituba, a quase totalidade das nascentes das bacias dos Sinos e Caí e grande parte
da bacia do Taquari-Antas. Para todas estas
bacias deve ser destacada a importância dos
banhados, como nascentes de numerosos cursos d'água que desempenham um papel regulador tanto nas épocas de secas como nos
períodos de altas precipitações.
Entre os meses de setembro e abril, os
Campos de Cima da Serra adquirem uma coloração verde dominante, constituindo-se
numa paisagem deslumbrante, que encanta
não só a população local, mas todos os turistas, brasileiros e estrangeiros, que têm o privilégio de visitar aquelas paragens.
Esta paisagem singular é
o resultado de
um manejo de
pastagens, que
pode ter tido início com a chegada dos primeiros colonizadores, grandes fazendeiros, provenientes de São Paulo (Sorocaba) e
de Santo Antônio da Patrulha, a partir da segunda metade
do século XVIII. Este processo de manejo de
pastagens, denominado de "queimadas controladas" se perpetuou durante os últimos
duzentos anos, sem qualquer interrupção. A
principal cobertura destes campos ou pastagem nativa é constituída pelo capim caninha
(Andropogus lateralis) também denominada
localmente por "macega" e hoje constitui mais
de 90% de toda a área destinada à alimentação de bovinos, ovinos e muares. Este capim,
cuja "soqueira" não é atingida pela "queimada controlada" rebrota durante os meses de
agosto e setembro e vai formar o imenso tapete verde que cobre praticamente toda a região. A partir do mês de abril, com a chegada
das geadas e nevadas, o capim caninha torna-se amarelo e seco, emitindo acículas muito
duras, mas assim mesmo, constitui a principal fonte de alimentação para os animais. Esta
reserva alimentar que, segundo os especialistas, tem um baixo valor nutritivo, é complementada por pastagens de inverno provenientes de pequenas lavouras e por rações artificiais em alguns casos. O capim caninha
que não é consumido durante os meses de
inverno, segundo os fazendeiros locais, tem
que ser queimado, por, pelo menos, três motivos: 1º) a presença das acículas dificulta o
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rebrote e fere os animais que tentam se alimentar da vegetação mais tenra que rebrota
junto ao solo; 2º) esta vegetação seca facilita
a propagação de incêndios de forma descontrolada, em geral iniciada ao longo das margens das estradas; 3º) o fogo, de forma controlada, elimina as sementes das ervas daninhas
e das espécies invasoras como as do pinus.
Porém este fogo elimina também sementes
de espécies nativas que serviriam para alimentação dos animais e diversificariam a
cobertura vegetal, mas principalmente, sob o
ponto de vista da preservação dos ecossistemas, elimina as sementes de araucárias. É
importante ser ressaltado que este manejo de
pastagens não contribui para o efeito estufa,
pois não há mudança no tipo de cobertura.
O Pinheiro Serrano (Araucária angustifolia)
constitui o "andar superior" de todos os capões
e também das florestas que margeiam as encostas da Serra Geral no Rio Grande do Sul e
da Serra do Mar ao longo dos três Estados da
Região Sul.
Ao contrário do pensamento popular, a região constituída pelo Planalto das Araucárias
nunca foi coberta por uma grande floresta. Na
época da sua formação fazia parte do imenso
continente chamado de Gondwana (Milani,
1997) que se estendia até a África de hoje. Com
a separação dos continentes e com o aparecimento do Oceano Atlântico surgiram muitas
falhas na porção oriental dos três Estados do
Sul, originando as escarpas dos Aparados da
Serra, que foram inicialmente cobertas com
lavas; isto ocorreu há cerca de 130 milhões de
anos e foi, segundo Villwock (Villwock, 1997),
"sem dúvida a maior manifestação vulcânica ocorrida sobre um continente que se tem notícia
em todos os tempos".
Portanto, a prática das "queimadas controladas" constitui-se num obstáculo à expansão
das esparsas florestas de capões, incluindo a
marca característica do ecossistema a espécie Araucária angustifólia. Porém, a topogra-
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As "queimadas controladas"
se perpetuaram durante os
últimos duzentos anos, sem
qualquer interrupção
fia da região oferece também obstáculos naturais a esta expansão, principalmente o
afloramento de rochas, que só permite o crescimento de espécies herbáceas, nunca de
árvores frondosas como o pinheiro serrano.
Segundo Messias (Messias, et all, 1997)
por exemplo, no município de São Francisco
de Paula, no máximo 10% de área de campos
poderá ser cultivada através do uso de máquinas. Estatísticas semelhantes podem ser
aplicadas na maioria dos outros municípios.
Esta situação constitui o principal motivo para
o não-estabelecimento de pastagens artificiais, inclusive aquelas formadas através das
técnicas de plantio direto. Por esta razão, as
pequenas lavouras existentes hoje na região
se localizam somente no entorno das sedes
das fazendas. A ânsia para aumentar, por parte
dos fazendeiros, a contribuição das pastagens
artificiais, está dando origem a uma parceria
chamada de "espúria" por muitos habitantes
da região. Durante os meses de primavera e
início do verão, áreas de fazendas são cedidas
para agricultores de outras regiões do Estado
para cultivar principalmente repolho e
batatinha; nestes casos a área selecionada
não fica restrita às baixadas e patamares, mas
se estende desde as bordas dos banhados,
margens de arroios, até as encostas e topo
das coxilhas, desde que possam ser utilizadas máquinas para o preparo da terra. O uso
intensivo de fertilizantes inorgânicos e de
agrotóxicos nestas lavouras está causando
uma série de contaminações nos banhados
e, em arroios e rios, além de provocar erosão
nas encostas cujos solos são naturalmente
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rasos. O preço pelo aluguel da terra é pago pelos
"agricultores itinerantes" através do cultivo
de pastagens de inverno utilizando a mesma
área. Este sistema em geral, é repetido no
máximo durante três anos consecutivos; a
partir daí a lavoura é abandonada e uma nova
área deve ser buscada na mesma fazenda ou
em outras.
2 Queimadas controladas ou a expansão
das florestas de pinus?
Neste alvorecer do terceiro milênio, a região dos Campos de Cima da Serra encontrase frente a um sério dilema motivado pelas
leis de preservação ambiental (Projeto de Lei
n 400/94). A proibição de qualquer tipo de
queimada está provocando um aumento do
êxodo rural com a conseqüente venda das áreas "multadas" que não vão ser mais utilizadas como fazendas, mas vendidas para empresas madeireiras. Posteriormente serão
cobertas por uma floresta uniforme de pinus.
Aqui cabe um detalhamento sobre o que a
população local chama de "queimada controlada". Como foi descrito anteriormente, a dificuldade em se encontrar áreas apropriadas
para a formação de pastagens artificiais suficientes para a alimentação de todos os animais durante os meses mais frios (é importante se destacar que durante os meses de
junho e julho o crescimento das pastagens
nativas é praticamente nulo) obriga os fazendeiros a deixar uma reserva de capim para a
alimentação dos animais. Vale lembrar que,
como já foi enfatizado acima, esta alimentação é bastante precária; segundo alguns críticos desse processo "os animais são alimentados com a própria carne", pois em geral
emagrecem muito durante o período frio. De
qualquer maneira, as queimadas são praticadas dividindo a área da fazenda em três ou
quatro partes, e em cada uma delas o fogo é
iniciado dois a três dias depois de uma chu-
va. A próxima área a ser queimada ocorre de
dez a doze dias depois da primeira, pois se toda
a área fosse queimada de uma só vez não
haveria alimentação para os animais até o
rebrote da nova vegetação. Em geral, o fogo é
iniciado a partir das bordas dos banhados e do
entorno dos capões, propagando-se no sentido
contrário dos ventos dominantes.
Por outro lado, os ambientalistas argumentam que os danos causados pelas queimadas
incluem a redução da cobertura do solo e a
conseqüente perda de alguns elementos químicos, nitrogênio por exemplo, redução das
populações de animais e a diminuição da freqüência de espécies herbáceas e da propagação da Araucária. Um outro dano ambiental
provocado pelas queimadas é a emissão de
particulados para a atmosfera. Como o período de queima de campos é muito curto, este
processo ocorre simultaneamente em muitas fazendas, podendo interferir no tráfego aéreo sobre a região.
Estas considerações levam a uma análise
mais profunda em termos do desenvolvimento sustentável na região. Para tanto, o tópico
será dividido em três enfoques ou dimensões
de sustentabilidades: ambiental, econômica
e social. É obvio que a dimensão ambiental é
a mais polêmica e abrangente, pois muitos
outros estudos são necessários além dos que
já estão em andamento, a maioria deles de
difícil execução e que poderão se estender
inclusive por um longo tempo. Por exemplo,
quanto à biodiversidade animal não há estudos detalhados sobre este assunto nos dias de
hoje, mas para se ter uma compreensão mais
profunda, teríamos que voltar no tempo e responder perguntas do tipo: como era a biodiversidade quando as queimadas foram iniciadas? Quando esta prática realmente começou? Será que coincidiu com o início do
cercamento das fazendas? etc.
Um desastre ambiental de grandes proporções ocorreu em tempos mais recentes, ou
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seja, no início do século XX, com o estabelecimento de serrarias sustentadas
com
corte
de
araucárias. Até a década dos sessenta,
por motivos econômicos e não ambientais,
somente eram cortadas araucárias com
perímetro superior a
40 centímetro. A madeira em forma de tábuas era utilizada na
construção civil. A
partir da década dos
sessenta, começou a
utilização da araucária para a fabricação do papel, de embalagens
etc, através do corte indiscriminado dos pinheiros. Os efeitos dessa prática são ainda
notados nos dias de hoje, pois na maioria das
florestas pode-se notar a baixa densidade de
araucárias. Porém, qual foi o efeito desta exploração sobre a biodiversidade animal? Atualmente esse assunto só tem interesse acadêmico, pois a partir de 1975 o corte raso de
araucárias foi proibido pelo IBAMA e o corte
seletivo tornou-se muito restrito.
Em conseqüência dessa situação, teve início o ciclo econômico do pinus. Desde 1975 o
florestamento e reflorestamento com diversas espécies de pinus vem se estendendo em
toda a região do Planalto das Araucárias. Inicialmente, graças aos incentivos governamentais, grandes e pequenas madeireiras
participaram deste processo. Decorridos cerca de 25 anos e com o fim dos incentivos fiscais, poucas são as pequenas serrarias que
ainda sobrevivem; em geral predominam as
grandes indústrias madeireiras com a tendência em formar grandes áreas contínuas
florestadas com pinus e em vários casos com
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a eliminação de banhados através de drenagens dos mesmos. Esta situação nos leva a
projetar, embora o tema seja por demais polêmico, que existe uma ameaça concreta de
extinção do ecossistema - Planalto das Araucárias. Dois outros fatos colaboram para aumentar este temor: 1º) Em relação à arrecadação de ICM pelos municípios da região, as
atividades econômicas relacionadas com a
exploração das florestas de pinus são altamente desejáveis. Os prefeitos são unânimes em
afirmar que as atividades agropecuárias rendem muito menos ICMS para os cofres municipais do que as atividades ligadas ao ramo
florestal. Por exemplo, o município de Jaquirana tem a sua arrecadação concentrada no
desempenho econômico de um número considerável de serrarias existentes em seu território. Conforme uma recomendação da engenharia florestal: técnica e economicamente "uma vez floresta, sempre floresta". Isto significa simplesmente que as áreas hoje cobertas por florestas artificiais nunca mais voltarão a ser campos. A extensão da área coberta
com pinus, deverá ser obtida através do in-
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ventário florestal realizado pela UFSM e divulgado em 4 de junho de 2001. Para a microrregião homogênea formada pelos municípios
de São Francisco de Paula, Cambará do Sul,
Jaquirana, Bom Jesus e São José dos Ausentes, a Universidade de Caxias do Sul (UCS,
2001) está desenvolvendo uma pesquisa onde
podem ser comparadas áreas queimadas, áreas roçadas, áreas não-queimadas, em termos
de fertilidade do solo, presença de microorganismos etc.; 2º) Do ponto de vista social, é desejável que estes pequenos fazendeiros, permaneçam nas suas propriedades, pois ao contrário, caso tenham que vender suas terras,
em geral para as grandes empresas madeireiras, irão engrossar as vilas das sedes municipais, verdadeiros cinturões de miséria, onde a
dignidade humana atinge os níveis mais baixos possíveis.
Quanto à abordagem econômica baseada
nas atividades agropastoris, a situação dos
Campos de Cima da Serra na atualidade pode
ser resumida nas seguintes considerações:
a área das fazendas está atingindo um limite
inferior, além do qual não é economicamente viável qualquer nova divisão. Esse limite
estaria em torno de 200 hectares, para o caso
dos proprietários viverem exclusivamente da
exploração da pecuária extensiva. Em áreas
Para a grande maioria dos
chamados fazendeiros a situação
econômica se encontra em uma
espécie de equilíbrio precário
menores, ou são praticados outros tipos de
atividades como o cultivo da maçã, de hortigranjeiros etc., ou ainda existem pessoas aposentadas na família ou finalmente, pior de
tudo, atingiram o nível de pobreza absoluta.
Por exemplo, para o município de São Francisco de Paula (Messias, 1997), a área de campos era composta por 1055 propriedades com
uma média de 300 hectares/propriedade e
somente 109 propriedades tinham área igual
ou superior a 500 hectares. Também o número de habitantes por propriedade era de 3,7.
Essa baixa densidade demográfica é o resultado da adoção do modelo consumista pelos fazendeiros locais. Por exemplo, na maioria
das propriedades rurais existem veículos automotores, pois devido às grandes distâncias
existentes entre as fazendas e as sedes municipais, o automóvel é uma necessidade.
Essa baixa densidade populacional nas fazendas dificulta a introdução de práticas alternativas de manejo dos campos, como por
exemplo o uso de roçadeiras manuais no corte do capim seco. É importante ser ressaltado
que a introdução de qualquer mão-de-obra externa à da fazenda é inviável economicamente na grande maioria dos casos.
Particularmente, somos favoráveis à introdução de cercas elétricas, cujas baterias seriam alimentadas com pequenos painéis
fotovoltáicos. Esse procedimento só será
viabilizado através de incentivos governamentais, porém, em muitos casos seriam cercas
longas, principalmente para englobar "aguadas". De qualquer maneira, essa prática reduziria a área queimada e poderia ser executada com mão-de-obra local. Contudo, mesmo
neste caso, ficaria a pergunta: como se evitaria a propagação das ervas daninhas e das
sementes de pinus?
Resumindo: para a grande maioria dos chamados fazendeiros a situação econômica se
encontra em uma espécie de equilíbrio precário. Não há recursos próprios para melhoramentos relativos à exploração da propriedade, é necessário o aporte de recursos externos. Nesse ponto, merece destaque o projeto que está sendo promovido pela EMATER/ RS
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em parceria com as prefeituras municipais
da região homogênea dos Campos de Cima da
Serra, que, entre outros objetivos, visa a alcançar índices de carne bovina de até 400kg/
ha. ano (atualmente este índice é de 300kg/
ha ano EMATER/RS - São Francisco de Paula,
2000). Quanto à dimensão social da sustentabilidade, uma consideração merece ser destacada: nas áreas coloniais dos municípios do
Planalto das Araucárias, para cada dez propriedades (minifúndios) existentes, seis estão abandonadas; já no caso dos Campos de
Cima da Serra, o número de propriedades
abandonadas é mínimo. Pode não mais existir a casa, sede do estabelecimento, porém a
propriedade continua sendo explorada. Uma
explicação técnico-científica para essa situação consiste no fato de, entre os animais superiores, os ruminantes (bovinos, ovinos e
caprinos etc.) serem os únicos que digerem a
celulose e esse é o glicídio mais abundante na
natureza. Portanto, os custos operacionais da
pecuária de corte em uma fazenda são os mais
baixos comparados com qualquer outro tipo de
atividade econômica passível de ser desenvolvida na área da mesma.
3 Algumas conclusões
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Não parece haver dúvidas de que as queimadas, mesmo de forma controlada, causam
danos ao meio ambiente. O problema central
nesse debate é a avaliação qualitativa e quantitativa desses danos. Nesse sentido, muitos
estudos são necessários, além de todos aqueles que estão em andamento na atualidade.
Por exemplo, os habitantes locais argumentam que a biodiversidade animal está em
equilíbrio com a prática das queimadas, pois
aquelas espécies sensíveis a esse tipo de
manejo já desapareceram há muito tempo.
Também, o maior perigo às espécies atualmente existentes se concentra nos incêndios sem controle algum, que poderão se in-
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Em termos de sustentabilidade
econômica e social a região parece ter atingido um equilíbrio.
A sustentabilidade ambiental
é que está sob suspeita
tensificar, caso cessem as queimadas controladas e não haja um outro tipo de manejo que
evite a formação de extensas áreas como capim seco durante os meses mais frios (junho
e julho).
Em termos de sustentabilidade econômica
e social, a região parece ter atingido um equilíbrio. A sustentabilidade ambiental é que está
sob suspeita, porém a ameaça não é proveniente só da prática das queimadas controladas, porém as grandes áreas contínuas plantadas com pinus apontam para uma ameaça
maior para o ecossistema. Contudo, a atividade madeireira não deve ser simplesmente
combatida; é necessário algum tipo de controle, pois é uma atividade bem recente, principalmente em relação às florestas de pinus.
Uma possível saída para este impasse, que
vem sendo discutida em muitas das reuniões locais envolvendo ONGs, técnicos e autoridades municipais etc. consiste em estimular os fazendeiros a implantarem pequenos
bosques de pinus e araucária, mantendo na
mesma área as espécies nativas porventura
existentes. Isto permitiria a médio prazo a
comercialização do pinhão e a floresta de
pinus constituiria uma espécie de poupança
cujo resgate se daria em torno de vinte anos.
Quanto à postura das autoridades ligadas
à área ambiental, se espera também uma
preocupação efetiva não só em relação às
queimadas mas também com a expansão das
florestas contínuas e homogêneas, principalmente com pinus. Essa última situação aponta para o desaparecimento total da biodiver-
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sidade e da beleza da encantadora paisagem
dos Campos de Cima da Serra, que tanto contribui para o desenvolvimento do turismo rural e ecoturismo.
Portanto, a região do Planalto das Araucárias enfrenta duas ameaças ambientais sérias: queimadas de campos e a propagação das
florestas de pinus, onde uma proibição radical das primeiras acentuará a segunda e,
nesse caso, de uma maneira irreversível. São
necessárias muitas negociações sem radicalismos e ainda muitos estudos deverão ser feitos até ser possível atingir também a sustentabilidade ambiental para a região. A
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