J Rodolfo S Martins CAPÍTULO 2 – SELEÇÃO DO EIXO E TIPO DO BARRAMENTO 1 confirmado na etapa de levantamentos de campo (sugerese escala 1:100 ou próximo disto. SELEÇÃO DO EIXO A escolha do eixo da barragem é geralmente feita durante o estudo de inventário, e inclui na realidade uma faixa mais provável para a locação do mesmo, função de diversas características. Cada local para implantação de barragem é único e tem condições topográficas, geológicas e hidrológicas particulares, que resultará na composição de um arranjo geral específico e que dificilmente poderá ser replicado exatamente. No capítulo anterior foram exemplificados diversos arranjos de barragens onde a disposição dos diferentes componentes atendeu às limitações topográficas, geotécnicas e hidráulicas que existiam. Por definição, o melhor arranjo para um determinado aproveitamento hidroelétrico é aquele que consegue posicionar todos os elementos do empreendimento de maneira a combinar a segurança requerida pelo projeto e as facilidades de operação e manutenção com o custo global mais baixo (MME, 2007) A escolha do local do barramento deve considerar, primeiramente, os vales estreitos, quedas d´água, corredeiras, afloramentos rochosos e características similares à estas que permitem economia nas estruturas. Em paralelo deve-se ter em mente que a viabilidade do eixo não será apenas econômica mas principalmente sócio ambiental, por isso, esta atividade exige grande dose de experiência do planejador Na fase de estudo de inventário, ada eixo de barragem deve-se determinar o maior nível de água que o reservatório pode atingir de forma expedita, isto é, sem considerar o zoneamento do reservatório para suas diferentes finalidades e, a partir da composição do perfil longitudinal do rio, verificam-se interferências como estradas, pontes, aglomerados urbanos e outras infraestruturas presentes na bacia. No momento da escolha do eixo geralmente se consideram critérios como acessos, localização das jazidas de materiais de construção e, principalmente, as facilidades para posicionamento das estruturas hidráulicas componentes. Figura 1: Estudos para posicionamento do eixo da barragem (DAEE, 2005) O posicionamento do eixo pode ser feito inicialmente em cartas topográficas na escala 1:50.000 e em seguida Seleção do Eixo da Barragem Figura 2: Posicionamento do eixo da barragem Figura 3: Planimetria da área da barragem (esc 1:500) Curva cota-área-volume Uma vez definida a posição do eixo, a primeira atividade a ser feita é a curva cota-área-volume, que servirá de fundamento para os estudos de determinação da altura final da barragem, evaporação e etc, e com base nos quais são feitos o posicionamento das estruturas de vertimento, tomada d’água e também a definição dos níveis operacionais.. A curva cota – área – volume é obtida a partir do levantamento topográfico da área do futuro lago (que pode ou não ser um reservatório, a depender de como será operado), como mostra a Figura 3. Os valores são obtidos delimitando-se as áreas compreendidas entre duas cotas. Nos levantamentos aéreos automatizados feitos através de voos com sistemas de posicionamento georeferenciados a área é mapeada diretamente em formado ‘raster’ (composto de pontos) espaçados de forma adequada, por 1 /4 PHD2416 Barragens e Estruturas Hidráulicas Guia de Estudo exemplo, a cada 20, 50 ou 100 m, de forma que o cálculo pode ser feito muito rapidamente com o auxílio de uma planilha eletrônica. Figura 4: Exemplo de arquivo ‘raster’ com a topografia da área Figura 5: Curva Cota Área Volume Escolha do Tipo de Barragem As barragens são construídas com diversas finalidades, entretanto as funções de reservação, desvio e detenção (USBR, 1987) são geralmente presentes em quase todos os tipos de aproveitamentos: Barragem de reservação – São construídas com o objetivo de acumular água no período de cheia para suprir a demanda na estiagem. Esses períodos podem ser sazonais , anuais ou maiores. Outra classificação dentro da classificação de reservação é quanto ao uso do volume reservado, como abastecimento, recreação, pesca, geração de energia e irrigação. O objetivo pelo qual a barragem é projetada influencia seu projeto, uma vez que estabelece critérios que devem ser seguidos como, por exemplo, volume do reservatório. Barragem de desvio – Esse tipo de barragem é construída para elevar o nível d’água possibilitando sua passagem para diques, canais e outros sistemas de condução. Esse tipo de construção é utilizada para possibilitar irrigação, para desviar um curso d’água natural para um canal artificial ou para um reservatório, para fins industriais ou uma combinação dos itens acima. Barragem de detenção – são construídas com o objetivo de retardar a vazão oriunda do escoamento superficial e para auxiliar no controle de cheias. Existem dois tipos de barragens. No primeiro a água é temporariamente armazenada e depois liberada por meio de uma estrutura de extravasão de forma que a vazão liberada não gere uma vazão total no canal de jusante que ultrapasse sua 2 /4 capacidade, sendo nesse caso uma barragem de detenção. No segundo caso, a água é retida o máximo possível para infiltrar em áreas permeáveis ou na fundação, sendo classificada como barragem de retenção. Algumas barragens de detenção são construídas para reter sedimentos e são chamadas de barragem de rejeitos. As barragens podem ser classificadas também acordo com o tipo de extravasão. Assim, existem as barragens de soleira livre, onde a vazão passa pela crista da barragem, sendo esse o vertedor. Nesse tipo de construção, o material mais utilizado na construção é o concreto. Outro tipo de projeto é aquele realizado de forma que não ocorra o galgamento da barragem. As barragens nesse caso geralmente são terra ou de rocha. Normalmente, esses dois tipos são combinados e restringe-se uma área para extravasão denominada de vertedor. Conforme já apresentado no Capítulo 1, a classificação mais utilizada para discussão de metodologias construtivas é a baseada no tipo de material utilizado para construção da estrutura da barragem. Barragem de Terra – esse tipo de barragem é a mais comum devido ao fato da matéria prima utilizada em sua construção é retirada das escavações que são necessárias para a construção da barragem ou devido ao fato de essa matéria prima está presente no ambiente próximo à construção e, além disso, esse material exige pouco processamento. Assim, utilizar essa matéria prima apresenta vantagens econômicas. Outro ponto é que os requisitos necessários para fundação e topografia são menos rígidos do que para outros tipos de barragens. Dentro da classificação de barragem de terra existem diversas sub-classificações sendo uma delas baseada no tipo de compactação utilizado. Assim, pode-se destacar que os principais tipos são compactação mecânica, utilizando-se por exemplo rolo compressor ou pé de carneiro e o aterro hidráulico, sendo que neste último uma mistura de água e um solo fino como o silte é lançado entre uma fileira de rochas que permite a passagem da água mas retém parcialmente o fino. Com relação às barragens compactadas à rolo, tem-se que elas apresentam grande vantagem econômica com relação às demais. Uma necessidade desse tipo de barragem é ter uma estrutura complementar para descarga e manutenção da segurança da barragem em eventos de cheia. Isso porque a barragem de terra é muito vulnerável ao galgamento da crista, que pode levar ao rompimento da barragem devido à ação erosiva da água. Barragem de Enrocamento – Esse tipo de barragem utiliza rochas de diversos diâmetros, que promove a estabilidade, e uma camada impermeável, que promove a estanqueidade. A camada impermeável pode ser localizada na face de montante da barragem, podendo ser uma camada de um solo impermeável, concreto, concreto asfáltico, placas de aço ou outro material impermeável. Outra possibilidade é que esta camada impermeável se localize no núcleo da barragem, podendo ser uma camada fina de solo impermeável. De maneira semelhante às barragens de terra, as barragens de enrocamento podem sofrer grandes danos caso ocorra o galgamento da estrutura. Desta maneira, extravasores devem ser dimensionados para lidar com o excesso de vazão decorrente de eventos de cheias. Com relação à fundação, as barragens de enrocamento exigem estruturas que não permitem grandes recalques, Seleção do Eixo da Barragem visto que a camada impermeável não deve ser rompida. Assim, os tipos de fundações recomendadas são em rocha ou em areia e cascalho compactados. As barragens de enrocamento são aconselháveis para locais com grande disponibilidade de rochas ou que possuam baixa disponibilidade de solo bom para construção de barragens de terra. É, também, uma boa alternativa para áreas que tenham grandes períodos chuvosos não permitindo a construção de barragens de terra ou ainda onde a construção de uma barragem de terra seria muito cara. Barragem de Concreto de Gravidade – As barragens de concreto são alternativas interessantes em locais onde as condições do solo para fundação são boas. Além disso, se adequam bem na função de vertedor de soleira livre, sendo assim utilizados em conjunto com as barragens de terra e de enrocamento. As barragens de gravidade podem ser retas ou curvas no plano. As barragens curvas tem a vantagem do custo e da segurança. Um tipo mais recente de barragem de concreto é a barragem de concreto compactado a rolo. Barragem de Concreto em Arco – esse tipo de barragem é realizada em locais onde a razão da distância entre os contatos da barragem com as laterais do vale e a altura não é muito grande. Além disso, a resistência na região de contato deve ser grande de forma a resistir aos esforços provenientes da estrutura em arco que repassa o esforço da pressão da água do reservatório. Dois tipos de estruturas serão aqui definidos: a de arco simples e a de arcos múltiplos. A estrutura de arco simples cobre a seção do rio com uma única estrutura e possui um limite máximo do comprimento da crista com relação à altura de 10:1. Seu projeto pode incluir blocos de pressão em cada contato, se necessário, e um vertedor ao longo da crista. A estrutura de arcos múltiplos pode ser de dois tipos. O primeiro tem uma estrutura cilíndrica de espessura uniforme. A segunda é formada por várias estruturas em arco apoiadas em contrafortes espaçados. O tempo de projeto e construção, qualidade dos materiais da barragem e de sua fundação, o tratamento da fundação e as considerações hidráulicas serão fortemente influenciados pelo objetivo da barragem a ser construída. Com relação à fundação tem-se ainda que solos que sofrem grande recalque, pedregulhos e matacões não são recomendados para esse tipo de estrutura. Outro aspecto é que esse tipo de barragem apresenta maior resistência ao galgamento durante ou após a construção. Barragem de Concreto em Contrafortes – Esse tipo de barragem pode ocorrer intercalando contrafortes e painéis planos ou a arcos de concreto. Nesse tipo de construção utiliza-se até 60% menos concreto do que nas barragens sólidas de concreto de gravidade, no entanto, esse custo é compensado com mão de obra e na utilização do aço. Esse tipo de construção é competitiva quando o custo da mão de obra não é grande e, quando isso não acontece, os demais tipos de barragem são mais vantajosos que este. Outros tipos de barragens – outros tipos de barragens foram construídos, no entanto seu número é pouco significativo. Estruturas envolvendo aço e madeira foram criadas porém, neste último caso, seus altos custos desestimularam seu uso. Fatores para a escolha do tipo A escolha do tipo de barragem é feita considerando-se os diversos aspectos envolvidos no seu projeto, de maneira que faz-se necessária a contribuição de profissionais das áreas de hidrologia, geotecnia, hidráulica, estruturas, topografia, geologia e outras áreas relacionadas à caracterização das fundações, materiais de construção e sismologia(ANA, 2015). Além disso, a escolha do tipo de barragem também é afetada por vários outros fatores como limitações das estruturas de extravasão, problemas relacionados ao desvio do rio durante o processo de construção, disponibilidade de mão de obra e equipamentos, acesso ao local de construção, condições do local de construção, finalidade da barragem e também a segurança da barragem. Assim, análises econômicas são realizadas considerando-se as diferentes alternativas, tendo em vista a escolha de uma delas. A seguir será discutido a influência de alguns fatores físicos na definição do tipo de barragem. Topografia – As considerações relativas à topografia contemplam a estrutura da superfície na área de construção da barragem, na área destinada ao reservatório e acesso ao local de construção e aos materiais de construção. A topografia influencia fortemente a escolha do tipo de barragem. Assim, leitos de rio estreitos em calhas rochosas e altas propiciam construção de barragens de enrocamento ou de concreto. Por outro lado, calhas abertas em locais planos sugerem a utilização de barragens de terra. Condições intermediárias sugerem outras opções como as estruturas compostas. Além disso, a topografia influencia a escolha das estruturas anexas. Por exemplo, no caso de se ter uma calha fechada com margens altas, pode ser mais econômico construir uma barragem de concreto com uma região de vertimento sobre soleira livre do que construir uma barragem de enrocamento com um vertedor. Geologia e Condições de Fundação – A adequação dos diversos tipos de rocha como fundação e os tipos de materiais para construção são questões geológicas que devem ser consideradas. Assim, a geologia de determinada área onde estará a fundação de certa barragem determina o tipo de barragem que é possível construir. Desta maneira, a resistência, permeabilidade e existência de falhas são importantes fatores na tomada de decisão. A seguir serão discutidos alguns tipos de fundação mais encontrados: Fundações em rocha – Fundações em rocha apresentam poucas restrições com relação ao tipo de barragem a ser escolhido. Isso porque apresentam grande resistência aos esforços, percolação e à erosão. Assim, o fator decisivo neste caso são os custos envolvidos no tratamento do solo como remoção da rocha fraturada, que normalmente são necessários. No caso da ocorrência de rochas fracas, esse fator irá influenciar fortemente o tipo de barragem a ser utilizado. Fundações em cascalho – Fundações em cascalho, quando bem compactados são uma boa alternativa para barragem de terra ou de enrocamento. No entanto, como nesse tipo de fundação geralmente ocorre grande percolação, cuidados quanto ao controle deste evento devem ser tomados. Fundações em silte ou areia fina – Fundações em silte ou areia fina podem ser utilizadas em barragens pequenas de gravidade e barragens de terra se propriamente projetadas mas, não são recomendadas para barragens de enrocamento. O projeto nessa condição deve considerar o PHD2416 Barragens e Estruturas Hidráulicas Guia de Estudo fato de a base de assentamento não ser uniforme, colapso na saturação, forças de empuxo, prevenção de piping, percolação excessiva e proteção à jusante contra erosão no pé da barragem. Fundações em argila- Fundações em argila podem ser utilizadas para barragens de terra, mas impõem a restrição de baixa inclinação nos taludes, tendo em vista a baixa resistência da fundação e os esforços de cisalhamento. Fundações em argila apresentam grande recalque de forma que esse tipo de fundação não é recomendado para barragens de enrocamento nem para barragens de concreto. Normalmente, são necessários testes no material da fundação em seu estado natural para determinar suas características e a sua capacidade de suportar sobrecarga. Fundações Não Uniformes – Por vezes acontecem situações nas quais fundações uniformes não podem ser encontradas, assim uma fundação não uniforme envolvendo diversos materiais com diferentes resistências pode ser utilizada. Nesse caso, mudanças no projeto devem ser realizadas para contrabalancear a heterogeneidade do solo. Materiais Disponíveis – materiais para construção barragens de vários tipos que podem estar disponíveis próximo ou no local da construção da barragem. Exemplos desses materiais são solos e rochas para barragens de enrocamento e agregados para concreto. A eliminação de custos relacionados ao transporte pode reduzir significativamente o custo total da obra. Hidrologia – As características do rio, com relação à sua vazão, e as características da precipitação na região da barragem afetam fortemente os custos da barragem, uma vez que influenciam o tratamento e o modo como a água será desviada durante a construção da barragem e as estruturas de vertimento. Vertedor – A escolha do vertedor está ligada a magnitude da cheia que gerará uma vazão a ser descarregada e ao arranjo da barragem e suas estruturas . Desta forma, em cursos d’água com potenciais grandes inundações, o vertedor pode ser a estrutura dominante, sendo a escolha do tipo de barragem uma condição secundária. O custo de construir um vertedor largo é normalmente uma grande porção do custo total de uma barragem. Um dos tipos de arranjo mais desejável é o uso do canal escavado fora dos limites da barragem, de maneira que o permite a seleção de uma barragem que não suporta galgamento, como enrocamento e de terra. Sismicidade – Se a barragem está localizada em uma área sujeita a terremotos, o projeto deve prever o acréscimo de carga e ação de esforços oriundos do choque. Assim, para esse caso, o projeto deve ser realizado por um especialista com experiência na área. Economia e estética A relação custo benefício está sempre presenta na escolha do tipo da barragem. Existem poucas áreas onde uma barragem não possa ser construída, mas em muitos casos os custos para sua implantação são muito altos e, assim, para realizar a escolha de implantação deste empreendimento determinam-se os custos e os benefícios derivados do empreendimento. Essa avaliação, no entanto, possui procedimentos determinados quando se trata da quantificação dos benefícios de atividades como produção de energia, irrigação e abastecimento, mas encontra dificuldades na quantificação dos benefícios de ações 4 /4 como controle de cheias ou a utilização para lazer, composição paisagística, ou ainda no desenvolvimento e atratividade local e regional. Neste caso, diversos fatores como avaliação da população com relação ao empreendimento e custos indiretos devem ser considerados. De modo geral, toda barragem deve possui um acabamento, compatível com seu propósito. Considerações estéticas podem ter um importante papel no tipo de barragem a ser selecionado, como é o caso das barragens que possuem como função a criação de áreas para lazer. ANA, 2015, Guia para a Elaboração de Projetos de Barragens: Manual do Empreendedor, v. 5: Brasília, DF, Agência Nacional e Águas, 194 p. DAEE, 2005, Guia Prático para Projetos de Pequenas Obras Hidráulicas: São Paulo, Secretaria de Estado de Energia Recursos Hídricos e Saneamento, Departamento De água e Energia Elétrica do Estado de São Paulo. MME, 2007, Manual de Inventário Hidrelétrico de Bacias Hidrográficas, in C. d. P. d. E. E. CEPEL, ed., Brasília, Ministério de Minas e Energia. USBR, 1987, DESIGN OF SMALL DAMS: Washington DC, UNITED STATES DEPARTMENT OF THE INTERIOR BUREAU OF RECLAMATION. Seleção do Eixo da Barragem