DIVERSIDADE DE RIZÓBIOS MICROSSIMBIONTES DE LEGUMINOSAS NATIVAS DOS CAMPOS GERAIS. Milena Serenato Klepa (PIBIC/CNPq/UEPG), Fabiane Paulitsch (PPG Biologia Evolutiva/UEPG), Jesiane Stefania Batista da Silva (Orientadora), e-mail: [email protected] Universidade Estadual de Ponta Grossa/Departamento de Biologia Estrutural, Molecular e Genética/Setor de Ciências Biológicas e da Saúde. Microbiologia/Microbiologia aplicada. Palavras-chave: Fixação Biológica de Nitrogênio, Diversidade de Rizóbios, Diversidade Resumo: Encontrada em grande número de espécies nos Campos Gerais, a família Fabaceae apresenta extrema relevância na fixação biológica de nitrogênio, através da simbiose com rizóbios compatíveis, resultando em estruturas especializadas denominadas nódulos. O presente trabalho objetivou realizar o primeiro levantamento de plantas nodulíferas nativas da região e avaliar a diversidade de rizóbios isolados. A partir de amostragens realizadas em áreas da região, constatou-se 8 espécies de Fabaceae nodulíferas, dentre as quais 3 espécies tiveram o primeiro relato sobre nodulação. Cento e nove rizóbios foram isolados e cultivados em YMA, possibilitando constatar grandes variações morfofisiológicas, permitindo assim, inferir sobre a existência de elevada diversidade fenotípica entre rizóbios nos solos da região. Pelo grande número de isolados, estirpes de Mimosa gymnas foram selecionadas para análise da diversidade genética. Uma elevada diversidade genotípica foi evidenciada no dendrograma gerado com os perfis de BOX-PCR. O sequenciamento do gene 16S rDNA permitiu corroborar que estirpes de Burkholdeira são as principais simbiontes de Mimosa na América do Sul. Já a árvore filogenética construída com sequencias parciais do gene nodC evidencia uma menor variabilidade do que a encontrada dentre sequencias do 16S rDNA, provavelmente devido ao seu envolvimento com a determinação da especificidade rizóbio-hospedeiro. Como se tratam de espécies endêmicas de Fabaceae, o levantamento e caracterização realizados permitiram obter dados de diversidade florística sobre um novo ponto de vista, além de relatar sobre espécies nunca descritas como nodulíferas anteriormente, que podem representar modelos para caracterização da evolução de beta-rizóbios. Introdução Localizada na porção centro-leste do Paraná, a região dos Campos Gerais contempla uma conjugação de fatores ambientais, que garante a esta, particularidades quanto às espécies vegetais (CARMO, 2006). Região onde se encontram alguns sítios naturais já implementados como unidades de conservação (UCs), tais como: Parque Estadual de Vila Velha, Parque Estadual do Guartelá e Parque Nacional dos Campos Gerais. De acordo com levantamentos florísticos realizados nas referidas regiões, a família Fabaceae é relatada por sua abundância e riqueza (CARMO, 2006; SILVA, 2014). Bactérias denominadas rizóbios estabelecem relação simbiótica específica com espécies desta família, culminando na infecção via pelos radiculares e organogênese de estruturas radiculares denominadas nódulos, no interior dos quais onde ocorre a fixação biológica do nitrogênio (FBN) pelos rizóbios (SCHULTZE & KONDOROSI, 1998). O conhecimento da capacidade nodulífera de leguminosas, bem como dos grupos de microrganismos presentes nos solos da região, nos permitem compreender alguns mecanismos relacionados com a capacidade de adaptação de determinadas espécies de plantas, compreender dados de diversidade florística por um novo ponto de vista, bem como fundamentar estratégias de recuperação da flora nativa em áreas degradadas. Nesse sentido, o presente trabalho visou realizar a primeira descrição de plantas nativas nodulíferas da região dos Campos Gerais, bem como caracterizar seus microssimbiontes. Materiais e métodos Leguminosas nativas contendo nódulos radiculares foram acondicionadas em sacos plásticos estéreis, mediante classificação taxonômica e emissão de comprovante de registro para coleta de material biológico (nº 49603) e autorização para atividades científicas (nº 49604), emitidas pelo ICMBio via SISBIO. Nódulos foram isolados da planta hospedeira e desinfestados de acordo com Hungria & Araújo (1994). Em seguida macerados em solução salina estéril e inoculados em placas de Petri contendo meio sólido seletivo Yeast Mannitol (YM)+Vermelho Congo e incubadas à 28ºC. As colônias de rizóbios isoladas foram caracterizadas fenotípicamente de acordo com Hungria & Silva (2011). As estirpes isoladas estão mantidas em estoque em Agar inclinado e criopreservadas em glicerol 50%, constituindo a “Coleção de culturas de bactérias multifuncionais dos Campos Gerais”. Além disso, foram depositados na “Coleção de Culturas de Microrganismos Multifuncionais” da Embrapa Soja (Londrina, PR). O DNA total dos isolados foi extraído com o kit miniPrep DNA genômico bacteriano, conforme instruções do fabricante. Verificou-se a integridade e concentração do DNA através de eletrofose em gel de agarose 1,0%. O DNA total de estirpes selecionadas foi utilizado como molde para amplificação do gene 16S rDNA, utilizando os iniciadores universais fD1 e rD1 (WEISBURG et al., 1991). Os produtos de PCR, de aproximadamente 1500pb, foram purificados utilizando o Illustra GFX PCR DNA and Gel Band Purification Kit (GE Healthcare). O gene nodC das estirpes foi amplificado utilizando-se os primers nodCBurkF e nodCBurkR (BOURNAUD et al., 2013). Os produtos de PCR foram purificados, utilizando o kit Illustra GFX PCR DNA and Gel Band purification kit (GE Healthcare). O sequenciamento foi realizado conforme descrito por Dall’Agnol et al., (2016). As sequências dos genes 16S rDNA e nodC foram corrigidas e alinhadas utilizando os softwares Bionumerics (Applied Mathematics, Kortrijk, Belgium, v. 7.6), Bioedit v. 7.2.5 e Geneious v.7.1 (Biomatters). As árvores filogenéticas foram construídas no programa MEGA v. 6.1, com modelo de distância Tamura Nei, algoritmo Maximum Likelihood e suporte estatístico (bootstrap) de 1000 repetições. A reação de amplificação para análise BOX-PCR, foi realizada utilizando o primer BOX-AIR (5’CTACGGCAAGGCGACGCTGACG-3’), seguindo as modificações de Batista et al., (2007). A partir dos perfis obtidos, foram gerados dendrogramas, utilizando o programa Bionumerics (Applied Mathematics, Kortrijk, Bélgica, v.4.6), utilizando-se o algoritimo UPGMA para a análise do agrupamento e o coeficiente de Jaccard com 3% de tolerância. Resultados e Discussão Dentre as espécies de plantas identificadas por especialistas do Herbário da Universidade Estadual de Ponta Grossa (HUPG), algumas já haviam sido relatadas como nodulíferas, tais como: Desmodium incanum, Zornia diphylla, Stylosanthes hippocampoides, Chamaecrista ramosa e Mimosa lanata. No entanto, a ocorrência de nódulos radiculares foi constatada pela primeira vez nas espécies M. micropteris, M. paranapiacabae e M. gymnas; por esse motivo, as caracterizações foram especialmente baseadas nos microssimbiontes das três espécies. A subfamília Mimosoideae, mais precisamente o gênero Mimosa, representou maior número de espécies, bem como de microssimbiontes isolados, sendo M. gymnas a espécie mais representativa. Foi encontrada uma grande diversidade quanto às características fenotípicas entre os isolados das referidas espécies, sendo que algumas bactérias retiradas de nódulos de uma mesma planta hospedeira apresentaram distintas características morfológicas. Poucos isolados mantiveram a neutralidade do meio YMA enquanto a grande maioria provocou acidificação, caracterizadas pela modificação da coloração do meio para amarelo. Pode-se inferir que tal condição seja decorrente da capacidade adaptativa de tais microrganismos às condições de pH ácido dos solos dos Campos Gerais (CARMO, 2006). Maior parte dos rizóbios teve crescimento rápido ou intermediário, formando colônias com produção de muco moderada e massas de consistência viscosas ou gomosas. Houve uma grande variação na coloração das colônias, assim como na forma, elevação, borda e superfície da colônia. Todos os rizóbios apresentaram característica opaca em relação aos detalhes ópticos. Poucos isolados foram classificados como gram-positivos; considerando que todos os rizóbios são bactérias gram-negativas, os isolados que foram classificados como gram-positivos foram descartados e considerados contaminantes. Dentre os 35 isolados de M.gymnas, 21 foram utilizados para análise de fingerprinting do BOX-PCR, sequenciamento do gene ribossomal 16S rDNA e do gene de nodulação nodC. Os perfis genômicos obtidos por BOX-PCR revelaram o agrupamento dos isolados em nove grupos, considerando um nível de similaridade de até 70% (figura 1). A partir das sequências obtidas pelo sequenciamento do gene 16S rDNA, nota-se uma elevada diversidade entre os microssimbiontes de M. gymnas (figura 2). Tal resultado corrobora a constatação de que estirpes de Burkholderia são os principais simbiontes de mimosoídeas da América do Sul (BONTEMPS, et al., 2010). Os isolados apresentaram similariedade com B. nodosa Br3470, simbionte de M. bimucronata, uma leguminosa arbórea nativa do Brasil. Em contrapartida, as sequências parciais do gene nodC, apresentaram baixa variabilidade entre os diferentes isolados (figura 3). De acordo com Bournaud et al., (2013), a filogenia de genes de nodulação de espécies de Burkholderia simbiontes de mimosoídeas é usualmente relatada como monofilética e nossos resultados corroboram tal constatação. A maior similaridade do gene nodC foi encontrada com a estirpe Burkholderia sp. JPY578, isolada de nódulo de M. blanchettii endêmica de campos rupestres da Chapada Diamantina (dos REIS JR et al., 2010). Conclusões O primeiro relato da habilidade de nodulação em leguminosas nativas da região dos Campos Gerais poderá contribuir como subsídio na manutenção biológica de áreas com solo degradado, do mesmo modo que o conhecimento dos rizóbios simbiontes destas conferem informações importantes relacionadas à evolução da interação plantamicrorganismo, bem como da diferenciação espacial na composição de populações simbióticas. Os dados obtidos ainda são insuficientes para determinação da espécie bacteriana, por isso serão utilizadas metodologias para classificar corretamente os isolados e principalmente a possível constatação da existência de novas espécies bacterianas. O presente trabalho abriu caminhos para estudos futuros de mesmo cunho em outras leguminosas nativas dos Campos Gerais, assim como na melhor compreensão de adaptações de espécies vegetais da família Fabaceae. Agradecimentos O desenvolvimento da pesquisa contou com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e apoio financeiro e técnico-científico do Programa de Pós-Graduação em Biologia Evolutiva, Laboratório de Biodiversidade e Herbário da Universidade Estadual de Ponta Grossa e Embrapa Soja – Londrina/PR. Referências BATISTA, J. S. S.; HUNGRIA, M; BARCELLOS, F. G.; FERREIRA, M. C.; MENDES, I. C. Variability in Bradyrhizobium japonicum and B. elkanii Seven Years after introduction of both the exotic microsymbiont and the soybean host in a Cerrados soil. Microbial Ecology, 53: 270-284, 2007. BONTEMPS C.; ROGEL, M. A.; WIECHMANN, A.; MUSSABEKOVA, A.; MOODY, S.; SIMON, M. F.; MOULIN, L.; ELLIOT, G. 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