Protium Burm. f. e Tetragastris Gaertn.

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BioTupé: Meio Físico, Diversidade Biológica e Sociocultural do Baixo Rio Negro,
Amazônia Central - Vol. 03.
Edinaldo Nelson SANTOS-SILVA, Veridiana Vizoni Scudeller,
Mauro José CAVALCANTI, (Organizadores). Manaus, 2011.
Capítulo 10
Diversidade
Meio Biológica
Físico
Identificação morfológica dos breus (Protium
Burm. f. e Tetragastris Gaertn.) da Reserva de
Desenvolvimento Sustentável do Tupé, Manaus-AM
1
Mário Henrique Fernandez
e-mail: [email protected]
2
Veridiana V. Scudeller
e-mail: [email protected]
Programa de Pós-Graduação em Botânica, Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia – INPA, Bolsista CNPq, Mestrado
2
Instituto de Ciências Biológicas – ICB, Universidade Federal do Amazonas – UFAM,
Departamento de Biologia
1
Resumo: Burseraceae é um grupo de plantas que desde suas primeiras descrições
científicas no séc. XVIII demonstrou um histórico antigo de utilização e, também,
de muita confusão, como é o caso da maioria das famílias de ampla distribuição
nas regiões tropicais do planeta. O grande número de sinonímias para diversas
espécies e as constantes revisões de grupo que propõem diversas mudanças pouco
definitivas no enquadramento de cada táxon, contribui apenas para subestimar a
importância desta família. Como exemplo, Protium é representado na Amazônia
por 73 espécies, a maioria não sendo prontamente identificada em inventários
e frequentemente confundida com outros gêneros de Burseraceae. Portanto,
neste estudo foi elaborada uma chave de identificação para as Burseraceae,
principalmente Protium e Tetragastris na Reserva de Desenvolvimento Sustentável
do Tupé, utilizando caracteres morfológicos vegetativos, além de selecionar
caracteres que melhor dão suporte à determinação, o que poderá contribuir
para reduzir a confusão taxonômica do grupo. Para tanto, foram selecionados
169
Fernandez & Scudeller
alguns indivíduos de Protium e Tetragastris de uma parcela permanente de 0,5
hectare previamente inventariada. Desses indivíduos foram coletadas amostras
de ramo estéril para análise das características vegetativas. Foi estabelecida uma
sequência de caracteres no programa DELTA para gerar uma matriz de dados
sobre as espécies amostradas. O programa realizou a análise do conjunto de
dados e formulou chaves de identificação considerando as diferenças entre os
caracteres estudados. Os resultados permitiram a elaboração de uma chave de
determinação que inclui caracteres como forma do ápice do folíolo, pilosidade do
peciólulo, pilosidade do ramo e morfologia da casca. Foram incluídas na análise
11 morfotipos, sendo nove pertencentes a Protium (P. opacum, P. crassipetalum, P.
calendulinum, P. divaricatum subsp. divaricatum, P. grandifolium, P. spruceanum,
P. guianense, P. paniculatum var. riedelianum e P. pilosissimum) e dois Tetragastris
(T. altissima e T. panamensis).
Palavras-chave: breu; Protium; Tetragastris; Morfologia; identificação de planta
estéril.
Introdução
O breu ou a almecegueira,
pertencente às Burseraceae, apresenta
um grande registro histórico de uso em
várias civilizações. Há indícios muito
antigos do uso da mirra (Commiphora)
e o olíbano (Boswellia), empregados
nos processos de embalsamar há mais
de 3.000 anos A.P. (Langenheim, 2003).
Outro exemplo é o copal (Protium sp.),
um tipo de breu da América Central,
cuja resina foi encontrada na forma de
moeda em sítios arqueológicos maias
(Case et al., 2003). O odor marcante e
a resina abundante que solidifica no
tronco das plantas são algumas das
características que provavelmente
influenciaram a curiosidade humana.
Atualmente não existe mais
a mesma importância deste produto
no mercado como no passado, porém
170
a utilização das plantas dessa família,
para os mais diversos fins ainda é
muito significativa. No Brasil o gênero
mais representativo em termos de que
número de espécies desta família é
Protium Burm. f. Sua madeira é usada na
construção civil, e a resina é empregada
na produção de vernizes ou para
calafetar embarcações. Na medicina
popular é uma planta empregada para
distúrbios gástricos, do sistema nervoso
e respiratório (Corrêa 1984; Lorenzi
1998, 2002; Lorenzi & Matos, 2002).
Além
da
importância
histórica da família, sua distribuição
nos trópicos e a diversidade de
espécies, junto as adaptações aos
mais variados terrenos e solos, tornam
Burseraceae uma das mais conhecidas
família de plantas. A maior parte dos
Identificação morfológica dos breus (Protium Burm. f. e Tetragastris) da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé, Manaus-AM
levantamentos florísticos realizados
na Amazônia indica um alto valor de
importância para os representantes
desta família Burseraceae (Milliken
1998), principalmente em ambientes
heterogêneos (Daly, 1987). O histórico
geológico complexo da Amazônia,
formada em parte por sedimentos férteis
dos Andes, e também por sedimentos
pobres provenientes dos escudos
quartzíticos brasileiro e das Guianas
que alimentam o rio Negro, formam um
mosaico ambiental que provavelmente
favoreceu a especialização edáfica de
diversas espécies vegetais. Uma das
consequências disso seria a grande
diversificação de espécies e uma alta
taxa de endemismos (Fine et al., 2005,
Ter Steege et al., 2006).
Em um estudo florístico
realizado na RDS Tupé, no baixo rio
Negro perto de Manaus, Burseraceae
ficou entre as famílias mais diversas
em número de espécies. Segundo
Diniz e Scudeller (2005), em meio
hectare de terra-firme amostrado, esta
família foi a primeira em número de
espécies com perímetro à altura do
peito (PAP) maior que 30 cm. Embora
não existam muitos artigos tratando
da utilização de Burseraceae, diversas
comunidades ribeirinhas e indígenas
utilizam regularmente a resina de
suas espécies para calafetar canoas,
afastar mosquitos das casas e como
tratamento de diversos problemas de
saúde (Plowden, 2001), e esse tipo
de utilização já foi presenciado nas
comunidades da RDS Tupé (obs. pess.).
Entretanto, uma família de
distribuição ampla, com um grande
histórico de uso, e com muitas espécies
adaptadas a cada tipo de ambiente,
geralmente se torna um grupo
complicado de determinar suas espécies,
e diversas delas são frequentemente
reclassificadas principalmente porque
foram descritas utilizando caracteres
não confiáveis – ou diagnósticos, como
é o caso das Lauraceae, Lecythidaceae
e Rubiaceae. A história taxonômica
das Burseraceae é muito confusa,
marcada por diversas sinonímias e
pelo uso de caracteres taxonômicos
pouco relevantes ou estáveis. Desde
a primeira descrição de Protium, uma
espécie denominada Amyris protium
em 1767 por Linnaeus, e que no ano
seguinte foi descrita novamente por
Burmann como Protium javanicum,
o gênero já apresentou diversas
denominações, incluindo espécies que,
achava-se pertencer a outros gêneros,
Em diversos casos, há menos diferenças
entre Protium e algumas espécies de
outros gêneros de Burseraceae que
entre algumas espécies deste mesmo
gênero (Daly, 1987).
Os estudos de Daly (1987)
elucidam de maneira mais consistente
as diferenças entre os gêneros e
espécies, além de consistir em uma
grande revisão nos estudos realizados
na família desde 1867. Apesar de
grandes mudanças no enquadramento
taxonômico da família, e o histórico
de utilização, relativamente poucas
espécies foram estudadas em maiores
171
Fernandez & Scudeller
detalhes, principalmente quanto à
composição fitoquímica. P. icicariba,
P. strumosum, P. spruceanum, P.
nitidifolium, P. paniculatum, P.
hebetatum, P. altsonii, P. heptaphyllum,
P. lewellyni e P. unifoliolatum foram as
únicas espécies do gênero Protium que
foram estudadas quanto a composição
dos óleos essenciais encontrados na
resina e nas folhas (Zoghbi et al., 1981;
Susunaga, 1996; Maia et al., 2000;
Almeida et al., 2002; Bandeira et al.,
2002, Zoghbi et al., 2002; Case et al.,
2003; Lima et al., 2005; Citó et al., 2006).
Também é preciso salientar que alguns
desses estudos registraram diferenças
significativas na concentração dos
princípios ativos em diferentes partes
das plantas. Além disso, Machado et
al. (2003) verificaram uma variação
temporal na concentração dos
constituintes dos óleos, também em
diferentes partes da planta, em P.
spruceanum. A maior parte desses
estudos também testou a atividade
biológica dos componentes da resina,
e são relatadas diversas ações das
resinas, principalmente atividade antiinflamatória, cercaricida, antibiótica
e cicatrizante. Por outro lado, há
um grande problema na ingestão de
produtos naturais como se fossem
medicamentos. A própria expressão
“produto natural” pode ser enganosa,
levando a um emprego abusivo ou uma
automedicação potencialmente danosa
(Silva, 2006).
Nem sempre é possível
encontrar
plantas
em
estágio
172
reprodutivo, principalmente porque a
maioria das plantas apresenta um ciclo
anual ou supra anual de reprodução e,
normalmente é de duração curta. Além
disso, dificilmente o ciclo reprodutivo
coincide com a possibilidade de
coleta da planta pelo coletor em sua
excursão. Na impossibilidade de coleta
de material fértil para determinação
específica é necessário recorrer a
métodos alternativos de identificação
propostos pela Taxonomia. Outros
caracteres podem ser analisados,
como a arquitetura foliar, anatomia
de órgãos ou células vegetais e,
recentemente, métodos moleculares
têm sido amplamente usados para
identificação e filogenia de diversos
organismos (Noe, 1934; Tippo, 1946;
Hickey, 1973; Dickison, 1975; Rury,
1981; Détienne & Jacquet, 1983;
Carlquist, 1992; Segaar & Van Der Ham,
1993; Stern et al., 1993; Fontenelle et
al., 1994; Kurzweil et al., 1995; Stern,
1997b, 1997a, Stern & Judd, 1999;
Stern & Whitten, 1999; Langenheim,
2003) e tem-se mostrados eficientes
no auxílio à taxonomia.
Portanto, o objetivo deste
estudo foi elaborar uma chave de
identificação para as espécies de
Burseraceae previamente identificadas
como breu (Protium) na RDS Tupé
(Diniz & Scudeller, 2005), utilizando
caracteres morfológicos vegetativos,
bem como selecionar caracteres que
melhor dão suporte à determinação
específica para discussão de seu valor
na taxonomia da família.
Identificação morfológica dos breus (Protium Burm. f. e Tetragastris) da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé, Manaus-AM
Material e métodos
Área de estudo, vegetação e espécies
amostradas
A vegetação da Reserva de
Desenvolvimento Sustentável (RDS) do
Tupé vem sendo estudada pela equipe
de Botânica do projeto BioTupé no
entorno da Comunidade São João do
Tupé (SJT) desde 2002, quando foram
implantadas 3 parcelas permanentes
de meio hectare cada, uma em área de
igapó e duas em terra-firme. A área de
estudo escolhida foi a parcela instalada
na trilha da cachoeira (Diniz e Scudeller
2005), onde foram inventariadas todas
as árvores com o diâmetro na altura
do peito (DAP) maior que 10 cm, e as
amostras coletadas foram armazenadas
no Herbário Ghillean Prance do Centro
Universitário Luterano de Manaus/
Universidade Luterana do Brasil
(CEULM/ULBRA).
O resultado do estudo
realizado por Diniz & Scudeller
(2005), aponta para uma grande
importância das Burseraceae na
estrutura fitossociológica local. Ali se
verificou a ocorrência de 49 indivíduos
provavelmente e Protium com DAP
maior que 10 cm. Nesse estudo os
indivíduos foram agrupados em
nove morfotipos diferentes, sendo P.
apiculatum o único determinado ao
nível específico, compondo 42% dos
indivíduos observados para o gênero.
Foram selecionados três indivíduos de
cada morfotipo apresentados na tabela
1. Dessa forma foram escolhidos 12
indivíduos que representariam melhor
os morfotipos da parcela, entretanto
uma investigação posterior revelou
que cada indivíduo selecionado
representava uma espécie, resultado
que também é apresentado na
tabela 1. Cabe salientar que até este
momento não haviam sido feitas novas
tentativas de determinação específica,
e acreditava-se que os morfotipos
pertencessem a um único gênero.
Elaboração da Chave
Após
a
determinação
dos especimes, as características
diagnósticas de cada espécie foram
listadas para a montagem de um banco
de dados que guiou a construção da
chave de identificação. Também foram
consultados alguns guias e descrições
publicados sobre essas espécies para
complementarem as informações.
Segundo Fine (2005), os principais
caracteres morfológicos que auxiliam
na identificação de espécies em
Burseraceae são: 1) cor da resina; 2)
odor; 3) margem da folha; 4) tamanho
e número de folíolos; e 5) textura da
folha. Daly (1987), porém, sugere outra
lista dos caracteres mais completa
que compreende melhor a variação
entre as espécies analisadas. A partir
do momento em que os estados dos
caracteres foram definidos, foi criada
a base de dados no programa DELTA,
sigla inglesa de Linguagem Descritiva
para Taxonomia (Dallwitz et al., 1999),
173
Fernandez & Scudeller
programa que automatizou o processo
de descrição e elaboração da chave
para identificação de espécies.
As exsicatas foram registradas
com uma máquina fotográfica
digital Fuji 9100. Detalhes da folha,
como peciólulo e gema apical foram
registrados com uma lupa Leika 4D
acoplada à computador via USB. Escalas
foram geradas pelo programa de captura
de acordo com uma medida padrão
calibrada em pixel, unidade de projeção
na tela do computador, e convertida
em milímetros no próprio programa
de captura de imagens. A montagem
das pranchas, utilizando as fotografias
digitais, foi realizada em programa de
gráficos vetoriais, CorelDraw© X3. As
legendas e demais marcações foram
incluídas nas pranchas através de
ferramentas de texto.
Coleta e análise do material botânico
Foi coletado material vegetativo
de todos os indivíduos selecionados e
herborizados segundo técnicas usuais.
Optou-se por aguardar o período fértil
do material para realizar a coleta de
ramos, pois é necessario a ascensão à
copa da árvore, sendo grande parte das
plantas maior que 15 m de altura, e,
também, pelo grau de dificuldade e risco
de coleta em altura. Essas coletas foram
realizadas no período de setembro a
novembro de 2007.
Para a identificação das
espécies foi utilizada a literatura
disponível (Daly, 1987; Ribeiro et al.,
1999; Fine, 2005) e realizada consulta
174
ao especialista na família, Dr. Douglas
Daly, do Jardim Botânico de Nova
Iorque (NYBG).
Para as descrições os
espécimes foram detalhadamente
analisados e mensurados, sendo
observada sob estereomicroscópio
a presença de indumentos, tipos e
padrões de nervação, ocorrência de
glândulas, formas e dimensões das
folhas. Nas descrições utilizou-se uma
sequência de caracteres definidos
previamente no DELTA. A abreviação
dos nomes dos autores de cada espécie
seguiu as especificações de Brummitt
e Powell (1992).
A nomenclatura adotada
para indicar as formas e os tipos de
indumento das estruturas vegetais
analisadas foi baseada em Radford et
al. (1974), sendo a organização da folha
e a ordem de venação estabelecidas de
acordo com Hickey (1973). Os termos
foram abordados de acordo com Font
Quer (1979). Agrafiados nomes das
espécies foram confirmados na página
eletrônica do Índice Internacional
dos Nomes de Plantas (IPNI, http://
www.ipni.org/) e, quando foi possível,
resgatada a obra príncipe.
Resultados e discussão
Como não foi possível,
ainda, a coleta de material fértil
para completa determinação dos
espécimes estudados, o auxílio do
especialista Dr. Douglas Daly foi
fundamental, sugerindo os prováveis
táxons a que pertencem os indivíduos
Identificação morfológica dos breus (Protium Burm. f. e Tetragastris) da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé, Manaus-AM
estudados.
Confrontadas
com
exsicatas depositadas no herbário
INPA, o conjunto de amostras é
composto por 11 espécies diferentes
pertencentes a dois gêneros, a saber,
Protium (nove espécies) e Tetragastris
(duas espécies), e somente Protium
divaricatum subsp. divaricatum está
representado por 2 indivíduos; das
outras espécies obteve-se apenas
um indivíduo. A determinação das
espécies no início deste trabalho foi
baseada nos resultados de Diniz &
Scudeller (2005), e foi comparada
com a determinação atual na tabela 1.
Um dos fatores que contribuiu para a
incongruência entre as determinações
foi, principalmente, a complexidade
observada na família e a ausência
de especialistas na identificação de
Burseraceae no período de realização
do trabalho.
Um aspecto que pode
chamar a atenção imediatamente
na tabela 1 é que os indivíduos de
número 29 e 215 pertencem ao
gênero Tetragastris, e determinálos como pertencentes a Protium
não é um erro difícil de acontecer.
Segundo Daly (1987), os caracteres
taxonômicos que separariam os
gêneros Protium e Tetragastris são, às
vezes, mais sutis do que os caracteres
que separam muitas espécies de
Protium. Em razão dessa proximidade
taxonômica, optou-se por manter os
dois indivíduos na análise e verificar
as diferenças encontradas. Dessa
maneira, os caracteres que poderiam
apresentar maior variação entre
indivíduos, como tamanho das folhas
ou folíolos e presença de galhas,
tiveram seu valor de confiabilidade
reduzido,
enquanto
caracteres
mais estáveis, como a distribuição
de tricomas nos ramos, tiveram o
valor de confiabilidade aumentado
no momento da elaboração da
chave. No programa DELTA, os
valores de confiabilidade (Character
Reliabilities), podem ser definidos
arbitrariamente com valor entre
zero e dez, sendo dez o valor mais
confiável. Dessa forma, caracteres
como a borda do ápice do folíolo
(Fig. 1) ou a pilosidade dos peciólulos
(Figs. 2 A e B), por serem mais
consistentes, receberam um valor de
confiabilidade 6; caracteres como a
coloração e cristalização da resina
(Figs. 2 C e D), por serem dependente
de processos de exsudação e sujeitos
à variação sazonal e/ou temporal
(Langenheim,
2003;
Susunaga,
1996) ou, também, o formato do
folíolo apical, receberam valor de
confiabilidade igual à 4; caracteres
mais sutis, como ritidoma na casca
do tronco ou a proporção entre ápice
e o comprimento total do folíolo
receberam valor de confiabilidade
igual à 1 devido à grande variação
encontrada entre as amostras
coletadas de um mesmo indivíduo.
175
Fernandez & Scudeller
Tabela 1: Atualização da lista das espécies de Prótium coletadas na parcela permanente de 0,5
hectar em floresta ombrófila densa na trilha da cachoeira na comunidade São João, RDS Tupé,
Manaus – AM, no período de setembro a novembro de 2007
No. Indiv.
Determinação por Diniz e
Scudeller (2005)
Determinação por Fernandez (2007)
5
Protium apiculatum
Protium opacum Swart
17
Protium apiculatum
Protium cf. crassipetalum Cuatrec.
22
Protium sp.8
Protium cf. calendulinum Daly
24
Protium sp.2
Protium divaricatum Engl. subsp. divaricatum
29
Protium sp.1
Tetragastris cf. panamensis (Engl.) Kuntze
31
Protium sp.2
Protium divaricatum Engl. subsp. divaricatum
102
Protium apiculatum
Protium cf. grandifolium Engl.
113
Protium sp.7
Protium cf. spruceanum (Benth.) Engl.
162
Protium sp.4
Protium cf. guianense (Aubl.) Marchand
163
Protium sp.2
Protium paniculatum Engl. var. riedelianum (Engl.) Daly
172
Protium sp.4
Protium cf. pilosissimum
215
Protium sp.5
Tetragastris cf. altissima (Aubl.) Swart
A chave de identificação
gerada pelo programa DELTA teve
como ponto de partida os caracteres
com maiores valores de confiabilidade.
Neste ponto deve ser destacada a
facilidade em criar novos atributos
ou caracteres, excluí-los, ou edita-los
da maneira que for mais conveniente
(Dallwitz et al., 2006), fazendo com que
a inclusão de sugestões e correções na
chave se desse de maneira simples.
O caráter que mais se destacou
visualmente foi o formato do ápice do
folíolo. A variação desse caráter é muito
clara e três estados diferentes puderam
ser diferenciados: um com a borda
inteira, outro com apículo formado por
176
um dobramento na porção distal do
acúmen, semelhante ao descrito para
P. apiculatum conforme Ribeiro et al.
(1999), e borda do ápice levemente
serrada (Fig. 1). Uma das espécies com a
borda do ápice serrada é P. spruceanum,
e as outras são P. pilosissimum e P.
guianense. Entre elas há uma diferença
muito sutil no tamanho dos dentes
da borda. As bordas serradas de P.
pilosissimum e P. guianense são mais
conspícuas que as de P. spruceanum,
e estas podem passar despercebidas
caso não sejam visualizadas com muita
atenção ou o auxílio de uma lupa.
A composição da folha foi
dividida em quatro estados, baseado no
Identificação morfológica dos breus (Protium Burm. f. e Tetragastris) da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé, Manaus-AM
Chave analítica para determinação das espécies de Protium e Tetragastris
ocorrentes nas RDS Tupé a partir de caracteres vegetativos.
1.
2(1).
3(2).
4(3).
5(1).
6(1).
7(6).
Ápice do folíolo com borda inteira....................................................................................2
Ápice do folíolo com borda levemente serrada....................................................................5
Ápice do folíolo com borda inteira e apículo.......................................................................6
Folhas compostas ternadas, ou unifolioladas......Protium divaricatum Engl. subsp. divaricatum
Folhas compostas com 2-3 pares de folíolos.............................................................................................
........................................................................Protium paniculatum Engl. var. riedelianum (Engl.) Daly
Folhas compostas com 4-5 pares de folíolos..............................................................3
Peciólulo com pilosidade esparsa; ramos robustos; com o ápice acuminado abruptamente;
presença de sapopemas tabulares......................................................................................4
Peciólulo com pilosidade densa; ramos finos; com o ápice acuminado suavemente .....................
........................................................................................................................Protium cf. grandifolium Engl.
Cristalização pulverulenta (vira pó); gema apical coberta por tricomas curtos; de textura
coriácea; base do folíolo apical simétrica.............................................................Protium opacum Swart
Cristalização em glóbulos (gotas); gema apical coberta por tricomas compridos; de textura
cartácea; base do folíolo apical subsimétrica.....................Protium cf. crassipetalum Cuatrec.
Base do folíolo apical assimétrica, ápice com borda levemente serrada e acuminado suavemente
........................................................................................................................Protium cf. pilosissimum Engl.
Base do folíolo apical subsimétrica, ápice com borda levemente serrada e acuminado
abruptamente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Protium cf. guianense (Aubl.) Marchand
Base do folíolo apical simétrica, ápice de borda mais serrada e acuminada
abruptamente..........................................................Protium cf. spruceanum (Benth.) Engl.
Folhas compostas com 2-3 pares de folíolos; com pilosidade mais densa apenas
na gema apical, e mais esparsa nos pecíolos; peciólulo glabro; pulvínulo apical
conspícuo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
Folhas compostas com 6 ou mais pares de folíolos; gema apical com pilosidade densa; peciólulo
com pilosidade densa; pulvínulo apical inconspícuo................Protium cf. calendulinum Daly
Ramos finos; venação eucamptódroma; cristalização da resina de forma pulverulenta (vira
pó); com o ápice acuminado suavemente..................Tetragastris cf. panamensis (Engl.) Kuntze
Ramos robustos; venação broquidódroma; cristalização da resina em glóbulos (gotas); com
o ápice acuminado abruptamente...............................Tetragastris cf. altissima (Aubl.) Swart
número de pares de folíolos presentes,
muito embora Daly (1987) tenha
criticado a fragilidade desse caráter.
Suas críticas, porém, fundamentamse no fato de utilizar como base
amostras de ramos férteis em herbário
e o número de folíolos variarem entre
essas amostras; no caso deste estudo,
foram utilizadas apenas ramos estéreis,
que apresentam menos variações
177
Fernandez & Scudeller
Figura 1: Diferentes tipos de ápice dos folíolos. A: Protium divaricatum Engl. subsp. divaricatum.
Apresenta o ápice com borda inteira; B: Protium cf. pilosissimum Engl. Com borda levemente
serrada. C: Protium cf. spruceanum (Benth.) Engl. Também com bordas levemente serradas, porém
menos conspíqua que em Protium cf. pilosissimum. D: Tetragastris cf. panamensis (Engl.) Kuntze.
Com ápice de borda inteira e apículo, dobramento da borda sobre a terminação da nervura central.
178
Identificação morfológica dos breus (Protium Burm. f. e Tetragastris) da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé, Manaus-AM
Figura 2: A: Protium paniculatum Engl. var. riedelianum (Engl.) Daly. Apresenta pilosidade esparsa
nos peiólulos, e os pelos são muito curtos, características indicadas pela seta; B: Protium divaricatum
Engl. subsp. divaricatum. Não apresenta pilosidade nos ramos e peciólulos. C: Protium cf. guianense
(Aubl.) Marchand. É um tipo de breu que tem a cristalização puvurulenta, quer dizer, em forma de
pó. D: Protium cf. calendulinum. Espécie de breu com cristalização de resina em forma de gotas.
179
Fernandez & Scudeller
que os ramos férteis. Neste estudo
utilizaram-se como categorias: (a) as
folhas ternadas a unifolioladas, (b) com
dois a três pares de folíolos, (c) quatro a
cinco pares, e (d) seis ou mais pares de
folíolos. Na chave, porém, o caráter seis
ou mais pares de folíolos foi excluído do
passo 2(1), e é usado posteriormente,
no passo 6(1) para diferenciar P.
calendulinum das espécies de
Tetragastris que apresentaram apenas
dois a três pares de folíolos.
A pilosidade do peciólulo,
assim como apresentar ramos finos
ou robustos (Figs. 2 A e B), sapopemas
tabulares e ápice acuminado de
maneira abrupta ou suave, formam
um conjunto de caracteres eficientes,
desde que todos sejam verificados
ocorrendo simultaneamente. Dessa
maneira, puderam ser diferenciadas
as espécies P. grandifolium, com
pilosidade densa, ramos finos, ápice
acuminado suavemente; P. opacum
e P. crassipetalum, cujos ramos
apresentam-se robustos, pilosidade
esparsa nos peciólulos e apresentam
sapopemas tabulares. Fine (2005) utiliza
alguns caracteres diferentes destes,
principalmente baseado nas relações
entre superfície abaxial e adaxial
em conjunto com características das
nervuras central e secundárias. O autor,
porém, não centrou os resultados em
uma chave de identificação, e sim num
guia ilustrado com grande subjetividade
em alguns caracteres, como cheiro
“doce” ou cheiro “agudo”, folíolos
“grandes e variáveis” ou “pequenos e
muitos”.
180
A conspicuidade do pulvínulo
na porção distal do peciólulo não
foi definida como um caráter com
confiabilidade alta principalmente por
causa do baixo número de folíolos
apicais entre os indivíduos coletados.
Isso se deve, em parte, pela predação
das folhas por herbívoros, anterior a
coleta, e em parte por seleção de folhas
durante o processo de coleta, tendo em
vista a dificuldade de prensar material
com folhas muito grandes. Mesmo
assim, o caráter foi analisado e foi
incluído na chave para diferenciar T.
altissima de P. calendulinum.
Langenheim (2003) descreveu
outros métodos recentes para a
taxonomia de plantas com resinas,
que levam em conta sua composição
química, porém não foi possível fazer
um tipo de análise tão aprofundada.
Por outro lado, após quatro meses da
coleta de madeira, foram tomadas fotos
das plantas utilizadas nas pranchas
para demonstrar a cor e a textura da
resina após o processo de cristalização.
Mas, por ser um caráter que, com certa
frequência, não está presente na planta
ou pode variar de acordo com a idade da
planta ou estação do ano, teve seu valor
de confiabilidade reduzido. Na chave é
utilizado para separar as espécies P.
opacum (Fig. 2 C), com cristalização
pulverulenta, de P. crassipetalum (Fig.
2 D), com cristalização em gotas, do
mesmo modo que ocorre entre as duas
espécies estudadas de Tetragastris.
As galhas poderiam ter sido
incluídas na chave, porém durante
a realização do estudo, não foram
Identificação morfológica dos breus (Protium Burm. f. e Tetragastris) da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé, Manaus-AM
coletadas folhas da maneira apropriada
para sua inclusão neste estudo.
Segundo Ribeiro et al. (1999), o caráter
pode representar uma interação
espécie-específica em Burseraceae,
e a morfologia de cada galha poderia
fornecer um carater forte para
determinação taxonômica. Outro caso
de caracteres não incluídos é o formato
do folíolo, em que deveria ser adotado
um folíolo padrão para as comparações,
e este seria o folíolo apical, que em
grande parte das amostragens se
apresentou predado por herbívoros,
deformado ou foi perdido antes ou
durante a coleta. Restando poucos
folíolos apicais para serem analisados
entre as espécies.
Conclusões
Este estudo permitiu a
elucidação da identidade de algumas
das espécies estudadas, que podem ser
encontradas no entorno da comunidade
São João, na RDS Tupé. Apesar disso
,ainda há a necessidade de confirmação
das determinações através da coleta
de material fértil. Os caracteres mais
importantes para a determinação
das espécies são: o ápice do folíolo,
pilosidade do peciólulo e a textura das
folhas. Os resultados obtidos com auxílio
do programa DELTA foram satisfatórios
e a chave gerada parece funcionar bem
e pode ser utilizada para determinação
das RDS do Tupé. Seu uso generalizado
pode ser feito desde que observada suas
limitações, pois o número de espécies
analisadas, 11 distribuídas em dois
gêneros até o presente momento, ainda
é pequeno frente ao número de espécies
encontradas na Amazônia Central.
Agradecimentos
O primeiro autor dedica este
artigo à memória de Carlos Ernesto
Fernandez, que além de excelente amigo
e conselheiro, foi antes de tudo, um pai
maravilhoso. Descanse em paz. Os autores
agradecem sinceramente às entidades
responsáveis pelo financiamento dos
custos operacionais e materiais para
execução do estudo cedidos pelo projeto
BioTupé com recursos do CNPq, e ao
mesmo pela bolsa de estudos concedida
durante parte do curso de mestrado
do primeiro autor. Juntamente a essas
entidades, agradecem ao INPA pela
oportunidade de realização do curso,
participação em atividades produzidas
por doutores e colegas e o atendimento
de seus servidores.
Ao Dr. Douglas Daly por suas
sugestões sobre as determinações das
exsicatas e pelas separatas de suas
publicações. Aos amigos Espiridião,
Jaumir e Mario Terra por todo o auxílio
em campo nas coletas das amostras e
análises, e a todos que colaboraram de
maneira construtiva com o estudo.
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