o fenômeno da representação na relação professor/aluno

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O FENÔMENO DA REPRESENTAÇÃO NA RELAÇÃO
PROFESSOR/ALUNO DO ENSINO MÉDIO: UMA PERSPECTIVA SÓCIOHISTÓRICA CONSTRUTIVISTA
Marlene Aparecida Barchi Dib *
RESUMO
Neste artigo pretendemos discutir o fenômeno das representações na relação
professor/aluno na escola média. Objetivamos também, propor uma reflexão sobre
questões subjetivas que envolvem essas relações propondo alguns caminhos para o
processo ensino/aprendizagem tornar-se melhor, mais prazeroso e com melhores
resultados para a educação integral dos educandos.
PALAVRAS-CHAVE
professor, representação, protagonismo, relações, escola média.
ABSTRACT
In this article we intend to discuss the phenomenon of representations in the teacher/
students relationship at the High School. We also aim to propose a reflection about
subjective questions that involves these relationship, offering some ways to improve the
learning/teaching process more pleasant and so, with best results for the formal
education of the students.
KEYWORDS
teacher, representation, protagonism, relationship, High School.
*Mestre em Fundamentos da Educação pela UEM de Maringá. Assistente Técnico Pedagógica da
Diretoria de Ensino - Região de Assis.
TRANSVERSAL - Revista Anual do IEDA, v.4, n.4, 2006.
Intenciona-se, com este artigo, proporcionar ao leitor uma breve reflexão sobre
as representações existentes entre a relação professor/aluno e seus reflexos no ensino
aprendizagem entre esses atores.
Antes, porém, para nosso melhor entendimento, discutiremos o significado das
representações, trazendo à baila algumas concepções sobre as mesmas, sob a ótica de
diversos autores.
Refletir sobre as representações implica em conduzir o indivíduo ao campo da
subjetividade, pois estas são signos que podem retratar a realidade ou atribuir
significados irreais, uma vez que se põem em cheque o repertório, o imaginário e as
emoções do sujeito.
Neste sentido, as representações nem sempre refletem a realidade, ela é
realidade percebida de outro ponto de vista, pois todos vemos o mundo, os fatos e as
situações que vivem a partir de uma certa ótica, que pressupõe a construção de tais
representações. Essas representações se relacionam a formas de compreender que tanto
foram sendo construídas pela humanidade ao longo de sua história, quanto são
decorrentes da própria história pessoal de cada um; tanto podem ser sustentadas por
teorias de referência, quanto podem ser mais intuitivas e até se relacionar a crenças e
religiões.
Houve um tempo, por exemplo, em que a humanidade acreditava que os
fenômenos da natureza manifestavam a ira dos deuses; para acalmá-los, eram feitas
oferendas, sacrifícios humanos e de outros animais. Ainda hoje, os seguidores de
determinadas religiões atribuem causas sobrenaturais às doenças e crêem que só podem
curá-las mediante recursos também sobrenaturais, e não pela intervenção da ciência
médica. Também houve um tempo em que se acreditava que a Terra era plana, ou que
era o centro do Universo e o Sol girava em torno dela; que o átomo era a menor
partícula da matéria; que toda mulher sangraria na primeira relação sexual; que durante
a amamentação não seria possível engravidar... Com maior ou menor apoio teórico,
essas e outras crenças levam à construção de representações que orientaram (e orientam)
as maneiras pelas quais os seres humanos compreendem o mundo, os fatos, as pessoas e
as relações construídas pelas pessoas entre si, com o mundo e com o próprio
conhecimento. Por exemplo, uma mulher pode ter sido criada em um grupo social no
qual circula a idéia de que ela deve obediência ao homem. Essa crença - que é, ela
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própria, uma construção social - leva à elaboração de uma representação a respeito de
como essa mulher deve proceder com seu marido no casamento, qual devem ser suas
aspirações e como deve orientar a educação dos filhos. Essas representações - muitas
vezes decorrentes das teorias - têm orientado as ações humanas, explicando-as e
justificando-as. Assim, construídas no processo de compreensão do mundo, elas têm
conseqüências diretas na ação do ser humano, determinando-a de maneira mais ou
menos consciente. Até o começo do século 20, entre outras restrições, a mulher não
tinha direito ao voto; as representações construídas a seu respeito correspondiam à idéia
de ‖sexo frágil‖, colocando-a como dona de casa, esposa e mãe dedicada, a figura ―por
trás do grande homem‖ em quem ‖não se bate nem com uma flor‖. Na década de 1960,
nas sociedades ocidentais, a denominada revolução sexual trouxe profundas alterações
nas representações a respeito do sexo e do casamento, redefinindo papéis e lugares
sociais de homens e mulheres. E quando é que as representações que construímos
sofrem
alterações?
Quando
se
mostram
insuficientes
ou
inadequadas
para
compreendermos o real. Quando as evidências desse real contrariam as representações
construídas para apreendê-lo ou não se ―encaixam‖ nelas (Programa de Formação
Continuada para Professores do Ensino Médio. SEE/2004. Material do Professor
Coordenador Pedagógico, p. 49-50).
Assim, podemos nos referir às representações como sendo idéias, conceitos,
concepções, valores, princípios e imagens com os quais pensamos sobre a realidade,
sobre nossas condições de existência. As nossas práticas, as nossas atitudes cotidianas
são orientadas pelas representações que formamos em nossas mentes sobre quem
somos, o que devemos fazer e como devemos interagir com as outras pessoas.
As representações estão, neste sentido, entre os elementos que formam a
identidade de cada um, mas não são pensamentos inatos que definiriam a essência de
cada ser humano, ou seja, elas são construídas relacionalmente nas trocas
intersubjetivas. Não é possível viver sem representar, isto é, sem construir um conjunto
de idéias em nossas mentes a respeito de tudo que se apresenta para nós.
Os grupos sociais de todos os tipos, de amigos, associações profissionais, classes
sociais, raças, etnias, gêneros etc., desenvolvem representações específicas que dão
sentido e explicam a sua posição e dos demais na sociedade. Como nos ensina Pierre
Bourdieu (1988, p.156), ―as representações dos agentes variam de acordo com sua
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posição (e com os interesses associados a ela)‖.
Assim, as representações podem surgir do contexto contemporâneo, das relações
sociais, manifestações culturais e nas relações econômicas em vigência. Não pode ser
pensada como um fenômeno individual, mas sim, como uma construção social que dá
conta do posicionamento do sujeito em relação a determinado tipo de objeto. Indicam,
ainda, uma provável orientação para a ação, haja vista que há uma grande variedade de
estudos acadêmicos pautados pela noção de representações nas áreas de psicologia,
sociologia e história.
As ciências sociais têm se debatido longamente a respeito de algumas
contradições entre formas de se estudar o mundo social: as práticas e as representações;
o material e o mental; o social e o simbólico; e ainda: o individual e o coletivo, o
interacionismo e o estruturalismo, os desvios e rebeldias com relação às normas sociais
e a reprodução dessas mesmas normas. Os trabalhos de Pierre Bourdieu, no campo da
sociologia, e de Roger Chartier, no campo da história, tem demonstrado que é possível
um entendimento de cultura que contemple as práticas e as representações. Chartier
entende por cultura, por um lado, as obras e gestos que configuram e justifica uma
apreensão estética, um princípio de classificação e de demarcação intelectual do mundo;
por outro, enquanto práticas comuns, ―sem qualidades‖, que exprimem a maneira pela
qual uma comunidade produz sentido, vive e pensa sua relação com o mundo
(CHARTIER, 1999, p. 8-9; 2002, p. 93). Contempla, desse modo, as representações e as
práticas coletivas.
O conceito de representações proposto por Chartier é delineado com o acúmulo
de contribuições de vários autores, dentre eles cabe destacar Bourdieu. As
representações são entendidas como classificações e divisões que organizam a
apreensão do mundo social, como categorias de percepção do real. As representações
são variáveis segundo as disposições dos grupos ou classes sociais. Aspiram à
universalidade, mas são sempre determinadas pelos interesses dos grupos que as forjam.
O poder e a dominação estão sempre presentes. As representações não são discursos
neutros: produzem estratégias e práticas tendentes a impor uma autoridade, uma
deferência e mesmo legitimar escolhas. Ora, é certo que elas colocam-se no campo da
concorrência e da luta. Nas lutas de representações tenta-se impor a outro ou ao mesmo
grupo sua concepção de mundo social: conflitos que são tão importantes quanto as lutas
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econômicas; são tão decisivos quanto menos imediatamente materiais (CHARTIER,
1990, p. 17).
Para José Henrique Carvalho Organista, doutor em Ciências Sociais (UERJ), do
ponto de vista sociológico, Durkheim é o primeiro autor a trabalhar com a categoria de
Representações Sociais. Na concepção durkheimiana é a sociedade que pensa. Desta
forma, para ele, nem sempre as representações são conscientes do ponto de vista
individual. O indivíduo do ponto de vista da teoria durkheimiana é visto como
―impotente‖ diante do poder absoluto e sistêmico da sociedade (1978, p. 79). Esta
premissa é criticada tanto pela Sociologia compreensiva, quanto pelo Materialismo
histórico dialético.
Weber, por exemplo, na concepção de Organista, entende a vida social como a
conduta individual. Em seu trabalho intitulado ―A Ética Protestante e Espírito do
Capitalismo‖, o autor ressalta que as representações sociais são juízos de valor que os
indivíduos possuem e pelos quais eles se orientam. Não é Weber, portanto, tão cético
em relação à autonomia do indivíduo quanto Durkheim, pois, para o primeiro o
indivíduo é a ―constelação singular‖ que informa sobre a ação social de seu grupo.
Assim, Weber chama atenção para a importância de se compreender as Representações
Sociais e, também, de sua eficácia para entender o desenvolvimento histórico.
Ainda para o mesmo estudioso, Marx parece concordar com Durkheim quanto
ao poder coercitivo que as crenças e os valores têm sobre os indivíduos. Todavia, diz
Organista, o primeiro raramente utiliza-se da categoria sociedade, preferindo a categoria
formação social, por entendê-la mais dinâmica e por expressar um processo, um espaço
contínuo de formação e transformação. Desta forma, não reduz o indivíduo à sociedade,
abrindo a possibilidade para existência dos antagonismos e das lutas de classe, afinal,
―as circunstâncias fazem os homens, mas os homens fazem as circunstâncias‖
(1984:73). Mesmo reconhecendo que ―as idéias dominantes são, em cada época, as
idéias das classes dominantes‖ (1984, p. 47), a concepção dialética marxiana não
subsume o indivíduo a sociedade, mas, também, não entende o primeiro como uma
entidade autônoma e a parte do conjunto da formação social. Enfim, o Indivíduo não é
para Marx uma fonte absoluta de significação capaz de criar e dar sentido a partir de si
mesmo.
Nesse sentido, um pressuposto que se impõe diz respeito à consideração de que
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as
representações
são
socialmente produzidas,
operando
sobre determinada
configuração histórica e temporal, pois estas circulam pelo mundo e pelas mentes.
Percebemos que são várias as acepções desse termo, e nem sempre a leitura feita
pelos estudiosos entra no campo do senso comum. Podemos considerar, em linhas bem
gerais, que o termo ―representação‖ varia da concepção mais voltada para o indivíduo e
sua capacidade de representar, substituir algo ausente ou atuar até o significado
sociológico.
Assim, partindo do pressuposto de que as representações são construídas em um
espaço e em um tempo socio-histórico determinados e apesar de se pautarem muitas
vezes por imagens e idéias cristalizadas, elas são dinâmicas, passíveis, portanto de
serem continuamente reconstruídas por pessoas e grupos.
Fundamentando-nos no Programa de Formação Continuada para Professores do
Ensino Médio-SEE, podemos inferir que perceber e refletir sobre as representações que
temos do jovem, da escola, do papel do professor, do processo de ensino e
aprendizagem, da função do projeto político-pedagógico da escola, etc., tendo em vista
rever concepções, idéias, conceitos e preconceitos, enfim, representações, é um dos
desafios dos atores envolvidos na escola média. Tais desafios somente poderão ser
vencidos se houver escuta, conversa, troca de experiências, superação de esteriótipos e
preconceitos, em suma, o estabelecimento de diálogos efetivos.
Em um processo de formação - de alunos, professores ou formadores -, é
fundamental essa reflexão a respeito das representações que todos possuem sobre os
vários aspectos envolvidos nos problemas que serão focalizados. Conhecer essas
representações contribui para o formador compreender as reações dos aprendizes, inferir
o que sabem a respeito das questões que serão trabalhadas e, a partir disso, fazer um
levantamento de necessidades de trabalho.
Percebe-se que muitas das representações construídas pelos professores a
respeito de seus alunos são permeadas por sua própria concepção do que é ser jovem.
Tais concepções, por sua vez, se baseiam em idéias de algumas áreas do conhecimento,
sobretudo Psicologia e Sociologia, convertidas em senso comum. O professor pode
refletir sobre o que é ser jovem, ou melhor, adolescente, sob uma perspectiva
psicológica, mas sem deixar de contextualizar essa representação em uma visão mais
sociológica, pensando no jovem que vive na sociedade atual, como produtor e produto
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dela. E, mais especificamente, pensar nos jovens que são nossos alunos. Para refletir
melhor acerca do modo de a sociedade ver os jovens, apresentaremos alguns excertos
propostos por Ana M. B. Bock e Brônia Liesbesny
que apresentam diferentes
concepções a respeito da adolescência.
Davi Levinsky (1995) conceitua adolescência como sendo uma fase do
desenvolvimento evolutivo em que a criança gradualmente passa para a vida
adulta de acordo com as condições ambientais e de história pessoal. Levinsky
vê a adolescência como de natureza psicossocial, no entanto, vincula seu
surgimento e desenvolvimento à puberdade e ao desenvolvimento cognitivo‖
(p. 208).
Outeiral (1994) conceitua adolescência tomando como eixo a definição de
identidade. O início está pontuado na puberdade. O jovem vive a
adolescência inicialmente com passividade diante das mudanças corporais;
depois há um choque de gerações na busca da independência e, por fim, a
busca da identidade profissional e inserção no mercado do trabalho na busca
do reconhecimento e da independência financeira. (p.209).
As pesquisadoras Ana Mercês Bahia Bock e Brônia Liesbesny analisaram livros
que foram escritos para pais e professores sobre o adolescente. Os resultados do estudo
apontam que a adolescência está pensada como algo natural, em que:
[...] como fase do desenvolvimento, as características são universais e
inevitáveis. Tomadas como fruto do desenvolvimento, são também
naturalizadas. É da natureza do homem e de seu desenvolvimento passar por
uma fase como a adolescência. As características dessa fase, tanto biológicas
quanto psicológicas, são naturais. Rebeldia, desenvolvimento do corpo,
instabilidade emocional, tendência à bagunça, hormônios, tendência à
oposição, crescimento, desenvolvimento do raciocínio lógico, busca da
identidade, busca da independência, enfim, todas as características são
equiparadas e tratadas da mesma forma, porque são da natureza humana
(BOCK, 2002, p. 61).
Esse estudo analisa as decorrências dessas concepções, mostrando que a relação
adulto/jovem será pensada como conflituosa e ao adulto se pedirá tolerância, pois a
adolescência ‘passa‘. (p.205). O mesmo estudo revela que as concepções de
adolescência dominantes nos livros ―são naturalizantes negativas‖.
A adolescência foi apresentada, em quatro livros estudados, por meio de
elementos, em geral, negativos. Negativos porque são características desvalorizadas na
sociedade, negativos porque aparecem como incompletude, imaturidade, algo que ainda
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não acabou de acontecer e de se desenvolver. As características positivas que aparecem
na descrição da adolescência são tomadas como algo ‘da fase‘, fruto da imaturidade. É
definida em oposição ao adulto, o qual aparece como a meta desse desenvolvimento,
como o estágio a ser atingido, como a etapa que apresenta as características que a
adolescência ainda não possui(Bock, 2002, p. 205).
Os excertos a seguir nos apresentam concepções distintas das anteriores. Vejam:
Para a Psicologia Sócio-Histórica, a adolescência não é vista como uma fase
natural do desenvolvimento. A adolescência não existiu sempre, pois se
constitui na História a partir de necessidades sociais, e todas as suas
características foram desenvolvidas a partir das relações sociais com o mundo
adulto e com as condições históricas em que se deu seu movimento. Assim,
a adolescência é uma fase de desenvolvimento da sociedade moderna
ocidental. Não é universal e não é natural. É histórica. (p. 211).
Adélia Clímaco (1991) trouxe em seus estudos vários fatores sociais, culturais e
econômicos que nos possibilitam compreender o surgimento, em nossa sociedade
ocidental, da adolescência. As revoluções industriais são o marco das transformações.
Trouxeram mudanças profundas nas formas de vida e de trabalho; este se sofisticou com
a tecnologia e passou a exigir um tempo prolongado de formação nas escolas de jovens
que se mantinham afastados do mercado. Além disso, o desemprego estrutural da
sociedade capitalista exigia cada vez mais novas condições para o ingresso no mercado
do trabalho; a mão-de-obra jovem deveria permanecer mais tempo na escola se
capacitando. Por outro lado, o avanço dos conhecimentos científicos deu mais tempo de
vida aos homens que, por isso, precisavam se manter mais tempo trabalhando, ou seja,
produzindo sobrevivência. Manter a mão-de-obra jovem na escola foi a solução. A
extensão do período escolar e o conseqüente distanciamento dos pais e da família
trazem a aproximação de um grupo de iguais (física e socialmente nas mesmas
condições) que, por identificação, se instituiu como um novo grupo social. As marcas
do corpo que se desenvolve física e biologicamente são tomadas como sinais, não como
geradoras da adolescência (p. 211).
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Cabe [...] refletirmos sobre a situação desses jovens: têm condições plenas de
inserção no mundo do trabalho, pois estão com seu corpo, sua cognição e
seus afetos desenvolvidos, aproximando-se dos adultos. Poderiam ocupar um
lugar no mundo adulto, bastaria que um ritual os iniciasse. Mas não: estarão
fora desse mundo adulto do trabalho, que possibilita independência
financeira, ainda por algum tempo ou por muito tempo. Essa contradição
entre as condições que possuem e a falta de autorização para o ingresso no
mundo social adulto será responsável pelo surgimento da maior parte das
características conhecidas hoje como dos adolescentes: rebeldia, conflito
geracional, indefinição de identidade e onipotência‖ (p. 211).
Os dois blocos de excertos apresentam distintas concepções de adolescência: em
que elas diferem, basicamente? Este é o desafio. Cabe ao educador entender as
concepções da sociedade sobre adolescência, analisá-las e questioná-las. Este é um
passo fundamental para que o professor perceba as imagens ou representações que ele
próprio tem sobre o adolescente.
Elas sem dúvida determinam seu modo de se relacionar com os alunos, dar
aulas, avaliá-los etc., e também definem o que a escola considera essencial para o
currículo e o projeto pedagógico.
Assim, segundo Dayrell, um dos caminhos possíveis para reduzir a distância
entre escola e vida é investir no protagonismo juvenil pensando-o sob três perspectivas
que estão intimamente relacionadas.
Em primeiro lugar, na dimensão didático-pedagógica, protagonismo significa
garantir uma certa autonomia ao estudante nos próprios processos de aprendizagem.
Trata-se de planejar o currículo, os programas e as aulas de forma a estimular e
assegurar a participação do aluno na construção de seu próprio conhecimento, na
definição de conteúdos, no desenvolvimento das aulas e nos processos de avaliação.
Em segundo lugar, na dimensão social, significa integrar os conteúdos
curriculares de forma a dar condições ao jovem de a partir desse conhecimento
integrado, interferir efetivamente na realidade, por meio de projetos interdisciplinares
que prevejam ações sociais a serem desenvolvidas com a população. O contato com a
comunidade gera sociabilidade e favorece a solidariedade. A possibilidade de usar o que
se aprende na escola, por sua vez, estimula o desejo de saber mais e, ao mesmo tempo,
favorece o desenvolvimento de competências e habilidades que sirvam aos jovens para
uma inserção no mercado de trabalho.
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Finalmente, em terceiro lugar, na dimensão cultural, significa abrir espaço no
currículo para a participação do jovem em atividades culturais, permitindo que ele
interfira também na produção cultural. Por meio da produção cultural realizada por
grande parte dos grupos [juvenis], os jovens se colocam como produtores ativos. As
músicas que criam, os shows que fazem e os eventos culturais que promovem, são
espaços de construção de auto-estima, possibilitando a formação de identidades
positivas.
Como se vê, a transformação das práticas docentes é bem ampla quando se opta
por dar ao jovem a possibilidade de atuar como protagonista. Mas a escola e seus
professores podem escolher um aspecto, um componente curricular para começar a
trabalhar em conjunto. Ora, a competência para ler e escrever textos é fundamental para
o desenvolvimento de qualquer uma das três dimensões apontadas: para ganhar
autonomia no processo de aprendizagem, para integrar conhecimentos de diferentes
áreas e desenvolver projetos de intervenção social e para participar de práticas culturais.
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