Rafael Manzo4 - Portal Mackenzie

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Figura 74 – Maquete da reforma do Portal de Branderburgo, Berlim, 1938, arqto. Albert Speer.
(SPEER, 1941)
Figura 75 – Perspectiva dos edifícios do Alto Comando do Exército e do Pavilhão do Soldado, a
direita, arqto. Wilhelm Kreis, 1938, eixo monumental de Berlim. (SPEER, 1941)
196
]
Figura 76 – Vista da Avenida Unter den Linden,com adaptações para o eixo monumental, Berlim,
1938, arqto. Albert Speer. (SPEER, 1941)
197
Figura 77 – Estádio Olímpico de Berlim, 1936, arqto. Werner March. (SPEER, 1941)
Figura 78 – Maquete do Aeroporto de Berlim, 1936, arqto. Ernest Sagebiel. (SPEER, 1941)
198
Figuras 79 e 80 – Praça Adolf Hitler em Weimar e Dresden, 1938, arqtos. Herman Giesler e Wilhelm
Kreis, respectivamente. (SPEER, 1941)
199
CAPÍTULO 4: ARQUITETURA E PODER NO PERÍODO GETULISTA (1930/1945)
No Rio de Janeiro, depois de construído o marco principal do movimento
moderno, o edifício do Ministério da Educação e Saúde (1936-43), fez-se o do
Ministério da Fazenda (1939-43), com o pórtico de estilo neogrego. [...] Eram
dois mundos que se digladiavam com a agravante de que os edifícios
estavam dispostos juntos um do outro e eram de igual importância, ambos de
grande monumentalidade (SANTOS apud CAVALCANTI, 2006, p.7)
4.1. O Contexto histórico.
O advento da República no Brasil não ocasionou mudanças na estética
arquitetônica. O estilo que continuou a predominar nas cidades foi o Ecletismo.
O Ecletismo foi um estilo arquitetônico que surgiu na Europa a partir do primeiro
quartel do século XIX, aproximadamente, e foi utilizado até por volta da década de
1890. No Brasil, este tipo de arquitetura foi usado até aproximadamente a década de
194059.
O Ecletismo era a mistura de estilos arquitetônicos do passado na mesma
edificação, dividindo-se em ecletismo com predominância de um estilo sobre o outro
e sem predominância. Quando da predominância, a classificação estilística da
edificação priorizava o estilo mais evidente na composição desta e quando não
havia predominância a classificação restringia-se apenas ao termo Eclético
(PATETTA apud FABRIS, 1987, pp.10-23).
59
Apesar de ter sido explicitamente ignorado pela historiografia artística brasileira até por volta do início da
década de 1980, o Ecletismo foi junto com o Neoclássico, o tema do II Congresso Nacional de História da Arte,
em 1984, no Rio de Janeiro.
200
Não era objetivo dos arquitetos, quando da composição estética da edificação, uma
elaboração que, de tão complexa em seus elementos, prejudicasse a identificação.
Ao contrário, pois se houvesse a opção pela predominância, nada mais lógico que
esta fosse facilmente identificável.
Além desta almejada facilidade na identificação do estilo, havia recomendações no
tocante ao predomínio, que acabaram de certa forma padronizando esta utilização,
tanto na Europa como no Brasil, por exemplo:
- Para catedrais e igrejas matrizes, padronizou-se o Neo-gótico como o estilo que
deveria ser evidenciado, pois as maiores edificações já construídas pela cristandade
foram as catedrais medievais, cujo estilo foi o Gótico.
- Para pequenas igrejas, de âmbito paroquial, o estilo a ser evidenciado deveria ser
o estilo Neo-românico, pois este remontava aos primórdios da Igreja Católica,
também na Idade Média.
- Em hospitais ligados a instituições religiosas a recomendação era novamente o
predomínio do estilo Neogótico, pois elementos góticos remetiam com mais
facilidade à identificação das instituições responsáveis por eles.
- Em hospitais mantidos por instituições burguesas, o estilo recomendado para a
priorização estilística era o Neo-renascimento, devido o estilo Renascentista ter sido
apoiado e representado a burguesia na sua origem (PATETTA apud FABRIS, 1987,
pp.10-23).
201
Cabe salientar que o Ecletismo valeu-se dos estilos de um momento anterior60, início
do século XIX, cuja característica foi a revivescência de praticamente todos os
estilos arquitetônicos da história, acrescidos do prefixo neo para informar o caráter
de temporalidade da edificação. Em suma, segundo o arquiteto e historiador italiano
Luciano Patetta:
A cultura arquitetônica deleitou-se, por mais de cem anos, com o fato de ter
acolhido os mais variados elementos lexicais, extraindo-os de todas as
épocas e regiões, recompondo-os de diferentes maneiras, de acordo com
princípios ideológicos, nos quais podem ser distinguidos, pelo menos, três
correntes principais: a da composição estilística; [...] a do historicismo
tipológico; [...] e a dos pastiches compositivos [...] (apud FABRIS, 1987,
p.14-5).
A inauguração deste momento em que a história foi a principal lente da humanidade;
a citar a própria criação da Arqueologia e da tipologia museu neste período, foi o
estilo Neoclássico, que trouxe para a arquitetura da segunda metade do século XIX,
a imagem de racionalidade desejada pelos ideais iluministas franceses, localizada
na antiguidade clássica greco-romana e representada na arquitetura pelo seu
símbolo maior, o templo.
É óbvio que este resgate restringiu-se ao caráter estético destas edificações, pois
nem o exíguo programa e o sistema construtivos destes eram adequados aos usos
propostos no século XIX, como edifícios administrativos, museus, escolas e
bibliotecas, por exemplo.
60
Este momento anterior é de forma geral denominado de Historicismo, devido ao resgate de todos os estilos
arquitetônicos já criados pelos arquitetos, e foi inaugurado pelo Neogótico, a partir das primeiras décadas do
século XIX, na Europa.
202
Se houve um predomínio da utilização do estilo Neoclássico por parte do Estado 61, o
Ecletismo foi o espelho na arquitetura da vontade de diversificação da burguesia.
Uma burguesia que, ao mesmo tempo em que criava modismos estéticos que
selecionavam a inserção de indivíduos neste grupo social, procurava também
elementos estéticos de diferenciação dentro deste segmento.
Além desta questão da diferenciação estética como fator de hierarquização social,
houve
também
a
diversificação
tipológica
urbana.
As
transformações
socioeconômicas advindas da Revolução Industrial no início do século XIX se
refletiram principalmente no cenário urbano. Apesar de o êxodo rural ter ocasionado
sérias e irreversíveis conseqüências para o campo, estas mudanças eram na sua
origem urbanas, afinal de contas, tanto os segmentos sociais que as promoveram,
quanto às atividades produtivas deste processo foram essencialmente urbanos.
Com a Revolução industrial houve um crescimento populacional nas cidades nunca
antes conhecido pelo homem. Houve a necessidade de se oferecer novas tipologias
arquitetônicas devido a esta grande demanda populacional, como grandes hospitais,
conjuntos habitacionais, grandes silos e depósitos para armazenamento de
alimentos, grandes mercados para distribuição, galpões industriais, estações
ferroviárias e todo um parque ferroviário para manobras e manutenção das
composições, galerias comerciais e lojas de departamentos, teatros de ópera,
escolas, penitenciárias e etc., além de adequações e implantação da malha viária e
da infraestrutura hidrosanitária.
Como podemos depreender perante o exposto acima, o equacionamento das
inúmeras variantes da urbanidade do século XIX, foi o grande desafio de todos os
segmentos técnicos e políticos da sociedade de então. Aos arquitetos coube
61
A afirmação do estilo Neoclássico como o mais adequado para edificações estatais remonta à adoção deste
pelos arquitetos da República Francesa advinda da Revolução Francesa de 1789, devido, segundo estes, à
sintonia entre a imagem e ideologia, ou seja; o equilíbrio, a harmonia e a austeridade refletidas pela fachada
de um templo grego, com a racionalidade iluminista embasadora do movimento revolucionário.
203
fornecer respostas no tocante às diversidades tipológicas e estéticas, justificando
assim a criação e utilização do Ecletismo, em uma escala internacional. No Brasil a
implantação do ecletismo teve motivação e clientela semelhantes.
Tanto a arquitetura Neoclássica como a Eclética tiveram a sua introdução direta ou
indiretamente ligada à vinda da família real portuguesa para o Brasil 62. O primeiro
através da contratação direta de edificações neste estilo, pela contratação da Missão
Artística Francesa de 1816 e pelo apoio à fundação da Academia Imperial de Belas
Artes e o segundo pela abertura dos portos às “nações amigas”, subentendendo-se
aqui, Inglaterra.
A abertura dos portos propiciou o intercâmbio mais intenso com a Inglaterra, fazendo
com que, além de produtos, técnicas construtivas e estilos diferentes dos tradicionais
no Brasil fossem assimilados. Assim sendo, o Ecletismo esteve ligado desde a sua
implantação no Brasil ao desejo de diferenciação de uma burguesia emergente,
frente às inúmeras possibilidades de negócios que se descortinavam.
Tanto os edifícios utilizados pelo Estado no Primeiro Império quanto no Segundo
Império foram construídos predominantemente no estilo Neoclássico ou Eclético com
predominância neoclássica. Mas de forma geral o que observamos foi o gradual
crescimento na utilização do ecletismo em qualquer tipologia arquitetônica
denotando a importância da burguesia em todas as instâncias. Inclusive entre um
dos significativos segmentos da jovem nobreza brasileira que tinha seus títulos
nobiliários originados das benesses reais, em conseqüência de seu poder
econômico ligado à atividade comercial.
62
Segundo a historiadora de arte italiana, Giovanna Rosso Del Brenna, o primeiro episódio de arquitetura
eclética no Brasil teria sido as intervenções do inglês John Johnston na edificação do comerciante Elias Antonio
Lopes, tranformando-a na residência de Dom João VI, na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, por volta de
1816 ( FABRIS, 1989, pp. 30-1)
204
Inicialmente, as transformações urbanas pelas quais passou a cidade do Rio de
Janeiro estavam ligadas a tentativa de equiparação desta cidade colonial de imagem
barroca, com o equivalente ao que se esperava da recém capital do Império, com a
vinda da corte portuguesa.
No entanto, essas ações foram tímidas se levadas em consideração as ambições da
corte,
embora
significativas
tendo-se
em
conta
a
realidade
da
cidade.
Posteriormente, as mudanças estavam quase que exclusivamente mais ligadas a
uma noção de embelezamento da cidade dentro de padrões burgueses, de
enaltecimento destes como sinônimo de civilidade, do que como demarcação da
presença do Estado. A centralização do poder político no período do Segundo
Império não teve espelhamento nem na arquitetura e nem no cenário urbano. Os
palacetes residenciais, os teatros, as lojas, os gabinetes de leitura, os cafés, as
estações ferroviárias e os bulevares, por exemplo, eram antes o cenário de uma
burguesia, da dinâmica das cidades pós Revolução Industrial, do que da opulência
imperial.
O Ecletismo de boa qualidade, ou seja, de composições harmoniosas e edifícios
bem construídos esteve ligado diretamente à presença de ciclos econômicos
pontuais, na maioria dos casos e a questões políticas em um segundo plano. Na
região norte do país, tivemos a construção de boas edificações ecléticas devido ao
ciclo econômico da borracha no início do século XX, principalmente nas cidades de
Belém e Manaus63.
Na cidade do Recife, grande parte dos edifícios ecléticos estava ligada ao ciclo do
algodão entre as décadas de 1860 e 1870, no vácuo deixado pela ruína dos
63
Período compreendido entre 1870 e 1912, onde destacamos o Palacete Bolonha, do engenheiro Francisco
Bolonha, de 1907, em Belém.
205
produtores norte-americanos, devido à Guerra da Secessão (1860-5), ocorrida
justamente nos estados do sul dos Estados Unidos, onde estes viviam64.
A nova capital do estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, fundada em 1898, teve
seus edifícios construídos com o estilo da época, o Ecletismo65.
Capital do Império, e depois da República, a cidade do Rio de Janeiro, sofreu
inúmeras intervenções de cunho estético, visando sua adequação ao estilo
arquitetônico em voga na Europa, o Ecletismo, pois como capital deveria dar o
exemplo para outras cidades brasileiras66.
Em São Paulo, os recursos advindos da cafeicultura, transformaram radicalmente a
cidade, fazendo com que, em um curto espaço de aproximadamente quarenta anos
(1870 a 1910), a antiga cidade de feições coloniais e construída com taipa
desaparecesse, dando lugar a uma nova São Paulo, eclética e construída com
tijolos67.
No sul do país, principalmente nas cidades de Pelotas e Porto Alegre, a deflagração
da Guerra do Paraguai (1865-70), fez aumentar a produção de charque para o
abastecimento das tropas do Exército brasileiro, aquarteladas nesta região e com
destino ao Paraguai. Foi um período de grandes lucros para os estancieiros
gaúchos, fortalecendo e formando fortunas. As cidades citadas foram as maiores
64
Destacou-se na cidade do Recife a predominância do Neogótico pela significativa presença inglesa na região.
65
“A construção de Belo Horizonte significa, assim, a ruptura definitiva com a tradição colonial: a adoção dos
novos estilemas, propostos pela era industrial, inscreve-se na recusa ao passado e na aspiração à
modernidade” (SALGUEIRO apud FABRIS, 1987, p.107).
66
A abertura da Avenida Central, inaugurada em 15 de novembro de 1905, além de espelhar todas as
possibilidades do ecletismo arquitetônico, através das fachadas de suas edificações, representou a ligação mais
efetiva da cidade com uma nova área portuária.
67
Ver Benedito Lima de Toledo, São Paulo: três cidades em um século (São Paulo: Duas Cidades, 1983).
206
beneficiárias e como conseqüência passaram por uma reformulação estética de
suas edificações, com a prevalência do Ecletismo68.
A proclamação da República em 1889 e as conseqüentes mudanças político
administrativas só reforçaram a opção estética pelo Ecletismo, tanto nas edificações
oficiais como nas demais. Na verdade, os novos quadros administrativos que
chegavam ao poder pertenciam, em sua maioria, aos mesmos segmentos sociais
das elites do período imperial. Portanto, os gostos relacionados à estética
arquitetônica eram muito semelhantes, destacando assim como diferencial
republicano, as obras de infraestrutura urbana.
As obras realizadas pelo prefeito Pereira Passos na cidade do Rio de Janeiro, a
partir de 1902, foram emblemáticas dentro do espírito higienista e embelezador
predominante no urbanismo vigente na Europa da época.
Os edifícios necessários aos novos quadros administrativos da emergente República
foram resultado de adaptações em edificações existentes, inclusive que haviam
servido de residência para membros da nobreza brasileira, adquiridos para este fim.
Poucas edificações foram construídas para o uso do Estado Republicano e as que o
foram, em quase nada se diferenciavam dos modelos arquitetônicos anteriores
(ROSSO DEL BRENNA apud FABRIS, 1987, pp. 53-61).
A Primeira República foi marcada por um fortalecimento do poder político regional
em detrimento do central; conseqüentemente, as edificações construídas na capital
da República, para uso e representação do Estado possuíam a mesma escala de
outras edificações relevantes no tecido urbano, como teatros, galerias comerciais e
escolas, por exemplo.
68
As principais cidades beneficiárias deste período no Rio Grande do Sul foram Pelotas, Rio Pardo, São Pedro,
São Leopoldo e principalmente, Porto Alegre.
207
Mesmo a recomendação da predominância do estilo Neoclássico dentro do
ecletismo para as edificações governamentais deixou de ser uma exclusividade
destes, pois museus, bibliotecas e escolas passaram também a apresentar esta
característica em suas fachadas. Tanto os materiais quanto as técnicas construtivas
eram as mesmas e sua utilização estava ligada antes à disponibilidade financeira do
que a alguma prerrogativa tipológica.
A escala utilizada nos edifícios do Estado era próxima da de outros edifícios públicos
e também privados, independentemente da tipologia arquitetônica e utilizavam-se
nestes, os mesmos elementos de atribuição de monumentalidade, como escadas
monumentais, pórticos, pés direitos duplos ou triplos e materiais nobres nos
revestimentos, como mármores e granitos.
Portanto, a diferenciação era
predominantemente estilística69.
Conseqüentemente, não se pode falar em uma linguagem arquitetônica associada à
República e nem em um estilo arquitetônico identificado com este novo regime
político, que o representaria com clareza.
O Ecletismo foi um estilo arquitetônico globalizante que não contemplava
características estéticas locais, fazendo com que as grandes cidades ficassem com
feições semelhantes, situando-as dentro de um padrão cultural. Manifestações com
características muito regionais não eram vistas com bons olhos e consideradas
inapropriadas dentro de um contexto cultural adequado.
69
A citar, por exemplo; de um dos escritórios mais importantes e atuantes nas primeiras décadas do século XX,
o de Heitor de Mello, Francisque Cuchet e Arquimedes Memória; os edifícios do Jockey e do Derby Clube, do
Catete, os palácios da Assembléia Legislativa e da Câmara dos Deputados e os quartéis da polícia.
208
O caráter dialético atribuído a evolução histórica a partir do Renascimento,
fundando a ditadura do novo, onde se difundiu que o presente seria
necessariamente uma evolução e o futuro, um objetivo certamente mais qualificado,
embasou este período denominado Belle Époque, caracterizado por uma grande
euforia frente às novas possibilidades. Este entusiasmo só foi dirimido com as
atrocidades e carnificina da Primeira Guerra Mundial e a constatação de que o
mesmo gênio criador era muito mais eficiente para destruir, colocando o homem em
sua verdadeira condição.
No campo artístico, havia uma incongruência bastante evidente. Uma sociedade que
priorizava a ciência e conseqüentemente o futuro continuava a se expressar com
uma linguagem alusiva ao passado. Fazíamos o futuro em edificações do passado, a
ciência era envolta por uma roupagem estilística incompatível com sua essência.
A expressão artística vigente não se constituía no que se esperava da arte, a
manifestação sincera da essência humana de um determinado contexto, impelindo
os artistas à procura de uma nova identidade. Em um primeiro momento, para fugir
do referencial historicista do ecletismo, associado à incoerência citada, foi se buscar
na natureza elementos para o desenvolvimento de uma nova linguagem, dando
origem, nos anos 1890, à Arte Nova, com suas diversas expressões regionais, como
o Art Nouveau francês e belga, o Jugendstil alemão e a Secessão austríaca
(ARGAN, 1992, pp.199-208). No entanto, as mudanças propostas por estes,
restringiram-se apenas ao repertório estético das fachadas e decoração dos
interiores, permanecendo a postura projetual e a organização dos espaços
semelhante à do ecletismo.
Um passo já havia sido dado, no sentido da construção de uma nova linguagem
arquitetônica. Mas, somente nas duas primeiras décadas do século XX surgiram os
movimentos artísticos de vanguarda que promoveram a transformação radical
necessária á adequação da expressão com os novos tempos. O objeto arquitetônico
seria abstraído de todos os elementos que o identificariam com o universo
209
arquitetônico conhecido desde então, reduzindo a arquitetura à sua essência: formas
geométricas puras (ARGAN, 1992, pp.324-68)
Raramente na história da arquitetura houve uma busca de ruptura tão profunda entre
as linguagens anterior e subseqüente e apesar de tal estética já ter sido proposta na
segunda metade do século XVIII pelos revolucionários Boullée e Ledoux70, não
houve a efetivação da construção de nenhuma edificação e uma rejeição a de tal
estética por todos os segmentos da sociedade de maneira geral.
O primeiro estilo a expressar a modernidade foi o Art Déco. Este fugia da estética
historicista sem, no entanto abdicar totalmente da imagem vigente de o que seria
arquitetura e até incorporando, em alguns casos, certa carga ornamental.
Rompia-se, em alguns casos e pela primeira vez, com a tradicional composição
arquitetônica de corpo, base e coroamento, salientando-se a verticalidade e o
geometrismo das edificações, atribuindo uma dinâmica à composição, bastante
adequada assim aos estes novos tempos, que tinham como premissas a velocidade
e a mecanização.
O Art Déco surgiu por volta de 1925, quando da Feira de Artes Decorativas de Paris,
tendo como maior expoente o arquiteto Auguste Perret e sua exploração das
possibilidades técnicas e estéticas do concreto armado. Este estilo se estendeu por
toda a Europa, porém de forma tímida, alcançando mais aceitação nos Estados
Unidos, onde através dos arranha-céus representou a pujança desta jovem nação. A
base do estilo manteve-se, porém houve uma ramificação regional, fazendo com que
70
Os arquitetos franceses Étienne-Louis Boullée (1728-1799) e Claude-Nicolas Ledoux (1736-1806) que foram
chamados de “arquitetos da Revolução” ou “visionários” ou “puristas”, começaram fazendo o Neoclássico na
busca por uma arquitetura que expressasse os ideais racionalistas da Revolução Francesa e evoluíram para uma
abstração que reduzia a arquitetura apena à composições com formas geométricas puras, antevendo para
alguns modernistas, como Le Corbusier, o movimento moderno.
210
o Art Déco dos arranha-céus nova-iorquinos com suas características linhas
escalonadas fizessem parte do imagético americano tanto quanto os tons cítricos e
chamativos das edificações Déco de Miami, bem apropriados para uma cidade que
pela sua localização geográfica sempre representou para os norte-americanos o
lado paradisíaco e permissivo da urbanização regida pelo sol.
No Brasil, antes do Art Déco e do Modernismo emergentes na década de 1920,
desenvolveu-se uma variante tipicamente americana na disputa pela representação
da modernidade arquitetônica deste período, em oposição ao tradicionalismo
acadêmico, que foi o estilo Neocolonial. Apesar do caráter ainda historicista deste,
ele inaugurou o debate sobre modernidade e nacionalismo na arquitetura 71, com
posições defendidas com intensidade nunca antes vista no Brasil, chegando em
alguns casos à esfera pessoal.
Este estilo foi comum a todos os países americanos e sua variação residiu no
referencial utilizado, mas obviamente, sempre no período colonial destes países,
onde se formaram as primeiras matrizes arquitetônicas pela adaptação do Barroco
Ibérico, com exceção do norte-americano, baseado no Neoclássico (AMARAL, 1994,
pp.11-6).
O estilo Neocolonial no Brasil originou-se em São Paulo através das obras dos
arquitetos Ricardo Severo (1869-1940) e Victor Dubugras (1868-1933). O primeiro,
de origem portuguesa, encantou as elites paulistanas em 1914, as famílias ditas
“quatrocentonas”
, com sua conferência intitulada “A Arte tradicional no Brasil: a
72
71
O caráter nacionalista desejado para a arte brasileira se apresentou primeiramente na literatura. Segundo
Hugo Segawa, “O ufanismo de Affonso Celso inaugurava o patriotismo oficial; escritores como Euclides da
Cunha (1866-1909) e Lima Barreto (1881-1922) teciam abordagens distintas daquelas prescritas na literatura
do Velho Mundo. Não há registros escritos de debates dessa natureza no âmbito da arquitetura na primeira
década do século 20. Todavia, a questão era latente, e, ao menos isoladamente, arquitetos manifestavam-se a
respeito na esteira da discussão mais ampla” (SEGAWA, 1997, p.32).
72
O termo “quatrocentonas” é uma alusão à origem de algumas famílias paulistas; a citar, os Prado, os Souza
Queirós, os Álvares Penteado e os Pacheco Chaves, por exemplo; localizada no século XVI, à época do IV
Centenário da cidade de São Paulo, em 1954.
211
casa e o templo” onde enfatizava a necessidade de se desprender dos estilos
historicistas do Ecletismo, por estes não possuírem nenhuma ligação com a história
de nosso país. Ele apregoava que a construção de uma identidade brasileira nas
artes passava necessariamente por uma revisão da arte portuguesa aqui
implantada, gênese de nossa cultura. Tendo inicialmente se exilado em 1891, devido
a questões políticas e radicando-se em definitivo no Brasil, em 1909, associou-se ao
Escritório Técnico Ramos de Azevedo, onde obteve o respaldo prático para sua
teorização.
O segundo, de nacionalidade francesa, chegou a São Paulo em 1891, foi também
colaborador do escritório de Ramos de Azevedo, projetando edifícios no estilo Art
Nouveau e professor da Escola Politécnica. Projetou em 1919 a primeira realização
do Neocolonial no Brasil, as escadarias do Largo da Memória, na cidade de São
Paulo e em 1922 o conjunto de edificações na estrada velha para Santos em
comemoração aos cem anos da independência brasileira.
No entanto, foi na cidade do Rio de Janeiro que este estilo alcançou a dimensão de
parâmetro a ser seguido por todos os arquitetos saídos da Escola Nacional de Belas
Artes. Seu diretor, o médico e historiador de arte, José Mariano Filho (1881-1946),
mesmo não sendo arquiteto nem artista plástico, foi o maior defensor e propagador
desta estética, através de discursos e teorias de legitimação do caráter nacionalista
do Neocolonial, a citar os Dez Mandamentos do Estilo Neocolonial, de sua autoria,
onde de forma pragmática, especificava-se o que era e como deveria ser utilizado o
Neocolonial. Foi o criador da própria denominação do movimento e foi decisivo na
escolha do governo pelo estilo Neocolonial para os pavilhões brasileiros nas
Exposições Internacionais da Filadélfia (1925) e de Sevilha (1928).
O Neocolonial foi usado em qualquer tipologia arquitetônica, de pequenas
residências a grandes edifícios públicos, atingindo o seu ápice na década de 1920.
Sua maior demonstração de prestígio ocorreu em 1922, dentro das efemérides
comemorativas do centenário da independência brasileira, através de sua utilização
212
na construção de inúmeros pavilhões na Exposição Internacional comemorativa
deste fato: o das Pequenas Indústrias, de Nestor Figueiredo e C. San Juan, que
tinha como referência o Convento de São Francisco da Ordem Primeira, em
Salvador; o da Caça e Pesca, de Armando de Oliveira, com referências da
arquitetura rural nordestina e o das Grandes Indústrias, de Arquimedes Memória e
Francisque Cuchet.
Outro aspecto relevante da arquitetura Neocolonial era o enaltecimento do caráter
de verdade construtiva das edificações do período colonial brasileiro, resvalando
assim em um caráter de vernacularidade que estas possuiriam, atribuindo esta
característica às justificativas da modernidade do Neocolonial. Mas com a
banalização deste repertório, ou seja, a utilização destes elementos arquitetônicos
fora da sua contextualidade levou ao “pastiche” cenográfico
. O último exemplar
73
importante da arquitetura Neocolonial foi o edifício da Faculdade de Direito de São
Paulo, de 1939, do arquiteto Ricardo Severo e o maior conjunto urbano Neocolonial
construído foi justamente na cidade de Ouro Preto, reconstruindo o cenário “colonial”
após a década de 1920.
O Art Déco também teve muita aceitação no Brasil, fazendo-se presente nas
edificações das principais cidades brasileiras concomitantemente com o Ecletismo, o
Neocolonial e o próprio Modernismo emergente, como já citado anteriormente. A
primeira edificação moderna construída no Brasil - um edifício de apartamentos na
Avenida Angélica, nº 172, São Paulo – Capital, de 1927, do arquiteto Júlio de Abreu
Júnior, foi uma exceção no conjunto de sua obra, mais voltada a soluções
tradicionais e ao Art Déco (XAVIER, 1983, p.1).
73
Uma das principais críticas de Lúcio Costa ao Neocolonial, que ele aprendeu na Escola Nacional de Belas
Artes, no Rio de Janeiro, durante o seu curso de arquitetura, e executou depois de formado, era justamente
sobre este caráter cenográfico que o estilo possuía e que ele havia comprovado quando de sua viagem para a
cidade histórica de Diamantina, em 1922. Lá ele pôde comprovar a distância entre o discurso acadêmico da
“verdade da arquitetura colonial” e a verdade construtiva propriamente dita daquela arquitetura, segundo
conclusão dele mesmo (COSTA, 1995, p.27).
213
A partir da década de 1930, durante o novo governo instituído, o Déco foi uma das
vertentes arquitetônicas mais freqüentes no cenário das cidades brasileiras,
principalmente no Rio de Janeiro, utilizado inclusive como representante da
modernidade apregoada durante o processo revolucionário de implantação de uma
nova estrutura de Estado.
São exemplos importantes deste estilo no Rio de Janeiro, então Capital Federal: a
Estação D. Pedro II - Central do Brasil, de 1937, projeto do arquiteto Roberto Magno
de Carvalho e Escritório Robert R. Prentice (Geza Heller e Adalberto Szilard); o
Palácio Duque de Caxias - Ministério da Guerra, de 1935, projeto do arquiteto
Christiano Stockler das Neves; o edifício A Noite, de 1929, dos arquitetos Joseph
Gire e Elisiário da Cunha Bahiana; o Edifício Unidos, de 1937, do arquiteto Luiz
Fossati; o Palácio do Comércio, de 1937, dos arquitetos Henri Paul Pierre Sajous e
Auguste Rendu;
o edifício Guinle, de 1928, do escritório Gusmão, Dourado &
Baldassini Ltda; o Tribunal Regional do Trabalho – Ministério do Trabalho, Indústria
e Comércio, de 1936, do arquiteto Mario Santos Maia; além do símbolo da cidade, o
Monumento ao Cristo Redentor, 1926/1931, do arquiteto Heitor da Silva Costa.
Todavia, apesar da existência de algumas diferenciações regionais, estas não se
constituíram em uma identidade arquitetônica específica o bastante para que
pudessem construir uma linguagem local, e muito menos nacional. A arquitetura Art
Déco no Brasil até representava a modernidade vigente, porém sua capacidade de
expressar um caráter nacionalista era frágil ou inexistente, constituindo-se assim no
oposto do Neocolonial. Mas apesar da arquitetura Art Déco não ter este caráter
nacionalista desejado, ela tinha uma escala de monumentalidade e onipresença
imprescindíveis a imagem de modernidade desejada para a construção de edifícios
para o novo Estado.
Portanto, a arquitetura Neocolonial só atendia aos anseios do Estado no quesito que
justamente faltava à arquitetura Art Déco, a nacionalidade. No que concenia à
modernidade e monumentalidade, ela não atendia, tanto que não foi utilizada para a
214
construção de edifícios estatais, à exceção da Escola Normal do Distrito Federal,
conhecida como Instituto de Educação74.
No Brasil, a dinâmica da transformação da estética arquitetônica teve um
componente diferente do europeu. Enquanto na Europa o Modernismo teve como
inimigo a História, no Brasil o modernismo teve como uma das principais bases, a
construção do caráter nacional pautado na herança de um determinado segmento
da história do país.
Desde o início da construção de uma linguagem artística genuinamente brasileira no
século XX, procurou-se elaborar o imbricamento entre a contemporaneidade dos
movimentos da vanguarda artística internacional e uma originalidade advinda de
especificidades e particularidades.
O próprio Oswald de Andrade, ao tomar contato com o Futurismo italiano em 1913,
em uma de suas viagens, de imediato associou as premissas deste movimento à
sua São Paulo, palco de frenéticas transformações urbanas desde a virada do
século XIX para o XX. A história que Tomaso Marinetti e seus companheiros
propunham eliminar era a mesma que mal acabava de ser implantada na cidade de
São Paulo, através da arquitetura Eclética. No entanto Oswald de Andrade havia se
encantando com a verve revolucionária da oratória futurista e retornando a São
Paulo propalaria as benesses de tal movimento para as artes de então.
Apesar de à época nenhuma proposta do arquiteto do grupo futurista, Antonio
Sant‟Elia, ter sido construída, como também não o foi posteriormente, a escala das
edificações impressionou Oswald de Andrade, que viu naqueles croquis de edifícios
e de cenários urbanos, uma noção de progresso materializada.
74
Projeto dos arquitetos Ângelo Brunhs e José Cortez, 1928-1930, na Tijuca, cidade do Rio de Janeiro.
215
Em fins de 1917, Anita Malfatti promoveu uma exposição de sua produção atual
que, se não era completamente inserida nas estéticas das vanguardas modernas, já
procurava alguma noção de identidade nacional, pelo uso incomum e surpreendente
de cores vivas. Estas obras foram duramente criticadas por Monteiro Lobato, um dos
críticos mais prestigiados de então, mas foi a crítica à modernidade destas pinturas
que aglutinou a formação do futuro grupo modernista em sua defesa.
Quanto à arquitetura, continuávamos presos ao Ecletismo e ao Neocolonial,
sinônimo de modernidade até então. Durante A Semana de Arte Moderna de 1922,
ocorrida em São Paulo, a arquitetura participou com alguns croquis dos arquitetos
Antonio Garcia Moya e Georg Przyrembel que não representavam nenhuma das
vanguardas modernas internacionais, mas eram apenas estranhas aos cânones
Beaux-arts, sendo que o primeiro apresentou edificações de referencial maia e
asteca e o segundo uma leitura particular do neocolonial.
Arquitetura Moderna propriamente dita iniciou-se só a partir da já citada edificação
na Avenida Angélica, em São Paulo do arquiteto Julio de Abreu Junior e,
principalmente pelo intermitente trabalho teórico e construtivo no sentido de
implantar esta nova linguagem, do arquiteto ucraniano Gregori Warchavchik (18961972).75
Tendo como ponto de partida sua própria residência, na Rua Santa Cruz, também na
cidade de São Paulo, este arquiteto publicou em alguns periódicos de então, artigos
com a finalidade de explicar aos leigos em arquitetura a proposta daquela nova
linguagem, além de construir assiduamente inúmeras edificações modernas.76
75
Cabe lembrar que Gregori Warchavchik foi discípulo do arquiteto Marcelo Piacentini, criador do Tardoclassicismo quando estudou no Instituto Superior de Belas Artes, em Roma, e depois de formado foi seu
assistente de1920 a 1922.
76
“Futurismo”, no jornal Il Picolo, de São Paulo e “Acerca da arquitetura moderna”, no jornal Correio da
Manhã, do Rio de Janeiro, ambos em 1925.
216
Composições de cubos brancos embasados no solo, clara influência do arquiteto
Walter Gropius, com raras concessões aos pilotis de Le Corbusier, desprovidas de
qualquer ornamentação, com uma estética funcionalista e desvinculada de
propósitos ligados à expressão de identidades regionais e/ou nacionais. A exceção
ficou por conta do paisagismo em que utilizou espécimes nativos, o que não era um
padrão projetual do paisagismo da época. A escala humana e a simplicidade destas
edificações, apesar de edificadas, em sua maioria, para membros da elite paulistana,
pessoas de hábitos sofisticados e seguidores de códigos tradicionalistas de etiqueta,
demonstram a vontade de se inserir em um novo conceito do que vinha a ser
modernidade, pautada pela praticidade e velocidade das primeiras décadas do
século XX.
Esta arquitetura restringiu-se ao âmbito habitacional, não se constituindo em
referência para edificações de grande porte fossem de uso comercial, residencial ou
estatal, até por volta da década de 1930, quando arquitetos adeptos desta nova
linguagem empreenderam esforços projetuais e construtivos na busca do partido
moderno vertical, voltado aos diversos usos.
São exemplos desta busca neste período: o Albergue da Boa Vontade, na cidade do
Rio de Janeiro, de 1931, de Affonso Eduardo Reidy e Gerson Pompeu Pinheiro; o
edifício residencial Columbus, na cidade de São Paulo, de 1932, de Rino Levi; o
edifício-sede do Instituto de Pensão e Aposentadoria dos Servidores do Estado, na
cidade do Rio de Janeiro, de 1933, de Paulo Antunes Ribeiro; o edifício
multifuncional Esther, na cidade de São Paulo, de 1935, de Álvaro Vital Brazil e
Adhemar Marinho; o edifício residencial Jarau, na cidade do Rio de Janeiro, de
1935, de Firmino Saldanha; o Asilo São Luís, na cidade do Rio de Janeiro, de 1935,
de Paulo Camargo e Almeida; o edifício do Ministério da Educação e Saúde, na
cidade do Rio de Janeiro, de 1936, de Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Carlos Leão,
Jorge Machado Moreira, Affonso Eduardo Reidy e Ernani Vasconcelos; o edifíciosede da Associação Brasileira de Imprensa, na cidade do Rio de Janeiro, de 1936,
de Marcelo e Milton Roberto; os edifícios do Hangar e do Aeroporto Santos Dumont,
na cidade do Rio de Janeiro, de 1937, de Marcelo e Milton Roberto; o edifício da
217
Estação de Hidroaviões, na cidade do Rio de Janeiro, de 1937, de Attílio Correa
Lima e o edifício-sede da Liga Brasileira contra Tuberculose, na cidade do Rio de
Janeiro, de 1937, de Marcelo, Milton e Maurício Roberto.
Como se pode facilmente observar pela relação acima, o único edifício destinado a
abrigar um órgão governamental, e conseqüentemente também com a função de
contribuir para a construção do imagético desejado por este novo Estado, foi o do
MES, que mesmo assim só foi concluído em 1943, já no final do governo de Getúlio
Vargas. E esta observação poderia indicar que o modernismo, provavelmente, não
poderia fornecer os elementos arquitetônicos necessários para a construção da
imagem de um Estado forte e, onipresente, apesar de que especificamente este
edifício os apresenta, como iremos abordar mais adiante.
Em São Paulo, paralelamente à atuação de Warchavchik e dentro da vertente
modernista, ainda que de forma tímida inicialmente, tivemos o arquiteto Rino Levi
(1901-65), que cursou a Escola de Belas Artes de Milão e a Real Escola Superior de
Arquitetura de Roma, em 1920; o engenheiro-arquiteto Oswaldo Arthur Bratke (19071997), que se graduou na Escola de Engenharia do Mackenzie, em São Paulo, em
1931; e o engenheiro Flávio de Carvalho (1899-1973), formado em engenharia na
Inglaterra em 1922.
Em 1925, Rino Levi enviou para São Paulo um artigo intitulado “A Arquitetura e a
Estética das Cidades”, publicado no jornal O Estado de São Paulo, em 15 de
outubro. No artigo ele exaltava os progressos técnicos ocorridos na área da
construção civil, bem como apontava para a incompatibilidade destes com a estética
arquitetônica vigente. Após constituir escritório, destacou-se pela abordagem
abrangente das possibilidades de atuação de um arquiteto, projetando qualquer
tipologia arquitetônica, desde residências até planos urbanos. Discerniu as
particularidades e especificidades das áreas de projeto e construção, projetando e
não construindo, em alguns casos e valorizando o trabalho em equipe, inclusive
multidisciplinares.
218
Devido a esta abrangência, desenvolveu novas soluções para programas
complexos, de acordo com o avanço tecnológico das áreas específicas e da própria
construção civil, como no caso dos projetos para cinemas, cinemas com hotéis e
fábricas. No entanto, quando da necessidade de atribuir à edificação atributos como
nobreza, imponência e monumentalidade, recorreu a soluções tradicionais, como a
utilização de pórtico frontal com altura diferenciada, recaindo na típica divisão base,
corpo e coroamento, mesmo que estereotipados, além da presença de materiais
nobres, como mármores e granitos. A linguagem moderna ainda não tinha a solução
para a construção de “palácios”, nesta experimental década de 1930.
Oswaldo Bratke destacou-se pela constante experimentação na busca da coerência
entre materiais e linguagem arquitetônica, aliando aos seus ateliers de projeto,
canteiros para desenvolvimento de novos materiais e técnicas. Seus espaços eram
racionais e fluidos, tendo também projetado inúmeras tipologias arquitetônicas,
destacando-se residências e edifícios comerciais. Da mesma forma que Rino Levi e
Eduardo Knese Mello, também optou, a partir do início da década de 1940 por
apenas projetar e não necessariamente construir.
Flávio de Carvalho destacou-se neste cenário muito mais como provocador e
contestador profissional, do que como construtor, envolvendo-se em polêmicas em
todos os concursos arquitetônicos dos quais participou, remetendo-as às questões
basilares da modernidade77.
Apesar da importante contribuição destes arquitetos para a afirmação da arquitetura
modernista entre nós, através de bons projetos e do desenvolvimento de materiais e
técnicas emergentes, não se pode falar em uma escola paulista de arquitetura
moderna. Mesmo com as semelhanças existentes entre os trabalhos dos arquitetos
citados, não havia uma preocupação em se compor um corpo teórico único que
77
A única obra urbana de Flávio de Carvalho foi um conjunto de 17 casas entre as alamedas Lorena e Ministro
Rocha Azevedo, na cidade de São Paulo, em 1933, no estilo modernista, e que hoje se encontram, na sua
maioria, bem descaracterizadas.
219
justifica-se tal denominação (BRUAND, 1981, pp. 269-281). Eram escritórios
independentes com visões específicas, como eram também neste período os
escritórios de Carlos da Silva Prado e Jayme da Silva Telles, que tiveram pouca
produção (SEGAWA, 1997, pp. 51-2).
Foi somente a partir da Revolução de 1930, com a reestruturação do Estado, que o
tema Palácio governamental e de outros edifícios de uso público se constituíram em
novo desafio. Havia o desafio de ligar as novas necessidades do novo Estado com
uma imagem de modernidade a ser impressa nas novas edificações. Nem no
exterior havia exemplos desta temática, criada na década de 1930. Tanto na Itália,
quanto na Alemanha, que também estavam reestruturando o aparelho estatal devido
à implantação de regimes totalitários, a linguagem dos edifícios governamentais
eleita havia sido prioritariamente o Tardo- classicismo e não o Modernismo.
Na cidade do Rio de Janeiro, esta questão tornou-se premente, pelo fato desta ser a
capital e, portanto, concentrar a administração federal, além da estadual e do Distrito
Federal. Boa parte da estrutura pré existente continuou a existir, com poucas
alterações, apenas substituindo-se nomes. No entanto, novas autarquias foram
criadas e algumas ampliadas, requerendo a adaptação de espaços existentes e a
criação de novos. São exemplos deste período os edifícios dos Ministérios do
Trabalho, Comércio e Indústria (1936-8); Educação e Saúde (1936-43), Fazenda
(1938-43); Marinha (1934-8); Guerra (1938-42) e da Central do Brasil (1936-40).
Pode-se considerar como marco iniciador do modernismo no Rio de Janeiro a
implantação do curso de arquitetura moderna na Escola Nacional de Belas Artes por
Lúcio Costa quando de sua curta permanência na diretoria desta escola, de outubro
de 1930 até setembro de 1931. O convite para a direção partiu de Rodrigo Mello
Franco de Andrade, então chefe de gabinete do Ministério de Educação e Saúde,
ligado aos escritores modernos, como Carlos Drummond de Andrade, que inclusive
o substituiu na chefia do gabinete, quando Rodrigo assumiu o SPHAN (Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
220
Lúcio Costa havia se formado em 1924 dentro dos moldes do Neocolonial vigente na
escola, sob direção de José Mariano Filho, tendo sido um dos melhores alunos desta
instituição. Tornou-se um dos maiores conhecedores da arte e arquitetura do
período
colonial
e
suas
primeiras
realizações
arquitetônicas
foram
fieis
representantes das premissas neocoloniais.
No entanto, segundo palavras do próprio Lúcio Costa, a constatação do caráter
cenográfico da arquitetura Neocolonial após uma viagem de estudos às Cidades
Históricas de Minas Gerais, somada à pertinência do discurso de Le Corbusier , em
1929, no auditório da escola Nacional de Belas Artes, no que concernia à
necessidade das edificações expressarem sua verdade construtiva, sem embustes
de qualquer espécie, influenciou-o profundamente, a ponto de convencê-lo do novo
caminho a ser adotado pela escola (COSTA, 1995, pp.108-16).
Assim, quando da oportunidade da mudança, ela foi aplicada nas artes e na
arquitetura, através de um novo projeto pedagógico e do convite a artistas e
profissionais de vanguarda para lecionar. Na arquitetura, o convite recaiu sobre os
nomes do russo Gregori Warchavchik, do belga Alexander Buddeus e do francobrasileiro Affonso Eduardo Reidy:
A reforma visará aparelhar a escola de um ensino técnico-científico tanto
quanto possível perfeito, e orientar o ensino artístico no sentido de uma
perfeita harmonia com a construção. Os clássicos serão estudados como
disciplina; os estilos históricos como orientação crítica e não para aplicação
direta (COSTA, 1995, p.68).
Apesar da curta sobrevivência deste curso, parcela significativa dos estudantes já
havia sido influenciada por essa nova arquitetura. Porém não se deve desconsiderar
que,
incluídos
conceitualmente,
neste
e
grupo,
que
também
optaram
por
estavam
esta
alunos
linguagem
descompromissados
pela
facilidade
de
representação gráfica. Foi o grupo consciente da mudança, que compôs a chamada
primeira geração do modernismo na arquitetura brasileira, que foi chamada de
221
Escola Carioca de Arquitetura Moderna por Mário de Andrade pela primeira vez 78.
Fizeram parte do grupo nomes como Álvaro Vital Brazil (1909-97), Carlos Leão
(1906-83), Ernani Vasconcelos (1909-88), Jorge Machado Moreira (1904-92), Luís
Nunes (1908-37), Marcelo Roberto (1908-64), Milton Roberto (1914-53) e Oscar
Niemeyer (1907).
O diferencial residiu principalmente na preocupação de se atribuir à arquitetura
moderna internacional uma roupagem nacionalista. Este processo se deu pela
interferência direta de Lúcio Costa, através da utilização de elementos arquitetônicos
tipicamente brasileiros, ligados à proteção da insolação, sistemas construtivos e
equacionamento de programas de necessidades. Neste aspecto, a sociedade com
Warchavchik (1931-4) serviu de escola prática sobre as premissas desta nova
arquitetura e o período de ostracismo vivido após a demissão da Escola Nacional de
Belas Artes até o início do projeto do Ministério da Educação e Saúde Pública
(1935), deu-lhe o tempo para estudar e conhecer mais profundamente as teorias que
embasavam esta arquitetura.
A diversidade de formas e materiais, o uso de brises soleil (quebra-sol), cobogós
(elementos vazados), pérgulas e marquises, aliada a jardins internos e externos
tornaram-se gradativamente uma marca desta arquitetura, acompanhada pelo
aperfeiçoamento no uso do concreto armado e a conseqüente exploração de suas
possibilidades estruturais e plásticas.
Este período de transição e criação de uma nova linguagem na arquitetura brasileira
é o mote da obra Razões da Nova Arquitetura, de Lúcio Costa, escrita entre 1934 e
1935, que também previu, de maneira geral, a afirmação desta linguagem como
hegemônica, num curto espaço de tempo79. No que tange à divulgação desta
78
“A primeira escola, o que se pode chamar legitimamente de ‘escola’ de arquitetura moderna no Brasil, foi a
do Rio, com Lucio Costa à frente, e ainda inigualada até hoje.”(ANDRADE apud CAVALCANTI, 2006, p. 7)
79
“Na evolução da arquitetura, ou seja, nas transformações sucessivas por que tem passado a sociedade, os
períodos de transição se têm feito notar pela incapacidade dos contemporâneos no julgar do vulto e alcance da
222
arquitetura, o primeiro e principal veículo foi a Revista da Diretoria de Engenharia,
periódico da repartição oficial da Prefeitura do Distrito Federal, conhecida
posteriormente como PDF (Prefeitura do Distrito Federal), iniciada em 1932, tendo
como co-fundadora e secretária, depois diretora, a engenheira Carmen Portinho.
Esta revista só publicava obras e projetos modernos, artigos técnicos ligados
principalmente ao desenvolvimento da engenharia do concreto armado e do conforto
térmico no Brasil, além de matérias internacionais ligadas ao Modernismo, tendo
contemplado as primeiras obras de Warchavchik e Lúcio Costa, dos arquitetos acima
citados e do departamento de arquitetura da Prefeitura do Distrito Federal, que tinha
como funcionário Affonso Eduardo Reidy.
Foi pela a presença deste arquiteto, Reidy, na estrutura do Estado, que favoreceu a
implantação da arquitetura moderna, fazendo com que, gradualmente, vários
equipamentos urbanos da cidade do Rio de Janeiro adquirissem esta feição, a partir
de 1932, atingindo a maior escala quando do convite de Lúcio Costa para participar
do primeiro edifício público modernista, o do MES.
Cabe salientar também a atuação do arquiteto Luís Nunes e equipe, na cidade do
Recife, no recém criado Departamento de Arquitetura e Construção (DAC), em 19345 e Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU), em 1936-7, com propostas
pautadas na racionalidade tanto das formas como dos sistemas construtivos e na
otimização dos recursos disponíveis, com requalificação profissional, pesquisa para
o desenvolvimento de novos materiais e métodos de trabalho com seriação de
etapas. Os programas a serem formulados e equacionados estavam relacionados à
implantação de serviços públicos novos, oriundos dos avanços científicos que
nova realidade cuja marcha pretendem sistematicamente deter. A cena é, então, invariavelmente a mesma:
gastas as energias que mantinham o equilíbrio anterior, rompida a unidade, uma fase imprecisa e mais ou
menos longa sucede, até que, sob atuação de forças convergentes, a perdida coesão se restitui e novo
equilíbrio se estabelece.
(COSTA apud XAVIER, 2003, pp. 39-40)
223
deveriam ser colocados ao dispor da população, segundo a plataforma política do
interventor no Estado de Pernambuco, Carlos de Lima Cavalcanti (1892-1967).
São obras deste período em Recife: o Hospital da Brigada Militar, a Escola Rural
Alberto Torres, a Usina Higienizadora de Leite, o Leprosário de Mirueira , o Pavilhão
de Verificação de Óbitos da Faculdade de Medicina e o Reservatório de Água de
Olinda. Os trabalhos foram interrompidos em 1937 com o golpe do Estado Novo e a
morte de Luís Nunes. Seus principais colaboradores, os arquitetos Fernando
Saturnino de Brito e Roberto Burle Marx e o engenheiro Joaquim Cardozo se
transferiram para o Rio de Janeiro e passaram a trabalharam continuamente com o
grupo carioca.
Na Capital Federal a presença dos arquitetos da Escola Carioca de Arquitetura
Moderna foi se tornando gradativamente mais freqüente, como por exemplo, com a
vitória dos Irmãos Roberto nos concursos da Associação Brasileira de Imprensa
(ABI) em 1936 e para o Aeroporto Santos Dumont em 1937, em que foram
apresentadas propostas em conformidade com os cânones Corbusianos dos Cinco
Pontos da Arquitetura Moderna, as ressalvas oriundas do entorno e priorizando as
questões relacionadas à insolação.
Em 1938 foram concluídas as obras da Estação de Hidroaviões, projeto dos
arquitetos Attilio Correia Lima, Jorge Ferreira, Renato Mesquita dos Santos, Renato
Soeiro e Thomas Estrela.
Cabe salientar que a opção pela estética modernista da maioria dos edifícios
aeroportuários construídos no período compreendido entre as décadas de 1930 e
1940, residiu muito mais nas questões de caráter funcionalista/operacional dos
programas de necessidades predominante nestas tipologias, do que em uma
concordância estilística por parte do Estado.
224
Outro fato muito importante neste processo de adoção desta nova linguagem
arquitetônica para a construção de edifícios estatais ou representativos do Estado foi
a escolha do projeto do arquiteto Lúcio Costa para o Pavilhão do Brasil na Feira
Mundial de Nova York, em 1939-40.
A escolha por um projeto modernista era uma premissa, visto que somente
arquitetos adeptos desta linguagem haviam sido convidados, uma vez que os
próprios organizadores norte americanos já haviam estipulado esta condição,
excluindo qualquer estilo historicista para pavilhões estrangeiros, restringindo seu
uso aos regionais norte americanos. Esta imposição levou o governo brasileiro a
suspender um decreto presidencial de 1922 que obrigava o uso do estilo Neocolonial
para qualquer edificação que fosse representar o país no exterior.
Apesar de sua vitória, o arquiteto Lúcio Costa convidou o arquiteto Oscar Niemeyer
para juntos executarem um novo projeto, por ter reconhecido no projeto deste,
qualidades relacionadas ao arrojo plástico necessário para evidenciar o pavilhão
brasileiro.
Era uma edificação de três pavimentos, com estrutura mista de aço e concreto,
formado por dois grandes volumes prismáticos em “L” gerando um pátio interno que
continha um espelho d‟água com espécimes tropicais, projetado por Burle Marx. As
faces de um dos volumes eram curvas e integravam-se com a rampa de acesso. Os
cobogós da fachada de acesso também eram elementos que se destacavam no
conjunto geral.
Essa arquitetura antecipava as futuras experimentações plásticas de Niemeyer, nos
edifícios do conjunto da Pampulha, em Belo Horizonte, em 1942-3 e já insinuava o
início do capítulo brasileiro na história da arquitetura moderna mundial. A
sinuosidade e a leveza do concreto desta edificação chamaram a atenção dos
críticos, nas só pelas questões de ordem técnica, como pela abertura de novas
225
possibilidades estéticas dentro do ideário modernista (CAVALCANTI, 2006, pp.1845).
A segunda metade da década de 1930 foi marcada por concursos de anteprojetos
para os efifícios-sede dos novos ministérios e de novas edificações para ministérios
já existentes, bem como a construção direta para outros. Em 1935 foi aberto o
concurso para a nova sede do Ministério da Educação e Saúde e em 1936 para o
Ministério da Fazenda. Os edifícios para o Ministério da Marinha (1934-8); para o
Ministério do Trabalho, Comércio e Indústria (1936-8) e para o Ministério da Guerra
(1938-42), foram construídos sem concurso.
A área escolhida para a implantação destas novas edificações foi a esplanada do
Castelo, obtida com o arrasamento do tradicional morro do mesmo nome, seguindo
o Plano Agache, no processo de ocupação de áreas necessárias devido ao
crescimento urbano. Foram construídos fora da esplanada, o edifício do Ministério
da Guerra, na Praça Duque de Caxias, no eixo da nova Avenida Presidente Vargas
e o do Ministério da Marinha, próximo à Praça XV.
O concurso para o MES foi vencido pelos arquitetos Archimedes Memória e
Francisque Cuchet, uma proposta com destaque para a ornamentação marajoara.
Estes arquitetos formavam o mais prestigiado escritório de arquitetura da cidade do
Rio de Janeiro e Archimedes Memória era o diretor da ENBA desde a demissão de
Lúcio Costa deste cargo.
Considerando-se que o corpo de jurados era formado em parte por membros de tal
escola, não foi surpresa a não seleção de todas as propostas que haviam utilizado o
repertório modernista, mesmo que não integralmente.
226
Apesar da dimensão dos ganhadores no cenário arquitetônico e cultural do Rio de
Janeiro, o ministro Gustavo Capanema, não satisfeito com o resultado, pagou o
prêmio aos ganhadores, mas não adotou o projeto para a construção do edifício do
Ministério. Não que o ministro fosse adepto do modernismo, pois na verdade não
havia ainda clareza em como este estilo racionalista, sem roupagem e escala
monumentalista, iria aglutinar os anseios de caráter simbólico ao extenso programa
de necessidades. Mas de uma coisa o ministro tinha certeza, independentemente
da influência de seus subordinados modernistas, como Rodrigo Mello Franco de
Andrade e Carlos Drummond de Andrade: não era aquela a imagem de
modernidade almejada pelo seu ministério e nem a visão governista neste aspecto
(CAVALCANTI, 2006, p.39).
Qual seria esta imagem? Esta questão no momento não tinha uma resposta única e
definitiva. O próprio Lúcio Costa quando convidado a desenvolver o novo projeto,
chamou os demais participantes do concurso com propostas modernas para
integrarem uma equipe que se incumbiria da difícil empreitada. Afinal de contas,
aquele seria o primeiro “palácio” governamental a ser construído no mundo e nem
mesmo Le Corbusier já havia trabalhado naquela escala e com objetivos a serem
cumpridos que
pareciam ambíguos: austeridade e imponência, modernidade e
tradição e todos rumo a um caráter de brasilidade.
227
4.2. Inventário da arquitetura estatal na cidade do Rio de Janeiro, de 1930 a
1945.
4.2.1. Urbanismo
Figura 81 – O Prefeito Henrique Dodsworth apresenta a maquete do “Plano da Cidade do Rio de
Janeiro” a Getúlio Vargas, em 1939. (CAVALCANTI, 2006)
Durante a gestão do prefeito Henrique Dodsworth (1937-45) foi restabelecida a
Comissão do Plano da Cidade, constituída por engenheiros e arquitetos lotados nos
quadros funcionais da cidade do Rio de Janeiro e do Serviço Técnico do Plano da
Cidade, órgão criado no período compreendido entre 1926 a 1930 na conjuntura do
Plano Agache80, na gestão do prefeito Prado Júnior. Tal comissão havia sido
80
Alfred Hubert Donat Agache (1875-1959): arquiteto e urbanista francês responsável na Europa, a partir de
1919, pelos Planos de Urbanização de Paris, de Dunquerque, de Poitiers, de Dieppe, de Orleans e de Lisboa.
228
dissolvida na gestão de Pedro Ernesto (1931-6) sem a implantação de nenhuma das
propostas de Agache, e agora, com o advento do Estado Novo, e a conseqüente
maior autonomia do Executivo, novas perspectivas se delineavam.
Retomou-se o Plano Agache, readequando-se suas propostas às novas condições
da cidade do Rio de Janeiro, levando-se em conta as obras do Aeroporto Santos
Dumont e a eletrificação da Estrada de Ferro Central do Brasil nos subúrbios,
constituindo assim, no setor viário, o Plano de Extensão e Transformação da Cidade,
cuja implantação foi delegada à liderança do engenheiro Edison Junqueira Passos,
diretor da Secretaria de Viação e Obras do Distrito Federal.
Faziam parte do escopo deste plano: “a Avenida Presidente Vargas, a remodelação
das quadras do centro, a Avenida Brasil, a Avenida Tijuca, o Corte do Cantagalo, a
urbanização do Botafogo, a remodelação da Floresta da Tijuca e a duplicação do
túnel do Leme” (SILVA LEME, 1999, p.365).
Desde 1857 havia a intenção de se ligar a Avenida do Mangue até o mar, visto
tratativas entre o poder público e o Barão de Mauá81, neste sentido. O Plano Agache,
corroborou a visão do barão, recomendando a abertura de tal avenida, que em 1938
foi incluída no escopo das intervenções a serem implantadas pelo Serviço Técnico
do Plano da Cidade.
Em 1927 vem ao Brasil para a elaboração do Plano do Distrito Federal, a cidade do Rio de Janeiro,
permanecendo por aqui por três anos para a finalização dos trabalhos. Ver Cidade do Rio de Janeiro, extensão,
remodelação e embelezamento. Paris: Foyer Bresilien, 1930.
81
O Barão de Mauá, Irineu Evangelista de Souza, esteve envolvido em propostas de melhoramentos da cidade
do Rio de Janeiro durante todo o Segundo Império, a começar pela implantação das ferrovias de Porto da
Pedra e para a cidade de Petrópolis.
229
As desapropriações necessárias para a abertura da Avenida Presidente Vargas
foram efetivadas a partir de 194082, com um total de 600 edificações demolidas
(SILVA LEME, 1999, p.365). Em 07 de setembro de 1944, a avenida foi inaugurada
pelo próprio presidente Getúlio Vargas e todo seu ministério, com desfile de
escolares, trabalhadores e militares, com toda a pompa que marcou todas as
manifestações do Estado Novo83 e segundo a arquiteta e urbanista Maria Cristina da
Silva Leme, “Sua abertura contribuiu para o processo de expulsão das populações
pobres da área central da cidade” (SILVA LEME, 1999, p.367).
Participaram como autores do projeto, através da Comissão do Plano da
Cidade, os engenheiros e arquitetos: José de Oliveira Reis, Nelson Muniz
Nevares, Hermínio de Andrade e Silva, Armando Stamile, Edwaldo
Vasconcelos, Aldo Botelho, Hélio Mamede, Domingos de Paula Aguiar,
João Moysés, Hélio Alves de Brito e Affonso Eduardo Reidy (SILVA LEME,
1999, p.367).
Outro projeto de relevância no escopo das incumbências da Comissão do Plano da
Cidade foi o de remodelação das quadras do centro, a partir de 1938, que
normatizou os novos limites de dimensão de quadras e ocupação de lotes, visando
atribuir à região maior permeabilidade e menor adensamento, coerente com as
características do tecido urbano das principais cidades no mundo.
Neste caso,
acrescenta-se apenas o nome do engenheiro Tobias Visconti à relação de
profissionais da Comissão.
A urbanização do bairro do Botafogo, atendendo as diretrizes do Plano Agache no
tocante à integração da Cidade Universitária, na praia Vermelha, ao novo traçado do
bairro, se deu a partir de 1944. Os jardins da orla da enseada do Botafogo foram
feitos posteriormente pelo arquiteto e paisagista, Roberto Burle Marx, entre 1951 e
82
Decreto presidencial nº6747, de 23 de abril de 1940.
83
Na cidade de São Paulo, o local preferido para os eventos do Estado Getulista era o Estádio Municipal do
Pacaembu.
230
1952.
Juntou-se à Comissão para a execução destes trabalhos o engenheiro-
arquiteto João Gualberto Marques Porto.
Por fim, muito importante foi a construção da Avenida Brasil. Esta foi construída
sobre um aterro, realizado pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento,
que era o responsável pelos trabalhos de saneamento na orla da baía, e teve como
objetivos deslocar a parte inicial das rodovias Rio - Petrópolis e Rio - São Paulo para
áreas mais distantes do tecido urbano, bem como valorizar estas extensões
periféricas da cidade. A Avenida Brasil foi inaugurada em 1946.
Figura 82 – Vista aérea da área a ser ocupada pela Avenida Presidente Vargas, Rio de Janeiro, e o
projeto modular para a Avenida. (CAVALCANTI, 2006)
231
Figura 83 – Demolição das edificações existentes para a implantação da Avenida Presidente Vargas,
Rio de Janeiro, 1941. (CAVALCANTI, 2006)
Figura 84 – Avenida Presidente Vargas após a demolição das edificações do local, Rio de Janeiro,
1946. (CAVALCANTI, 2006)
232
Figura 85 – A Avenida Presidente Vargas em seu esplendor, Rio de Janeiro, 1947. (KOSMOS, 1948)
Figura 86 – Projeto para a Praça do Castelo, na Esplanada do Castelo, Rio de Janeiro, 1940.
(CAVALCANTI, 2006)
233
Figura 87 – Vista aérea da Esplanada do Castelo ainda sem a urbanização, Rio de Janeiro, 1931.
(CAVALCANTI, 2006)
234
4.2.2. Edificações e monumentos
Relacionamos abaixo as edificações construídas pelo Estado Getulista no período
de 1930 a 1945, na cidade do Rio de Janeiro, para uso do seu quadro funcional,
visto a reestruturação administrativa pela qual passou o Estado a partir da ascensão
de Getúlio Vargas ao poder com a Revolução de 1930 e posteriormente com a
implantação do Estado Novo.
Incluímos também nesta relação, edificações de instituições ligadas ao governo e
que tiveram apoio financeiro deste para a sua construção, como a Associação
Brasileira de Imprensa (ABI), o Instituto de Pensões e Aposentadorias dos
Industriários (IAPI), o Instituto de Pensões e Aposentadorias dos Comerciários
(IAPC), a Associação Comercial do Rio de Janeiro, o Instituto de Resseguros do
Brasil (IRB) e a Liga Brasileira Contra a Tuberculose.
A cronologia utilizada considerou as datas de projeto e construção, respectivamente
e
a
classificação
estilística
considerou
a
predominância
dos
elementos
arquitetônicos presentes na edificação. Incluímos as denominações atuais no intuito
de facilitar a identificação, bem como uma provável visitação as edificações.
235
Figura 88 - 1926-31 – Monumento ao Cristo Redentor
Morro do Corcovado – Cosme Velho
Projeto: Heitor da Silva Costa, Paul Landowski – escultor (cabeça e mãos) e Lélio
Landucci – assistente
Construção: Heitor da Silva Costa e Pedro Fernandes Vianna da Silva – engenheiros
Colaboração: Heitor Levy.
Estilo: Art Déco
236
Figura 89 - 1933-40 (reforma) – Edifício do Instituto Nacional de Serviço Social
Rua Pedro Lessa, 36 / Avenida Graça Aranha, 35 – Centro
Projeto: Paulo Antunes Ribeiro
Reforma: Stelio Alves de Souza
Construção: Brandão, Magalhães & Cia. Ltda.
Estilos: Moderno inicialmente, Art Déco após a reforma.
237
Figura 90 - 1934 – Edifício do Instituto Nacional de Previdência Social
Avenida Graça Aranha, 169 / Rua México, 128 – Centro.
Projeto: não identificado
Construção: não identificado
Estilo: Art Déco
238
Figura 91 - 1934 / 1938 – Edifício do Ministério da Marinha
Rua D. Manuel, 15 - Centro
Projeto: Departamento de Obras do Ministério da Marinha
Construção: Departamento de Obras do Ministério da Marinha
Estilo: Tardo- classicista
239
Figura 92 - 1935 – Edifício da Polícia Federal
Avenida Rodrigues Alves, 1 – Centro.
Projeto: não identificado
Construção: não identificado
Estilo: Art Déco.
240
Figura 93 - 1935 – Escola Municipal República Argentina
Boulevard Vinte e oito de Setembro, 125 – Vila Isabel.
Projeto: Eneas Silva
Construção: não identificado
Estilo: Art Déco
241
Figura 94 - 1936 – Castelo D‟água do Maracanã
Praça Maracanã – Maracanã
Projeto: Inspetoria de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro
Construção: J. Baerlein & Cia
Estilo: Art Déco
242
Figura 95 - 1936 / 1938 – Edifício Sede da Associação Brasileira de Imprensa – ABI
Rua Araújo Porto Alegre, 71 – Centro
Projeto: Marcelo e Milton Roberto
Terraço-Jardim: Roberto Burle Marx
Construção: Duarte e Cia
Estilo: Moderno
243
Figura 96 - 1936-38 – Tribunal Regional do Trabalho (antigo edifício do Ministério do
Trabalho, Indústria e Comércio)
Avenida Presidente Antonio Carlos, 105 – Centro
Projeto: Mário Santos Maia
Equipe de desenvolvimento e fiscalização: Dulphe Pinheiro Machado, Edgar de
Mello, Mário Santos Maia, Plínio R. Catanhede, Affonso Eduardo Reidy e Antonio de
Almeida
Construção: Construtora Raja Gabaglia
Estilo: Art Déco
244
Figura 97 - 1936 -40 – Estação D. Pedro II, sede da Flumitrens, Central do Brasil
Praça Cristiano Otoni, s/n° - Centro Projeto: Roberto Magno de carvalho e escritório
Robert R. Prentice (Geza Heller e Adalberto Szilard)
Construção: José Maurício da Justa (responsável), Cumplido Santiago & Cia
(alvenaria e acabamentos)
Estilo: Art Déco
245
Figura 98 - 1936-43 – Palácio Gustavo Capanema (antigo edifício do Ministério da
Educação e Saúde)
Rua da Imprensa, 16 – Centro
Projeto: Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Carlos Leão, Jorge Machado Moreira, Affonso
Eduardo Reidy e Ernani Vasconcelos.
Consultoria: Le Corbusier
Colaboradores: Roberto Burle Marx (jardins) e Emílio Baumgart (cálculo estrutural)
Principais obras de arte: Cândido Portinari (pintura e azulejaria), Bruno Giorgi e
Celso Antônio Menezes (esculturas)
Construção: Serviço de Obras do Ministério da Educação e Saúde Pública
Estilo: Moderno
246
Figura 99 - 1937 – Palácios do Comércio (antigo edifício da Associação Comercial
do Rio de Janeiro)
Rua da Candelária, 9 – Centro
Projeto: Henri Paul Pierre Sajours & Auguste Rendu
Construção: Dourado S.A
Estilo: Art Déco
247
Figura 100 - 1937-8 – Estação de Hidroaviões
Praça Marechal Âncora, s/n° - Centro
Projeto: Attílio Corrêa Lima
Colaboradores: Jorge Ferreira, Thomaz Estrella, Renato Mesquita dos Santos e
Renato Soeiro
Construção: Departamento de Aviação Civil (Paulo Osório Jordão de Brito –
responsável técnico)
Estilo: Moderno
248
Figura 101 - 1937- 44 – Aeroporto Santos Dumont
Praça Salgado Filho, s/nº - Centro
Projeto: Marcelo e Milton Roberto
Construção: Departamento de Aviação Civil (César Grilo – responsável técnico)
Jardins: Roberto Burle Marx
Estilo: Moderno
249
Figura 102 - 1938-40 – Edifício Plínio Catanhede (antigo edifício do Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Industriários – IAPI)
Avenida Almirante Barroso, 78 - Centro
Projeto: Marcelo e Milton Roberto
Construção: Divisão de Engenharia do IAPI
Estilo: Moderno
250
Figura 103 - 1938-42 – Palácio Duque de Caxias (antigo edifício do Ministério da
Guerra)
Praça Duque de Caxias, s/nº - Centro
Projeto: Christiano Stockler das Neves
Construção: não identificado
Estilo: Art Déco
251
Figura 104 - 1938-43 – Ministério da Fazenda
Avenida Presidente Antonio Carlos, 375 – Centro
Projeto: Luiz de Moura
Construção: Cavalcanti Junqueira S.A
Estilo: Tardo classicista
252
Figura 105 - 1939-40 - Pavilhão do Brasil Na Feira Internacional de Nova York*
Flushing Meadows – Queens – Nova York – EUA
Projeto: Lúcio Costa e Oscar Niemeyer
Construção: Comissão da Feira
Estilo: Moderno
253
Figura 106 - 1941-2 – Edifício João Carlos Vital (antigo edifício do Instituto de
Resseguros do Brasil – IRB)
Avenida Marechal Câmara, 171 – Centro
Projeto: Marcelo, Milton e Maurício Roberto
Jardins e terraços: Roberto Burle Marx
Obras de arte: Paulo Werneck (mural em mosaico)
Construção: Instituto de Resseguros do Brasil (Rui Moreira – engenheiro
responsável)
Estilo: Moderno
254
Figura 107 - 1941-4 – Edifício Valparaíso (antigo edifício da Liga Brasileira Contra a
Tuberculose)
Avenida Almirante Barroso, 54 – Centro
Projeto: Marcelo e Milton Roberto
Construção: Divisão de Engenharia do IAPI
Estilo: Moderno
*Obs.: Incluímos o edifício em questão, mesmo não tendo sido construído na cidade
do Rio de Janeiro, foco de nosso trabalho, por ser uma das edificações relevantes,
no processo de construção de uma imagem de modernidade, almejada para o Brasil
do Estado Getulista.
255
4.3. Os Palácios do Poder: os edifícios dos ministérios getulistas
Figura 108 – Vista aérea da Esplanada do Castelo com os edifícios dos Ministérios, Rio de Janeiro,
1947. (KOSMOS, 1948)
Desde os discursos da Aliança Liberal na época da eleição para a presidência da
República
de
1929,
termos
como
moderno,
modernização,
modernidade,
nacionalismo e Estado mais atuante, foram se tornando cada vez mais freqüentes.
Após a Revolução de 1930, com a ascensão de Getúlio Vargas ao posto de
mandatário máximo do país, a concretização de uma plataforma política que
256
contemplasse
estas
questões,
significava
o
diferencial
alardeado
pelos
revolucionários.
A modernização do país implicava na implantação das premissas da modernidade,
como o liberalismo econômico; a priorização da industrialização na composição da
economia, o trabalho assalariado e a garantia dos direitos mínimos desta classe, e a
não intervenção do Estado no sistema; e o liberalismo político com a manutenção
das instituições democráticas. Moderno seria manter-se atual, sintonizado com as
tendências internacionais. Ao mesmo tempo, e justamente para não ser engolido por
economias mais estruturadas, via-se a necessidade de se ater a princípios que
garantissem uma autonomia perante estas, negociando condições favoráveis dentro
de um sistema que já indicava certa globalização (CAVALCANTI, 2006, pp. 225-32).
Assim sendo, a construção da imagem do Brasil que emergiu da Revolução de 1930,
se delineou pelo Governo Provisório e Constitucional de Getúlio Vargas e atingiu sua
configuração definitiva com o advento do Estado Novo, apesar de não apresentar as
premissas citadas em sua integralidade, desenvolvendo uma “modernidade à
brasileira”, como já exposto anteriormente neste trabalho, tinha que se valer de
instrumentos que lhe aferissem um caráter de modernidade e nacionalismo, ou seja,
ao mesmo tempo, tínhamos que parecer modernos e originais.
Das vinte obras relacionadas no inventário deste trabalho, parte tinha como objetivo
atender à questão da modernização da infraestrutura para um melhor funcionamento
da cidade. Exemplificamos este aspecto, com o reservatório denominado Castelo
D‟Água
do
Maracanã,
construído
para suprir uma antiga deficiência no
abastecimento de água potável para a cidade do Rio de Janeiro, que foi ressaltada
pelo crescimento da urbanização; a nova Estação Ferroviária Pedro II, maior e com
equipamentos mais modernos; a Estação de Hidroaviões, como conseqüência de
uma tendência da aviação nacional perante a predominância das capitais próximas
ao mar e de rios; e o Aeroporto Santos Dumont, já projetado para as modernas
aeronaves.
257
Não que estas obras também não pudessem representar o caráter ostentatório de
poder do Estado Getulista que as construiu, mas estavam muito mais ligadas à
demonstração da modernidade deste, pela presunção de aspectos técnicos e
científicos necessários ao cumprimento específico de suas funções.
Cabe ratificar, neste aspecto, a informação também já apresentada anteriormente
neste trabalho, da grande presença de técnicos nos quadros funcionais do Estado
Getulista, criando até a imagem que se manteve por um bom tempo, da priorização
destes em postos que exigiriam conhecimentos específicos em detrimento do
aspecto político nesta escolha.
Nesta linha de raciocínio, podem-se inserir os esforços para a criação da
Universidade do Brasil, a partir de 1933, como medida para sanar uma real
deficiência na quantidade de profissionais habilitados para o exercício não só das
tarefas tradicionais do funcionalismo público, agora incrementadas por novos
processos de administração, como das ocupações oriundas dos ministérios criados
por Getúlio Vargas, além do intuito de abastecer com profissionais específicos e
competentes o programa desenvolvimentista proposto por este Estado.
A maioria das edificações relacionadas no inventário das realizações do Estado
Getulista foi destinada à administração pública direta e indireta, como no caso dos
Institutos de Aposentadoria e Pensões das categorias profissionais (IAP‟s), que
tinham a anuência do Estado. Mas sem dúvida, as edificações que melhor
representaram o Estado de Getúlio Vargas no tocante à imagem de poder almejada
por este, embasada pela tentativa de concretização da onipresença do Estado na
vida dos cidadãos em todos os seus aspectos, na solidez de sua estrutura, na
perenidade de sua constituição, na segurança e confiança perante os compromissos
firmados, na grandeza de suas pretensões para o país e seu povo, na ratificação do
conceito de nação pelas suas tradições e ao mesmo tempo de modernidade, foram
as dos ministérios.
258
Foram construídas as sedes dos ministérios da Marinha (1934-8), do Trabalho,
Indústria e Comércio (1936-8), da Educação e Saúde (1936-43), da Guerra (193842) e o da Fazenda (1938-43), que atenderam, algumas mais que outras, todas, ou
algumas, as qualidades desejadas, citadas acima. Interessante ressaltar que apesar
de grande parte das construções ter ocorrido durante a rígida ditadura do Estado
Novo, houve flexibilidade na escolha dos estilos para estas edificações, ficando
excluído apenas o Neocolonial.
Para a presente análise foram selecionadas as edificações dos ministérios civis,
quais sejam; do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, a do Ministério da
Educação e Saúde Pública e do Ministério da Fazenda as edificações dos militares
tiveram sua imagem ligada antes à especificidade, ao imagético relacionado às
forças armadas do que ao do governo instituído.
259
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