ANO 2 | n 0 04| VOL.02 | DEZEMBRO 2015 EDITORIAL D i fi c u ld a d e s i ne re nt e s à pesquisa médica em seres humanos R E L AT O D E C A S O A p re s e nt a ç ã o ne u ro ló g i c a de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente AT U A L I Z A Ç Ã O D O T E M A Te r a p i a e n d o v a s c u l a r p a r a o acidente vascular cerebral isquêmico agudo: um marco histórico RESUMO DE ARTIGO Heart Failure Survival Score em pacientes com Doença de Chagas: correlação com variáveis funcionais ISSN 235777903 R E V I S TA D E S A Ú D E RSHSI Nº 04 VOL. 02 ANO: 2015, MÊS: DEZEMBRO SUPERVISORES DOS PROGRAMAS DE RESIDÊNCIA MÉDICA 1. ANESTESIOLOGIA Supervisor: Prof. Dr. Jedson dos Santos Nascimento 10. MEDICINA INTENSIVA Supervisor: Prof. Dr. Edson Marques Filho 2. CANCEROLOGIA CLÍNICA Supervisor: Prof. Dr. Dálvaro de Oliveira Castro Júnior 11. NEONATOLOGIA (Maternidade Prof. José Maria de Magalhães Netto) Supervisora: Profa. Dra. Rosana Pellegrini Pessoa 3. CARDIOLOGIA Supervisor: Prof. Dr. Gilson Soares Feitosa 4. CARDIOLOGIA PEDIÁTRICA Supervisora: Prof a. Dra. Anabel Góes Costa 5. CLÍNICA MÉDICA Supervisor: Prof. Dr. Jamocyr Moura Marinho 6. CIRURGIA GERAL Supervisor: Prof. Dr. André Ney Menezes Freire 7. CIRURGIA DO APARELHO DIGESTÓRIO Supervisor: Prof. Dr. André Ney Menezes Freire 8. GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA (Maternidade Prof. José Maria de Magalhães Netto) Supervisor: Prof. Dr. Rone Peterson Cerqueira Oliveira 12. NEUROLOGIA Supervisor: Prof. Dr. Pedro Antônio Pereira de Jesus 13. ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA Supervisor: Prof. Dr. Rogério Meira Barros 14. OTORRINOLARINGOLOGIA Supervisor: Prof. Dr. Nilvano Alves de Andrade 15. PNEUMOLOGIA Supervisor: Prof. Dr. Jamocyr Moura Marinho 16. REUMATOLOGIA Supervisor: Prof. Dr. Mittermayer Barreto Santiago 17. UROLOGIA Supervisor: Prof. Dr. Luiz Eduardo Café 9. HEMODINÂMICA E CARDIOLOGIA INTERVENCIONISTA Supervisor: Prof. Dr. José Carlos Raimundo Brito COEDITORES DA REVISTA DE SAÚDE DO HSI ANESTESIOLOGIA Jedson dos Santos Nascimento HEMODINÂMICA E CARDIOLOGIA INTERVENCIONISTA José Carlos Raimundo Brito ÁREA MULTIPROFISSIONAL Patrícia Alcântara Doval de Carvalho Viana MEDICINA INTENSIVA Edson Marques Silva Filho CANCEROLOGIA CLÍNICA Dálvaro Oliveira de Castro Júnior NEONATOLOGIA Rosana Pellegrini Pessoa CARDIOLOGIA Gilson Soares Feitosa NEUROLOGIA Jamary Oliveira Filho CARDIOLOGIA PEDIÁTRICA Anabel Góes Costa ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA Marcos Antônio Almeida Matos CIRURGIA GERAL André Ney Menezes Freire OTORRINOLARINGOLOGIA Nilvano Alves Andrade CIRURGIA DO APARELHO DIGESTIVO André Ney Menezes Freire PNEUMOLOGIA Jamocyr Moura Marinho CLÍNICA MÉDICA Alina Coutinho Rodrigues Feitosa REUMATOLOGIA Mittermayer Barreto Santiago GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA Rone Peterson Cerqueira Oliveira UROLOGIA Luiz Eduardo Café 3 CONSELHO EDITORIAL EDITOR-CHEFE Gilson Soares Feitosa Hospital Santa Izabel - Santa Casa de Misericórdia da Bahia Adriano Santana Fonseca Adriano Dias Dourado Oliveira Adson Roberto Santos Neves Alex Guedes Alina Coutinho Rodrigues Feitosa Ana Lúcia Ribeiro de Freitas Anabel Góes Costa André Ney Menezes Freire Angele Azevedo Alves Mattoso Anita Perpétua Carvalho Rocha de Castro Antônio Carlos de Sales Nery Antônio Fernando Borba Fróes Júnior Antônio Moraes de Azevedo Júnior Augusto José Gonçalves de Almeida Áurea Angélica Paste Bruno Aguiar Cristiane de Brito Magalhães Cristiane Abbhusen Lima Castelo Branco Dálvaro Oliveira de Castro Júnior Daniela Barros Darci Malaquias de Oliveira Barbosa Daniel Santana Farias Daniele Leal Braga da Silva David Greco Varela Edson Marques Silva Filho Elves Anderson Pires Maciel Fábio Luís de Jesus Soares Flávio Robert Sant’ana Gilson Soares Feitosa-Filho Giovanna Lúcia Oliveira Bonina Costa Guilhardo Fontes Ribeiro Gustavo Almeida Fortunato Heitor Ghissoni de Carvalho Humberto Ferraz França de Oliveira Iana Conceição da Silva Ilana D´Andrade Souza Jacqueline Araújo Teixeira Noronha Jamary Oliveira Filho Jamile Seixas Fukuda Jamocyr Moura Marinho Jayme Fagundes dos Santos Filho Jeany de Oliveira Barreto Jedson Nascimento dos Santos Joberto Pinheiro Sena Joel Alves Pinho Filho Jorge Bastos Freitas Júnior Jorge Eduardo de Schoucair Jambeiro José Alves Rocha Filho Lígia Beatriz Wanke de Azevedo Liliana D’Almeida Galrão Lívia Maria Quirino da Silva Andrade Luciane Souza Coutinho Lucimar Soares Garcia Rosa Luís Fernando Pinto Jonhson Luiz Eduardo Fonteles Ritt Marcos Vinícius Santos Andrade Maria do Socorro Albuquerque Miranda Maria Lúcia Duarte Mariana Lesquives Vieira Matheus Tannus dos Santos Maura Alice Santos Romeo Melba Moura Lobo Moreira Nilzo Augusto Mendes Ribeiro Paulo José Bastos Barbosa Pedro Antônio Pereira de Jesus Pepita Bacelar Borges Patrícia Alcântara Doval de Carvalho Viana Patrícia Falcão Pitombo Rajaná Regina Moura Itaparica Reinaldo da Silva Santos Júnior Renato Ribeiro Gonçalves Ricardo Eloy Pereira Rogério Meira Barros Rone Peterson Cerqueira Oliveira Rosalvo Abreu Silva Rosana Pellegrini Sandra Oliveira Silva Sérgio Tadeu Lima Fortunato Pereira Sheldon Perrone de Menezes Ubirajara de Oliveira Barroso Júnior Verusca de Matos Ferreira Viviane Sampaio Boaventura Oliveira 4 EXPEDIENTE SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DA BAHIA Provedor Roberto Sá Menezes Vice-Provedor Luiz Fernando Studart Ramos de Queiroz Escrivão Renato Augusto Ribeiro Novis Tesoureira Ana Elisa Ribeiro Novis Hospital Santa Izabel Superintendente de Saúde Eduardo Queiroz Diretor de Ensino e Pesquisa Gilson Soares Feitosa Diretor Técnico-Assistencial Ricardo Madureira Diretora Administrativa e de Mercado Mônica Bezerra EXPEDIENTE Ag editora Ana Lúcia Martins Vanessa Cerqueira 5 SUMÁRIO 7 Editorial 40 Relato de Caso: Neurologia 8 Atualização de Tema: Anestesiologia 43 Resumo de Artigo: Cardiologia 15 Atualização de Tema: Neurologia 46 Resumo de Artigo: Coloproctologia 22 Atualização de Tema: Ortopedia 49 Resumo de Artigo: Ortopedia 50 Artigo Multiprofissional: Farmácia 53 Protocolo de Atendimento 58 Eventos Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo): relato de caso Joel Alves Pinho 58 Instruções aos Autores Relato de Caso: Cirurgia Errata 26 31 34 37 Dificuldades inerentes à pesquisa médica em seres humanos Gilson Feitosa Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada por tromboelastometria Murilo Pereira Flores Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral isquêmico agudo: um marco histórico Mateus Santana do Rosário Impactos do envelhecimento humano na ORTOPEDIA. A especialidade está preparada? Flávio Robert Santana Atualização de Tema: Pneumologia Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da hipertensão pulmonar Marcel Lima Albuquerque Relato de Caso: Bioimagem Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem contraste: relato de caso Paulo Henrique Muccini Relato de Caso: Cardiologia Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero Adson Neves Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente Gabriel Xavier-Souza Heart Failure Survival Score em pacientes com Doença de Chagas: correlação com variáveis funcionais Marcus V. S. Andrade Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal: considerações técnicas de resultados preliminares da primeira experiência brasileira Luciano Santana de Miranda Ferreira Avaliação dos efeitos da terapia de reposição enzimática na função motora de pacientes com mucopolissacaridoses Marcos Almeida Matos Uso de R-EPOCH em paciente com Linfoma não-Hodgkin da Zona Cinzenta Ludymilla Silva Ramos Batista de Oliveira Na edição passada da Revista de Saúde – Hospital Santa Izabel (ANO 2 / Nº 3 / VOL. 02 / SETEMBRO 2015), na página 47, onde se lê, artigo multiprofissional – Enfermagem. Leia-se, artigo multiprofissional – Psicologia. EDITORIAL Dificuldades inerentes à pesquisa médica em seres humanos Autor: Gilson Feitosa 1 Maria da Consolação é uma jovem senhora de 35 anos, alegre, com a perspectiva de sua primeira gestação. Seu médico é um ativo pesquisador na área de obstetrícia e, durante o acompanhamento do seu processo gestacional, além de lhe explicar os cuidados básicos a serem tomados durante sua gravidez, aventou a possibilidade do seu engajamento num novo estudo, em que se testava a eficácia da aspirina em prevenir pré-eclâmpsia em gestantes de maior risco de aparecimento da condição, como era o seu caso. Sua concordância foi a de tomar um medicamento contendo aspirina ou placebo, sendo-lhe explicado que nem mesmo o médico que lhe prescrevia o medicamento do estudo sabia o seu real conteúdo. Somente quando da conclusão da observação feita ao longo dos meses de acompanhamento e juntando para análise os seus com os demais resultados de muitas outras participantes, seria possível concluir se, de fato, a aspirina tinha sido eficaz em prevenir a pré-eclâmpsia, comparando o número de casos desta ocorrência entre as pacientes que fizeram uso da aspirina e aquelas que fizeram o uso do placebo. Cefaleias eram comuns na vida da Maria e se exacerbaram no início das gestações, ante a expectativa gerada pela nova experiência. Um remédio antigo sempre aliviou sua cefaleia e voltou a ser usado com frequência. Era o Melhoral, que de tão corriqueiro já não era lembrado como medicamento. Tanto assim que seu obstetra a lembrou da inconveniência de usar anti-inflamatórios, chegando a nomear alguns dos mais conhecidos, pela interferência com o objetivo da pesquisa, competindo com a aspirina, se por acaso ela estivesse usando o placebo, ou potencializando a mesma, se esta fosse a opção selecionada. Na lista de medicamentos proibidos não constava o Melhoral e ela tampouco sabia que o mesmo continha o próprio ácido acetilsalicílico. Tal caso aponta para os diversos graus de dificuldade que a pesquisa clínica em seres humanos pode oferecer. O controle de fatores externos se faz de maneira quase absoluta em animais experimentais, frequentemente enjaulados. Não há maneira absoluta de evitar totalmente a possibilidade de vieses em ensaios clínicos. Dentre as mais comuns encontram-se as diversas covariáveis que podem afetar tanto a intervenção como o desfecho que se procura, confundindo os resultados obtidos, sendo os exemplos mais comuns: a idade, o sexo, raça, escolaridade, entre outros. Randomização, mascaramento de investigadores e sujeitos do experimento, e número adequado de participantes no estudo são as medidas que tentam minimizar o efeito de possíveis vieses. No caso aqui exposto, a randomização de um número grande o suficiente de pacientes ofereceria igual oportunidade para desvios semelhantes do protocolo, em ambos os grupos estudados, da aspirina ou do placebo. Ou quando não fosse esse o caso, minimizaria o seu efeito. Tal conhecimento nos deveria remeter à consideração de que conclusões obtidas de ensaios clínicos devam sempre merecer uma análise crítica e eventuais verdades defendidas ardorosamente podem não se confirmar em outros experimentos. 1- Editor RSHSI Endereço para correspondência: [email protected] 7 Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14. Atualização em Anestesiologia Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada por tromboelastometria Murilo Pereira Flores1, Bruno França Guedes1, João Paulo Kerckhof1 Resumo O modelo fisiológico clássico da cascata da coagulação vem sendo questionado por não ser capaz de explicar com a devida abrangência todos os fenômenos do processo da hemostasia in vivo. Para preencher estas lacunas na compreensão dos seus mecanismos, foi desenvolvida a teoria da coagulação baseada em superfícies celulares. Este novo olhar permite uma melhor elucidação da interação entre as vias extrínseca e intrínseca, bem como do papel do componente celular. Diante destes novos conhecimentos, tornam-se ainda mais evidentes as limitações dos testes tradicionais da hemostasia em predizer de forma fidedigna as demandas dos pacientes na vigência de distúrbios hemostáticos perioperatórios. Os testes viscoelásticos, como a tromboelastometria, por sua vez, fornecem uma avaliação mais global, rápida e precisa da coagulação. Deste modo, os algoritmos transfusionais guiados por este método têm representado um importante avanço nesta aérea, permitindo melhor racionalização dos recursos, reduzindo custos e melhorando os desfechos dos pacientes. Palavras-chave: hemostasia, sangramento perioperatório, tromboelastometria Key words: hemostasis, perioperative bleeding, thromboelastometry Introdução Na década de 1960, foi proposto um modelo de cascata para elucidar o processo da coagulação sanguínea, composto por uma série de etapas sequenciais, no qual a ação de um fator leva à ativação do seu subsequente nesta cadeia.1,2 Este modelo está disposto no formato de um ‘Y’, que ilustra a presença de 2 vias, extrínseca e intrínseca, convergindo para uma via co- mum. Por fim, todo este processo culmina na geração de grandes quantidades de trombina, a qual transforma o fibrinogênio em fibrina.3 Embora este conceito da cascata da coagulação tenha levado a um avanço significativo no entendimento deste processo, observações experimentais e clínicas mais recentes demonstram que este modelo clássico não reflete completamente os eventos da hemostasia in vivo. A falha da via extrínseca em compensar uma disfunção na via intrínseca, como é o caso dos hemofílicos, é um exemplo de limitação da teoria clássica da cascata.4 Além disso, já é sabido que estas 2 vias não são independentes nem redundantes, o que não é compatível com a explicação clássica. Diante destas lacunas, em 2001, foi proposto por Monroe e Hoffman um modelo de hemostasia baseado nas superfícies celulares, contemplando o fator celular, que até então não havia recebido a atenção e importância devidas.3 No campo da avaliação laboratorial da hemostasia, o componente celular também não tem sido levado em consideração de maneira adequada. Testes como TP (tempo de protrombina) e TTPa (tempo de tromboplastina parcial ativado) substituem as células por vesículas de fosfolipídios, negligenciando o seu papel na condição in vivo.4 Atualmente, estes testes são considerados fracos preditores de sangramento nos pacientes críticos e submetidos a cirurgias de grande porte. Portanto, são inadequados para monitorização de estados de coagulopatia ou direcionamento da terapia hemostática.5 Por outro lado, testes viscoelásticos realizados à beira-leito, como a tromboelastometria, fornecem medidas em tempo real acerca da formação e dissolução do coágulo.6 Além disso, mostram resultados em curto espaço de tempo (15 a 25 minutos), permitindo ações terapêuticas mais rápidas e eficazes. Com isso, são evitadas transfusões desnecessárias, as quais estão comprovadamente associadas a efeitos adversos, 2015|8 Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14. como infecções nosocomiais, complicações tromboembólicas e lesão pulmonar aguda.5 No cenário perioperatório, a terapia hemostática guiada por tromboelastometria vem demonstrando extrema eficácia, reduzindo a necessidade de transfusão e seus efeitos deletérios, melhorando os desfechos dos pacientes e diminuindo custos.5 Novo modelo da coagulação Frente às inúmeras limitações em explicar fenômenos relacionados à hemostasia in vivo, um novo modelo baseado em superfícies celulares foi proposto. Neste novo modelo, a hemostasia ocorre em um processo passo a passo, regulado por componentes celulares.3 Pode ser dividido em 4 estágios ou fases, e não mais em duas vias. As fases seriam: iniciação, amplificação, propagação e finalização.3,4,7 O objetivo da hemostasia é produzir um “plug” de plaquetas e fibrina para selar a lesão na parede do vaso sanguíneo.3 A iniciação se dá após a lesão endotelial expor FT (fator tecidual) presente em membranas celulares ao redor do leito vascular. O FT liga-se e ativa o FVII (fator VII) presente na circulação sanguínea. Esse complexo formado por FT e FVIIa (fator VII ativado) é responsável por ativar pequenas quantidades de FX e FIX. O FXa associa-se ao seu cofator, FVa, e forma uma protrombinase localizada na superfície da célula que expressa FT. Esta protrombinase é responsável pela conversão de protrombina em trombina. Esta é produzida em quantidades insuficientes para ativar a conversão de fibrinogênio em fibrina.3,4,7 Na fase de amplificação que se segue, a principal função atribuída à trombina produzida durante a fase de iniciação é a ativação máxima das plaquetas, alterando a permeabilidade das mesmas, permitindo a entrada de íons de cálcio e a liberação de substâncias quimiotáticas e fator V. Na superfície das plaquetas ativadas, a trombina ainda atua na ativação dos fatores V, VIII e XI.4 O fator VIIIa dissocia-se do fator de Von Willebrand, permitindo a este mediar a adesão plaquetária ao sítio lesado.3 Durante a fase de propagação, na superfície das plaquetas ativas, o FIXa (produzido na fase de iniciação), associado ao FVIIIa (produzido na fase de amplificação), forma um complexo tenase que ativa FX. Este FXa associado ao FVa forma um outro complexo protrombinase, responsável por produzir um “burst”, ou explosão, de trombina. Esta cliva fibrinogênio em fibrina, que irá polimerizar, com auxílio do fator XIII (também ativado pela trombina), consolidando o tampão plaquetário inicial.3,4,7 O processo de coagulação deve ser autolimitado, a fim de evitar a propagação do mesmo, que poderia levar à oclusão do vaso por trombo.3,4,7 Para desempenhar este papel de limitação do desenvolvimento do coágulo, o organismo lança mão dos mecanismos da fase de finalização. Estão envolvidos neste processo o inibidor da via do fator tecidual, a proteína C, a proteína S e antitrombina.4 Aspectos técnicos da tromboelastometria Os testes laboratoriais tradicionais de avaliação da coagulação, como o TP e TTPa, têm valor limitado para avaliação da coagulação in vivo. Além disto, demandam um longo período para sua realização, tornando-os pouco úteis para o manejo do sangramento perioperatório.8 A necessidade de uma rápida e abrangente avaliação da capacidade hemostática total do paciente tem levado ao desenvolvimento de ensaios globais da hemostasia.8 Dentre estes, destacam-se os testes viscoelásticos. Estes avaliam o processo contínuo da coagulação de uma amostra de sangue total, produzindo uma informação dinâmica sobre o desenvolvimento, estabilização e dissolução do coágulo.5,8 A tromboelastografia foi desenvolvida por Hellmut Hartert em 1948 e incorporada à avaliação perioperatória da coagulação nas últimas décadas. Há atualmente dois tipos de avaliação viscoelastométrica: a tromboelastografia (TEG) e a tromboelastometria rotacional (ROTEM).5,8,9 Apesar de apresentarem o mesmo racional teórico, TEG e ROTEM apresentam características técnicas diferentes e utilizam reagentes diferentes, fazendo com que os resultados dos mesmos não sejam totalmente intercambiáveis. O ROTEM permite diagnósticos mais precoces e prontamente distingue diversos tipos de coagulopatias, como hiperfibrinólise, trombocitopenia, coagulopatia dilucional e a presença de efeito residual de heparina.8 O ROTEM utiliza uma amostra de sangue total citratado, incubado a 37°C, colocado numa cuveta aquecida, dentro da qual é introduzido um pino suspenso, 2015|9 Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14. conectado a um sistema de detecção. À medida que o coágulo se forma, as redes de fibrina transmitem a energia cinética gerada pela rotação da cuveta para o pino. Desta forma, é gerada uma representação gráfica de todo o processo.5,9 (Figura 1) Os principais parâmetros avaliados através do ROTEM são:6,8,9 (Tabela I) 1 - tempo de coagulação (CT): tempo para a amplitude alcançar 2mm; avalia o início da coagulação e depende basicamente do tempo para a formação de trombina. 2 - tempo de formação do coágulo (CFT): tempo necessário para a amplitude aumentar de 2mm para 20mm. Está relacionado à polimerização da fibrina. 3 - ângulo alfa: linha que tangencia a curva a partir do CT. Indica a velocidade de formação do coágulo. Depende da função plaquetária e em menor extensão do fibrinogênio e fatores de coagulação. Figura 1 - Parâmetros medidos pela tromboelastometria. (adaptado de Journal of Cardiothoracic and Vascular Anesthesia 2012;26(6):1083-1093) Para iniciar a coagulação da amostra, é utilizado um reagente. Este pode ser o fator tecidual, que ativa a via extrínseca, sendo este teste denominado EXTEM, ou o ácido elágico, que ativa a via intrínseca, teste denominado INTEM. Reagentes adicionais podem ser utilizados para complementação da análise. O EXTEM pode ser complementado com inibidor de fibrinólise como aprotinina (APTEM) ou inibidor de função plaquetária como citocalasina D (FIBTEM). A análise com INTEM pode ser complementada com adição de heparinase (HEPTEM).5,9,10 (Figura 2) 4 - amplitude 10 (A10): amplitude 10 minutos após o CT; está relacionada à força viscoelástica do coágulo. 5 - firmeza máxima do coágulo (MCF): amplitude máxima do coágulo; depende principalmente da polimerização da fibrina, plaquetas e fator XIII. 6 - lise máxima (ML): percentagem de redução da amplitude 60 minutos após o CT. Uma redução maior que 15% fornece o diagnóstico de hiperfibrinólise. Tabela 1 - Valores de referência da tromboelastometria. (adaptado de Journal of Cardiothoracic and Vascular Anesthesia 2012;26(6):1083-1093) Impacto da tromboelastometria na prática clínica Figura 2 - Traçado tromboelastomérico normal. (extraído de www.rotem.de) A terapia transfusional e a correção de distúrbios da coagulação são determinantes para o desfecho de pacientes submetidos a cirurgias de grande porte. A transfusão de hemoderivados alogênicos está associada a importantes efeitos adversos, como infecções nosocomiais, injúria pulmonar aguda, disfunção de múltiplos órgãos, infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, tromboembolismo e insuficiência renal, bem como aumento na mortalidade.5,11,12,13 O diagnóstico e tratamento precoces das diáteses hemorrágicas é, portanto, fundamental para diminuir tais eventos.12 2015|10 Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14. O uso do ROTEM tem se mostrado uma estratégia extremamentte custo-efetiva. Ele permite o diagnóstico diferencial precoce dos distúrbios de coagulação e terapia alvo-dirigida. Diversos trabalhos mostraram redução das necessidades transfusionais, redução da incidência de complicações associadas à transfusão e melhores desfechos para os pacientes.5 Uma metanálise da Cochran que incluiu 9 ensaios randomizados, com um total de 776 participantes, demonstrou que a terapia transfusional guiada pelo ROTEM resultou em menos sangramento e reduziu a necessidade de transfusão de plaquetas e plasma fresco em cirurgias cardíacas e transplantes hepáticos.12 Uma revisão envolvendo 12 trabalhos sobre uso de tromboelastometria em pacientes submetidos a cirurgia cardíaca mostrou redução no uso de hemoderivados, mas ainda com evidências limitadas quanto aos desfechos clínicos dos pacientes.13 Um estudo prospectivo com 71 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca de urgência, guiado por tromboelastometria, demonstrou redução na mortalidade.11 Já um estudo alemão comparando o uso de hemoderivados antes e após a implementação de terapia guiada por ROTEM, envolvendo um total de 1.422 pacientes (sendo 729 antes e 693 após) demonstrou que os custos com hemoderivados no tratamento perioperatório de desordens da coagulação foi reduzido em 32% com o uso do ROTEM. Entre as reduções destacam-se diminuição de 25% de transfusões de concentrados de hemácias, 50% de plaquetas e 80% de plasma fresco. Esta redução compensou claramente o custo para a implementação do método.14 boelastometria pode ser uma técnica útil no manejo destes pacientes.18 Nos pacientes politraumatizados, ele também pode ser utilizado para diagnóstico de coagulopatia, auxiliando o manejo dos pacientes, podendo estar associado a melhores desfechos.19 Terapia hemostática guiada por tromboelastometria Na atualidade, existem basicamente três estratégias para o manejo das coagulopatias no cenário perioperatório e do trauma. A primeira delas é conhecida como “ressuscitação por controle de danos”, que orienta a transfusão preemptiva de plasma fresco e concentrado de plaquetas conforme a demanda por concentrado de hemácias na proporção de 1:1:1.5 Esta abordagem foi originalmente implementada em cenários de campos de batalha, nos quais os recursos diagnósticos e terapêuticos são limitados, objetivando evitar retardo na terapia transfusional.6 A segunda estratégia descrita é orientada por testes hemostáticos convencionais, como o TP e o TTPA. Entretanto, estas ferramentas não são capazes de predizer adequadamente e em tempo hábil a real demanda do paciente na vigência do distúrbio de coagulação.5 A terceira estratégia, por sua vez, prevê a implementação da tromboelastometria para guiar a hemoterapia perioperatória, já que permite uma avaliação rápida e precisa da função hemostática, individualizando a abordagem, melhorando desfechos e reduzindo custos, como demonstrado anteriormente.6 (Figuras 3 e 4) Outro estudo, prospectivo e randomizado, envolvendo 100 pacientes submetidos a cirurgias cardíacas complexas, comparando a terapia convencional com a terapia guiada por tromboelastometria, demonstrou uma redução na taxa de transfusão de hemoderivados, bem como redução no tempo de ventilação mecânica, tempo de permanência em UTI e mortalidade após 6 meses.15 Frente à crescente produção de trabalhos mostrando a avaliação perioperatória dos distúrbios hemorrágicos pelo ROTEM, a terapia transfusional guiada já é recomendada pelas principais sociedades de anestesiologia, a Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA) e a Sociedade Europeia de Anestesiologia (ESA).16,17 Em outros cenários que não apenas o sangramento perioperatório, o ROTEM tem sido avaliado para diagnóstico de coagulopatia. Em pacientes com sepse/ SIRS, tanto um estado de hipercoagulabilidade quanto de hipocoagulabilidade pode estar presente, e a trom- Figura 3 - Exemplos de traçados tromboelastométricos anormais: (A) distúrbio plaquetário; (B) deficiência de fibrinogênio; (C) hiperfibrinólise; (D) efeito da heparina. (extraído de www.rotem.de) 2015|11 Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14. Figura 4 - Proposta de algoritmo para terapia hemostática perioperatória. Esta terapia hemostática guiada já é recomendada pela Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA) e pela Sociedade Europeia de Anestesiologia (ESA) nos seus guidelines para manejo do sangramento perioperatório.16,17 Em termos práticos, o uso da tromboelastometria deve ser considerado em cirurgias de grande porte com possibilidade de coagulopatia. É importante ressaltar que as intervenções terapêuticas devem ser implementadas apenas se o quadro clínico do paciente for compatível com os achados laboratoriais. A presença de achados tromboelastométricos normais associada a sangramento perioperatório clinicamente evidente deve levantar a suspeita de causa cirúrgica, apontando para a necessidade de intervenção imediata.5,6,10 Como regra geral, em qualquer situação com possibilidade de distúrbios hemostáticos, a primeira ação profilática e terapêutica deve ser garantir a estabilização das condições basais determinantes para a hemostasia, como a temperatura corporal, o pH sanguíneo e a concentração sérica do cálcio ionizado.5 Como ponto de partida na avaliação, deve-se analisar os traçados do EXTEM e INTEM, que avaliam respectivamente as vias extrínseca e intrínseca da coagulação.5 O MCF está relacionado à função plaquetária e do fibrinogênio. Para fazer o diagnóstico diferencial, devese comparar o MCF do EXTEM com o MCF do FIBTEM. Quando o último também está diminuído, trata-se de uma disfunção do fibrinogênio, seja quantitativa ou qualitativa, ou até mesmo, raramente, à deficiência do fator XIII, que tem importante papel na polimerização da fibrina.5 Atualmente, sabe-se que o MCF pode ser substituído por um parâmetro ainda mais precoce, o A10, aumentando a agilidade na obtenção do diagnóstico.20 Se o MCF do FIBTEM estiver normal, o diagnóstico mais provável é uma deficiência plaquetária, qualitativa ou quantitativa.5 É importante salientar que, no contexto da cirurgia cardíaca, as amostras para o EXTEM e o FIBTEM já podem ser coletadas antes da infusão da protamina, uma vez que não sofrem influência do efeito da heparina.6 Desta forma, o fibrinogênio ou o crioprecipitado podem ser preparados e administrados de forma mais precoce, caso seja necessário. O achado de um CT prolongado no EXTEM e normal no INTEM aponta para uma deficiência nos fatores de coagulação dependentes da vitamina K, que devem idealmente ser repostos com concentrado de complexo protrombínico ou, alternativamente, plasma fresco.5,6,10 Por outro lado, a presença de um CT prolongado no INTEM e normal no EXTEM aponta para 2 possibilidades: neutralização insuficiente da heparina ou deficiência de fatores da coagulação da via intrínseca. Para fazer esta diferenciação, deve-se lançar mão do HEPTEM. Se o CT for normal neste traçado, está confirmado o efeito residual da heparina. Se for igualmente prolongado, deve-se repor estes fatores de coagulação com plasma fresco.5,10 É importante frisar que o uso de protamina em excesso também pode levar a um distúrbio hemostático clinicamente relevante, levando a um prolongamento do CT no INTEM de forma semelhante à heparina.6 Caso o paciente apresente uma deficiência na via intrínseca associada ao efeito residual da heparina, o CT do INTEM e HEPTEM estarão prolongados, entretanto, no HEPTEM, este será menor.5 Outro parâmetro importante a ser avaliado é a lise máxima em 60 minutos (ML) no EXTEM. Este reflete o efeito do sistema fibrinolítico sobre o coágulo. Caso seja maior que 15%, o diagnóstico provável é de hiperfibrinólise. O achado de um ML normal no APTEM confirma a hipótese e indica a necessidade do uso de antifibrinolítico. Caso o ML no HEPTEM permaneça alterado, pode-se tratar de deficiência do fator XIII ou disfunção plaquetária.5,6 É importante diferenciar adequadamente uma hiperfibrinólise patológica da retração normal do coágulo, que é representada por um ML menor que 15%.10 Uma limitação importante da tromboelastometria diz respeito à avaliação da hemostasia primária. A coagulopatia decorrente da doença de von Willebrand ou do uso de medicações antiplaquetárias (ácido acetilsalicílico, 2015|12 Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14. clopidogrel, abciximabe, dentre outras), por exemplo, pode não ser evidenciada por este método.5 Entretanto, na vigência de um MCF normal no EXTEM, a ocorrência de plaquetopenia menor que 50.000/mm3 é pouco provável, não podendo se afastar desordens funcionais.6 Conclusão A evolução do conhecimento acerca dos mecanismos da coagulação in vivo tem possibilitado um melhor entendimento do papel de cada componente neste complexo sistema, sobretudo o componente celular, bem como a interação entre eles. Atualmente, a melhor ferramenta disponível para avaliar este processo de forma rápida e eficiente é a tromboelastometria, a qual fornece dados extremamente relevantes para o diagnóstico diferencial das coagulopatias no cenário perioperatório. Já é consenso na literatura que testes como TP e TTPA são inadequados para guiar a terapia hemostática perioperatória. Por outro lado, algoritmos transfusionais baseados na tromboelastometria proporcionam uma melhor otimização do tratamento e racionalização no uso dos recursos disponíveis. Esta estratégia reduz a necessidade de transfusão de hemocomponentes, bem como seus efeitos deletérios, e melhora os desfechos dos pacientes, além de reduzir custos. Referências 1. Macfarlane RG. An enzyme cascade in the blood clotting mechanism, and its function as a biological amplifier. Nature 1964;202:498–9. 2. Davie EW, Ratnoff OD. Waterfall sequence for intrinsic blood clotting. Science 1964;145:1310-2. 3. Hoffman M, Monroe DM. Coagulation 2006: A Modern View of Hemostasis. Hematol Oncol Clin N Am 2007;21:1-11. 4. Ferreira CN, Sousa MO, Dusse LMS, et al. O novo modelo da cascata de coagulação baseado nas superfícies celulares e suas implicações. Rev Bras Hematol Hemoter 2010;32(5):416-421. ma. Journal of Cardiothoracic and Vascular Anesthesia 2012;26(6):1083-1093. 7. Sucker C, Zotz RB. 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Sua fisiopatologia consiste em diminuição de fluxo sanguíneo para determinada área cerebral, seja por embolia à distância, formação de placa aterosclerótica, alteração de pequenos vasos ou qualquer outra condição que propicie fenômenos trombóticos. Suas manifestações clínicas são variadas e dependem de qual área do sistema nervoso foi afetada2. Por ser uma entidade incapacitante, diversas terapias voltadas para a restauração do fluxo sanguíneo em tempo hábil, a fim de que não ocorra dano cerebral permanente, têm sido propostas. A terapia de reperfusão na prática clínica teve seu início após o estudo NINDS3. Nesse estudo, o grupo de paciente que usou o ativador de plasminogênio tecidual recombinante (rt-PA), comparado ao grupo placebo, teve melhora dos desfechos clínicos em 3 meses, quando a terapia era realizada em 3 horas. Outros estudos como o STARS, SITS-MOST e ECASS III corroboraram com tal evidência, além do último ter provado que a ampliação do tempo do início dos sintomas até o inicio da trombólise para 4,5 horas era viável, segura e efetiva 4–7. Entretanto, apesar do avanço conseguido até então, a trombólise venosa sofre restrições devido a sua janela terapêutica limitada, contraindicações (como cirurgias recentes, uso de anticoagulantes orais, história de sangramento intracraniano) e ação trombolítica limitada nas oclusões de grandes artérias cerebrais, que correspondem a dois terços dos casos de AVC de circulação anterior e denotam as maiores taxas de incapacidades e mortalidade8,9 . Em 2015, houve uma mudança de paradigmas quanto ao tratamento do AVC isquêmico agudo quando o estudo holandês MR CLEN mostrou uma redução sig- nificativa de incapacidades em 90 dias, após comparar a terapia padrão com rt-PA venoso com a terapia associada rt-PA venoso e trombectomia mecânica10. Desde então, diversos outros estudos tiveram que acessar seus dados a fim de avaliar a segurança dos sujeitos em seus estudos. Desde então, incluindo o MR CLEAN, cinco trabalhos foram publicados em periódicos de alto impacto, todos mostrando benefício da terapia endovascular quando comparada à terapia padrão nos casos de AVC isquêmico com oclusão de grandes artérias, culminando com modificação do nível de evidência da terapia endovascular no AVC isquêmico agudo10–15. REVISÃO DA ANATOMIA DA CIRCULAÇÃO CEREBRAL Quatro grandes artérias são as principais fontes de irrigação do cérebro: duas carótidas e 2 vertebrais. Pode-se dividir, anatomicamente, as circulações como anterior (sistema carotídeo) e posterior (sistema vértebro-basilar), que irrigam diferentes partes do cérebro. Sintomas específicos podem denotar, a partir apenas das manifestações clínicas, qual sistema vascular está alterado. Essas artérias ascendem a partir da aorta e seus ramos principais e entram no crânio formando uma complexa rede vascular com anastomoses entre si [FIGURAS 1 E 3]. A circulação anterior tem como suas artérias principais as carótidas internas (ACI). Elas derivam da bifurcação das carótidas comuns, entram no canal carotídeo do osso temporal e se subdividem, didaticamente, em partes petrosa, cavernosa e craniana16. Sua porção craniana, por fim, subdivide-se em artéria cerebral anterior e artéria cerebral média. Interrupção do fluxo nessa artéria denota doença extremamente grave. A artéria cerebral anterior (ACA) irriga a porção ântero-medial do cérebro (FIGURA 1) e possui as divi2015|15 Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21. sões anatômicas a seguir: A1, da terminação da artéria carótida interna até a junção com a comunicante anterior; A2, término de A1 até a origem da artéria calosomarginal; A3, a partir do final de A2 até suas porções terminais16 [FIGURA 2]. A artéria cerebral média (ACM) é o ramo mais calibroso da artéria carótida interna. Irriga a face súpero-lateral do telencéfalo (hemisférios cerebrais), sendo a mais importante artéria craniana. Subdivide-se em: M1 da terminação da ACI até a bifurcação (ou trifurcação); M2: segmento que corre lateral à fissura de Sylvius (sulco lateral); M3: parte que sai da lateral da fissura sylviana; M4: são as porções corticais16 [FIGURA 1]. A circulação posterior constitui-se do sistema vértebro-basilar. As 2 artérias vertebrais ascendem a partir das artérias subclávias, quando se juntam na transição bulbopontina para formar a artéria basilar. As artérias vertebrais e a basilar, juntamente com seus ramos, irrigam o tronco encefálico, cerebelo e parte posterior do cérebro [FIGURA 3]. Os ramos terminais do sistema vértebro-basilar são as artérias cerebrais posteriores. Estas subdividem-se em P1, da bifurcação da basilar até a artéria comunicante posterior; P2, da comunicante posterior até a cisterna perimesencefálica; P3 até o final do sulco calcarino. [FIGURA 3]16. Percebe-se, então, que a partir de lesões arteriais específicas diversos sintomas podem ter sua gênese no AVC isquêmico. Lesões em artérias mais proximais, como a ACI e artéria basilar, podem ter consequências catastróficas e, portanto, terapias efetivas devem ser implementadas para evitá-las. ESTUDOS EM TERAPIA ENDOVASCULAR PARA AVC ISQUÊMICO A terapia endovascular consiste na utilização de dispositivos que são introduzidos no sistema arterial, em sala de hemodinâmica, utilizando-se da arteriografia digital por subtração como navegador anatômico. O restabelecimento do fluxo sanguíneo pode ser realizado através da liberação do trombolítico “in loco” (trombólise intra-arterial), onde se observa a interrupção do fluxo sanguíneo na arteriografia, ou através da remoção do trombo através de catéteres específicos (trombectomia mecânica). Os dispositivos podem ser por retração por mola (eg. MERCI – dispositivos de 1ª geração), dispositivos de aspiração (eg. PENUMBRA – 2ª geração) ou os mais recentes stents retráteis (eg. SOLITAIRE FR – 3ª geração). Os dispositivos de última geração têm taxas de recanalização maiores que os primeiros17. O uso da terapia endovascular foi estudada com os estudos PROACT I e PROACT II18,19. Nesses estudos, o inibidor do plasminogênio tecidual pro-uroquinase foi liberado através de catéter de terapia endovascular. Essa medida foi mais eficaz quando comparada com o placebo em pacientes com oclusão de ACM em até 6 horas do início dos sintomas, com taxas de recanalização (TICI 2-3) de 66%. Frente a esses estudos, surge uma nova maneira de se tentar a reestruturação do fluxo sanguíneo, além da trombólise venosa convencional, e por muito tempo esta estratégia fora utilizada em casos não elegíveis ao tratamento convencional. Em 2013, três estudos frustraram os entusiastas sobre a terapia endovascular. O SYNTHESIS-EXP, IMS 3 e MR RESCUE falharam em demonstrar benefício da trombectomia mecânica sobre a terapia padrão 20–22. Diversas críticas convergiram nesses três estudos. O SYNTHESIS-EXP, que randomizou paciente para trombectomia mecânica, comparando à terapia padrão, falhou provavelmente por não exigir nenhum protocolo concernente à terapia endovascular, não selecionar os pacientes comprovadamente com oclusão de grandes artérias e por usar catéteres de tecnologia anterior (MERCI). Havia também uma demora na randomização do grupo intervenção, selecionando-o mais tardiamente, o que poderia ter comprometido os desfechos em longo prazo22. A utilização da seleção dos pacientes por imagem de penumbra (tecido ainda viável) foi um marco do MR RESCUE. Entretanto, o mesmo não obteve resultados positivos. A utilização de catéteres de gerações anteriores (MERCI ou PENUMBRA), além do início tardio para o início da terapia (mediana de 5,5 horas), pode ter contribuído com esses desfechos, haja vista que a taxa de recanalização (TICI 2b/3) foi de apenas 27%20. No mesmo ano (no mesmo número do periódico), era publicado o IMS III 21. Este foi um grande estudo, realizado nos Estados Unidos, envolvendo 656 pacientes randomizados de maneira 2:1 para terapia endovascular mais trombólise venosa ou trombólise venosa isolada. Este estudo também mostrou-se incapaz de mostrar benefício da estratégia endovascular sobre a trombólise venosa isolada. Entretanto, análises de subgrupo neste estudo já mostravam uma tendência de benefício quando a embolectomia era realizada em tempos menores (em menos de 90 minutos após a realização do rt-PA) 2015|16 Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21. ou quando o trombolítico era realizado abaixo de 60 minutos dos sintomas. Os motivos de não serem mostrados benefícios da terapia em teste eram semelhantes aos dos estudos anteriores supracitados: uso de catéteres de tecnologia anterior (Merci e Penumbra), a despeito do uso de catéteres retráteis (Solitaire FR – 1,5% de uso neste estudo); tempo prolongado para o início da terapia endovascular; seleção de pacientes não baseada na identificação de oclusão de grandes artérias (critério de seleção por imagem)15. MR CLEAN: O marco histórico para terapia endovascular em AVCi agudo Apesar dos estudos de 2013 se mostrarem frustrantes no que tange o uso da embolectomia em AVCi agudo, os dados do IMS III21, além de diversos outros pequenos estudos sobre este tema23 suscitaram, a realização de trabalhos mais elaborados, com seleção de pacientes mais adequada (seja através da confirmação de oclusão de grandes artérias a partir de estudo de vasos por TC ou RNM, no momento da entrada na emergência ou com atenção maior para técnicas de identificação precisa da área de penumbra isquêmica e “core” isquêmico). Teve-se atenção maior para implementação mais rápida da terapia endovascular nos pacientes selecionados e também o uso de técnicas e dispositivos mais avançados, a fim de se obter uma reperfusão mais rápida e bem-sucedida10. Eis que surge o MR CLEAN, apresentado no 9th World Stroke Congress (WSC), em outubro de 2014, em Istambul, onde seus autores conseguem mostrar o benefício da terapia endovascular sobre a trombólise venosa nos pacientes com AVCi agudo e com oclusão proximal de grandes artérias da circulação anterior. Tal apresentação trouxe impacto relevante na comunidade científica e sobre os outros estudos em terapia endovascular que estavam em curso: todos tiveram que analisar seus resultados interinamente, a fim de avaliar a eficácia e a segurança dos pacientes24. Publicado em janeiro de 2015 (onlinefirst em dezembro de 2014), no New England Journal of Medicine (NEJM), o MR CLEAN, que fora um estudo multicêntrico conduzido na Holanda, analisou 500 pacientes randomizados em 1:1 para a trombólise venosa associada à terapia endovascular. Os pacientes que eram randomizados para o grupo intervenção deveriam ser passíveis de tratamento em até 6 horas do início dos sintomas, ter oclusão proximal (M1 ou M2) da artéria cerebral média ou anterior (A1 ou A2) comprovadas a partir de angiografia por tomografia computadorizada (angioTC), por ressonância nuclear magnética (angioRNM) ou arteriografia digital por subtração (ADS). Seu desfecho principal era a análise da escala de Rankin modificada, uma escala de 7 pontos que varia de 0 (sem sintomas) até 6 (morte), sendo que um escore entre 0-2 significa independência funcional25. O quadro clínico do paciente com acesso a escalas funcionais (mRs, NIHSS) no dia da randomização, 24 horas e de 5-7 dias ou na alta. As avaliações 90 dias após o ictus eram feitas a partir de entrevistas por telefone com pacientes ou cuidadores. As imagens eram avaliadas considerando a TC do baseline através do ASPECTS (Alberta Stroke Program Early Computed Tomography Score), um escore que varia de 0-10, onde 1 ponto é tirado a partir da evidência de isquemia em áreas predefinidas. As angioTC, angio RNM e ADS eram avaliadas no baseline e 24 horas após para avaliação de reperfusão. A terapia mecânica foi utilizada em 84% do grupo randomizado para a intervenção e o uso de catéteres de nova geração foi utilizado em 81,5%. O grupo intervenção teve uma melhora importante dos desfechos em todas as categorias de mRs, exceto por morte (mRs 6). Houve uma redução de risco absoluto para desfecho favorável (mRs 0-2) entre os grupos de 13,5%, com um número necessário para tratar (NNT) de 8%. Os escores NIHSS foram menores, em média 2,9 pontos no grupo intervenção 5-7 dias após os eventos. Evidências de recanalização no momento da trombectomia (TICI 2b/3) foram evidenciadas apenas em 58,7% dos pacientes. Entretanto, a evidência de recanalização após 24 horas (avaliada pela angioTC) foi observada em 75,4% no grupo intervenção e em 32,9% no grupo trombólise isolada. Houve também diminuição do volume do infarto no grupo intervenção. Os eventos adversos graves em 90 dias não diferiram entre os grupos. Tais dados mostram que a terapia endovascular por trombectomia mecânica para os pacientes com AVCi agudo com evidência de oclusão proximal de grandes artérias e elegíveis para realização do tratamento em 6 horas é viável, eficaz e segura e deve, portanto, ser realizada nos centros em que tal estratégia é disponível10. ESCAPE, EXTEND IA, REVASCAT E SWIFT-PRIME: perpetuação da evidência de benefício da terapia endovascular 2015|17 Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21. Após a divulgação dos resultados apresentados em outubro de 2014, no 9th World Stroke Congress, os estudos em andamento sobre terapia endovascular tiveram que analisar seus resultados interinamente, a fim de avaliar a eficácia e segurança dos pacientes no estudo. ESCAPE Estudo realizado no Canadá (e com centros no Canadá, EUA e Europa), o ESCAPE publicado em fevereiro de 2015, na NEJM, era focado em pacientes com AVCi com menos de 12 horas de início de sintomas, porém selecionados a partir de critérios de imagem (ASPECTS e angioTC para confirmação de oclusão proximal). Eram esperados 500 pacientes para o início da análise, entretanto, devido aos resultados do MR CLEAN, 315 pacientes foram analisados. Este estudo prezou pela rapidez da instituição da terapia, com metas de 60 minutos para a punção arterial e de 90 minutos para a reperfusão a partir da primeira imagem de TC. A mediana de tempo neste estudo da primeira imagem de TC para a punção arterial foi de 51 minutos. Quando analisados os desfechos primários (mRs 0-2 em 90 dias) houve uma redução de risco absoluto de 24%, tendendo ao grupo intervenção com um NNT de 4. Não houve diferença estatística entre os desfechos de segurança e neste estudo pode-se observar uma redução de mortalidade significativa no grupo intervenção (10,4% X 19%)11. EXTEND IA O EXTEND IA, este é um estudo de fase II, foi também publicado em fevereiro de 2015, no NEJM, e contou apenas com 70 pacientes para análise, devido às questões de segurança após a publicação do MR CLEAN. Para a seleção dos pacientes foram utilizados critérios semelhantes aos estudos anteriores para comprovação de oclusão proximal em grandes artérias. Entretanto, o mesmo inovou com a seleção de pacientes baseada numa técnica automatizada baseada em TC para avaliação de tecido viável (RAPID, versão não comercial de pesquisa, Universidade de Stanford). Esta técnica também permite avaliar as taxas de reperfusão após a implementação da terapia escolhida. Tal estratégia pode melhorar os desfechos, uma vez que seleciona os pacientes que se beneficiariam realmente da terapia de reperfusão e excluiria os pacientes com grandes áreas de tecido não viável, prevenindo assim complicações inerentes ao tratamento (hemorragia e uso de contraste de maneira indevida)12. O benefício da terapia endovascular também foi comprovado neste pequeno estudo, com 71% dos pacientes com mRs 0-2 em 90 dias, comparados com 40% no grupo controle (NNT = 4). Neste estudo, os tempos para o início da terapia de reperfusão (seja ela a venosa ou trombectomia mecânica) foram bastante reduzidos (mediana do início do AVCi até reperfusão com sucesso – TICI 2b/3 = 248 minutos; mediana do início da punção arterial até reperfusão com sucesso – 43 minutos). Esta rapidez pode ter desempenhado papel importante no alcance dos desfechos primários. Houve também uma das maiores taxas de reperfusão no momento da terapia endovascular (TICI 2b/3 86%), além de uma taxa de reperfusão em 24 horas, comparando-se as imagens iniciais de angioTC com as de 24 horas do tratamento de 100% no grupo intervenção. Este estudo também se utilizou de 100% de catéteres de última geração (Solitaire FR)12. REVASCAT Em abril de 2015, outro estudo conduzido em Barcelona, o REVASCAT, randomizou 206 pacientes, que poderiam chegar em até 8 horas do início dos sintomas, entre a trombectomia mecânica com o catéter Solitaire FR ou terapia com rt-PA isolada. O estudo era previsto para 690 pacientes, entretanto, fora terminado precocemente, como os estudos anteriores, por motivos já supracitados. Os pacientes eram selecionados para o tecido cerebral viável, através do escore ASPECTS, e as oclusões proximais, confirmadas por angioTC ou angioRNM13. Os desfechos primários para este estudo eram semelhantes aos anteriores. O grupo intervenção, atingiu desfechos para independência funcional (mRs 0-2) em 90 dias em 43,7% dos casos, comparados a 28,2% no grupo controle (NNT 6,5). No grupo intervenção 65,7% dos pacientes tiveram reperfusão com sucesso (TICI 2b/3). Os desfechos de segurança também não diferiram entre os grupos neste estudo13. SWIFT-PRIME Por fim, foi publicado também no NEJM, em abril de 2015, o SWIFT-PRIME, estudo multicêntrico conduzido em 39 centros nos EUA e Europa. Os pacientes selecionados deveriam ter o local de oclusão proximal confirmado por angioTC ou angioRNM e eram alocados para o grupo intervenção (trombectomia com o catéter Solitaire FR) ou terapia trombolítica isolada14. 2015|18 Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21. Dos pacientes que foram submetidos à trombectomia mecânica, 60% estavam independentes funcionalmente em 90 dias, comparados com 35% do grupo controle (RRA = 25%; NNT =4). Reperfusão com sucesso foi atingida em 88% dos pacientes do grupo trombectomia (TICI 2b/3). Os tempos para intervenção neste estudo também foram bastante animadores: 224 minutos do ictus até a punção arterial; 77 minutos do rt-PA até a punção arterial e 57 minutos da imagem inicial até a punção arterial14. Não houve, em semelhança com os outros estudos, diferenças de mortalidade ou de eventos adversos entre os grupos estudados. pacientes e na organização dos serviços que lidam com essa modalidade de doença. Figuras Figura 1 - Áreas de irrigação das principais artérias cerebrais CONSIDERAÇÕES FINAIS Por ser uma doença prevalente e incapacitante, terapias na tentativa de diminuição de sequelas neurológicas em pacientes acometidos por AVCi são indispensáveis. No início dos anos 90, os estudos que implementaram o uso do rt-PA modificaram expressivamente a visão e a instituição de cuidados aos pacientes com AVCi3,6,7. Entretanto, apesar do benefício inquestionável do uso da trombólise venosa em AVCi hiperagudo (com janela entre 3-4,5 horas), muitos pacientes ainda pendiam de ser beneficiados, seja por chegarem à emergência fora da estreita janela de trombólise venosa, seja por contraindicações ao uso da terapia ou por fatores relativos à localização da oclusão2,9,15. Apesar dos resultados iniciais frustrantes, a trombectomia mecânica para pacientes selecionados (oclusão proximal de grandes artérias e com pequeno “core” isquêmico) se mostrou uma terapia viável, eficaz e segura. Pacientes que outrora não se beneficiariam da terapia de reperfusão com trombolítico venoso, como aqueles que tivessem fora da janela de 4,5 horas, ou estivessem em uso de anticoagulantes (ou outras contraindicações, a trombólise venosa), atualmente podem se beneficiar desta nova modalidade terapêutica. A tabela 1 mostra o desfecho agrupado dos principais estudos que mostram a eficácia da trombectomia e o impacto na qualidade de vida dos pacientes submetidos a essa técnica. Ainda há muito a ser estudado no que concerne às técnicas para trombectomia mecânica, uso de novos catéteres, tempo para implementação da terapia e uso em outras situações (“wake-upstroke” , tempo prolongado de ictus, seleção de pacientes por métodos mais avançados)15,26. Pode-se dizer, portanto, que em 2015 vivenciamos mais uma mudança de paradigma para o tratamento do AVCi hiperagudo e que, sem dúvidas, estes novos estudos e novas evidências trarão impacto no manejo desses Artéria Cerebral Anterior Artéria Cerebral Média Artéria Cerebral Posterior Modificado do Netter Atlas of Neuroanatomy and Neurophysiology. 2002. Figura 2 - Irrigação cerebral: circulação anterior Artéria Cerebral Anterior Artéria Cerebral Média Modificado do Netter Atlas of Neuroanatomy and Neurophysiology. 2002. 2015|19 Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21. Figura 3 - Irrigação do cérebro: circulação posterior 4. GW A, VE B, WM C, Bell R, Verro P, SA H. Intravenous tissue-type plasminogen activator for treatment of acute stroke: The standard treatment with alteplase to reverse stroke (stars) study. JAMA. 2000;283(9):1145-1150. http://dx.doi.org/10.1001/ jama.283.9.1145. Artéria Cerebral Posterior Artéria Basilar Artérias Vertebrais Modificado do Netter Atlas of Neuroanatomy and Neurophysiology. 2002. TABELAS Tabela 1 - Comparação dos desfechos nos 5 estudos mais recentes em terapia endovascular para AVCi agudo. MR CLEAN EXTENDIA ESCAPE REVASCAT 500 70 315 206 196 mRs 0-2 – controle 19,1% 40% 29,3% 28,2% 35% mRs 0-2 endovascular 32,6% 71% 53% 43,7% 60% TICI 2b-3 58,7% 86% 72,4% 65,7% 88% 8 4 4 6,5 4 N (randomizados) SWIFT PRIME Resultados NNT mRs em 90 dias 1587. doi:10.1056/NEJM199605233342114. mRs – Escala de Rankin modificada; TICI – Trombólise no infarto cerebral; NNT – número necessário para tratar REFERÊNCIAS 1. Almeida SRM. Análise epidemiológica do acidente vascular cerebral no Brasil. Rev Neurociências. 2012; 20 (4): 481-482. doi: 10.4181/RNC. 2012. 20. 483 ed. 2p. 2. Biller J, Love BB, Schneck MJ. 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Mesmo em países em desenvolvimento, como o Brasil, a vida média está chegando perto dos 75 anos. Em países mais desenvolvidos, entretanto, esta temática tem sido ponto importante da agenda social e econômica há muito mais tempo. A crise financeira da previdência social assume destaque especial, tendo em vista que o número de pensionistas (aposentados) vem crescendo ano a ano e o número de trabalhadores contribuintes, ao contrário, vem diminuindo. Neste contexto temos a eterna briga que põe, de um lado, as iniciativas sociopolíticas governamentais para alterar a idade da aposentadoria (novas regras de cálculos, etc) e a reação da sociedade organizada, que pleiteia proventos como políticas sociais compensatórias. O problema é matematicamente simples: se os governantes não tomarem cuidado, em pouco tempo não haverá recursos para pagar os aposentados e isso será o CAOS DO ENVELHECIMENTO! Esta situação exige discernimento e clarividência da classe governante para encontrar medidas de equilíbrio, mas estas não são qualidades comumente observadas nos gestores, nem da previdência e nem da saúde. Mas, não vamos mais divagar nesta linha, para que não saiamos do nosso propósito. Vamos nos ater ao lado médico, apresentando as múltiplas condições de saúde, que também se agigantam com o envelhecimento e para as quais os gestores deveriam estar preparados. Comecemos pelas morbidades clínicas de alta prevalência: o brasileiro está ficando obeso, diabético e hipertenso e, evidentemente, esses fatores na terceira idade vão acarretando consequências cada vez mais complexas. Por este motivo, os governos federal e estaduais já gastam milhões fornecendo não só tra- tamento, mas também algumas drogas, gratuitamente, para o controle destas condições na população carente. Isto nem de longe cobre o total de gastos que um idoso tem para comprar mensalmente todo medicamento que precisa, ficando o resto por conta própria. Mas, chegando na ORTOPEDIA, os dois grandes problemas que afetam os idosos são a OSTEOPOROSE e a OSTEOARTROSE. A última destas é a doença articular mais comum no mundo, afetando aproximadamente cerca de 10 a 15% das pessoas do planeta sem considerar a idade, mas com taxa de 60% em mulheres e 70% em homens acima de 65 anos1. A OSTEOPOROSE, por sua vez, é uma doença osteometabólica, caracterizada por diminuição da massa óssea e deterioração da microarquitetura do tecido ósseo com consequente aumento da fragilidade óssea e da susceptibilidade a fraturas2 (ver detalhe na figura 1). Figura 1 - Tecido ósseo normal (sólido) e osteoporótico (fraco), susceptível a fraturas do colo femoral. Estima-se que cerca de 50% das mulheres e 20% dos homens com idade igual ou superior a 50 anos sofrerão uma fratura osteoporótica ao longo da vida. Apro- 2015|22 Santana, FR et al. Impactos do envelhecimento humano na ortopedia. A especialidade está preparada? Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 22-25. ximadamente, 5% dos indivíduos que apresentam fratura de quadril morrem durante a internação hospitalar, 12% morrem nos 3 meses subsequentes e 20% morrem no ano seguinte ao da fratura, conforme dados norte-americanos3. É, pois, sobre esta verdadeira epidemia, a osteoporose e suas consequências em populações mais idosas, que queremos nos deter. É nosso objetivo despertar a atenção para os seus principais aspectos e também apresentar um panorama local desta realidade, que deixa evidente a fragilidade dos gestores em lidar com este grave problema de saúde pública do idoso. Características clínicas da osteoporose Para compreender a fisiopatologia da osteoporose deve-se ter em mente que o osso não é uma estrutura estática, mas encontra-se submetido a uma constante remodelação. O equilíbrio entre a formação e a reabsorção óssea depende do funcionamento adequado dos osteoclastos e osteoblastos. Na osteoporose senil ocorre diminuição da atividade osteoblástica, aumento na atividade osteoclástica ou de uma combinação de ambas. A menor atividade física associada ao envelhecimento, imobilização ou paralisia eleva ainda mais o ritmo da perda óssea. As mulheres estão em especial risco, pois após a menopausa diminuem drasticamente o nível de hormônios sexuais. Baixos níveis de estrógeno resultam em maior secreção de IL-1, que é conhecido como estimulador mais potente dos osteoclastos4. O diagnóstico da osteoporose é dado pela densidade mineral óssea medida pela absormetria radiológica de dupla energia ou DEXA (DualEnergy X-ray Absorptiometry). A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a osteoporose como uma condição em que a densidade mineral óssea é igual ou inferior a 2,5 desvios-padrão abaixo do pico de massa óssea encontrada no adulto jovem, e a osteopenia ou baixa massa óssea, como uma condição em que a densidade mineral óssea encontra-se entre 1 e 2,5 desvios-padrão abaixo do pico de massa óssea encontrada no adulto jovem. Assim, o número de desvios-padrão abaixo do normal, também conhecido como escore T, deve ser usado para definir a doença5. O rastreio para a osteoporose com densitometria óssea está indicado para todas as mulheres com idade igual ou superior a 65 anos e homens com idade igual ou superior a 70 anos, independentemente da presen- ça de fatores de risco; mulheres na pós-menopausa e homens com idade entre 50 e 69 anos com fatores de risco para fratura (índice de massa corporal, estilo de vida e história familiar); mulheres na perimenopausa, se houver fatores de risco específicos associados a aumento de fratura, tais como baixo peso corporal, fratura prévia por pequeno trauma ou uso de medicamentos que causam perda óssea; adultos que sofrerem fratura após os 50 anos; indivíduos com anormalidades vertebrais radiológicas; e adultos com condições associadas à baixa massa óssea ou perda óssea, como artrite reumatoide ou uso de glicocorticoides na dose de 5 mg de prednisona/dia ou equivalente por período igual ou superior a 3 meses6. Como exposto na introdução deste artigo, o envelhecimento da população já é também uma realidade brasileira. Em 1991, o total de idosos, pessoas com 60 anos ou mais era de 10,7 milhões ou 7,2% da população, em 2011 esse grupo somou 23,5 milhões ou 12,1% da população7. O custo do tratamento das fraturas osteoporóticas nestes idosos também assumiu proporções alarmantes. Ao analisarmos o dispêndio do Ministério da Saúde com o tratamento de osteoporose no Sistema Único de Saúde (SUS) no triênio 2008 – 2010, foram realizados 3.252.756 procedimentos relacionados ao tratamento de osteoporose em idosos do Brasil no triênio 2008 – 2010, que totalizaram R$ 288.986.335,15. Sendo 106 milhões de reais somente com pacientes com 80 anos ou mais8. O tratamento da osteoporose não é somente cirúrgico e pode ser divido em medicamentoso e não medicamentoso. A atividade física contribui para a redução do risco de fratura de duas formas: uma, porque a força biomecânica que os músculos exercem sobre os ossos é capaz de aumentar a densidade mineral óssea e outra, porque a atividade física regular pode ajudar a prevenir as quedas que ocorrem, devido a alterações do equilíbrio e diminuição de força muscular e de resistência. Além dos exercícios físicos já citados, a estratégia de prevenção deve incluir a revisão de medicamentos psicoativos e outros associados ao risco de quedas, avaliação de problemas neurológicos, correção de distúrbios visuais e auditivos e medidas de segurança ambiental conforme protocolos de prevenção de quedas. O tabagismo deve ser rigorosamente desencorajado, bem como a ingestão excessiva de álcool. O tratamento medicamentoso tem como padrão para todos os idosos a suplementação de cálcio e vitamina D, devendo ser garantida a ingestão diária mí- 2015|23 Santana, FR et al. Impactos do envelhecimento humano na ortopedia. A especialidade está preparada? Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 22-25. nima em todos os casos. Aconselha-se ingestão equivalente a 1.200-1.500 mg de cálcio elementar por dia. Caso o consumo seja inferior a essa quantidade, o que é frequente, o cálcio deve ser suplementado. No entanto, considera-se razoável que o aporte da quantidade diária recomendada se faça primariamente por meio da dieta sempre que possível, principalmente na presença de doença cardiovascular. A vitamina D tem importância fundamental e não influi só na absorção do cálcio e na saúde óssea, mas também no desempenho muscular, equilíbrio e risco de queda. Recomenda-se a ingestão diária de 800-1.000 UI de vitamina D para adultos com 50 anos ou mais. Com essa dose, alguns estudos mostraram redução de fraturas de quadril e não vertebrais, especialmente na população com risco aumentado de quedas, como idosos frágeis institucionalizados. A exposição solar da face, tronco e braços antes das 10 horas ou após as 16 horas por no mínimo 15 minutos, 2-4 vezes por semana, também é recomendada, salvo por contraindicação dermatológica. Em relação ao tratamento da osteoporose propriamente dita, temos medicações de primeira linha (alendronato de sódio, risedronato de sódio, pamidronato dissódico) e segunda linha (raloxifeno, estrógenos conjugados, calcitonina teriparatida, ácido zoledrônico, ranelato de estrôncio, ibandronato e mais recentemente denosumabe) que não entraremos em mais detalhes, pois não é o intuito deste artigo6. Com a queda natural dos hormônios femininos, as mulheres podem perder de 2% a 4% do cálcio dos seus ossos por ano. Sendo assim, é fundamental que se faça a prevenção. As mulheres menstruam em média por 35 anos e então é só fazer as contas: a 1ª menstruação (menarca) aos 12 anos, mais 35 anos e a menopausa começará a dar sinais aos 47 anos em diante (às vezes, menos). Para a prevenção é primordial realizar todo ano um perfil hormonal feminino (marcadores de perda óssea, dosagem de cálcio e fósforo e ainda dosagem de vitamina D) e, em seguida, uma DENSITOMETRIA para definir com segurança a massa óssea da paciente (esse exame, de um modo geral, é feito da região da coluna lombar e colo do fêmur, mas alguns profissionais acrescentam o exame do punho). Considerações finais Mas, porque toda essa preocupação com o tratamento da osteoporose? Pelo simples fato de que po- deríamos evitar as fraturas típicas da osteoporose, tais como as que ocorrem na coluna vertebral, fêmur proximal, fratura do punho (rádio distal) e fratura do úmero proximal. Desta forma, seria possível não só diminuir custos econômicos com tratamentos de alta complexidade, mas também diminuiríamos o sofrimento humano com menor prevalência de morbidades, internamentos, incapacidade física e também de mortalidade. A maior parte dessas fraturas osteoporóticas tem indicação de cirurgia de alto custo e alta complexidade e aí se iniciam as complicações. As fraturas da região proximal do fêmur, infelizmente, têm elevada taxa de mortalidade. Portanto, é melhor “prevenir do que remediar”. Em um contexto mais próximo da nossa realidade, no Hospital Santa Izabel, foram realizadas pelo serviço de ortopedia 412 cirurgias para tratamento de fraturas osteoporóticas desde 2010 até o presente momento. Logicamente, um idoso com uma fratura sempre causa um transtorno familiar enorme, principalmente se ele fica acamado; e nas classes menos favorecidas, o problema, às vezes, é quase insolúvel. O Sistema Único de Saúde (SUS) permite a realização de todas as cirurgias para fraturas osteoporóticas, porém paga em torno de R$ 250,00 de honorários para toda equipe cirúrgica (cirurgião, 2 auxiliares e anestesista). Uma cirurgia desse porte (alta complexidade) demora em média 3 horas para ser realizada, não sendo fácil também encontrar profissionais para realizar o procedimento, visto que o cirurgião ganha em média R$ 100,00. O equivalente a um corte de cabelo! (sem menosprezar o profissional do salão, é claro). Há algum tempo, a Prefeitura de Salvador, sabedora da situação, fez uma contratualização com o Hospital Santa Izabel para que fossem realizadas cirurgias (artroplastias) de joelho e de quadril, sendo realizadas em torno de 961 procedimentos. É claro que muitos destes procedimentos não foram exclusivamente por osteoporose. Novamente, a osteoartrose, uma parceira do envelhecimento na ortopedia, também contribuiu em grande monta. Mesmo assim, a contratualização teve que ser suspensa por falta de numerário e isto ocasionou até o momento 88 pacientes aguardando para cirurgia de quadril, 292 para cirurgias do joelho, sem qualquer perspectiva de solução. Este exemplo mostra que precisamos muito mais do que dinheiro para enfrentar as demandas da população idosa. Precisamos de ações que sejam efetivas na prevenção e terapêutica e que ainda não foram encontradas pelos gestores da saúde. Não é possível à mente 2015|24 Santana, FR et al. Impactos do envelhecimento humano na ortopedia. A especialidade está preparada? Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 22-25. comum, entretanto, saber se estas soluções realmente não existem ou se não é desejo encontrá-las. E, enquanto isto, a saúde, a segurança e a educação estão no mesmo barco, num imenso oceano sem rumo! Referências 1. Rezende MU, Campos GC, Pailo AL. Current concepts in osteoarthritis. Acta Ortop Bras. 2013; 21. 120-2. 2. Kanis JA. Diagnosis of osteoporosis and assessment of fracture risk. Lancet. 2002;359:1929-1936. 3. Kanis JA, Burlet N, Cooper C, Delmas PD, Reginster JY, Borgstrom F, et al. European guidance for the diagnosis and management of osteoporosis in postmenopausal women. 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Endereço para correspondência: [email protected] 2015|25 Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30. Atualização em Pneumologia Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da hipertensão pulmonar Marcel Lima Albuquerque1, Jamocyr Moura Marinho1 Palavras-chave: hipertensão pulmonar, diagnóstico, dessaturação Key words: pulmonary hypertension, diagnosis, desaturation Hipertensão pulmonar é uma doença relacionada a um grupo amplo de patologias que têm como fator comum a elevação da resistência vascular pulmonar culminando em hipertrofia e posterior falência do ventrículo direito, que, se não abordado de forma específica, pode evoluir em um curto espaço de tempo para a morte. Manifestações clínicaS Sintomas e sinais de hipertensão pulmonar (HP) podem ser difíceis de reconhecer, devido à inespecificidade. Inicialmente, os pacientes se apresentam com dispneia e fadiga. Como a HP é progressiva, as manifestações clínicas evoluem ao longo do tempo, de modo que os pacientes podem, eventualmente, desenvolver os sinais e sintomas de hipertensão pulmonar grave com insuficiência manifesta do ventrículo direito (por exemplo, dor no peito ao esforço, síncope e congestão, incluindo edema periférico, ascite e derrame pleural). O diagnóstico é frequentemente adiado porque os sintomas são atribuídos incorretamente à idade, falta de condicionamento ou a outra condição médica. Como resultado, a HP muitas vezes não é suspeitada até que os sintomas se tornem graves. Estima-se que mais de 20% dos pacientes apresentem sintomas de HP por um período superior a dois anos antes do diagnóstico. Isto é particularmente prevalente entre os pacientes com menos de 36 anos e naqueles com condições médicas coexistentes.1 Sintomas - Os sintomas iniciais da HP são resultados de uma incapacidade para aumentar adequadamente o débito cardíaco durante o exercício, sendo os mais importantes a dispneia, letargia e fadiga. Os sintomas adicionais acontecem com a progressão da doença e o desenvolvimento da hipertrofia do ventrículo direito, com posterior insuficiência.2 A dor no peito (angina) é geralmente secundária à hipoperfusão subendocárdica causada por aumento do estresse da parede do ventrículo direito e demanda de oxigênio do miocárdio. No entanto, pode ser ocasionalmente causada pela compressão dinâmica da artéria coronária esquerda por uma artéria pulmonar alargada; este risco é maior para os pacientes com um tronco da artéria pulmonar com, pelo menos, 40 mm de diâmetro.3 A síncope é devido à incapacidade de aumentar o débito cardíaco durante a atividade ou bradicardia reflexa secundária à ativação dos mecanorreceptores no ventrículo direito. O edema periférico é devido à falência do ventrículo direito, elevação das pressões de enchimento no lado direito das câmaras cardíacas e expansão do volume extracelular.4 E a anorexia e/ou dor abdominal no quadrante superior direito, devido à congestão hepática passiva. Entre os sintomas menos frequentes encontramos tosse, hemoptise e rouquidão (síndrome de Ortner). A rouquidão é causada pela compressão do nervo laríngeo recorrente esquerdo pela dilatação do tronco da artéria pulmonar. Exame físico - Pacientes com HP podem desenvolver os seguintes sinais no exame físico, à medida que progridem de HP sozinho para HP associada à falência do ventrículo direito: • O primeiro achado no exame físico do paciente com HP geralmente é o aumento da intensidade do componente pulmonar da segunda bulha, que pode até tornar-se palpável. • Com o desenvolvimento da hipertrofia ventricular direita, ocorre o surgimento do pulso venoso jugular. Isto pode ser acompanhado por um quarto som cardíaco direito ou por incursão paraesternal. • Falência do ventrículo direito (ou bloqueio de ramo direito) amplia a divisão da segunda bulha. A ausculta pode revelar um sopro holossistólico de insuficiência tricúspide e, ocasionalmente, em doença mais grave, 2015|26 Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30. um sopro de regurgitação pulmonar diastólico. Estes sopros e galopes do lado direito aumentam com a inspiração. A hipertensão venosa sistêmica causada por falência do ventrículo direito pode levar a uma variedade de resultados, como a elevada pressão venosa jugular, uma terceira bulha em ventrículo direito e uma onda V proeminente no pulso venoso jugular. Hepatomegalia, fígado pulsátil, edema periférico, ascite e derrame pleural também podem existir. Alguns pacientes com HP, devido à doença pulmonar obstrutiva crônica grave (DPOC), desenvolvem edema, mesmo na ausência de insuficiência cardíaca direita. A patogênese de edema nestes doentes não é bem compreendida. Alguns pacientes podem também ter os sinais e sintomas da causa subjacente de HP (por exemplo, doença do tecido conjuntivo, insuficiência cardíaca, DPOC).5 Avaliação diagnóstica Testes diagnósticos são indicados sempre que houver suspeita de HP. O propósito do teste de diagnóstico é confirmar o diagnóstico, determinar a sua gravidade e identificar a sua causa. Sugere-se começar a avaliação com um ecocardiograma.6 Quando o ecocardiograma não sugere HP, os clínicos precisam ser guiados pela suspeita clínica. A avaliação diagnóstica deve ser dirigida para diagnósticos alternativos se a suspeita clínica de HP é baixa, ao passo que o cateterismo cardíaco direito deve ser considerado, se a suspeita clínica de HP ainda for alta. Quando o ecocardiograma é sugestivo de HP, devese determinar se há ou não doença cardíaca esquerda no ecocardiograma o suficiente para explicar o grau de HP estimado:6 • Os pacientes com doença cardíaca esquerda no ecocardiograma o suficiente para explicar o grau de HP estimado não necessitam de mais testes para determinar a etiologia da HP. Isto pode ser mais evidente em pacientes com disfunção sistólica ventricular esquerda grave, doença mitral grave ou doença da válvula aórtica. Pode ser menos evidente em pacientes com disfunção diastólica ou insuficiência cardíaca diastólica (insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada). Se houver incerteza, o cateterismo cardíaco pode ser útil. • Os pacientes que não possuem nenhuma doença do coração esquerdo, que pareça suficiente para explicar o grau de HP estimado, ou uma potencial segunda etiologia, devem fazer testes de diagnósticos adicionais para procurar uma causa alternativa da HP. Os testes podem incluir testes de função pulmonar, ventilação-perfusão, oximetria, polissonografia e/ou testes de laboratório (por exemplo, sorologias autoimunes, sorologia para HIV e testes de função hepática). A sequência dos testes devem ser priorizada de acordo com a história e exame físico do paciente. Como exemplo, teste de função pulmonar é um teste inicial adequado em um tabagista importante. Para pacientes nos quais existe suspeita de doença pulmonar crônica, o cateterismo cardíaco direito geralmente é reservado para aqueles nos quais a gravidade da HP ao ecocardiograma não é explicada pela gravidade da sua doença pulmonar subjacente ou para aqueles nos quais existe suspeita de uma etiologia alternativa. Quando a disfunção pulmonar é grave o suficiente para explicar o grau de HP ao ecocardiograma, cateterismo cardíaco direito não é indicado. Cateterismo cardíaco direito é indicado para confirmar a HP e avaliar a sua gravidade, embora isso muitas vezes é feito no momento em que a terapia é iniciada. A prova de esforço pode ser realizada, também para determinar a gravidade da doença funcional. Testes diagnósticos Radiografia de tórax - A radiografia de tórax clássica de um paciente com HP mostra alargamento das artérias pulmonares centrais com atenuação dos vasos periféricos, resultando em campos pulmonares oliguêmicos. Alargamento do ventrículo direito (espaço retroesternal diminuído) e dilatação do átrio direito também podem ser vistos. Ocasionalmente, a causa subjacente da HP é aparente na radiografia de tórax (por exemplo, doença pulmonar intersticial). Eletrocardiograma - O eletrocardiograma (ECG) de um paciente com HP pode demonstrar sinais de hipertrofia ventricular direita, incluindo desvio do eixo para direita, relação entre onda S e onda R maior do que um em V1, bloqueio de ramo direito completo ou incompleto ou aumento da amplitude da onda P na derivação II (P pulmonale), devido ao aumento do átrio direito. A maioria dos sinais de ECG é específica, mas não é sensível para a detecção da doença ventricular direita. Alterações eletrocardiográficas não se correlacionam com a gravidade da doença ou prognóstico.7 Ecocardiograma - O ecocardiograma é realizado para estimar a pressão sistólica da artéria pulmonar e para avaliar o tamanho do ventrículo direito, espessura e função. Além disso, a ecocardiografia pode avaliar o 2015|27 Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30. tamanho do átrio direito, função sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo e disfunções valvares, assim como derrames pericárdicos e comunicações intracardíacas. Para estimar a pressão da artéria pulmonar no ecocardiograma, utiliza-se da regurgitação tricúspide, que geralmente existe nesses casos. A velocidade máxima de regurgitação tricúspide é registrada e a pressão sistólica da artéria pulmonar (PSAP) é então calculada: PSAP = (4 x [TRV] 2) + RAP Onde TRV é a velocidade de regurgitação tricúspide máxima e RAP é a pressão atrial direita estimada a partir do tamanho e da variação respiratória do fluxo na veia cava inferior. O ecocardiograma com Doppler é limitado quando um jato adequado de regurgitação tricúspide não pode ser identificado.8 Pacientes com HP podem ter sinais ecocardiográficos de sobrecarga do ventrículo direito, incluindo abaulamento paradoxal do septo para o ventrículo esquerdo durante a sístole e hipertrofia da parede livre do ventrículo direito. Quando houver falha do ventrículo direito, irá ocorrer dilatação e hipocinesia, achatamento do septo, dilatação do átrio direito e regurgitação tricúspide. A regurgitação tricúspide não é devido a uma anormalidade intrínseca da valva tricúspide, e sim uma manifestação secundária de dilatação do anel tricúspide e ventrículo direito (ou seja, insuficiência tricúspide funcional). Outros achados associados à hipertensão pulmonar são a insuficiência pulmonar e fechamento mesossistólico da válvula pulmonar.9 Com base em um estudo ecocardiográfico com Doppler, pode ser determinado se a HP é provável, improvável ou possível:10 • HP é provável se a PSAP é > 50 e o TRV é > 3.4. • HP é improvável se a PSAP é ≤ 36, o TRV é ≤ 2.8 e não há outros achados sugestivos. • HP é possível com as outras combinações de resultados. Ecocardiograma pode ser falho na avaliação de pacientes com suspeita de HP, especialmente quando uma regurgitação tricúspide é inadequada. Testes de função pulmonar - Provas de função pulmonar são realizadas para identificar e caracterizar doença pulmonar subjacente que pode estar contribuindo para HP. Um padrão obstrutivo é sugestivo de DPOC, enquanto a doença restritiva sugere doença intersticial pulmonar, fraqueza neuromuscular ou doença da parede torácica. Geralmente, doença intersticial pulmonar grave (com volumes pulmonares abaixo de 50 por cento do previsto) e doença pulmonar obstrutiva produzem HP. Na maioria das circunstâncias, HP não deve ser atribuído à doença pulmonar se as provas de função pulmonar são apenas levemente anormais, já que a própria HP pode causar anormalidades.11,12 Oximetria - Dessaturação noturna da oxiemoglobina pode ser identificada por oximetria. É comum em pacientes com HP e pode levar à terapia de oxigênio suplementar durante o sono. Oximetria não é um teste de diagnóstico aceitável para distúrbios respiratórios relacionados com o sono, como a apneia obstrutiva do sono.13 Polissonografia - A polissonografia é o teste de diagnóstico padrão-ouro para distúrbios respiratórios relacionados com o sono, como a apneia obstrutiva do sono. Ela deve ser realizada quando a suspeita clínica é alta ou os resultados da oximetria são discordantes com a expectativa clínica. Cintilografia Ventilação-perfusão (V/Q) - É o estudo de imagem preferencial para avaliar pacientes com doença tromboembólica crônica (hipertensão pulmonar tromboembólica crônica). Cintilografia V/Q normal exclui doença tromboembólica crônica com uma sensibilidade de 96-97% e uma especificidade de 90-95%. Quando a cintilografia V/Q sugere que a doença tromboembólica crônica existe, a angiografia pulmonar é necessária para confirmar o diagnóstico e definir a extensão da doença. Cintilografia V/Q é uma parte importante na avaliação diagnóstica da HP, devido à doença tromboembólica crônica ser potencialmente reversível com a cirurgia.14 Exames laboratoriais - Os exames de sangue realizados durante a avaliação diagnóstica de hipertensão pulmonar incluem: • Sorologia para o HIV. • Testes de função hepática para triagem de hipertensão portopulmonar. • Anticorpo antinuclear (FAN) para triagem de HAP devido a doenças do tecido conjuntivo; considerar fator reumatoide (FR) e anticorpo anticitoplasma de neutrófilos (ANCA), se clinicamente indicados. No contexto clínico adequado, estudos de laboratório em busca de evidência de anemia hemolítica crônica (por exemplo, anemia falciforme) ou esquistossomose são adequados. Péptido natriurético cerebral N-terminal (NT-proBNP) é o precursor do péptido natriurético do 2015|28 Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30. cérebro (BNP). Ambos os peptídeos são liberados do tecido miocárdico do ventrículo direito e esquerdo quando dilatados. O NT-proBNP e o BNP são úteis no diagnóstico de insuficiência cardíaca. No entanto, eles não fazem distinção entre a insuficiência ventricular esquerda ou direita. Eles também desempenham um papel prognóstico em pacientes com HP, embora a precisão diminua se há presença de disfunção renal.15,16 Teste ergométrico - O teste ergométrico é normalmente realizado através do teste de caminhada de seis minutos (TC6), ecocardiograma de estresse ou teste de esforço cardiopulmonar (ergoespirometria).17 Cateterismo cardíaco direito - Necessário para confirmar o diagnóstico de HP e determinar com precisão a gravidade dos distúrbios hemodinâmicos. O cateterismo cardíaco direito também é útil em pacientes que têm HP distintas, devido à doença do coração esquerdo, como disfunção sistólica, disfunção diastólica ou doença cardíaca valvular (hipertensão venosa pulmonar). Esses pacientes têm uma pressão média de oclusão da artéria pulmonar (POAP) ≥15 mmHg, medida pelo cateterismo cardíaco direito.18 No entanto, só essa medida é insuficiente para diagnosticar definitivamente HP, devido à doença do coração esquerdo, pois ela pode estar falsamente elevada, devido à dilatação das artérias pulmonares e a incompleta oclusão do catéter-balão. Para evitar este dilema, os pacientes com uma POAP ≥15 mmHg devem ter medido diretamente a pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (PDFVE), através de cateterismo cardíaco esquerdo. Não realizar esse procedimento pode significar em erros diagnósticos (HP devido à doença do coração esquerdo erroneamente), o que têm importantes implicações terapêuticas.19 Um benefício adicional da cateterização do coração direito é analisar a presença e/ou a gravidade de uma derivação da esquerda para a direita congênita ou adquirida, que pode ser confirmada quando estudos não invasivos não são definitivos. Critérios diagnósticos - O diagnóstico definitivo de hipertensão pulmonar (HP) requer cateterismo cardíaco direito. HP é confirmada quando a pressão média da artéria pulmonar é ≥25 mmHg em repouso. A pressão da artéria pulmonar média de 8 a 20 mmHg em repouso é considerada normal, enquanto a pressão da artéria pulmonar média de 21 a 24 mmHg em repouso tem implicações clínicas incertas.6, 19 Classificação:6 • Grupo 1 - HAP (hipertensão arterial pulmonar). • Grupo 2 - HP devido à doença do coração esquerdo. • Grupo 3 - HP devido à doença pulmonar crônica e/ ou hipoxemia. • Grupo 4 - Hipertensão pulmonar tromboembólica crônica (HPTEPC). • Grupo 5 - HP devido a mecanismos multifatoriais pouco claros. Grupo 1 - Hipertensão arterial pulmonar - O diagnóstico de HAP exige cateterismo cardíaco direito para demonstrar uma pressão média da artéria pulmonar ≥25 mmHg em repouso. Vários critérios adicionais para excluir as restantes categorias de HP também devem ser atendidos: • Pressão capilar pulmonar <15 mmHg (para excluir HP devido à doença do coração esquerdo). • Doenças pulmonares crônicas e outras causas de hipoxemia são leves ou ausentes (para excluir HP devido à doença pulmonar crônica ou hipoxemia). • Doença tromboembólica venosa está ausente (para excluir HP tromboembólica crônica). • Excluir doenças sistêmicas (exemplo: sarcoidose), doenças hematológicas e doenças metabólicas (exemplo: doença de armazenamento de glicogênio). O objetivo é excluir HP com mecanismos multifatoriais pouco claros. O diagnóstico de HAP também é suportado por um aumento da resistência vascular pulmonar e gradiente transpulmonar (diferença entre a pressão arterial pulmonar média e a pressão capilar pulmonar média). Grupo 2 - HP devido à doença do coração esquerdo - Cateterismo direito com pressão arterial média pulmonar (PAP) ≥25 mmHg, pressão capilar pulmonar ≥15 mmHg e um débito cardíaco normal ou reduzido. Informações complementares importantes são a presença de aumento do átrio esquerdo visto no ecocardiograma. Aumento do átrio esquerdo é um “biomarcador” para a presença de hipertensão atrial esquerda crônica. Grupo 3 - HP devido à doença pulmonar crônica e/ ou hipoxemia - O diagnóstico de HP devido à doença pulmonar crônica e/ou hipoxemia é feito pela demonstração de HP no cateterismo direito ou ecocardiograma e provas de moderada a acentuada disfunção pulmonar e/ou hipoxemia. Todas as outras causas de HP também devem ser descartadas. Grupo 4 - HP devido à hipertensão pulmonar tromboembólica crônica - Hipertensão pulmonar tromboembólica crônica é diagnosticada por HP no cateterismo 2015|29 Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30. direito que ocorre na presença de oclusão tromboembólica da vasculatura pulmonar proximal ou distal e na ausência de outras causas de HP. Grupo 5 - HP devido a mecanismos multifatoriais Pacientes com HP que não se enquadram claramente em uma classificação da OMS ou têm etiologias combinadas podem se enquadrar neste grupo (exemplo: anemia falciforme). Referências 1. Brown LM, Chen H, Halpern S, et al. Delay in recognition of pulmonary arterial hypertension: factors identified from the REVEAL Registry. Chest 2011; 140:19. 2. Runo JR, Loyd JE. Primary pulmonary hypertension. Lancet 2003; 361:1533. 3. Mesquita SM, Castro CR, Ikari NM, et al. Likelihood of left main coronary artery compression based on pulmonary trunk diameter in patients with pulmonary hypertension. Am J Med 2004; 116:369. 4. Rich S, McLaughlin VV, O’Neill W. Stenting to reverse left ventricular ischemia due to left main coronary artery compression in primary pulmonary hypertension. Chest 2001; 120:1412. 5. Fishman AP. Pulmonary hypertension and cor pulmonale. In: Pulmonary Disease, Fishman AP (Ed), McGraw Hill, New York 1989. 6. Task Force Members:, Galiè N, Humbert M, et al. 2015 ESC/ERS Guidelines for the diagnosis and treatment of pulmonary hypertension: The Joint Task Force for the Diagnosis and Treatment of Pulmonary Hypertension of the European Society of Cardiology (ESC) and the European Respiratory Society (ERS)Endorsed by: Association for European Paediatric and Congenital Cardiology (AEPC), International Society for Heart and Lung Transplantation (ISHLT). Eur Heart J 2015. 7. McLaughlin VV, Archer SL, Badesch DB, et al. ACCF/AHA 2009 expert consensus document on pulmonary hypertension: a report of the American College of Cardiology Foundation Task Force on Expert Consensus Documents and the American Heart Association: developed in collaboration with the American College of Chest Physicians, American Thoracic Society, Inc., and the Pulmonary Hypertension Association. Circulation 2009; 119:2250. 8. Mikami T, Kudo T, Sakurai N, et al. Mechanisms for development of functional tricuspid regurgitation determined by pulsed Doppler and two-dimensional echocardio- graphy. Am J Cardiol 1984; 53:160. 9. Yock PG, Popp RL. Noninvasive estimation of right ventricular systolic pressure by Doppler ultrasound in patients with tricuspid regurgitation. Circulation 1984; 70:657. 10. Arkles JS, Opotowsky AR, Ojeda J, et al. Shape of the right ventricular Doppler envelope predicts hemodynamics and right heart function in pulmonary hypertension. Am J Respir Crit Care Med 2011; 183:268. 11. 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Tolle JJ, Waxman AB, Van Horn TL, et al. Exercise-induced pulmonary arterial hypertension. Circulation 2008; 118:2183. 18. Halpern SD, Taichman DB. Misclassification of pulmonary hypertension due to reliance on pulmonary capillary wedge pressure rather than left ventricular end-diastolic pressure. Chest 2009; 136:37. 19. Hoeper MM, Bogaard HJ, Condliffe R, et al. Definitions and diagnosis of pulmonary hypertension. J Am Coll Cardiol 2013; 62:D42. 1- Serviço de Pneumologia do Hospital Santa Izabel Endereço para correspondência: [email protected] 2015|30 Muccini, PH et al. Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem contraste: relato de caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 31-33. Relato de Caso – Bioimagem Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem contraste: relato de caso Paulo Henrique Muccini1, Luiz Eduardo Lago de Castro1, Marianna Machado Oliveira1. Palavras-chave: tomografia computadorizada de crânio, policitemia, diagnóstico Key words: computer tomography of brain, polycythemia, diagnosis Introdução O aumento da atenuação dos vasos cerebrais e seios venosos na tomografia computadorizada sem contraste (TCSC) é uma característica de imagem de condições que levam à hemoconcentração, como a policitemia. Contudo, pode mimetizar trombose venosa cerebral e trazer dificuldades diagnósticas.1 RELATO DE CASO Paciente do sexo feminino, 12 anos, portadora de cardiopatia: dupla via de saída de ventrículo direito com ampla comunicação interventricular com hipertensão pulmonar grave, dependente de oxigênio suplementar e síndrome de Eisenmenger. Apresentava policitemia secundária à hipoxemia e vinha recebendo hidratação venosa contínua para hemoconcentração. A paciente encontrava-se em internação hospitalar prolongada, fora de proposta cirúrgica, e estava em programação de alta hospitalar com O2 domiciliar e sildenafil, quando apresentou episódio súbito de crise convulsiva focal, com nistagmo e liberação esfincteriana, acompanhada de desconforto respiratório e bradicardia. Foi intubada e estabilizada, encaminhada para realizar tomografia computadorizada (TC) do crânio e posteriormente para UTI. A sua hemoglobina encontrava-se em 20,2 g/dL e o hematócrito em 60,5%, uma semana antes do ocorrido. A TC do crânio foi realizada em aparelho multidetectores de 16 canais em uma única fase: sem contraste, sendo observada hiperdensidade vascular difusa, incluindo os vasos do polígono de Willis (figura 1) e sobretudo do sistema venoso cerebral (figura 2), mensurada em cerca de 60 UH na região da confluência dos seios. Não havia alterações no parênquima encefálico. A paciente foi tratada com anticoagulantes. Figura 1 - Irrigação do cérebro: circulação posterior Figura 2 - Irrigação do cérebro: circulação posterior 2015|31 Muccini, PH et al. Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem contraste: relato de caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 31-33. DISCUSSÃO HEMATÓCRITO E ATENUAÇÃO DE VASOS NA TC O hematócrito normal varia entre 42 e 52% em adultos e entre 37 e 47% em neonatos. O sangue circulante, quando o paciente apresenta um hematócrito de 45%, apresenta densidade aproximada de 40 UH. Desta forma, os grandes vasos e seios venosos durais apresentam-se isodensos ou levemente hiperdensos em relação à substância cinzenta, que nos adultos normais apresentam densidade de cerca de 39 UH.2 O conceito de que a hemoconcentração leva a um aumento da atenuação dos feixes de raio X no interior de vasos cerebrais é amplamente aceito.1 New et al. demonstraram uma relação linear entre o valor de atenuação na TC e o hematócrito em preparações de sangue total. A atenuação na TC da hemoglobina foi associada ao seu conteúdo proteico, com o conteúdo de ferro contribuindo apenas com 7% do total da atenuação.3,4 Muitos autores relataram casos de policitemia que apresentam hiperdensidade vascular difusa, incluindo o polígono de Willis e seios venosos durais na TCSC.2,3,5,6 Em muitos casos, o achado de hiperdensidade vascular difusa é o primeiro achado num paciente sem diagnóstico prévio de policitemia, que faz o exame por queixas de cefaleia, por exemplo. POLICITEMIA X TROMBOSE Policitemia é um dos estados de hipercoagulabilidade que predispõem a trombose. Desta forma, seios hiperdensos relacionados ao aumento de hematócrito podem ser difíceis de diferenciar de trombose venosa dural. O envolvimento simétrico, homogeneidade da hiperdensidade e o envolvimento de virtualmente todos os seios venosos durais e estruturas vasculares principais podem sugerir que a policitemia está presente, ao invés de trombose venosa.3 O diagnóstico de trombose venosa cerebral é feito quando se encontra uma hiperdensidade vascular seletiva. Como o hematócrito de um trombo/coágulo agudo é muito alto (acima de 90%) e a globina apresenta massa de alta densidade, coágulos sanguíneos recentes apresentam-se hiperdensos na TC. O “cord sign” representa a direta visualização da veia cortical trombosada, vista como uma hiperdensidade linear, outro achado de trombose venosa cerebral.3 Contudo, a policitemia pode também se apresentar com uma hiperdensidade isolada de seio venoso em TC sem contraste, mimetizando uma trombose venosa cerebral em pacientes sem trombose.3,7 Nestes casos, a angio-RM ou a angio-TC podem ajudar a confirmar a presença ou ausência de trombos, mas a RM é mais sensível na detecção de alterações parenquimatosas recentes.2,3 Black D. F. et al realizaram a mensuração da densidade dos seios venosos durais (na região da confluência dos seios) em 166 exames de TCSC e correlacionaram com o valor da hemoglobina e hematrócrito destes pacientes. Foram também avaliados 8 pacientes com trombose venosa. Os autores observaram que 7 dos 8 pacientes com trombose apresentaram valores de atenuação dos seios > 70UH, mas nenhum dos indivíduos normais. Eles também avaliaram a relação entre a densidade tomográfica do seio e o nível de hematócrito (H:H) e demonstraram que, quanto maior a diferença entre um alto valor de UH no seio e um valor baixo de hematócrito, mais provavelmente o paciente tem uma trombose venosa. O valor médio da relação H:H nos casos de trombose foi 2,2. Apenas 4% dos pacientes sem trombose apresentaram valores H:H entre 1,8-1,9 e nenhum foi maior ou igual a 2,0. O número reduzido de casos deste estudo limita a conclusão precisa sobre valores de corte para trombose baseados na mensuração da atenuação vascular na TC sem contraste.1 OUTROS DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS Além da policitemia e da trombose venosa, outros diagnósticos devem ser aventados num paciente com hiperdensidade vascular difusa, entre eles: aspecto normal no crânio neonatal, edema cerebral difuso, hemorragia subaracnoide e subdural. No crânio neonatal, a hiperdensidade dos vasos pode estar associada a um parênquima cerebral de menor densidade, devido ao processo incompleto de mielinização, além de estar associada a uma policitemia fisiológica. Da mesma forma, em pacientes com edema cerebral difuso, há redução da densidade do parênquima e então os vasos aparentam estar hiperdensos, bem como o cerebelo, chave para o diagnóstico. Pacientes com hemorragia subdural ou subaracnoide ao longo do tentório e foice cerebral podem apresentar uma falsa hiperdensidade dos seios venosos durais. A presença de sangue nos sulcos cerebrais, coleções subdurais, hipodensidades parenquimatosas e história de trauma ou hipertensão usualmente ajudam no diagnóstico correto.2 CONCLUSÃO O conceito de que a hemoconcentração leva a um aumento da atenuação dos feixes de raio X no interior 2015|32 Muccini, PH et al. Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem contraste: relato de caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 31-33. de vasos cerebrais é amplamente aceito. Em pacientes com policitemia, a hiperdensidade vascular difusa e simétrica pode estar relacionada à hemoconcentração na ausência de trombose venosa. A presença de hiperdensidade vascular seletiva é mais indicativa de trombose, contudo, há casos relatados de policitemia sem trombose com esta apresentação. Tentativas de quantificar a densidade do seio que indica trombose foram realizadas, mas ainda necessita-se de estudos com maior volume amostral. Desta forma, a angio-RM ou a angio-TC podem ajudar a confirmar a presença ou ausência de trombos nestes casos. REFERÊNCIAS 1. Black DF, Rad A, Gray LA, et al. Cerebral Venous Sinus Density on Noncontrast CT Correlates with Hematocrit. Am J Neuroradiol 32: 1354 –57, 2011. 2. Rastogi R. Computer Tomography of Brain in Polycythemia. MJAFI 64:377-378, 2008. 3. Bora M, Kurian P, Basavaiya PV, et al. Uniform hyperdense vessels in non-contrast CT of brain: An anusual finding inplain CT scan diagnostic of polycythemia. MJDRDYPU, 7(3): 362-365, 2015. 4. New PF, Aronow S. Attenuation measurement of whole blood and blood fractions in computer tomography. Radiology 121: 635-40, 1976. 5. Gayathri S, Prasad A, Sachdeva N, et al. Unique features of polycythemia observed on plain non contrast CT scan of head. J Pediatr Neurosci 5(1): 27-29, 2010. 6. Bhoil RJ. Peculiar NCCT Brain Picture in Polycythemia. Postgrad Med Edu Res 48(4): 197-198, 2014. 7. Healy JF, Nichols C. Polycythemia mimicking venous sinus thrombosis. Am J Neuroradiol 23: 1402-3, 2002. 1- Serviço de Bioimagem do Hospital Santa Izabel Endereço para correspondência: [email protected] 2015|33 Pinho, JA et al. Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo)-Relato de caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 34-36. Relato de Caso – Cardiologia Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo) - Relato de caso Joel Alves Pinho1, Thiago Carvalho Pereira1, Joberto Pinheiro Sena1, Thales Costa Cardoso1, Vitor Maia Teles Ruffini1, Leonardo Pereira Santana1 Palavras-chave: Takotsubo, síndrome coronariana aguda, insuficiência cardíaca aguda Key words: Takotsubo, acute coronary syndrome, heart failure INTRODUÇÃO Essa entidade clínica foi descrita inicialmente no Japão, em 1991, e a partir daí passou a ser reconhecida em todo o mundo. Várias denominações têm sido dadas, síndrome do coração partido, síndrome do balonamento apical, cardiomiopatia neuroadrenérgica, etc; cardiomiopatia do estresse (Takotsubo), nos últimos anos, ganhou a preferência. Takotsubo é uma palavra japonesa para armadilha de pegar polvo (Octopus pot). Como o formato assumido pelo VE nessa patologia lembra tal artefato, pelo balonamento do apex do VE, o termo foi usado na descrição inicial dessa patologia. A doença se caracteriza por uma disfunção sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo (VE) de caráter transitório, com uma variedade de alterações da contratilidade da parede ventricular. CASO CLÍNICO Paciente ESA, 75 anos, feminina, aposentada, procedente de Salvador, admitida na emergência do HSI em 27/02/13, com dor retroesternal em queimação, associada a náuseas, palidez e dispneia há 5h da admissão. A dor teve uma duração de 5 minutos e recorreu 2h após com as mesmas características, fazendo-a buscar o nosso hospital. Informava ser hipertensa em uso de Losartan 50mg/dia e em tratamento de depressão havia 2 anos. Ex-tabagista há 30 anos e em tratamento de osteoporose. No exame físico estava em bom estado geral, lúcida e eupneica. PA: 130/80 mmHg, P- 88 bpm, rítmico. O precórdio era calmo, com o ictus no 5º EIE, LMC. As bulhas estavam hipofonéticas, em dois tempos e não havia sopros. Os pulmões estavam limpos e não apresentavam alterações em outras áreas. O ECG reali- zado de imediato revelou supradesnível do segmento ST nas derivações precordiais direitas e a paciente foi encaminhada para coronariografia, que revelou lesão proximal e isolada de 50% na descendente anterior e ventriculografia esquerda, assinalando grande hipocontratilidade difusa, incompatível com o padrão coronariográfico. Foi mantida na unidade coronariana sob tratamento para SCA, com níveis elevados de troponinas (de 1,22 a 1,70) e submetida à ecocardiografia que evidenciou acinesia das porções medial e apical de todas as paredes, preservando a contratilidade das porções basais e FE de 26%. O diagnóstico de Takotsubo foi assim estabelecido, tendo a paciente boa evolução hospitalar e normalização do ecocardiograma antes da alta, com FE de 78%. DISCUSSÃO Esse caso ilustra bem o problema do Takotsubo. Houve manifestação clínica de SCA, aparentemente sem um gatilho identificado, mas havendo história de tratamento para depressão numa idosa, menopausada. O diagnóstico inicial foi de SCA com supra do segmento ST, ocorrendo imediata realização de coronariografia que não revelou obstruções compatíveis com o quadro eletrocardiográfico de IAM com supra de ST e grande disfunção ventricular identificada na ventriculografia esquerda. O padrão ecocardiográfico clássico subsequente e a elevação discreta dos marcadores de necrose, com total recuperação ecocardiográfica da contratilidade ventricular após uma semana, confirmaram o diagnóstico. Apesar dos esforços realizados, o entendimento dos fatores etiológicos e fisiopatológicos envolvidos nessa doença ainda permanece limitado, parecendo haver uma relação entre o eixo cérebro-coração2,3, com um excesso de catecolaminas sendo o responsável pela 2015|34 Pinho, JA et al. Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo)-Relato de caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 34-36. cardiomiopatia, podendo haver vasoespasmo em múltiplos vasos coronarianos, anormalidades na função microvascular e cardiotoxidade das catecolaminas. A doença se caracteriza por uma disfunção sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo (VE) de caráter transitório, com uma variedade de alterações da contratilidade da parede ventricular. Na fase aguda se apresenta como um quadro de síndrome coronariana aguda (SCA), com achados clínicos, eletrocardiográficos e enzimáticos muito similares, associados a diferentes graus de disfunção ventricular, com insuficiência cardíaca aguda variável. Os principais achados clínicos são a presença de dor torácica, dispneia e síncope. Alterações eletrocardiográficas são comuns, como supradesnivelamento do segmento ST (34 a 56%), ondas Q patológicas, inversão da onda T com QT prolongado, além de alterações inespecíficas da repolarização. Com esses achados, o diagnóstico inicial é de SCA, entretanto, a angiografia coronariana é normal ou revela alterações discretas incompatíveis com a importância do quadro clínico. A elevação dos níveis de troponinas cardíacas é frequente, embora discreta, contrastando com as importantes anormalidades contráteis e hemodinâmicas. A ventriculografia esquerda e/ou estudo ecodopplercardiográfico demonstra(m) abaulamento apical com acinesia ou discinesia acometendo de metade a dois terços do VE associada à hiperdinamia dos segmentos basais. No Japão, ocorre mais frequentemente nos homens4, contudo, nos países ocidentais, predomina nas mulheres5-7, com uma relação de 9/1. Essa variação não tem razões conhecidas até o momento. Tem sido progressivamente mais diagnosticada nos pacientes com disfunção ventricular aguda nas salas de emergência. As mulheres idosas menopausadas representam o principal grupo de risco (em torno de 80% dos casos), sendo que a cardiomiopatia é frequentemente desencadeada por intenso estresse físico ou emocional, perdas financeiras, desastres naturais e, por vezes, secundária a estresse provocado por outras doenças. Entretanto, pode ocorrer na ausência desses fatores. Mais da metade dos pacientes com Takotsubo apresentam uma desordem neurológica ou psiquiátrica aguda, antiga ou crônica, podendo aparecer no contexto de hemorragia subaracnoidea, epilepsia, trauma craniano, AVC, ansiedade e depressão8-10. internacional recentemente publicado7, ela tem uma evolução aguda semelhante à da doença coronariana convencional, podendo recorrer mesmo anos após o evento inicial. A ressonância cardíaca com gadolíneo é útil para diferenciá-la do IAM e da miocardite, por não demonstrar presença de edema miocárdico ou realce tardio. O acometimento do ventrículo direito pode ocorrer em 25% dos casos. As principais complicações agudas são: insuficiência cardíaca, taquicardia ventricular, fenômenos tromboembólicos, regurgitação mitral e choque cardiogênico. O tratamento tem como base manter o suporte clínico-hemodinâmico, para permitir a recuperação espontânea do miocárdio. Na ausência de hipotensão arterial ou sinais de baixo débito cardíaco, podem ser utilizados betabloqueador, inibidor da enzima conversora e diurético. Pacientes que cursam com hipotensão arterial necessitam de suporte hemodinâmico com uso cauteloso de inotrópicos, como dobutamina, e vasopressores na presença de hipotensão refratária. Em pacientes que estejam evoluindo com choque refratário, medidas excepcionais, como o emprego do balão intra-aórtico e da circulação extracorpórea (ECMO), podem ser realizadas, na expectativa de uma reversão do quadro clínico, dada a natureza transitória da síndrome. No registro internacional de Takotsubo7, a maior experiência publicada sobre o tema, num consórcio de 25 centros na Europa e Estados Unidos, 1.750 pacientes foram estudados e um grupo de 455 foi pareado com semelhante população com síndrome coronariana aguda. Dos 1.750 pacientes, 89,9% eram do sexo feminino, com idade média de 66,8 anos. Gatilhos emocionais ocorreram em menor proporção que os físicos (27,7% versus 36,0%) e 28,5% não tiveram gatilhos identificados. Comparados com pacientes com SCA, desordens neurológicas ou psiquiátricas foram mais comuns (55,8% vs 25,7%) e a FE do VE média foi menor (40,7% vs 51,5%). Complicações hospitalares, incluindo choque e morte, foram semelhantes (p= 0,93). Na evolução em longo prazo, a taxa de eventos cardíacos e cerebrovasculares maior foi de 9,9% por paciente-ano e a taxa de morte, 5,6% por paciente-ano. Dessa maneira, Takotsubo deve ser visto como uma condição com substancial morbimortalidade. É considerada uma condição benigna, com recuperação total da função ventricular dentro de duas a quatro semanas, entretanto, de acordo com o registro 2015|35 Pinho, JA et al. Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo)-Relato de caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 34-36. FIGURAS REFERÊNCIAS 1. Sato HTH, Uchida T, Dote K, Ishihara M. Tako-tsubo-like left ventricular dysfunction due to multivessel coronary spasm. In: Kodama K, Haze K, Hori M, eds. Clinical aspect of myocardial injury: from ischemia to heart failure. Tokyo: Kagakuhyoronsha Publishing, 1990: 56-64. (In Japanese. 2. Samuels MA. The brain-heart connection. Circulation 2007; 116: 77-84. 3. Suzuki H, Matsumoto Y, Kaneta T, et al. Evidence for brain activation in patients with takotsubo cardiomyopathy. Circ J 2014; 78: 256-8. 4. Aizawa K, Suzuki T. Takotsubo cardiomyopathy: Japanese perspective. Heart Fail Clin 2013; 9: 243-7. Figura 1 - ECG compatível com SCA com supra do ST nas derivações precordiais direitas. 5. Sharkey SW, Windenburg DC, Lesser JR, et al. Natural history and expansive clinical profile of stress (tako-tsubo) cardiomyopathy. J Am Coll Cardiol 2010; 55: 333-41 6. Schneider B, Athanasiadis A, Stöllberger C, et al. Gender differences in the manifestation of tako-tsubo cardiomyopathy. Int J Cardiol 2013; 166: 584-8. 7. Templin C, Ghadri JR, Diekmann J, Napp LC et al.Clinical Features and Outcomes of Takotsubo (Stress) Cardiomyopathy N Engl J Med 2015;373:92938. 8. Yoshimura S, Toyoda K, Ohara T, et al. Takotsubo cardiomyopathy in acute ischemic stroke. Ann Neurol 2008; 64: 547-54. Figura 2 - Ventriculografia esquerda revelando disfunção sistólica grave e ampla. 9. Summers MR, Lennon RJ, Prasad A. Pre-morbid psychiatric and cardiovascular diseases in apical ballooning syndrome (tako-tsubo/stress-induced cardiomyopathy): potential pre-disposing factors? J Am Coll Cardiol 2010; 55: 700-1 10. Le Ven F, Pennec PY, Timsit S, Blanc JJ. Takotsubo syndrome associated with seizures: an underestimated cause of sudden death in epilepsy? Int J Cardiol 2011; 146: 475-9. 1- Serviço de Cardiologia do Hospital Santa Izabel Endereço para correspondência: [email protected] Figura 3 - Imagem ecocardiográfica revelando morfologia típica do balonamento apical na sístole. 2015|36 Santos, ARN et al. Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 37-39. Relato de Caso – Cirurgia Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero Adson Roberto Neves Santos1, Isadora Teles Sanjuan1, Mirlaine Carvalho Muniz de Souza1, Thiago Franchischetto Ribeiro1, Fábio Oliveira Neves1, André Ney Menezes Freire1. Palavras-chave: câncer de colo de útero, tratamento cirúrgico, terapia de radiação Key words: cancer of the uterine cervix, surgical treatment, radiation therapy O câncer de colo de útero é a mais frequente neoplasia genital feminina em países subdesenvolvidos. Representa o terceiro câncer mais comum entre as brasileiras, atrás apenas dos tumores de mama e colorretal (exceto os casos de câncer de pele não melanoma) e a quarta causa de morte em mulheres por câncer no Brasil, segundo dados do INCA. No Brasil, a estimativa para o ano de 2014 é de 15.590 mil novos casos, dentre 5.430 mortes, e na Bahia, 1.300 novos casos para o mesmo ano. Esta neoplasia, que habitualmente está associada a infecção pelo HPV (papiloma vírus humano), acomete a faixa etária dos 20 - 29 anos com aumento da incidência até os 50 - 60 anos. Geralmente, ela se desenvolve lentamente e por isso tem alta possibilidade de cura quando tratada nos estágios iniciais. O método de rastreio recomendado é o exame preventivo - Papanicolau.1,2 Infelizmente, no Brasil, mais de 50% das mulheres têm o diagnóstico da neoplasia já na fase avançada, com estadiamento igual ou superior a II.3 Histologicamente, há dois tipos principais de câncer de colo do útero: os carcinomas de células escamosas (CEC), que representam entre 80% e 90% dos casos, e os adenocarcinomas, de 10% a 20% do total, com pior prognóstico. O estadiamento do câncer de colo do útero é padronizado pela FIGO (Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia) e é baseado na avaliação clínica que envolve toque retal e vaginal, colposcopia e exames radiológicos. A partir do estadiamento, cada paciente terá seu tratamento determinado.4,5 Tabela 1 - TRATAMENTO CLÁSSICO NIC III / IA1: Conização / Traquelectomia/ Histerectomia simples IA2 / IB1: Traquelectomia radical/ Histerectomia Radical (Whertheim Meigs) IB2 - IVA : Radioterapia e Quimioterapia concomitante IVB : Quimioterapia Paliativa Apesar do avanço da radioterapia e quimioterapia nos últimos anos, a incidência de recidiva da doença ainda é alta. Dependendo do estágio clínico inicial, há relatos de até 80%.2,4 Um estudo revelou a localização destas recidivas e este é um aspecto fundamental para estabelecer uma nova estratégia de tratamento. Neste trabalho, cerca de 29% das pacientes apresentaram recidiva do tumor, das quais 35% somente na pelve, 56% extrapélvico e 7% intra e extrapélvicos. As pacientes com recidivas pélvicas locais são elegíveis para cirurgia de resgate – exenteração pélvica, pois não poderão realizar nova radioterapia e o controle com quimioterapia isolada não apresenta bons resultados.6 A exenteração deve ser muito bem indicada e possuir uma seleção cuidadosa, frente a sua complexidade. A sobrevida geral em 5 anos com o tratamento cirúrgico permeia 20-60% e a mortalidade relacionada ao procedimento, menos que 10%.6 Este procedimento cirúrgico foi descrito pela primeira vez em 1948, por Brunchwig, uma ressecção pélvica multivisceral para o tratamento de neoplasias pélvicas avançadas.2,7 Podemos classificá-la em três tipos. Na exenteração anterior há ressecção em monobloco dos órgãos genitais femininos e trato urinário inferior (bexiga e uréteres); na posterior há ressecção dos órgãos genitais e retossigmoide; e na total procede-se ao esvaziamento pélvico, com a realização simultânea da exenteração anterior e posterior. Além da ressecção ampliada, a cirurgia também contempla derivações pélvicas, a exemplo da reconstrução das vias excretoras sob técnica de Bricker (urostomia - anastomose de uréteres em segmento de delgado) ou colostomia úmida (dupla derivação – fezes e urina).7 Conforme já fundamentado na literatura, esta cirurgia radical é o tratamento de escolha para pacientes que apresentarem recidivas locais após tratamento radioterápico e quimioterápico, sendo nesses casos a única chance de cura para estas pacientes.7 2015|37 Santos, ARN et al. Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 37-39. RELATO DE CASO CASO 1 Paciente S.A.S., 31 anos, G3P3A0, iniciou acompanhamento no HSI em dezembro/2007, com queixa de sangramento vaginal há 4 meses antes da primeira consulta. Ao exame ginecológico observou-se sangramento e lesão ulcerada, infiltrativa em colo de útero e o exame físico determinou EC IIIB. Foi submetida à biópsia, com resultado de Carcinoma Escamocelular bem diferenciado. Foram solicitados exames adicionais para estadiamento, dentre os quais apenas a TC de abdome de janeiro/2008 mostrava alterações: lesão expansiva infiltrativa, acometendo corpo e colo de útero + formação cística septada de contornos lobulados em região anexial direita, indissociada à lesão anterior. Iniciado, ainda naquele mês, tratamento radioterápico + quimioterápico concomitantes, seguido de braquiterapia. A paciente evoluiu com boa tolerância ao tratamento, terminando esquema proposto 03 meses depois, assintomática, sem queixa. Em junho/2008 não apresentava queixas, nem sinais de doença residual. Porém, em setembro/2008, evoluiu com dor pélvica leve e recorrência do sangramento genital, sendo investigada e encontrada recidiva local. Novos exames de imagem foram solicitados, TC confirmou a recidiva pélvica com invasão da bexiga, porém sem evidência de doença extrapélvica. Frente ao quadro clínico de recidiva e falha terapêutica com RxTQt, em dezembro/2008 foi submetida à exenteração anterior com anatomia patológica revelando margens cirúrgicas livres. Há aproximadamente 7 anos vem sendo acompanhada ambulatorialmente com bom estado clínico, assintomática e sem sinais de recorrência tumoral. CASO 2 Paciente S.S.M.S., 44 anos, G7P4A3, iniciou acompanhamento no HSI em março/2013, com queixa de sangramento vaginal há cerca de 2 anos da primeira consulta, com exame preventivo daquele mesmo ano, sugestivo de adenocarcinoma. Optou-se por realizar nova biópsia, onde houve diagnóstico de adenocarcinoma mucinoso, moderadamente diferenciado do colo uterino, do tipo endocervical. Possuía história prévia de cesária, histerectomia subtotal e plástica vaginal em outro serviço. Solicitada RNM de pelve, que mostrou lesão de aspecto expansiva, infiltrativa em projeção de colo uterino, envolvendo cúpula vaginal e parede anterior da vagina, com extensão parametrial. Classificada como EC IIB e iniciados, ainda naquele mês, tratamentos radioterápico e quimioterápico concomitantes. Não realizou a braquiterapia por ausência de condições geométricas. Apesar de 4 meses de tratamento, a paciente não obteve resposta adequada e ao fim do período contatou-se doença persistente. Novos exames de imagem foram solicitados, sem evidência de doença extrapélvica. Devido à falha terapêutica com RxTQt e persistência da doença pélvica, em outubro/2013 foi submetida à exenteração pélvica total, obtendo-se margens livres e sucesso terapêutico. Desde então, vem sendo acompanhada ambulatorialmente há 2 anos, com bom estado clínico, assintomática e sem sinais de recidiva da doença. Figura 1 - Tomografia para reestadiamento, mostrando recidiva pélvica com invasão da bexiga. 2015|38 Santos, ARN et al. Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 37-39. 1- Serviço de Cirurgia do Hospital Santa Izabel Endereço para correspondência: [email protected] Figura 2 - Exenteração pélvica total REFERÊNCIAS 1. Albuquerque KM, Frias PG, Andrade CLT , Aquino EML , Menezes G, Szwarcwald CL. Cobertura do teste de Papanicolaou e fatores associados à não-realização: um olhar sobre o Programa de Prevenção do Câncer do Colo do Útero em Pernambuco, Brasil. Cad. Saúde Pública 2009; 25(2): 301-9. 2. Coelho FRG, Soares FA, Focchi J,Fregnani JHTG, Zeferino LC, Villa LL, Federico MH, Novaes PERS, Costa RLR. Câncer de colo do útero. 1ª ed. São Paulo: Tecmedd 2008. 3. Rama C, Roteli-Martins C, Derchain S, Longatto-Filho A, Gontijo R, Sarian L, Syrjanen K, Ching T, Aldrighi J. Rastreamento anterior para câncer de colo uterino em mulheres com alterações citológicas ou histológicas. Rev Saúde Pública 2008; 42(3). 4. Green JA, Kirwan JM, Tierney JF, et al. Survival and recurrence after concomitant chemotherapy and radiotherapy for cancer of the uterine cervix: a systematic review and meta-analysis. Lancet 2001;358(September (9284)): 781–6 5. Morice P, Uzan C, Zafrani Y, Delpech Y, Gouy S, Haie-Meder C. The role of surgery after chemoradiation therapy and brachytherapy for stage IB2/II cervical cancer. Gynecologic Oncology 107 (2007): S122– S124. 6. Kasamatsu T, Onda T, Yamada T, Tsunematsu R. Clinical aspects and prognosis of pelvic recurrence of cervical carcinoma. International Journal of Gynecology and Obstetrics (2005) 89, 39—44 7. Bricker EM, Butcher HR, Lawler WH, Mcafee CA. Surgical Treatment of Advanced and Recurrent Cancer of the Pelvic Viscera: * An Evaluation of Ten Years Experience . Annals of Surgery 1960 Apr; 152( 3): 1960. 2015|39 Souza, GX et al. Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 40-42. Relato de Caso – Neurologia Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente Gabriel Xavier-Souza1, Matheus Mendes Pires 1, Jamile Seixas Fukuda1, Thiago Gonçalves Fukuda1, Jamary Oliveira Filho1 Palavras-chave: hipoparatireoidismo, hipocalcemia, calcificações intracranianas Key words: hypoparathyroidism, hypocalcemia, brain calcification introdução Paciente de 67 anos, destra, com história de que há três meses da admissão passou a apresentar alteração cognitiva caracterizada por amnésia anterógrada, desorientação têmporo-espacial e dificuldade para realizar tarefas rotineiras, como abotoar roupas e manipular utensílios domésticos. Há 21 dias da admissão, apresentou um episódio de crise convulsiva tônico-clônica generalizada (CCTCG) autolimitada, tendo procurado atendimento médico em unidade de emergência e liberada em seguida. Nos 21 dias seguintes até a chegada ao Hospital Santa Izabel (HSI), os familiares testemunharam cinco episódios de parada comportamental associada a automatismos, com duração menor que 5 minutos, seguidos de períodos de desorientação, atribuídos a crises epilépticas, com atendimentos em vários pronto-atendimentos, porém sem realizar investigação etiológica do quadro. No dia da admissão, a paciente foi trazida à emergência do HSI com relato de uma nova CCTCG, com duração de 5 minutos, seguida de desorientação durante cerca de 20 minutos. Paciente com histórico de hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia e hipotireoidismo pós-cirúrgico relatou duas abordagens cirúrgicas cervicais em 1992 (tireoidectomia) e 1993 (paratireoidectomia), devido à tumoração benigna em tireoide (estudo anatomopatológico indisponível). Na admissão, a paciente apresentava-se vigil, desatenta, desorientada no tempo e orientada no espaço, com pressão arterial de 146x91mmHg, FC de 108bpm, FR de 18ipm, saturação de oxigênio, 96% em ar ambiente. Notava-se postura flexora em tetania em membros superiores (Sinal de Trousseau espontâneo). Disártrica, sem alterações de linguagem. As pupilas eram fotorreagentes e isocóricas. Motricidade ocular extrínseca preservada. Força muscular grau 5/5 em todos os segmentos. Notava-se também placa ovóide em face medial do terço distal da perna direita, medindo 10cmx5cm de consistência pétrea, não aderida a planos profundos, aparentemente contida no tecido subcutâneo. Durante a avaliação, a paciente apresentou rebaixamento do nível de consciência seguida de nova CCTCG, evoluindo com status epilepticus, sendo sedada com midazolam e submetida à intubação orotraqueal (IOT). Os exames laboratoriais da admissão evidenciavam ureia 35mg/dL, creatinina 0,7mg/dL, sódio 134mmol/L, potássio 3,1mmol/L, magnésio 1,5mg/dL, fósforo 7,9mg/dL, cálcio sérico 4,7mg/dL, cálcio iônico 0,49mmol/L (VR>1,16mmol/L), TSH 0,005µUI/mL (VR > 0,270µUI/mL), T4 livre 10,2µg/dL. À tomografia de crânio era possível identificar calcificações em substância branca cerebelar e em coroa radiada perpendicularmente aos ventrículos laterais (Figura 1). Ainda nesse estudo de imagem foram identificadas calcificações esféricas em todo espaço subcutâneo. A paciente foi admitida na unidade de terapia intensiva neuroclínica, sendo imediatamente realizada reposição de cálcio com infusão em dose de ataque e manutenção de gluconato de cálcio intravenoso e carbonato de cálcio via oral. Houve recuperação progressiva dos níveis de cálcio (Ca ionizado diário: 0,49 > 0,86 > 1,06 > 1,15 mmol/L), sendo possível suspender a sedação após cerca de 24 horas após a IOT, levando-se em conta o diagnóstico presuntivo de status epilepticus secundário à hipocalcemia. Dessa forma, com parâmetros ventilatórios mínimos e nível de consciência adequado, a paciente foi extubada 30 horas após a admissão. A paciente apresentou laringoespasmo e broncoespasmos recorrentes após a extubação, que resultaram no prolongamento de sua internação em unidade fechada. 2015|40 Souza, GX et al. Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 40-42. A paciente permaneceu internada no total de 16 dias, período em que foi mantida a reposição de cálcio associada à calcitriol, ambos via oral. Adicionalmente, a paciente fez uso de levotiroxina sódica e foi necessário a introdução de salmeterol e fluticazona para controle dos episódios intermitentes de broncoespasmos. A investigação adicional do quadro endocrinológico revelou tireoglobulina de 125,22ng/mL (VR<35,0ng/ mL), antitireoglobulina de 1UI/mL (VR<4UI/mL), 25-hidroxivitamina D de 38,30ng/mL (VR para suficiência > 30,0ng/mL) e PTH de 1pg/mL (VR>4pg/mL). Foi realizada radiografia do membro inferior esquerdo para documentar as áreas de calcificações (Figura 2). A avaliação cognitiva padronizada foi prejudicada, tendo em vista que a enferma ainda estava hospitalizada e com menos de um mês de estabilização metabólica. Ao exame, entretanto, era possível constatar que a paciente encontrava-se lúcida e orientada no tempo e no espaço, reconhecendo seus familiares, sem déficits de linguagem, incluindo semântica e abstração. A paciente ainda relatou que se recordava de diversos episódios em que se apresentava confusa e incapacitada ainda em seu domicílio, descrevendo que sentia “lentificação do pensamento” nesse período. A paciente recebeu alta hospitalar em uso de carbonato de cálcio, calcitriol, lexotiroxina e fenitoína (em transição para carbamazepina), com orientação de acompanhamento com endocrinologista e neurologista. Discussão O hipoparatireoidismo é definido como a secreção inadequada de hormônio paratireoidiano (PTH), resultando em homeostase ineficaz dos níveis de cálcio, permitindo, assim, hipocalcemia. Essa condição pode ser congênita ou adquirida1, 2. O hipotireoidismo pós-cirúrgico se configura como a principal etiologia dessa entidade. Isso se deve à grande incidência de alterações na secreção do PTH após abordagens cirúrgicas cervicais, em especial a tireoidectomia3. Os índices de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico chegam a 50%, porém a maior parte dos casos se configura como alterações transitórias da atividade das glândulas paratireoides, geralmente associadas a edema ou hemorragias glandulares1, 3. De 0,9% a 9,0% dos pacientes submetidos às mais diversas técnicas para exérese total ou subtotal da tireoide apresentarão uma função paratireoidiana insuficiente para manter os níveis séricos de cálcio, mesmo após 6 meses da cirurgia, condição denominada de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente2, 3. As complicações associadas ao hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente devem-se à hipocalcemia crônica a qual esse paciente será exposto. Dessa forma, o quadro clínico clássico será composto preferencialmente por alterações da contração muscular, incluindo tetania, broncoespasmo, laringoespasmo, cólica biliar e intestinal, disfunção do músculo detrusor, parto prematuro. Parestesiasperiorais e na posta dos dedos são queixas frequentes. Adicionalmente, o paciente pode apresentar prolongamento do intervalo QT, insuficiência cardíaca (raros casos), catarata precoce, osteoporose, alterações dentárias, além de lesões cutâneas psoriasiformes1, 2, 4. Do ponto de vista neurológico, a hipocalcemia crônica resulta em calcificações intracranianas, síndromes extrapiramidais (parkinsonismo e coreia), papiledema, encefalopatia, alucinações, demência e convulsões5-9. A deposição de cálcio encontrada no hipoparatireoidismo ocorre predominantemente nos núcleos da base, tálamo e cerebelo, porém pode acometer coroa radiada em menor frequência8. O status epilepticus induzido por alterações hidroeletrolíticas é pouco frequentes e apresenta baixa taxa de resposta à terapia anti-convulsivante convencional, de forma que a identificação e correção do distúrbio deve ser realizada de forma mais rápida possível9, 10. Em um paciente apresentando hipocalcemia verdadeira (através da correção do cálcio total excluindo-se hipoalbuminemia ou dosando-se o cálcio ionizado), deve-se levar em consideração os diagnósticos etiológicos diferenciais de hipoparatireoidismo adquirido, dentre eles: hipomagnesemia grave (Mg < 1mg/dL); síndrome poliglandularauto-imune tipo I; hipoparatireoidismo autoimune (presença de anticorposanti receptor sensor de cálcio); e pseudo-hipoparatireoidismo (resistência periférica dos receptores à ação do PTH); deficiência de vitmina D; insuficiência renal crônica; pancreatite; e sepse1, 4. No caso descrito, a paciente apresentava cálcio ionizado baixo, níveis séricos de magnésio, acima de 1mg/dL, e como condição predisponente, o histórico de paratireoidectomia em 1993. A dosagem sérica de PTH corroborou para o diagnóstico presuntivo realizado na admissão de hipocalcemia secundária, a hipoparatireoidismo pós-cirúrgico, permanente, resultando em síndrome demencial e status epilepticus secundários à hipocalcemia crônica. Ponto que chama a aten- 2015|41 Souza, GX et al. Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 40-42. ção para o diagnóstico neste caso foi a instalação de quadro demencial rapidamente progressivo, associado a crises convulsivas. No exame físico, a presença de postura distônica característica de membros superiores e calcificações metastáticas em subcutâneo reforçaram a suspeita clínica. Figuras Figura 1 - Tomografia axial de crânio evidenciando calcificações em substância branca em ambos os hemisférios cerebelares. Figura 2 - Radiogradia de membro inferior esquerdo em que se pode observar zona de calcificação no terço distal da perna, já descrita ao exame físico. 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S. Andrade ¹ Artigo Original: Heart Failure Survival Score in Patients With Chagas Disease: Correlation With Functional Variables. Luiz E. Ritt, Antonio Carlos Carvalho, Gilson S. Feitosa, Joel A. Pinho-Filho, Cristiano R.B. Macedo, Fabio Vilas-Boas, Marcus V.S. Andrade, Gilson S. Feitosa-Filho, Augusto J.G. Almeida, Marcos Barojas, Renato D. Lopes. L.E. Ritt. Rev. Esp. Cardiol. 2012;65(6): 538–543 RESUMO Introdução e objetivos: a doença de Chagas é uma causa prevalente de insuficiência cardíaca na América Latina e seu prognóstico é pior do que outras etiologias. O Heart Failure Survival Score (HFSS) tem sido utilizado para avaliar o prognóstico em pacientes com insuficiência cardíaca; no entanto, este escore ainda não foi estudado em pacientes com cardiopatia chagásica. Métodos: o Heart Failure Survival Score foi calculado em 55 pacientes com grave disfunção sistólica do ventrículo esquerdo, devido à doença de Chagas. As correlações foram avaliadas entre o HFSS e variáveis obtidas a partir de ecocardiogramas, testes de exercício cardiopulmonar, medidas de qualidade de vida e testes de caminhada de 6 minutos. Resultados: os pacientes foram distribuídos entre as classes New York Heart Association II-IV; 89% estavam em uso de inibidores da enzima de conversão da angiotensina ou bloqueadores dos receptores da angiotensina, 62% estavam usando betabloqueadores, 86% estavam usando diuréticos e 74% estavam em uso de bloqueadores dos receptores de aldosterona. A média do HFSS foi de 8,75 (0,80). O escore teve boa correlação com variáveis do teste cardiopulmonar, tais como a absorção de oxigênio pico (0,662; P < 0,01), consumo de oxigênio no limiar anaeróbio (0,644; P < 0,01), a inclinação da eficiência ventilatória de dióxido de carbono (0,417; P < 0,01), o pulso de oxigênio (0,375; P < 0,01), a inclinação da eficiência ventilatória do consumo de oxigênio (0,626; P < 0,01), o teste de caminhada de 6 minutos (0,370; P < 0,01), a fração de ejeção do ventrículo esquerdo (0,650; P = 0,01) e o diâmetro do átrio esquerdo (0,377; P < 0,01). Se observou também no limite da significância estatística uma correlação entre a pontuação do HFSS e a qualidade de vida (0,283; P <0,05). Conclusões: em pacientes com insuficiência cardíaca por doença de Chagas, o Heart Failure Survival Score mostrou boa correlação com as principais variáveis prognósticas dos testes funcionais. Palavras-Chave: miocardiopatia, insuficiência cardíaca, prognóstico. Key Words: cardiomyopathy, heart failure, prognosis. Comentários Ainda que se tenha observado uma significativa redução na incidência da Doença de Chagas na forma aguda no Brasil, ainda temos principalmente na região Norte e Nordeste uma grande prevalência de pacientes com IC de etiologia Chagásica. A Insuficiência Cardíaca (IC) é o estágio final para quase todas as doenças que afetam o coração. Apesar dos progressos na prevenção primária e secundária de doenças cardíacas, a IC ainda é uma causa predominante de mortalidade e hospitalização¹. A Doença de Chagas é uma causa prevalente de IC no Brasil e em outros países latino-americanos4. O prognóstico dos pacientes com IC secundária à Doença de Chagas parece ser pior que em outras etiologias5,6. Um escore prognóstico em Doença de Chagas foi recentemente publicado7. Embora o teste cardiopulmonar e suas variáveis e o teste de caminhada de 6 minutos tenham sido amplamente avaliados em pacientes com IC, o escore HFSS em portadores de IC por Doença de Chagas ainda não foi avaliado. Assim, o objetivo desse estudo foi avaliar a correlação entre o HFSS e testes prognósticos clássicos em IC em uma população sintomática e com IC avançada por Chagas8-13. 2015|43 Andrade, MVC. Heart Failure Survival Score em pacientes com Doença de Chagas: correlação com variáveis funcionais. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 43-45. O estudo tem grande relevância, devido ao tema, pois a Doença de Chagas é muito prevalente na nossa região, tendo um elevado impacto na estratégia de políticas de saúde pública para as regiões Norte e Nordeste. Esse estudo trata da avaliação da correlação entre variáveis prognósticas em Insuficiência Cardíaca (IC) e o escore HFSS. Esse escore é um dos mais estudados na prática clínica, entretanto ainda não havia essa correlação na literatura entre essa etiologia de IC e testes prognósticos. Foram estudados 55 pacientes com IC devido à Doença de Chagas, que já participavam de dois protocolos de pesquisa no ambulatório de insuficiência cardíaca do Hospital Santa Izabel. Os pacientes tinham idade entre 18 e 75 anos e tinham sorologia positiva para Doença de Chagas confirmada por dois métodos distintos, bem como grave disfunção ventricular esquerda (fração de ejeção < 35%) e sintomas (New York Heart Association [NYHA] classes II -IV) após um período estável de terapia farmacológica. Os pacientes com doenças pulmonares, doença valvular cardíaca primária, lesões coronarianas obstrutivas > 50% ou aqueles não aderentes ao tratamento medicamentoso foram excluídos. Todos os pacientes realizaram exames laboratoriais, eletrocardiograma, Holter 24h, teste cardiopulmonar, ecocardiograma, teste de caminhada de 6 minutos, avaliação clínica e tiveram sua qualidade de vida avaliada pelo Minnesota Living with Heart Failure Questionnaire (MLHFQ). O protocolo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da instituição e todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido¹³. O HFSS foi calculado de acordo com as publicações originais, utilizando as variáveis inerentes para cada paciente avaliado na visita inicial e exames basais3-7. A maioria dos pacientes era do sexo masculino (69%). Além disso, 89% dos pacientes estavam em uso dos inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA) ou dos antagonistas dos receptores da angiotensina (BRA) e 62% utilizavam betabloqueadores. A pontuação média para o escore HFSS foi de 8,75 (0,80). Entre as variáveis deste escore, os valores médios para sódio, pressão arterial média, fração de ejeção e pico de VO2 foram, respectivamente, de: 138 mEq/L, 78 mmHg, 27,6% e 17,3 ml/Kg/min. Distúrbio da condução intraventricular ou ritmo de marcapasso estava presente em 47 pacientes (85%). Nenhum dos pacientes tinha doença arterial coronariana. A média da distância percorrida no teste de caminhada de 6 minutos foi < 400 m. O valor médio da pontuação no escore de qualidade de vida pelo Minnesota Living with Heart Failure Questionnaire (MLHFQ) foi de 38. Em relação aos dados do teste cardiopulmonar, a relação de troca foi significativa (1,08), que era compatível com um exercício máximo para o ponto de vista metabólico (relação de troca > 1,05), a média de VE/VCO2 foi de 36 (>34) e a percentagem média do pulso de oxigênio foi de 74%. Os pacientes tiveram uma frequência cardíaca de recuperação atenuada < 16 bpm. Nosso estudo tem algumas limitações. O tamanho amostral foi pequeno, realizado em um único centro e não foram coletados dados da função do ventrículo direito, onde já foi demonstrado ser de valor para prever a capacidade funcional em pacientes chagásicos. Portanto, não foi possível testar as correlações entre o escore HFSS e a função ventricular direita nesta população. Concluímos que em pacientes com Insuficiência Cardíaca (IC) secundária à doença de Chagas, o Heart Failure Survival Score (HFSS) se correlacionou bem com as principais variáveis prognósticas de testes funcionais, mas teve uma fraca correlação com a mensuração da qualidade de vida. Como esperado, os pacientes com classes funcionais menores tiveram uma pontuação no HFSS menor. O HFSS pode ser uma ferramenta útil para avaliação prognóstica na IC, devido à doença de Chagas. Estudos longitudinais e de acompanhamento clínico são necessários para melhor determinar os pontos de corte ótimos do HFSS para tomada de decisão nessa população específica. Referências 1. Jessup M, Abraham WT, Casey DE, Feldman AM, Francis GS, Ganiats TG, et al. 2009 Focused update: ACCF/AHA guidelines for the diagnosis and management of heart failure in adults: a report of the American College of Cardiology Foundation/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. Circulation. 2009;119:1977-2016. 2. Mehra MR, Kobashigawa J, Starling R, Russell S, Uber PA, Parameshawar J, et al. Listening criteria for heart transplantation: International Society for Heart and Lung Transplantation guidelines for the care of cardiac transplant candidates-2006. J Heart Lung Transplant. 2006;25:1024-42. 3. Aaronson KD, Schwartz JS, Chen TM, Wong KL, Goin JE, Mancini DM. Development and prospective validation of a clinical index to predict survival in am- 2015|44 Andrade, MVC. Heart Failure Survival Score em pacientes com Doença de Chagas: correlação com variáveis funcionais. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 43-45. bulatory patients referred for cardiac transplant evaluation. Circulation. 1997;95:2660-7. 4. Hernandez-Leiva E. Epidemiologia del sindrome coronario agudo y la insuficiencia cardiaca en Latinoamerica. Rev Esp Cardiol. 2011;64:34-43. 1 - Serviço de cardiologia do Hospital Santa Izabel Endereço para correspondência: [email protected] 5. Pereira Nunes MC, Barbosa MM, Ribeiro AL, Amorim Fenelon LM, Rocha MO. Factores predictivos de la mortalidad en pacientes com miocardiopatia dilatada: importancia de la enfermedad de Chagas como etiologia. Rev Esp Cardiol. 2010;63:788-97. 6. Bestetti RB, Muccillo G. Clinical course of Chagas’ heart disease: a comparison with dilated cardiomyopathy. Int J Cardiol. 1997;60;187-93. 7. Rassi Jr A, Rassi A, Little WC, Xavier SS, Rassi SG, Rassi AG, et al. Development and validation of a risk score for predicting death in Chagas’ heart disease. N Engl J Med. 2006;355:799-808. 8. Mancini DM, Eisen H, Kussmaul W, Mull R, Edmunds Jr LH, Wilson JR, et al. Value of peak exercise oxygen consumption for optimal timing of cardiac transplantation in ambulatory patients with heart failure. Circulation. 1991;83:778-86. 9. Arena R, Myers J, Aslam SS, Varughese EB, Peberdy MA. Peak VO2 and VE/VCO2 slope in patients with heart failure; a prognostic comparison. Am Heart J. 2004;147:354-60. 10. Arena R, Myers J, Abella J, Peberdy MA, Bensimhon D, Chase P, et al. Development of a ventilatory classification system in patients with heart failure. Circulation. 2007;115:2410-7. 11. Arena R, Myers J, Abella J, Peberdy MA, Bensimhon D, Chase P, ET AL. The prognostic value of heart rate response during exercise and recovery in patients with heart failure: influence of beta-blockade. Int J Cardiol. 2010;138;166-73. 12. Oliveira RB, Myers JN, Araujo CGS, Arena R, Mandic S, Bensimon D, et al. Does peak oxygen pulse complement peak VO2 in risk stratifying patients with heart falure ? Am J Cardiol. 2009;104:554-8. 13. Guazzi M, Dickstein K, Vicenzi M, Arena R. Six-minute walk test and cardiopulmonary exercise testing in patients with chronic heart failure: a comparative analysis on clinical and prognostic insights. Circ Heart Fail. 2009;2;549-55. 2015|45 Ferreira, LSM et al. Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal: considerações técnicas de resultados preliminares da primeira experiência brasileira. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 46-48. Resumo de Artigo – Coloproctologia Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal: considerações técnicas de resultados preliminares da primeira experiência brasileira Luciano Santana de Miranda Ferreira¹, Carlos Ramon Silveira Mendes¹, Ricardo Aguiar Sapucaia¹, Meyline de Andrade Lima¹, Sérgio Eduardo¹ Alonso Araújo¹, Eduardo Costa Cobas¹, Luiz Carlos Araújo Amoedo¹. Artigo original publicado: video-assisted anal fistula treatment: technical considerations and preliminary results of the first brazilian experience. Arq. Bras. Cir. Dig. 2014. Jan-Mar, 27(1):77-81. Mendes, CRS; Ferreira, LSM; Sapucaia, RA; Lima, MA; Araújo, SEA. RESUMO Racional: a fístula anorretal é um trajeto epitelizado que estabelece comunicação de origem infecciosa entre o reto ou o canal anal com a região perineal. Representa a fase crônica de um abscesso anorretal. Objetivo: descrever a técnica empregada na experiência preliminar nos primeiros casos realizados no Brasil. Técnica: as principais etapas da operação são visualização do trajeto fistuloso através da fistuloscopia sob irrigação, empregando o fistuloscópio Karl Storz, identificação do orifício interno sob visão direta, tratamento endoscópico do trajeto com eletrocoagulação e tratamento do orifício interno, que pode ser feito com grampeador, avanço de retalho ou sutura simples. Resultados: a distância mínima entre a borda anal e o orifício interno foi de 5.5cm. O tempo operatório foi de 31,75min (18-45) em média. Em todos os casos, o orifício interno pôde ser identificado após fistuloscopia completa, sendo tratado por sutura simples. Não ocorreram complicações intra ou pós-operatórias. Após seguimento de cinco meses, um (12,5%) caso evoluiu com recidiva. Conclusão: o tratamento vídeoassistido da fístula anorretal mostrou-se factível, seguro e reprodutível. Possibilita estudo direto do trajeto fistuloso e identificação e trajetos acessórios que, inclusive, poderiam passar desapercebidos na cirurgia convencional, bem como o orifício interno. Palavras-Chave: fístula anal, tratamento videoassistido, cirurgia. Key Words: anal fistula, videoassisted treatment, surgery INTRODUÇÃO A fístula anorretal consiste em um trajeto epitelizado que comunica o canal ou o reto com a região perianal. Em cerca de 90% dos casos têm origem criptoglandular. Nos 10% restantes, as causas podem ser devido à doença de Crohn, trauma, radioterapia ou malignidade. Sua incidência é estimada em 8.6 para 100.000, com predominância no sexo masculino (2:1), sendo mais prevalente entre a terceira e quarta década de vida. O quadro clínico consiste em dor, tumoração perianal e drenagem recorrente de exsudato seropurulento e, às vezes, sanguinolento. Seu diagnóstico é feito após história clínica e exame físico e confirmado com ultrassonografia endoanal ou ressonância magnética para avaliação do trajeto fistuloso e sua relação com o aparelho esficnteriano. O tratamento da fístula anorretal é iminentemente cirúrgico, não sendo possível cicatrização da fístula de outro modo. Os objetivos da cirurgia são controle dos sintomas e manutenção da continência anal. As técnicas mais frequentemente utilizadas são fistulotomia em um tempo ou fistulotomia em dois tempos, com incisão ou drenagem com seton. Ambas necessitam transsecção de um segmento do esfíncter anal, o que pode levar a graus variados de comprometimento da função esfincteriana¹. Foi a necessidade de reduzir o trauma ao esfíncter anal que levou ao desenvolvimento de técnicas alternativas, como o plug de colágeno, cola de fibrina e sintética com cianoacrilato, técnicas de avanço mucoso e mais recentemente a ligação do trajeto fistuloso interesfincteriano (LIFT). A combinação da abordagem videoendoscópica a um procedimento minimamente invasivo levou à proposta do tratamento videoassistido da fístula anal, como descrito por Meinero em 2006². Um dos passos mais importantes para o sucesso do procedimento é a exata localização do orifício interno. O VAAFT (video-assisted anal fistula treatment) utiliza um equipamento inovador, o fistuloscópio rígido, para estudar o trajeto fistuloso, buscando identifi- 2015|46 Ferreira, LSM et al. Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal: considerações técnicas de resultados preliminares da primeira experiência brasileira. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 46-48. car abscessos crônicos, trajetos secundários e o orifício interno da fístula. O maior benefício da técnica VAAFT é a realização do procedimento sem trauma ao aparelho esfincteriano e, portanto, sem risco de incontinência pós-operatória³, além de resultar em uma ferida cirúrgica menor, enquanto as técnicas tradicionais estão associadas a um risco de incontinência fecal de até 45%. Apesar de não comprometer a incontinência fecal, o VAAFT está associado a um índice de recidiva de 30%. Contudo, os casos de recidiva podem ser reabordados pela mesma técnica. O objetivo deste artigo é descrever a técnica e a experiência inicial da técnica VAAFT para tratamento da fístula analno Brasil por este método. Todos os casos foram operados por dois dos autores (CRSM e LSMF). Oito cirurgias VAAFT foram realizadas até julho de 2013. O critério de inclusão foi o diagnóstico de fístulas complexas (não tratáveis com fistulotomia simples). Em todos os casos, a etiologia da fístula era doença criptoglandular. Os critérios de exclusão foram suspeita de malignidade, doença de Crohn e histórico de radioterapia pélvica. Nenhum caso foi submetido à ostomia derivativa. Todos os casos foram submetidos à colonoscopia e ressonância magnética no pré-operatório. Foi utilizada a classificação de Parks. O seguimento pós-operatório foi feito com 15 dias, dois meses e depois com 6 e 12 meses. Em todos os casos foram utilizados antibióticos profiláticos. A técnica VAAFT foi realizada com a utilização do fistuloscópio fabricado pela Karl Storz (Tuttligen, Alemanha – figura 1), conectado à câmera com equipamento cirúrgico completo de videoendoscopia. O fistuloscópio tem diâmetro de 3,3x4,7mm, mede 14cm de comprimento, com 8° de angulação da óptica e tem um canal de trabalho e irrigação, sendo conectado a um sistema fechado de solução de glicina para dilatar e irrigar o trajeto fistuloso. DIAGNÓSTICO Nesta fase é realizada a fistuloscopia, iniciando pelo orifício externo da fístula, e tem como objetivo a progressão através da fístula, identificando o trajeto principal, buscando trajetos acessórios, abscessos crônicos e atingir o orifício interno. O paciente é posicionado em litotomia sob anestesia espinhal. Com infusão contínua de solução de glicina/manitol, o fistuloscópio progride através do trajeto fistuloso, sob visão direta. A identificação de trajetos secundários é uma das principais vantagens da técnica (figura 2), quando comparada com a exploração às cegas com estilete ou injeção de azul de metileno. A etapa final da fase diagnóstica é a saída pelo orifício interno da fístula. Figura 2 - Aspecto da fistuloscopia intraoperatória, identificando a bifurcação do trajeto fistuloso. TRATAMENTO Esta fase consiste na destruição do trajeto fistuloso e desbridamento, seguido de abordagem do orifício interno. Para destruir o trajeto é utilizado o eletrodo monopolar, sob visão direta, cauterizando centímetro a centímetro, iniciando ao nível do orifício externo até o orifício interno. A irrigação contínua e uma escova removem o material necrosado. O fechamento do orifício interno é outro passo crítico. É realizado com a utilização de um grampeador, com avanço de retalho ou com sutura simples. RESULTADOS A técnica VAAFT é dividida em duas etapas: diagnóstico e tratamento. Figura 1 - Fistuloscópio Karl Storz. Apenas uma paciente era do sexo feminimo (12,5%). A idade média foi de 43 (29-66) anos. A distância média entre os orifícios externo e interno foi de 5,5cm (4-9). Seis fístulas tinham trajeto transesfínctérico e duas extraesfínctérico. Dois casos eram fístulas recidivadas, com mais de um orifício externo. O orifício 2015|47 Ferreira, LSM et al. Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal: considerações técnicas de resultados preliminares da primeira experiência brasileira. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 46-48. interno foi identificado em todos os casos e foi abordado com sutura simples em todos os casos. Não houve complicações intra ou pós-operatórias. Após um período médio de seguimento de 5 meses, foi observado recidiva em um caso (12,5%). DISCUSSÃO Nessa série preliminar, foi demonstrada a segurança, eficácia e reprodutibilidade da técnica VAAFT. Seu maior benefício é a preservação do aparelho esfincteriano, associado à visão direta do trajeto fistuloso, com identificação de trajetos acessórios e coleções, bem como do orifício interno. São poucos os estudos sobre o tratamento cirúrgico da fístula anal com a técnica VAAFT, disponíveis na literatura mundial. Esse relato é pioneiro no Brasil e tem a maior casuística nacional. Fístulas simples são preferencialmente tratadas através de fistulotomia em um tempo, procedimento mais simples e bastante eficaz. Porém, as fístulas complexas, que comprometem a musculatura esfincteriana, estão associadas a elevado risco de distúrbios da continência. Para esses casos, é necessário lançar mão de técnicas de preservação esfincteriana. O maior obstáculo à utilização dessas técnicas é o alto índice de recidiva4,⁵. A utilização de cola de fibrina está associada a recidivas de mais de 50%⁶. As técnicas de avanço de retalho têm índices de recidiva em torno de 54%. A despeito da alta recorrência, ambas as técnicas podem ser repetidas. A técnica LIFT tem sido utilizada mais recentemente, com sucesso de 97% no seu relato inicial⁷, porém no LIFT não é possível a identificação do trajeto e de coleções crônicas. A técnica VAAFT inclui a identificação precisa do trajeto fistuloso e do orifício interno, com seu fechamento e completa destruição do trajeto fistuloso. Até o presente momento, a maior série foi publicada pelos idealizadores da técnica, com 136 pacientes, relatando sucesso em 73,5% dos casos no primeiro procedimento e 87,1% após a segunda abordagem². A grande inovação da técnica é a abordagem da fístula sob visão direta, com identificação do trajeto e do orifício interno, com preservação esfincteriana. catrização do tratamento cirúrgico da fístula anal, isso ainda permanece indefinido. A técnica VAAFT para fístulas complexas é segura e reprodutível e permite a visualização direta do trajeto fistuloso e eventuais trajetos secundários, bem como do orifício interno. REFERÊNCIAS 1. Ritchi, RD; Sackier, JM; Hodde, JP. Incontinencerates after cutting seton treatment for anal fistula. Colorrectal Dis 2009; 11(6): 564-571. 2. Meinero, P; Mori L: Video-assisted anal fistula treatment (VAAFT): A novel sphincter-saving procedure for treating complex anal fistulas. Tech Coloproctol 2011: 15(4): 417-422. 3. Mendes, CRS; Ferreira, LSM, Sapucaia, RA; Lima, MA; Araújo, SEA. VAAFT - Videoassisted anal fistula treatment: a new approach for anal fistula. J Coloproctol 2014:34(1): 62-64. 4. Mizrahi, N; Wexner, SD; Zmora, O; Da Silva, J; Efron, EG; Weiss, A; Vernava, M. Endorrectal advancement flap: are there predictors of failure? Dis Colon Rectum 2002; 45(12): 1616-1621. 5. Ozuner, G; Hull, TL; CRTMILL, j; Fazil, VW. Long-erm analysis of the use of gtransanal rectal advancement flaps for complicated anorectal/vagnal fistulas. Dis Colon Rectum, 1996; 39(1): 10-14. 6. Sentovich, SM. Fibrin glue for all anal fistulas. J GastrointestSurg 2011; 5(2): 158-161. 7. Shanwani, A; Nor, AM; Amri, N. Ligation of the intersphincteric fistula tract (LIFT): a sphincter-saving technique for fistula-in-ano. Dis Colon Rectum 2010; 53(1): 39-42. 1. Serviço de Coloproctologia do Hospital Santa Izabel. Endereço para correspondência: [email protected] CONCLUSÃO A fistuloscopia rígida permanece a técnica mais inovadora. Como esse recurso afetará as taxas de ci- 2015|48 Matos, MA. Avaliação dos efeitos da terapia de reposição enzimática na função motora de pacientes com mucopolissacaridoses. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 49. Resumo de Artigo – Ortopedia Avaliação dos efeitos da terapia de reposição enzimática na função motora de pacientes com mucopolissacaridoses. Autor: Marcos Almeida Matos¹ Resumo do artigo: Matos MA, Barreto R, Acosta AX. Evaluation of motor response in mucopolysaccharidosis patients treated with enzyme replacement therapy. Orthop Traumatol Rehabil. 2013, 31;15(5):389-93. Doi: 10.5604/15093492.1084240. Palavras-chave: mucopolissacaridose, resposta motora, tratamento Key words: mucopolysaccharidosis, response motor, treatment As mucopolissacaridoses (MPS) compõem um grupo de doenças caracterizadas pela deficiência de enzimas lisossomais necessárias para a degradação dos mucopolissacarídeos ou glicosaminoglicanos (GAG), como são atualmente denominados. Os GAGs são componentes do material extracelular de vários tipos de tecidos, dentre eles: o nervoso, cardiovascular, conjuntivo e osteoarticular. Estas substâncias estão constantemente sendo sintetizadas e metabolizadas pelas células no interior dos lisossomos, em um processo contínuo de turn over. A ausência de uma destas enzimas interrompe a degradação dos GAGs e determina o acúmulo deste “lixo” tóxico dentro das células, ocasionando disfunção e apoptose. Cada tipo de mucopolissacaridose tem a falta de uma enzima específica que determina suas particularidades, contudo, todas guardam uma série de características clínicas comuns. As MPSs são doenças letais e multissistêmicas que produzem deformidades ósseas em coluna e membros com nanismo (denominadas disostose múltipla), alterações cardiopulmonares e desordens variadas no sistema nervoso central, dentre outras graves alterações que podem levar à morte dos pacientes antes ou durante a adolescência. Há aproximadamente dez anos, surgiu um tratamento de base para as MPSs que consiste na reposição da enzima que se encontra deficiente, conhecido como terapia de reposição enzimática (TRE). Este tratamento vem sendo cada vez mais utilizado e seus benefícios para órgão e sistemas vitais já estão adequadamente estudados, tais como diminuição de infecções pulmonares, melhora da função cardiovascular e diminuição de importantes comorbidades clínicas potencialmente letais, associadas à doença. As alterações motoras, por sua vez, correspondem a um conjunto de deformidades que define indiretamente a gravidade da doença, causando incapacidade, restrição da mobilidade e marcante diminuição da qualidade de vida dos pacientes. Entretanto, a avaliação deste quadro motor ainda não havia sido ade- quadamente realizado após o advento da TRE. Desta forma, o artigo apresentado é pioneiro em apresentar os resultados de melhora no quadro motor ortopédico em pacientes com mucopolissacaridoses após um ano de tratamento com reposição enzimática específica. Foram avaliados vinte e dois pacientes portadores de MPSs do tipo I, II e VI, antes e após um ano de terapia. Os indivíduos foram estratificados de I a V pela classificação de função motora grosseira e foram avaliados quanto à condição neuromuscular, amplitude de movimentos em ombro, cotovelo e joelho, além de função da mão e os reflexos miotendinosos. Considerando que a doença é crônica e rapidamente progressiva, definiu-se como bom quando a terapia foi capaz de barrar a evolução da doença ou melhorar a progressão do quadro clínico. 38% dos pacientes apresentaram piora leve do quadro clínico, enquanto que 14,3% apresentaram melhora e 47,6% mantiveram seu quadro inalterado. A função da mão e o exame neurológico, incluindo-se reflexos, mantiveram-se inalterados. Já a amplitude de movimentos melhorou globalmente nos pacientes, sendo que foi estatisticamente significante para os ombros. Os resultados deste estudo demonstraram pela primeira vez que a terapia de reposição enzimática é capaz de barrar a progressão motora das MPSs ou melhorar o quadro em até 61% dos casos e também que a TRE produz melhora global da amplitude de movimentos, especialmente em ombros e membros superiores. Por estes achados ficou evidente o impacto que a terapia tem sobre a função motora, capacidade física e de mobilidade do paciente para realização de atividades de vida diária. 1 - Serviço de Ortopedia do Hospital Santa Izabel Endereço para correspondência: [email protected] 2015|49 Oliveira, LSRB et al. Diagnóstico de câncer na perspectiva de pessoas do interior e capital da Bahia. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 50-52. Artigo Multiprofissional – Farmácia Diagnóstico de câncer na perspectiva de pessoas do interior e capital da Bahia Ludymilla Silva Ramos Batista de Oliveira1, Jamile de Oliveira Andrade1, Larissa Ferreira Lucas2 Resumo Os linfomas são um conjunto de doenças linfoproliferativas variadas, morfologicamente divididas em linfomas de Hodgkin (LH) e linfoma não-Hodgkin (LNH). Há algumas condições que predispõem o aparecimento dessa patologia, como: o vírus Epstein-Barr e HIV, transplante de órgãos, doenças autoimunes, doenças intestinais como a celíaca e exposição a fatores ambientais, como: exposição à radiação ionizante, herbicidas, solventes orgânicos e resinas de cabelo. O número de mortes no Brasil de pessoas com linfomas não-Hodgkin no ano de 2013 foi de 4.033 óbitos1. Esses altos valores chamam a atenção dos profissionais de saúde que atuam na onco-hematologia e sobre o tratamento oferecido aos pacientes. Assim como as possíveis reações que venham a desenvolver. Sendo assim, foi realizado acompanhamento ao paciente com LNH na nossa instituição, ao protocolo instituído e às reações que o mesmo viesse a ter. Palavras-chave: linfoma não-Hodgkin, Linfoma não-Hodgkin da Zona Cinzenta, R-EPOCH. Key words: non-Hodgkin lymphoma, Hodgkin lymphoma the Grey Zone, R-EPOCH. Non- Introdução Os linfomas são um conjunto de doenças linfoproliferativas variadas, morfologicamente divididas em linfomas de Hodgkin (LH) e linfoma não-Hodgkin (LNH). O linfoma não-Hodgkin apresenta um aumento de incidência entre 50 e 65 anos, mas pode aparecer em qualquer faixa etária, inclusive em crianças. Há mais de 40 formas distintas. O número de mortes no Brasil de pessoas com linfomas não-Hodgkin no ano de 2013 foi de 4.033 casos, sendo 2.231 homens e 1.802 mulheres. A estimativa de novos casos para o ano 2014 foi de 9.790, sendo 4.940 homens e 4.850 mulheres. Por razões ainda desconhecidas, o número de casos duplicou nos últimos 25 anos, principalmente entre pessoas com mais de 60 anos1. Há algumas condições que predispõem o aparecimento dessa patologia, como: o vírus EpsteinBarr, HIV, HTLV-1, Helicobacter Pylori, Vírus Herpes-8, que é o vírus do sarcoma de Kaposi em pacientes com SIDA/HIV, transplante de órgãos devido ao uso prolongado de imunossupressores, doenças autoimunes por levarem ao estado de hiperproliferação dos linfócitos B, doenças intestinais como a celíaca, que pode levar ao aumento de linfoma intestinal e exposição a fatores ambientais, como: exposição à radiação ionizante, herbicidas, solventes orgânicos e resinas de cabelo. Os linfomas não-Hodgkin podem ser classificados em dois grandes grupos: os indolentes e os agressivos. Os indolentes evoluem de uma forma insidiosa, com sobrevida média entre 5-10 anos, porém não respondem bem à quimioterapia. Já os agressivos, se não tratados, evoluem a óbito no período de meses a semanas, porém respondem bem ao tratamento quimioterápico. A atual classificação das neoplasias linfoides baseiase na morfologia, na informação clínica, imunofenotipagem e características genéticas e moleculares2. A maioria dos linfomas podem ser classificado com precisão. No entanto, alguns linfomas presentes com características de transição entre linfoma difuso de grandes celulas B (LDGCB) e linfoma de Hodgkin clássico (LHC) ou LDGCB e linfoma de Burkitt (LB), sendo estes difíceis de classificá-los3. Mas na 4ª edição da Classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS) para as Neoplasias dos Tecidos Hematopoiético e Linfoide, publicada em 2008, incluiu a categoria Linfoma de Células B, não classificável, com características intermédias entre Linfoma Difuso de Grandes Células B e linfoma de Hodgkin Clássico4,5. Essa inclusão abrange ao Linfoma não-Hodgkin da Zona 2015|50 Oliveira, LSRB et al. Diagnóstico de câncer na perspectiva de pessoas do interior e capital da Bahia. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 50-52. Cinzenta (LMZC), este sendo mais comum em adultos jovens do sexo masculino, apresentando um curso clínico mais agressivo, extremamente raro, pior prognóstico quando comparado com o Linfoma de Hodgkin, subtipo Esclerose Nodular (LH-EN) e Linfoma Primário do Mediastino (LPM). O objetivo deste trabalho é descrever um relato de caso de Linfoma não-Hodgkin de células B da Zona Cinzenta, seguido de discussão do tema. Caso Clínico Paciente C.A.J., 46 anos, sexo masculino, natural e procedente de Salvador (BA), profissional enfermeiro, iniciou tratamento quimioterápico em agosto/2015, com programação de R-EPOCH para 6 ciclos com intervalo de 21 a 28 dias. Passando por implante de porth-cath em 07/08/15 e com realização de biópsia de Medula Óssea (MO) para fechamento de diagnóstico com Linfoma não-Hodgkin B agressivo (Grey Zone), com características entre LDGCB e LB. Sendo que as tomografias não mostravam linfonodos aumentados no tórax, abdome ou pescoço. Primeiro ciclo em 11/08/15 e após primeiro dia paciente negou náuseas, vômitos e sem reação infusional ao anticorpo monoclonal, o rituximabe. Ao final do ciclo, o paciente apresentou lesão expansiva em região de face medial do braço direito com cerca de 5x3cm, sem flogose, com redução do tamanho da lesão em eixo perpendicular ao membro, hiperemia em mão e antebraço direito sem outros sinais flogísticos. Recebendo alta hospitalar em 18/08/15, com resultado de hemograma (Hemoglobina 12mm/dL; Hematócrito 36%; Leucócitos 2420 cels/mm3; Segmentados 2580 cels/mm3; Plaquetas. 211.000). Realizou segundo ciclo sem intercorrências entre 05/09/15 e 11/09/15 com resultado de hemograma (Hemoglobina 12,9mm/dL; Hematócrito 38%; Leucócitos 2800 cels/mm3; Segmentados 2232cels/mm3; Plaquetas 224.000), sem demais toxicidades relacionadas à quimioterapia, negando algia, febre, náuseas, linfonodomegalias ou outras queixas, houve diminuição significativa do volume tumoral que o paciente apresentou em membro superior direito. No terceiro ciclo, o paciente realizou entre dias 05/10/15 e 12/10/15 com atraso de 3 dias para início da quimioterapia, devido à febre baixa, porém intermitente, relatada em casa pelo paciente, utilizando Moxifloxacino e Sulfametoxazol e Pirimetamina de caráter profilático. Paciente teve alta hospitalar com resultados laboratoriais (Hemoglobina 10mm/dL; Hematócrito 28%; Leucócitos 2440cels/mm3; Segmentados 2098cels/mm3); Raio-X de tórax normal e urocultura negativa e com boa tolerabilidade à quimioterapia, sem mais intercorrências relevantes. Paciente segue em programação para seu quarto ciclo de R-EPOCH nessa instituição no mês de novembro. Discussão É sabido que em linfomas agressivos a sobrevida sem tratamento é de meses a semanas. Sendo assim a importância do diagnóstico precoce e início do tratamento o mais rápido possível, pois os linfomas agressivos, diferentemente dos indolentes, respondem melhor à quimioterapia, com uma taxa de cura de 40-85%, dependendo do tipo histológico. As características do Linfoma não-Hodgkin de células B do mediastino da Zona Cinzenta (LMZC): tem distribuição etária entre adultos jovens, com maior incidência entre os 20-40 anos, acometendo mais homens do que mulheres, localizando-se no mediastino anterior, com crescimento da “ sheet-like” de células pleomórficas tumorais e fibrose6. O tratamento instituído para esse paciente foi o R-EPOCH (Rituximabe 375mg/m2) IV no D1, seguido de Doxorrubicina 15 mg/m2, Etoposídeo 65 mg/m2 e Vincristina 0,5mg/m2 por infusão contínua do D2 ao D4, Ciclofosfamida 750mg/m2 no D5 e prednisona 60mg/m² por VO de D1-D14, de um a seis ciclos com intervalo de 21 a 28 dias entre os ciclos. Desde o desenvolvimento do protocolo CHOP (ciclofosfamida, vincristina, prednisona), há 25 anos, têm sido feitos muitos esforços para melhorar o tratamento de linfomas agressivo. Estes esforços conduziram ao desenvolvimento de regimes que eram mais complexos e muitas vezes mais tóxicos, porém nenhum demonstrou ser mais eficaz do que o CHOP para o tratamento de linfomas agressivos. Infelizmente, com a terapia padrão CHOP, apenas um terço dos pacientes permanece livre de progressão de doença no período de 5 anos. O mesmo relata que inúmeros estudos, por um período de aproximadamente 10 anos, resultaram no protocolo EPOCH (etoposídeo, prednisona, vincristina, ciclofosfamida, doxorrubicina) com uma infusão intravenosa contínua durante 96 horas. O EPOCH foi inicialmente avaliado em 131 pacientes com linfomas recidivos ou refractário e mostrou uma alta taxa de resposta (74%) em geral e toxicidade tolerável7. Num estudo realizado in vitro, o rituximabe foi utilizado para regular a expressão do gene conhecido como Bcl-2, responsável por codificar uma proteína envolvida no processo de controle da apoptose e sensibilizar as células do linfoma para os agentes citotóxicos, visto que 2015|51 Oliveira, LSRB et al. Diagnóstico de câncer na perspectiva de pessoas do interior e capital da Bahia. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 50-52. os pacientes que possuem a expressão do Bcl-2 possuem taxa de resposta de sobrevida livre de progressão em torno de 50%, e os que não possuem essa taxa aumentam para 82%8. Em um seguimento de 33 meses com 50 pacientes em uso de Rituximabe-EPOCH (R-EPOCH), tratados previamente com outro protocolo, realizaram uma média de 4 ciclos, variando de um a seis ciclos, sendo que catorze pacientes tiveram remissão completa e vinte pacientes, remissão parcial9. O paciente C.A.J. encontra-se no seu terceiro ciclo, apresentando remissão das lesões de pele no braço direito, baixa toxicidade ao protocolo e boa tolerabilidade às infusões de quimioterapia. Além de não serem observadas as reações como febre, broncoespasmos e calafrios durante a primeira infusão do rituximabe, já conhecido como medicamento capaz de produzir tais reações no paciente. Em outro estudo com 24 pacientes com LMZC entre nov/1999 e fev/2013, foi avaliada a toxicidade em todos os 145 ciclos de dose ajustada - etoposideo, doxorrubicina, ciclofosfamida, vincristina, prednisona e rituximabe ( DA- EPOCH –R). O alvo farmacodinâmico dos neutrófilos absolutos (ANC)<500 células/mm3 foi conseguida em 53% dos ciclos, com baixa frequência de ANC < 100 células/mm3 (9%) e trombocitopenia < 25.000 céls/mm3 (2%). Febre e neutropenia ocorreu em 12% dos ciclos. Grau 3 ou toxicidades não-hematopoiéticas superiores incluindo íleo e toxicidade neurosensorial ocorreu em < 4% dos doentes. Não houve mortes relacionadas ao tratamento10. Comparando com os dados clínicos do paciente C.A.J, o mesmo não apresentou neutropenias como as relatadas no estudo anterior, sendo considerado um bom tolerante à quimioterapia e por consequência com poucas possibilidades de desenvolver uma infecção oportunista, que poderia acarretar em um prejuízo ao tratamento do mesmo. E com boas expectativas para o quarto ciclo, que será realizado no mês de novembro. Referências 1. Ministério da Saúde, Instituto Nacional do Câncer (INCA). Estimativas de linfoma não-hodgkin 2014. Disponível em:http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/ tiposdecancer/site/home/linfoma_nao_hodgkin]. Acesso em out/2015. 2. HOELLER, S.; COPIE- BERGMAN, C. Grey Zone Lymphomas: Lymphomas with Intermediate Features. Advances in Hematology. France. 2012 3. QUINTANILLA-MARTINEZ, L. et al., Gray zones around diffuse large B cell lymphoma. Conclusions based on the workshop of the XIV meeting of the European Association for Hematopathology and the Society of Hematopathology in Bordeaux, France. Journal of Hematopathology, vol. 2, no. 4, 2009. Disponível em [http:// www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20309430]. Acesso em nov/2015. 4. ZERBINI, M. C. N. et al. Classificação dos tumores hematopoéticos e linfoides de acordo com a OMS: padronização da nomenclatura em língua portuguesa, 4ª edição. Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial. v. 47. Rio de Janeiro. 2011. Disponível em: [http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1676-24442011000600011&script=sci_arttext]. Acesso em nov/2015. 5. CAMPO, E. et al. The 2008 WHO classification of lymphoid neoplasms and beyond: evolving concepts and practical applications. Blood. 2011. 6. SOUSA, E. B. B. O Desafio no Diagnóstico de Linfomas Agressivos. Serviço de Hematologia Clínica do Hospital de Santo António – Centro Hospitalar do Porto, Portugal. 2011. Disponível em: [http://repositorio-aberto. up.pt/bitstream/10216/66291/2/93213.pdf] Acesso em out/2015. 7. WILSON, W.H. et al. Dose-adjusted EPOCH chemotherapy for untreated large B-cell lymphomas: a pharmacodynamic approach with high efficacy. Blood. 2002. 8. WILSON, W.H. et al. WPhase II study of dose-adjusted EPOCH-rituximab in untreated high risk large B-cell lymphomas. Blood. 2001. 9. JERMAN, M. et al. Rituximab–EPOCH, an effective salvage therapy for relapsed, refractory or transformed B-cell lymphomas: results of a phase II study. Annals de Oncology, 2004. 10. WILSON, W.H. et al.. A prospective study of mediastinal gray-zone lymphoma. Blood. 2014. Disponível em: [http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/ PMC4155269/]. Acesso em out/2015. 1 - Serviço de Farmácia da Oncologia do Hospital Santa Izabel 2 - Serviço de Hematologia do Hospital Santa Izabel Endereço para correspondência: [email protected] 2015|52 Protocolo de atendimento Síndrome Coronariana Aguda sem SUPRA de ST 1. OBJETIVO Oferecer aos pacientes que procuram o serviço de emergência de adulto do Hospital Santa Izabel com Síndrome Coronariana Aguda um atendimento rápido e organizado e um tratamento adequado, baseado em diretrizes atuais. 2. TERMOS E DEFINIÇÕES 2.1. IAM SST- INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO SEM SUPRADESNIVELAMENTO DO SEGMENTO ST Os critérios eletrocardiográficos sugestivos de IAM sem supra de ST na presença de sintomas compatíveis com síndrome coronariana aguda são: Infra de ST horizontal ou descendente > = 0,05 mV (0,5 mm) em duas derivações contíguas da mesma parede e/ou inversão de onda T > = 0,1 mV (1 mm) em duas derivações contíguas da mesma parede. 3. META Diagnóstico precoce e realização do eletrocardiograma em 10 minutos. 4. ELEGIBILIDADE 4.1. Critérios de Inclusão Pacientes com dor torácica ou sintoma considerado equivalente isquêmico. 5. PONTOS CRÍTICOS Identificar precocemente os pacientes com dor torácica. Análise imediata do eletrocardiograma por parte do médico plantonista. Reconhecer que paciente com dor torácica típica, mesmo com ECG normal e troponina negativa, poderá ter síndrome coronariana aguda. 6. MARCADORES DO PROCESSO Reconhecimento precoce de paciente com dor torácica – 100%. Realizar eletrocardiograma em 10 minutos – 100%. Taxa de uso de aspirina na alta. Média de permanência hospitalar dos pacientes que entram no protocolo. 7. INDICADORES DE RESULTADO Taxa de mortalidade dos pacientes que entram no Protocolo. Comparar a mortalidade hospitalar com a mortalidade predita pelo escore GRACE. 8. PÚBLICO-ALVO Pacientes assistidos com suspeita de IAM sem supra de ST no Hospital Santa Izabel. 9. MEDIDAS GERAIS E TRATAMENTO MEDICAMENTOSO 1- Repouso no leito nas primeiras 24 horas, podendo se prolongar à medida que estejam presentes sintomas ou achados ao exame físico ou em exame complementar que caracterize instabilidade clínica. 2- Monitorização cardíaca contínua. 3- Oxigenioterapia apenas para pacientes dispneicos, com saturação < 90% ou com fatores de risco para hipoxemia. 4- Nitrato – usar apenas: • em pacientes com isquemia persistente; • em pacientes com insuficiência cardíaca; • em pacientes hipertensos. Dinitrato de Isossorbida, 5mg sublingual a cada 5 minutos em três oportunidades, se necessário. Nitroglicerina IV, 5 a 10 mcg/min. em infusão contínua, podendo-se aumentar a dose em 10mcg/min a cada 10 minutos até o alívio do sintoma ou o aparecimento de efeitos adversos (cefaleia, hipotensão arterial PAS < 100mmHg e/ou aumento da frequência cardíaca para >10% do basal. Contraindicado o uso na presença de hipotensão arterial (PAS < 90 mmHg), bradicardia (FC < 50bpm) e para pacientes que fizeram uso recente de inibidores da fosfodiesterase (24 horas para sildenafila ou vardenafila e 48 horas para tadalafila). 5- Morfina: indicada para pacientes que persistam com sintomas anginosos a despeito do uso da terapêutica anti-isquêmica apropriada. Morfina de ser empregada na dose de 1 a 5 mg, por via intravenosa, podendo ser repetida a cada 5 ou 30 minutos, se for necessário. 6- AAS: usar dose de ataque de 200mg, mastigado ou macerado (caso não tenha feito na sala de emergência ou hemodinâmica) e depois manter indefinidamente, desde que não tenha contraindicações (sangramento ativo, anafilaxia, etc.). A dose de manutenção pode variar de 100 a 200mg dia (usar sempre uma dose > ou = a 1 mg/Kg/dia), administrado por via oral, em dose única. 7- Inibidores P2Y12: em associação com AAS ou isoladamente em pacientes com contraindicações ao uso do AAS, deve-se utilizar pelo período de pelo menos 1 ano: • Clopidogrel: 300 mg ou 600 mg (perspectiva de in- 53 tervenção dentro de 6 horas) de dose de carga (caso não tenha feito na sala de emergência ou hemodinâmicas), seguida de 75 mg/dia por via oral. • Ticagrelor: dose de ataque de 180 mg (caso não tenha feito na sala de emergência ou hemodinâmicas), seguida de 90 mg duas vezes ao dia. • Prasugrel: em pacientes que vieram do Laboratório de Hemodinâmica e que fizeram uso de dose de ataque de 60 mg de prasugrel, deve-se manter a dose de 10 mg/ dia por via oral. 8- Inibidores da GlicoproteinaIIbIIIa: pacientes que em uso da terapêutica antiplaquetária dupla e que estejam evoluindo com recorrência de isquemia pode-se lançar mão de um inibidor da glicoproteína IIbIIIa, até que se providencie a realização de procedimento de revascularização (cirurgia ou angioplastia). Nestas situações, a escolha recai sobre o Tirofiban a dose recomendada é de 0,4 mg/kg/min, por 30 minutos, seguida da dose de manutenção de 0,1 mg/kg/min, podendo ser mantido por até 96 horas. Em caso de cirurgia deve-se suspender a droga 4 a 6 horas antes do procedimento cirúrgico, enquanto que, se o paciente for para angioplastia, a droga não deve ser suspensa e deve ser mantida por, no mínimo, 12 horas após o término do procedimento percutâneo. 9- Tratamento Anticoagulante: o tratamento anticoagulante deve ser mantido ao menos nas primeiras 48 horas ou até a realização da angioplastia coronária nos pacientes que foram estratificados de forma invasiva. As opções disponíveis são: • Enoxaparina – 1 mg/Kg de peso a cada 12 horas, administrado por via subcutânea. Pacientes com clearance de creatinina estimado menor que 30 mL/min deve ajustar a dose para 1 mg/Kg de peso uma vez ao dia. • Fondoparinux – 2,5 mg/dia por via SC. Melhor opção para aqueles pacientes que são mantidos em terapêutica clínica e naqueles com elevado risco de sangramento. • Heparina não fracionada – dose de ataque de 60 IU/ kg de peso (dose máxima de 4000 IU), com infusão inicial de 12 IU/kg/h e ajustando a dose conforme o TTPa. 10- Betabloqueador: deve ser iniciado nas primeiras 24 horas, em pacientes sem sinais de IC aguda, sinais de baixo débito, bloqueio AV de 1° grau com PR > 240 mseg, BAV de II ou III grau sem uso de MP, história de asma ou reatividade brônquica. Deve-se iniciar o uso de metoprolol por via oral, podendo a dose variar de 25 a 200 mg/dia, de acordo com a frequência cardíaca e a pressão arterial. Em pacientes com quadro de IC estabilizada, recomenda-se o uso oral do metoprolol ou carvedilol, este último em dose que pode variar de 3,125 mg a 25 mg, de 12/12 horas. O betabloqueador IV pode ser utilizado em situações onde seja seguro fazê-lo e, também, seja desejável a rápida redução da FC, como por exemplo em pacientes isquêmicos com hipertensão e taquicardia. Em pacientes com indicação de uso de betabloqueador em que seja desejável o uso de uma droga de ação rápida e de meia vida curta (p. ex.: pacientes instáveis, pacientes com contraindicações relativas, etc) pode-se optar pelo uso de esmolol por infusão venosa contínua. Dilui-se 1 ampola de Brevbloc (2500mg) em 250 ml de SG a 5% (concentração de 10 mg/ml) e a dose varia de 50 a 200 mcg/kg/ min (0,05 a 0,2 mg/kg/min). Os pacientes que não possuem contraindicação definitiva e que não utilizaram betabloqueador por alguma outra circunstância clínica, devem ter reavaliada diariamente a indicação de uso da droga. 11- Antagonista dos Canais de Cálcio – Diltiazem está indicado para pacientes que apresentem recorrência de isquemia e que têm contraindicação ao uso de betabloqueadores, desde que não estejam presentes: sinais de IC, instabilidade hemodinâmica, bloqueio AV de 1° grau com PR > 240 mseg ou BAV de II ou III grau sem uso de MP. O Diltiazem deve ser utilizado por via oral, em doses que podem variar de 30 a 60 mg, administradas a cada 3 ou 4 vezes ao dia. Também pode estar indicado para pacientes que evoluam com persistência de isquemia, apesar do uso de betabloqueadores e nitratos. Nesta situação em que o paciente está em uso de betabloqueador deve-se preferir Anlodipino oral, na dose de 5 a 10 mg/dia. 12- IECA – Inibidores da ECA devem ser iniciados e mantidos a longo prazo, em pacientes com FE < 40%, assim como naqueles com HAS ou DM. Pode-se optar por captopril em doses que variam de 12,5 a 50 mg a cada 8 horas, Enalapril de 5 a 10 mg a cada 12 horas e Ramipril de 2,5 a 10 mg a cada 12 horas. 13- Bloqueadores dos Receptores de Angiotensina (BRA): estão indicados para pacientes com intolerância a IECA. Pode-se optar por losartana em doses que variam de 25 a 50 mg a cada 12 horas e valsartana de 80 a 160 mg a cada 12 horas. 14- Espironolactona: indicada para pacientes com IC ou pós IAM com FE< 40% e em uso de betabloqueador e IECA. Constitui-se contraindicação ao seu uso disfunção renal significativa (creatinina> 2,5 mg / dL em homens ou > 2,0 mg / dL em mulheres) ou hipercalemia (K > 5,0 mEq / L). 15- Estatina: atorvastatina 80 mg/dia, por via oral, deve ser administrada a partir das primeiras 24 horas, a todos os pacientes, salvo existam contraindicações. 16- Balão de Contra – pulsação aórtica: deve ser utilizado em pacientes que estejam cursando com instabilidade hemodinâmica ou com isquemia refratária e que 54 estejam na perspectiva de realizar um procedimento de revascularização miocárdica (cirurgia ou angioplastia). 17- Fisioterapia – Todos os pacientes internados na UCO deverão ter prescrição de fisioterapia respiratória. A UCO tem como objetivo geral a ser perseguido a mobilização do paciente fora do leito, se possível, decorridas as primeiras 24 horas de evolução. Porém, na visita multiprofissional pela manhã, baseado nos parâmetros clínicos de evolução de cada paciente e na relação risco-benefício envolvida, deverá ser definida a liberação ou não do paciente para movimentação fora do leito, assim como o tipo de mobilização permitida. 18- Acompanhamento Psicológico – Será utilizado como critério de solicitação para acompanhamento psicológico dos pacientes com SCA sem supra: • Pacientes com SCA em que foi indicado procedimentos invasivos (cirurgia de revascularização miocárdica, angioplastia coronária ou CATE). • Histórico psiquiátrico prévio (depressão, esquizofrenia, transtorno bipolar, etc). • Pacientes portadores de deficiência prévia (cognitiva, visual ou auditiva). • Identificação de demandas por parte da equipe. Na primeira manhã após a admissão: colesterol total, HDL, triglicérides, hemograma completo, glicemia, ureia, creatinina, Na e K. Diariamente: hemograma completo, glicemia, ureia, creatinina, Na e K. 9.3.ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO Os pacientes internados com SCA tem um risco aumentado de novos eventos no primeiro ano após o internamento inicial. Este risco é particularmente maior no primeiro mês após o internamento com SCA. Assim, algumas características clínicas e eletrocardiográficas, além da elevação dos marcadores de necroses miocárdicas, permitem identificar pacientes com perfil de maior risco de eventos futuros. Para classificar os pacientes quanto ao seu risco têm sido utilizados alguns escores, sendo o escore GRACE um dos mais utilizados e o que tem apresentado melhor capacidade de predição. Assim, em todo paciente admitido com SCA sem supra de ST deve ser obtido o escore de risco GRACE. 9.1. ELETROCARDIOGRAMA O eletrocardiograma de pacientes internados em unidade fechada (UCO/UTI) com SCA deve ser realizado a cada 8 horas no primeiro dia de admissão hospitalar com o diagnóstico de SCA. A partir daí, o ECG deve ser repetido diariamente pela manhã. Pacientes que apresentem recorrência de sintomas devem ter o ECG repetido mais frequentemente. Pacientes que chegaram à unidade após a realização de intervenção coronária percutânea deve ter ECG realizado logo após a sua chegada na UCO e repetido a critério do médico plantonista. O primeiro na admissão do paciente com SCA na UCO deve incluir o registro das derivações V7 e V8. 9.2. EXAMES LABORATORIAIS Os pacientes internados no HSI com SCA deverão realizar rotineiramente os seguintes exames de laboratório: Na Admissão: CK-Mb massa, hemograma completo, glicemia, ureia, creatinina, Na, K, TP, TTPa. Troponina e CK-Mb massa: pelo menos duas dosagens, desde que o intervalo entre elas não seja inferior a 9 horas. Depois, solicitar apenas em situação de necessidade de caracterização de curva compatível com IAM, em casos de recorrência de isquemia ou após intervenções percutâneas. 55 Pacientes que evoluam com sinais de instabilidade clínica ou com isquemia refratária devem realizar o CATE em caráter de urgência. A partir da soma de pontos obtida, os pacientes têm sido separados em três estratos de risco: • Baixo Risco: até 108 pts. (mortalidade hospitalar < 1%). • Risco Intermediário: de 109 a 140 pts. (mortalidade hospitalar entre 1 e 3%). • Alto Risco: ≥ 140 pts. (mortalidade hospitalar > 3%). 9.4. REALIZAÇÃO DE CATETERISMO CARDÍACO Buscando aperfeiçoar a estratificação do risco de novos eventos pelos pacientes, o cateterismo cardíaco (CATE) é o método invasivo utilizado para identificar os pacientes com anatomia coronária de maior risco e que possam se beneficiar de procedimentos de revascularização miocárdica (angioplastia ou cirurgia). No nosso serviço indicamos CATE precoce (primeiras 48 horas) como modo preferencial de estratificação nas seguintes situações: • Pacientes de risco moderado ou alto. • Pacientes que evoluíram com recorrência de isquemia identificada por angina e/ou por alterações isquêmicas no ECG. • Por indicação do médico assistente. Estes pacientes devem ter o seu exame agendado na rotina para o dia subsequente a sua chegada. Quando o paciente chegar em finais de semana e feriados e o escore GRACE for ≥ 140 pontos, um exame deve ser agendado para o dia seguinte e deve-se chamar o cardiologista intervencionista de sobreaviso para realizar o procedimento. Nos pacientes com GRACE intermediário (entre 109 e 139) ou baixo, mas que tenha se definido por estratégia invasiva, o exame deve ser agendado para o primeiro dia útil após o feriado. Todavia, caso o paciente apresente recorrência de isquemia, clínica ou silenciosa (caracterizada pelo ECG), o CATE deve ser antecipado. 9.5.ESTRATIFICAÇÃO SELETIVA INVASIVA Neste cenário, os pacientes são acompanhados com o tratamento clínico e realizam CATE apenas se apresentarem recorrência espontânea de isquemia ou se em testes funcionais (TE, ECO estresse ou cintilografia miocárdica), realizados durante o internamento, apresentarem sinais ou sintomas compatíveis com isquemia miocárdica. No nosso Serviço indicamos a estratificação seletivamente invasiva nas seguintes situações: • Pacientes de baixo risco. • Indicação do médico assistente. Em casos de pacientes com outras comorbidades que limitem o prognóstico, o manejo clínico deve ser individualizado, com discussão conjunta pela equipe multiprofissional, junto às outras especialidades e profissionais assistentes envolvidos. 9.6. ECOCARDIOGRAMA Deve ser realizado nas seguintes situações: • Todos os pacientes que tiveram IAM. • Pacientes sem nenhuma avaliação recente da função ventricular esquerda. • Pacientes com manifestações de IC. • Pacientes que forem encaminhados para realizar CATE sem ventriculografia. OBS.: em muitas situações, os exames poderão ser realizados após a alta para unidade aberta e antes da alta hospitalar, sem prejuízos aos pacientes. 9.7. CRITÉRIO DE ALTA Os pacientes com SCA sem supra de ST devem ter alta para unidade aberta decorridas 48 horas da última manifestação de isquemia miocárdica ou de outra manifestação clínica julgada relevante (congestão, arritmia, etc.). 10. REFERÊNCIA NORMATIVA 2013 ACCF/AHA Guideline for the Management of ST-Elevation Myocardial Infarction. Diretrizes Brasileiras de Antiagregantes Plaquetários e Anticoagulantes em Cardiologia. Third universal definition of myocardial infarction, European Heart Journal (2012) 33, 2551–2567. Acute Myocardial Infarction in patients presenting with ST-segment elevation, ESC Clinical Practice Guidelines, European Heart Journal (2012) 33, 2569–2619. REVISTA DE SAÚDE DO HOSPITAL SANTA IZABEL SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DA BAHIA 56 11. Membros elaboradores Dr. Marcus Vinícius Matos Dr. Joberto Sena Dr. Paulo Barbosa Dr. Antônio Neri Dr. José Carlos Brito Dra. Andrea Karolinne Dr. Paulo Adriano Leão Enfa. Lucimare Passos Enfa. Joselma Reis Enfa. Olga Novaes Enfa. Aridea Mamédio Enfa. Isilda Queiroz Bioquímica Jussara Silveira Farmacêutica Bárbara Kely 12. Consenso Camilla Cumming Dr. Luís Afonso Lígia Wanke Jaqueline Noronha 57 EVENTOS Eventos Fixos NOME DO EVENTO LOCAL DIA DA SEMANA HORÁRIO SESSÃO DE HEMODINÂMICA AUDITÓRIO JORGE FIGUEIRA 2ª FEIRA 07 ÀS 09 HORAS SESSÃO DE CASOS CLÍNICOS E ARTIGOS EM CLÍNICA MÉDICA AUDITÓRIO JORGE FIGUEIRA 3ª FEIRA 10 ÀS 12 HORAS SESSÃO DE ATUALIZAÇÃO EM CLÍNICA MÉDICA AUDITÓRIO JORGE FIGUEIRA 5ª FEIRA 11 ÀS 12 HORAS SESSÃO MULTIDISCIPLINAR DE ONCOLOGIA AUDITÓRIO JORGE FIGUEIRA 5ª FEIRA 07 ÀS 09 HORAS SESSÕES DE OTORRINOLARINGOLOGIA SALA DE TREINAMENTO 04 3ª E 6ª FEIRA 07 ÀS 09 HORAS SESSÃO DE TERAPIA INTENSIVA SALA DE TREINAMENTO 04 4ª FEIRA 11 ÀS 13 HORAS SESSÃO DE RADIOLOGIA TORÁCICA (PNEUMOLOGIA) SALA DE TREINAMENTO 04 4ª FEIRA 07 ÀS 09 HORAS SESSÕES DE NEUROLOGIA SESSÕES DE UROLOGIA AUDITÓRIO DO SENEP 4ª FEIRA 17 ÀS 19 HORAS SALA DE TREINAMENTO 04 5ª FEIRA 16 ÀS 19 HORAS AUDITÓRIO DO SENEP 3ª FEIRA 07 ÀS 08 HORAS AUDITÓRIO DO SENEP 4ª A 6ª FEIRA 07 ÀS 09 HORAS SESSÃO DE CIRURGIA GERAL AUDITÓRIO DO SENEP 3ª FEIRA 08 ÀS 10 HORAS SESSÕES DE ANESTESIOLOGIA SALA DE TREINAMENTO 01 2ª A 6ª FEIRA 07 ÀS 09 HORAS SESSÃO DE PNEUMOLOGIA AUDITÓRIO DO SENEP 5ª FEIRA 08 ÀS 10 HORAS SESSÕES DE CARDIOLOGIA PEDIÁTRICA SALA DE TREINAMENTO 02 5ª FEIRA 07 ÀS 09 HORAS SALA DE TREINAMENTO 03 6ª FEIRA 07 ÀS 09 HORAS SESSÃO DE ARRITMOLOGIA SALA DE TREINAMENTO 03 4ª FEIRA 13 ÀS 15 HORAS SALA DE TREINAMENTO 02 4ª FEIRA 07:30 ÀS 09:00 HORAS SALA DE TREINAMENTO 01 5ª FEIRA 09:00 ÀS 10:30 HORAS SESSÕES DE REUMATOLOGIA INSTRUÇÕES AOS AUTORES Especificações do Editorial - Normatização Geral Classificação manuscritos Nº máximo de autores TÍTULO: Nº máximo de RESUMO: Nº máximo caracteres com espaço de palavras Editorial 2 100 0 Atualização de tema 4 100 250 Resumo de artigos publicados pelo HSI 10 100 250 Relato de casos 6 80 0 Continuação: Classificação manuscritos Nº máximo de palavras Nº máximo de Nº máximo de com referência referências tabelas ou figuras Editorial 1.000 10 2 Atualização de tema 6.500 80 8 Resumo de artigos publicados pelo HSI 1.500 10 2 Relato de casos 1.500 10 2 58