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ANO 2 | n
0
04| VOL.02 | DEZEMBRO 2015
EDITORIAL
D i fi c u ld a d e s i ne re nt e s à
pesquisa médica em
seres humanos
R E L AT O D E C A S O
A p re s e nt a ç ã o ne u ro ló g i c a
de hipoparatireoidismo
pós-cirúrgico permanente
AT U A L I Z A Ç Ã O D O T E M A
Te r a p i a e n d o v a s c u l a r p a r a
o acidente vascular cerebral
isquêmico agudo: um marco
histórico
RESUMO DE ARTIGO
Heart Failure Survival Score
em pacientes com Doença de
Chagas: correlação com
variáveis funcionais
ISSN 235777903
R E V I S TA D E S A Ú D E
RSHSI Nº 04 VOL. 02 ANO: 2015, MÊS: DEZEMBRO
SUPERVISORES DOS PROGRAMAS DE RESIDÊNCIA MÉDICA
1. ANESTESIOLOGIA
Supervisor: Prof. Dr. Jedson dos Santos Nascimento
10. MEDICINA INTENSIVA
Supervisor: Prof. Dr. Edson Marques Filho
2. CANCEROLOGIA CLÍNICA
Supervisor: Prof. Dr. Dálvaro de Oliveira Castro Júnior
11. NEONATOLOGIA (Maternidade Prof. José Maria de
Magalhães Netto)
Supervisora: Profa. Dra. Rosana Pellegrini Pessoa
3. CARDIOLOGIA
Supervisor: Prof. Dr. Gilson Soares Feitosa
4. CARDIOLOGIA PEDIÁTRICA
Supervisora: Prof a. Dra. Anabel Góes Costa
5. CLÍNICA MÉDICA
Supervisor: Prof. Dr. Jamocyr Moura Marinho
6. CIRURGIA GERAL
Supervisor: Prof. Dr. André Ney Menezes Freire
7. CIRURGIA DO APARELHO DIGESTÓRIO
Supervisor: Prof. Dr. André Ney Menezes Freire
8. GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA (Maternidade Prof. José Maria
de Magalhães Netto)
Supervisor: Prof. Dr. Rone Peterson Cerqueira Oliveira
12. NEUROLOGIA
Supervisor: Prof. Dr. Pedro Antônio Pereira de Jesus
13. ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA
Supervisor: Prof. Dr. Rogério Meira Barros
14. OTORRINOLARINGOLOGIA
Supervisor: Prof. Dr. Nilvano Alves de Andrade
15. PNEUMOLOGIA
Supervisor: Prof. Dr. Jamocyr Moura Marinho
16. REUMATOLOGIA
Supervisor: Prof. Dr. Mittermayer Barreto Santiago
17. UROLOGIA
Supervisor: Prof. Dr. Luiz Eduardo Café
9. HEMODINÂMICA E CARDIOLOGIA INTERVENCIONISTA
Supervisor: Prof. Dr. José Carlos Raimundo Brito
COEDITORES DA REVISTA DE SAÚDE DO HSI
ANESTESIOLOGIA
Jedson dos Santos Nascimento
HEMODINÂMICA E CARDIOLOGIA INTERVENCIONISTA
José Carlos Raimundo Brito
ÁREA MULTIPROFISSIONAL
Patrícia Alcântara Doval de Carvalho Viana
MEDICINA INTENSIVA
Edson Marques Silva Filho
CANCEROLOGIA CLÍNICA
Dálvaro Oliveira de Castro Júnior
NEONATOLOGIA
Rosana Pellegrini Pessoa
CARDIOLOGIA
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NEUROLOGIA
Jamary Oliveira Filho
CARDIOLOGIA PEDIÁTRICA
Anabel Góes Costa
ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA
Marcos Antônio Almeida Matos
CIRURGIA GERAL
André Ney Menezes Freire
OTORRINOLARINGOLOGIA
Nilvano Alves Andrade
CIRURGIA DO APARELHO DIGESTIVO
André Ney Menezes Freire
PNEUMOLOGIA
Jamocyr Moura Marinho
CLÍNICA MÉDICA
Alina Coutinho Rodrigues Feitosa
REUMATOLOGIA
Mittermayer Barreto Santiago
GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA
Rone Peterson Cerqueira Oliveira
UROLOGIA
Luiz Eduardo Café
3
CONSELHO EDITORIAL
EDITOR-CHEFE
Gilson Soares Feitosa
Hospital Santa Izabel - Santa Casa de Misericórdia da Bahia
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Adriano Dias Dourado Oliveira
Adson Roberto Santos Neves
Alex Guedes
Alina Coutinho Rodrigues Feitosa
Ana Lúcia Ribeiro de Freitas
Anabel Góes Costa
André Ney Menezes Freire
Angele Azevedo Alves Mattoso
Anita Perpétua Carvalho Rocha de Castro
Antônio Carlos de Sales Nery
Antônio Fernando Borba Fróes Júnior
Antônio Moraes de Azevedo Júnior
Augusto José Gonçalves de Almeida
Áurea Angélica Paste
Bruno Aguiar
Cristiane de Brito Magalhães
Cristiane Abbhusen Lima Castelo Branco
Dálvaro Oliveira de Castro Júnior
Daniela Barros
Darci Malaquias de Oliveira Barbosa
Daniel Santana Farias
Daniele Leal Braga da Silva
David Greco Varela
Edson Marques Silva Filho
Elves Anderson Pires Maciel
Fábio Luís de Jesus Soares
Flávio Robert Sant’ana
Gilson Soares Feitosa-Filho
Giovanna Lúcia Oliveira Bonina Costa
Guilhardo Fontes Ribeiro
Gustavo Almeida Fortunato
Heitor Ghissoni de Carvalho
Humberto Ferraz França de Oliveira
Iana Conceição da Silva
Ilana D´Andrade Souza
Jacqueline Araújo Teixeira Noronha
Jamary Oliveira Filho
Jamile Seixas Fukuda
Jamocyr Moura Marinho
Jayme Fagundes dos Santos Filho
Jeany de Oliveira Barreto
Jedson Nascimento dos Santos
Joberto Pinheiro Sena
Joel Alves Pinho Filho
Jorge Bastos Freitas Júnior
Jorge Eduardo de Schoucair Jambeiro
José Alves Rocha Filho
Lígia Beatriz Wanke de Azevedo
Liliana D’Almeida Galrão
Lívia Maria Quirino da Silva Andrade
Luciane Souza Coutinho
Lucimar Soares Garcia Rosa
Luís Fernando Pinto Jonhson
Luiz Eduardo Fonteles Ritt
Marcos Vinícius Santos Andrade
Maria do Socorro Albuquerque Miranda
Maria Lúcia Duarte
Mariana Lesquives Vieira
Matheus Tannus dos Santos
Maura Alice Santos Romeo
Melba Moura Lobo Moreira
Nilzo Augusto Mendes Ribeiro
Paulo José Bastos Barbosa
Pedro Antônio Pereira de Jesus
Pepita Bacelar Borges
Patrícia Alcântara Doval de Carvalho Viana
Patrícia Falcão Pitombo
Rajaná Regina Moura Itaparica
Reinaldo da Silva Santos Júnior
Renato Ribeiro Gonçalves
Ricardo Eloy Pereira
Rogério Meira Barros
Rone Peterson Cerqueira Oliveira
Rosalvo Abreu Silva
Rosana Pellegrini
Sandra Oliveira Silva
Sérgio Tadeu Lima Fortunato Pereira
Sheldon Perrone de Menezes
Ubirajara de Oliveira Barroso Júnior
Verusca de Matos Ferreira
Viviane Sampaio Boaventura Oliveira
4
EXPEDIENTE
SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DA BAHIA
Provedor
Roberto Sá Menezes
Vice-Provedor
Luiz Fernando Studart Ramos de Queiroz
Escrivão
Renato Augusto Ribeiro Novis
Tesoureira
Ana Elisa Ribeiro Novis
Hospital Santa Izabel
Superintendente de Saúde
Eduardo Queiroz
Diretor de Ensino e Pesquisa
Gilson Soares Feitosa
Diretor Técnico-Assistencial
Ricardo Madureira
Diretora Administrativa e de Mercado
Mônica Bezerra
EXPEDIENTE
Ag editora
Ana Lúcia Martins
Vanessa Cerqueira
5
SUMÁRIO
7
Editorial
40
Relato de Caso: Neurologia
8
Atualização de Tema: Anestesiologia
43
Resumo de Artigo: Cardiologia
15
Atualização de Tema: Neurologia
46
Resumo de Artigo: Coloproctologia
22
Atualização de Tema: Ortopedia
49
Resumo de Artigo: Ortopedia
50
Artigo Multiprofissional: Farmácia
53
Protocolo de Atendimento 58
Eventos
Cardiomiopatia do estresse
(Takotsubo): relato de caso
Joel Alves Pinho
58
Instruções aos Autores
Relato de Caso: Cirurgia
Errata
26
31
34
37
Dificuldades inerentes à pesquisa médica em
seres humanos
Gilson Feitosa
Teoria da coagulação baseada em
superfícies celulares e terapia guiada por
tromboelastometria
Murilo Pereira Flores
Terapia endovascular para o acidente vascular
cerebral isquêmico agudo: um marco histórico
Mateus Santana do Rosário
Impactos do envelhecimento humano na
ORTOPEDIA. A especialidade está preparada?
Flávio Robert Santana
Atualização de Tema: Pneumologia
Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação
da hipertensão pulmonar
Marcel Lima Albuquerque
Relato de Caso: Bioimagem
Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio
sem contraste: relato de caso
Paulo Henrique Muccini
Relato de Caso: Cardiologia
Papel da exenteração pélvica no câncer
de colo de útero
Adson Neves
Apresentação neurológica de
hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente
Gabriel Xavier-Souza
Heart Failure Survival Score em pacientes com
Doença de Chagas: correlação com variáveis
funcionais
Marcus V. S. Andrade
Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula
anal: considerações técnicas de resultados
preliminares da primeira experiência brasileira
Luciano Santana de Miranda Ferreira
Avaliação dos efeitos da terapia de reposição
enzimática na função motora de pacientes com
mucopolissacaridoses
Marcos Almeida Matos
Uso de R-EPOCH em paciente com
Linfoma não-Hodgkin da Zona Cinzenta
Ludymilla Silva Ramos Batista de Oliveira
Na edição passada da Revista de Saúde –
Hospital Santa Izabel (ANO 2 / Nº 3 / VOL. 02 /
SETEMBRO 2015), na página 47, onde se lê, artigo
multiprofissional – Enfermagem. Leia-se, artigo
multiprofissional – Psicologia.
EDITORIAL
Dificuldades inerentes à pesquisa
médica em seres humanos
Autor: Gilson Feitosa 1
Maria da Consolação é uma jovem senhora de
35 anos, alegre, com a perspectiva de sua primeira
gestação.
Seu médico é um ativo pesquisador na área de obstetrícia e, durante o acompanhamento do seu processo gestacional, além de lhe explicar os cuidados básicos a serem tomados durante sua gravidez, aventou a
possibilidade do seu engajamento num novo estudo,
em que se testava a eficácia da aspirina em prevenir
pré-eclâmpsia em gestantes de maior risco de aparecimento da condição, como era o seu caso.
Sua concordância foi a de tomar um medicamento contendo aspirina ou placebo, sendo-lhe explicado
que nem mesmo o médico que lhe prescrevia o medicamento do estudo sabia o seu real conteúdo. Somente quando da conclusão da observação feita ao longo
dos meses de acompanhamento e juntando para análise os seus com os demais resultados de muitas outras participantes, seria possível concluir se, de fato, a
aspirina tinha sido eficaz em prevenir a pré-eclâmpsia,
comparando o número de casos desta ocorrência entre as pacientes que fizeram uso da aspirina e aquelas
que fizeram o uso do placebo.
Cefaleias eram comuns na vida da Maria e se exacerbaram no início das gestações, ante a expectativa
gerada pela nova experiência.
Um remédio antigo sempre aliviou sua cefaleia e
voltou a ser usado com frequência. Era o Melhoral,
que de tão corriqueiro já não era lembrado como medicamento. Tanto assim que seu obstetra a lembrou da
inconveniência de usar anti-inflamatórios, chegando a
nomear alguns dos mais conhecidos, pela interferência com o objetivo da pesquisa, competindo com a aspirina, se por acaso ela estivesse usando o placebo,
ou potencializando a mesma, se esta fosse a opção
selecionada. Na lista de medicamentos proibidos não
constava o Melhoral e ela tampouco sabia que o mesmo continha o próprio ácido acetilsalicílico.
Tal caso aponta para os diversos graus de dificuldade que a pesquisa clínica em seres humanos pode
oferecer. O controle de fatores externos se faz de maneira quase absoluta em animais experimentais, frequentemente enjaulados.
Não há maneira absoluta de evitar totalmente a
possibilidade de vieses em ensaios clínicos. Dentre
as mais comuns encontram-se as diversas covariáveis
que podem afetar tanto a intervenção como o desfecho
que se procura, confundindo os resultados obtidos,
sendo os exemplos mais comuns: a idade, o sexo,
raça, escolaridade, entre outros.
Randomização, mascaramento de investigadores e
sujeitos do experimento, e número adequado de participantes no estudo são as medidas que tentam minimizar o efeito de possíveis vieses.
No caso aqui exposto, a randomização de um número grande o suficiente de pacientes ofereceria igual
oportunidade para desvios semelhantes do protocolo,
em ambos os grupos estudados, da aspirina ou do placebo. Ou quando não fosse esse o caso, minimizaria
o seu efeito.
Tal conhecimento nos deveria remeter à consideração de que conclusões obtidas de ensaios clínicos
devam sempre merecer uma análise crítica e eventuais verdades defendidas ardorosamente podem não
se confirmar em outros experimentos.
1- Editor RSHSI
Endereço para correspondência: [email protected]
7
Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada
por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14.
Atualização em Anestesiologia
Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia
guiada por tromboelastometria
Murilo Pereira Flores1, Bruno França Guedes1, João Paulo Kerckhof1
Resumo
O modelo fisiológico clássico da cascata da coagulação vem sendo questionado por não ser capaz de explicar com a devida abrangência todos os fenômenos
do processo da hemostasia in vivo. Para preencher
estas lacunas na compreensão dos seus mecanismos,
foi desenvolvida a teoria da coagulação baseada em
superfícies celulares. Este novo olhar permite uma melhor elucidação da interação entre as vias extrínseca e
intrínseca, bem como do papel do componente celular.
Diante destes novos conhecimentos, tornam-se ainda
mais evidentes as limitações dos testes tradicionais da
hemostasia em predizer de forma fidedigna as demandas dos pacientes na vigência de distúrbios hemostáticos perioperatórios. Os testes viscoelásticos, como a
tromboelastometria, por sua vez, fornecem uma avaliação mais global, rápida e precisa da coagulação. Deste modo, os algoritmos transfusionais guiados por este
método têm representado um importante avanço nesta
aérea, permitindo melhor racionalização dos recursos,
reduzindo custos e melhorando os desfechos dos pacientes.
Palavras-chave: hemostasia, sangramento perioperatório, tromboelastometria
Key words: hemostasis, perioperative bleeding,
thromboelastometry
Introdução
Na década de 1960, foi proposto um modelo de cascata para elucidar o processo da coagulação sanguínea, composto por uma série de etapas sequenciais,
no qual a ação de um fator leva à ativação do seu subsequente nesta cadeia.1,2 Este modelo está disposto
no formato de um ‘Y’, que ilustra a presença de 2 vias,
extrínseca e intrínseca, convergindo para uma via co-
mum. Por fim, todo este processo culmina na geração
de grandes quantidades de trombina, a qual transforma o fibrinogênio em fibrina.3
Embora este conceito da cascata da coagulação tenha levado a um avanço significativo no entendimento
deste processo, observações experimentais e clínicas
mais recentes demonstram que este modelo clássico
não reflete completamente os eventos da hemostasia
in vivo. A falha da via extrínseca em compensar uma
disfunção na via intrínseca, como é o caso dos hemofílicos, é um exemplo de limitação da teoria clássica
da cascata.4 Além disso, já é sabido que estas 2 vias
não são independentes nem redundantes, o que não
é compatível com a explicação clássica. Diante destas
lacunas, em 2001, foi proposto por Monroe e Hoffman
um modelo de hemostasia baseado nas superfícies
celulares, contemplando o fator celular, que até então
não havia recebido a atenção e importância devidas.3
No campo da avaliação laboratorial da hemostasia,
o componente celular também não tem sido levado
em consideração de maneira adequada. Testes como
TP (tempo de protrombina) e TTPa (tempo de tromboplastina parcial ativado) substituem as células por
vesículas de fosfolipídios, negligenciando o seu papel na condição in vivo.4 Atualmente, estes testes são
considerados fracos preditores de sangramento nos
pacientes críticos e submetidos a cirurgias de grande
porte. Portanto, são inadequados para monitorização
de estados de coagulopatia ou direcionamento da terapia hemostática.5
Por outro lado, testes viscoelásticos realizados à
beira-leito, como a tromboelastometria, fornecem medidas em tempo real acerca da formação e dissolução
do coágulo.6 Além disso, mostram resultados em curto
espaço de tempo (15 a 25 minutos), permitindo ações
terapêuticas mais rápidas e eficazes. Com isso, são
evitadas transfusões desnecessárias, as quais estão
comprovadamente associadas a efeitos adversos,
2015|8
Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada
por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14.
como infecções nosocomiais, complicações tromboembólicas e lesão pulmonar aguda.5 No cenário perioperatório, a terapia hemostática guiada por tromboelastometria vem demonstrando extrema eficácia,
reduzindo a necessidade de transfusão e seus efeitos
deletérios, melhorando os desfechos dos pacientes e
diminuindo custos.5
Novo modelo da coagulação
Frente às inúmeras limitações em explicar fenômenos relacionados à hemostasia in vivo, um novo modelo baseado em superfícies celulares foi proposto. Neste novo modelo, a hemostasia ocorre em um processo
passo a passo, regulado por componentes celulares.3
Pode ser dividido em 4 estágios ou fases, e não mais
em duas vias. As fases seriam: iniciação, amplificação,
propagação e finalização.3,4,7
O objetivo da hemostasia é produzir um “plug” de
plaquetas e fibrina para selar a lesão na parede do vaso
sanguíneo.3 A iniciação se dá após a lesão endotelial
expor FT (fator tecidual) presente em membranas celulares ao redor do leito vascular. O FT liga-se e ativa o
FVII (fator VII) presente na circulação sanguínea. Esse
complexo formado por FT e FVIIa (fator VII ativado) é
responsável por ativar pequenas quantidades de FX
e FIX. O FXa associa-se ao seu cofator, FVa, e forma
uma protrombinase localizada na superfície da célula
que expressa FT. Esta protrombinase é responsável
pela conversão de protrombina em trombina. Esta é
produzida em quantidades insuficientes para ativar a
conversão de fibrinogênio em fibrina.3,4,7
Na fase de amplificação que se segue, a principal
função atribuída à trombina produzida durante a fase de
iniciação é a ativação máxima das plaquetas, alterando
a permeabilidade das mesmas, permitindo a entrada de
íons de cálcio e a liberação de substâncias quimiotáticas
e fator V. Na superfície das plaquetas ativadas, a trombina ainda atua na ativação dos fatores V, VIII e XI.4 O fator
VIIIa dissocia-se do fator de Von Willebrand, permitindo a
este mediar a adesão plaquetária ao sítio lesado.3
Durante a fase de propagação, na superfície das
plaquetas ativas, o FIXa (produzido na fase de iniciação), associado ao FVIIIa (produzido na fase de amplificação), forma um complexo tenase que ativa FX.
Este FXa associado ao FVa forma um outro complexo
protrombinase, responsável por produzir um “burst”,
ou explosão, de trombina. Esta cliva fibrinogênio em
fibrina, que irá polimerizar, com auxílio do fator XIII
(também ativado pela trombina), consolidando o tampão plaquetário inicial.3,4,7
O processo de coagulação deve ser autolimitado,
a fim de evitar a propagação do mesmo, que poderia
levar à oclusão do vaso por trombo.3,4,7 Para desempenhar este papel de limitação do desenvolvimento do
coágulo, o organismo lança mão dos mecanismos da
fase de finalização. Estão envolvidos neste processo o
inibidor da via do fator tecidual, a proteína C, a proteína S e antitrombina.4
Aspectos técnicos da tromboelastometria
Os testes laboratoriais tradicionais de avaliação
da coagulação, como o TP e TTPa, têm valor limitado para avaliação da coagulação in vivo. Além disto,
demandam um longo período para sua realização,
tornando-os pouco úteis para o manejo do sangramento perioperatório.8
A necessidade de uma rápida e abrangente avaliação da capacidade hemostática total do paciente
tem levado ao desenvolvimento de ensaios globais da
hemostasia.8 Dentre estes, destacam-se os testes viscoelásticos. Estes avaliam o processo contínuo da coagulação de uma amostra de sangue total, produzindo
uma informação dinâmica sobre o desenvolvimento,
estabilização e dissolução do coágulo.5,8
A tromboelastografia foi desenvolvida por Hellmut
Hartert em 1948 e incorporada à avaliação perioperatória da coagulação nas últimas décadas. Há atualmente dois tipos de avaliação viscoelastométrica: a
tromboelastografia (TEG) e a tromboelastometria rotacional (ROTEM).5,8,9
Apesar de apresentarem o mesmo racional teórico,
TEG e ROTEM apresentam características técnicas diferentes e utilizam reagentes diferentes, fazendo com
que os resultados dos mesmos não sejam totalmente
intercambiáveis. O ROTEM permite diagnósticos mais
precoces e prontamente distingue diversos tipos de
coagulopatias, como hiperfibrinólise, trombocitopenia,
coagulopatia dilucional e a presença de efeito residual
de heparina.8
O ROTEM utiliza uma amostra de sangue total citratado, incubado a 37°C, colocado numa cuveta aquecida, dentro da qual é introduzido um pino suspenso,
2015|9
Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada
por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14.
conectado a um sistema de detecção. À medida que
o coágulo se forma, as redes de fibrina transmitem a
energia cinética gerada pela rotação da cuveta para o
pino. Desta forma, é gerada uma representação gráfica de todo o processo.5,9 (Figura 1)
Os principais parâmetros avaliados através do ROTEM são:6,8,9 (Tabela I)
1 - tempo de coagulação (CT): tempo para a amplitude alcançar 2mm; avalia o início da coagulação e
depende basicamente do tempo para a formação de
trombina.
2 - tempo de formação do coágulo (CFT): tempo
necessário para a amplitude aumentar de 2mm para
20mm. Está relacionado à polimerização da fibrina.
3 - ângulo alfa: linha que tangencia a curva a partir
do CT. Indica a velocidade de formação do coágulo.
Depende da função plaquetária e em menor extensão
do fibrinogênio e fatores de coagulação.
Figura 1 - Parâmetros medidos pela tromboelastometria. (adaptado de Journal of Cardiothoracic and
Vascular Anesthesia 2012;26(6):1083-1093)
Para iniciar a coagulação da amostra, é utilizado
um reagente. Este pode ser o fator tecidual, que ativa a
via extrínseca, sendo este teste denominado EXTEM,
ou o ácido elágico, que ativa a via intrínseca, teste denominado INTEM. Reagentes adicionais podem ser
utilizados para complementação da análise. O EXTEM
pode ser complementado com inibidor de fibrinólise
como aprotinina (APTEM) ou inibidor de função plaquetária como citocalasina D (FIBTEM). A análise com
INTEM pode ser complementada com adição de heparinase (HEPTEM).5,9,10 (Figura 2)
4 - amplitude 10 (A10): amplitude 10 minutos após o
CT; está relacionada à força viscoelástica do coágulo.
5 - firmeza máxima do coágulo (MCF): amplitude
máxima do coágulo; depende principalmente da polimerização da fibrina, plaquetas e fator XIII.
6 - lise máxima (ML): percentagem de redução da
amplitude 60 minutos após o CT. Uma redução maior
que 15% fornece o diagnóstico de hiperfibrinólise.
Tabela 1 - Valores de referência da tromboelastometria. (adaptado de Journal of Cardiothoracic and Vascular Anesthesia 2012;26(6):1083-1093)
Impacto da tromboelastometria na prática clínica
Figura 2 - Traçado tromboelastomérico normal. (extraído de www.rotem.de)
A terapia transfusional e a correção de distúrbios
da coagulação são determinantes para o desfecho de
pacientes submetidos a cirurgias de grande porte. A
transfusão de hemoderivados alogênicos está associada a importantes efeitos adversos, como infecções
nosocomiais, injúria pulmonar aguda, disfunção de
múltiplos órgãos, infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, tromboembolismo e insuficiência renal, bem como aumento na mortalidade.5,11,12,13
O diagnóstico e tratamento precoces das diáteses
hemorrágicas é, portanto, fundamental para diminuir
tais eventos.12
2015|10
Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada
por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14.
O uso do ROTEM tem se mostrado uma estratégia
extremamentte custo-efetiva. Ele permite o diagnóstico diferencial precoce dos distúrbios de coagulação
e terapia alvo-dirigida. Diversos trabalhos mostraram
redução das necessidades transfusionais, redução da
incidência de complicações associadas à transfusão e
melhores desfechos para os pacientes.5
Uma metanálise da Cochran que incluiu 9 ensaios randomizados, com um total de 776 participantes, demonstrou que a terapia transfusional guiada pelo ROTEM resultou em menos sangramento e reduziu a necessidade
de transfusão de plaquetas e plasma fresco em cirurgias
cardíacas e transplantes hepáticos.12 Uma revisão envolvendo 12 trabalhos sobre uso de tromboelastometria em
pacientes submetidos a cirurgia cardíaca mostrou redução
no uso de hemoderivados, mas ainda com evidências limitadas quanto aos desfechos clínicos dos pacientes.13
Um estudo prospectivo com 71 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca de urgência, guiado por tromboelastometria, demonstrou redução na mortalidade.11
Já um estudo alemão comparando o uso de hemoderivados antes e após a implementação de terapia guiada
por ROTEM, envolvendo um total de 1.422 pacientes
(sendo 729 antes e 693 após) demonstrou que os custos com hemoderivados no tratamento perioperatório
de desordens da coagulação foi reduzido em 32% com
o uso do ROTEM. Entre as reduções destacam-se diminuição de 25% de transfusões de concentrados de
hemácias, 50% de plaquetas e 80% de plasma fresco.
Esta redução compensou claramente o custo para a
implementação do método.14
boelastometria pode ser uma técnica útil no manejo
destes pacientes.18 Nos pacientes politraumatizados,
ele também pode ser utilizado para diagnóstico de coagulopatia, auxiliando o manejo dos pacientes, podendo estar associado a melhores desfechos.19
Terapia hemostática guiada por tromboelastometria
Na atualidade, existem basicamente três estratégias para o manejo das coagulopatias no cenário perioperatório e do trauma. A primeira delas é conhecida como “ressuscitação por controle de danos”, que
orienta a transfusão preemptiva de plasma fresco e
concentrado de plaquetas conforme a demanda por
concentrado de hemácias na proporção de 1:1:1.5
Esta abordagem foi originalmente implementada em
cenários de campos de batalha, nos quais os recursos
diagnósticos e terapêuticos são limitados, objetivando
evitar retardo na terapia transfusional.6
A segunda estratégia descrita é orientada por testes
hemostáticos convencionais, como o TP e o TTPA. Entretanto, estas ferramentas não são capazes de predizer adequadamente e em tempo hábil a real demanda
do paciente na vigência do distúrbio de coagulação.5 A
terceira estratégia, por sua vez, prevê a implementação
da tromboelastometria para guiar a hemoterapia perioperatória, já que permite uma avaliação rápida e precisa
da função hemostática, individualizando a abordagem,
melhorando desfechos e reduzindo custos, como demonstrado anteriormente.6 (Figuras 3 e 4)
Outro estudo, prospectivo e randomizado, envolvendo 100 pacientes submetidos a cirurgias cardíacas
complexas, comparando a terapia convencional com a
terapia guiada por tromboelastometria, demonstrou uma
redução na taxa de transfusão de hemoderivados, bem
como redução no tempo de ventilação mecânica, tempo
de permanência em UTI e mortalidade após 6 meses.15
Frente à crescente produção de trabalhos mostrando
a avaliação perioperatória dos distúrbios hemorrágicos
pelo ROTEM, a terapia transfusional guiada já é recomendada pelas principais sociedades de anestesiologia, a Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA) e
a Sociedade Europeia de Anestesiologia (ESA).16,17
Em outros cenários que não apenas o sangramento
perioperatório, o ROTEM tem sido avaliado para diagnóstico de coagulopatia. Em pacientes com sepse/
SIRS, tanto um estado de hipercoagulabilidade quanto
de hipocoagulabilidade pode estar presente, e a trom-
Figura 3 - Exemplos de traçados tromboelastométricos anormais: (A) distúrbio plaquetário; (B) deficiência de fibrinogênio; (C) hiperfibrinólise; (D) efeito da
heparina. (extraído de www.rotem.de)
2015|11
Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada
por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14.
Figura 4 - Proposta de algoritmo para terapia hemostática perioperatória.
Esta terapia hemostática guiada já é recomendada
pela Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA) e
pela Sociedade Europeia de Anestesiologia (ESA) nos
seus guidelines para manejo do sangramento perioperatório.16,17
Em termos práticos, o uso da tromboelastometria
deve ser considerado em cirurgias de grande porte com
possibilidade de coagulopatia. É importante ressaltar
que as intervenções terapêuticas devem ser implementadas apenas se o quadro clínico do paciente for
compatível com os achados laboratoriais. A presença
de achados tromboelastométricos normais associada a
sangramento perioperatório clinicamente evidente deve
levantar a suspeita de causa cirúrgica, apontando para
a necessidade de intervenção imediata.5,6,10
Como regra geral, em qualquer situação com possibilidade de distúrbios hemostáticos, a primeira ação
profilática e terapêutica deve ser garantir a estabilização
das condições basais determinantes para a hemostasia, como a temperatura corporal, o pH sanguíneo e a
concentração sérica do cálcio ionizado.5
Como ponto de partida na avaliação, deve-se analisar os traçados do EXTEM e INTEM, que avaliam
respectivamente as vias extrínseca e intrínseca da coagulação.5
O MCF está relacionado à função plaquetária e do
fibrinogênio. Para fazer o diagnóstico diferencial, devese comparar o MCF do EXTEM com o MCF do FIBTEM. Quando o último também está diminuído, trata-se
de uma disfunção do fibrinogênio, seja quantitativa ou
qualitativa, ou até mesmo, raramente, à deficiência do
fator XIII, que tem importante papel na polimerização da
fibrina.5 Atualmente, sabe-se que o MCF pode ser substituído por um parâmetro ainda mais precoce, o A10, aumentando a agilidade na obtenção do diagnóstico.20 Se
o MCF do FIBTEM estiver normal, o diagnóstico mais
provável é uma deficiência plaquetária, qualitativa ou
quantitativa.5 É importante salientar que, no contexto
da cirurgia cardíaca, as amostras para o EXTEM e o
FIBTEM já podem ser coletadas antes da infusão da
protamina, uma vez que não sofrem influência do efeito
da heparina.6 Desta forma, o fibrinogênio ou o crioprecipitado podem ser preparados e administrados de forma
mais precoce, caso seja necessário.
O achado de um CT prolongado no EXTEM e normal no INTEM aponta para uma deficiência nos fatores
de coagulação dependentes da vitamina K, que devem
idealmente ser repostos com concentrado de complexo
protrombínico ou, alternativamente, plasma fresco.5,6,10
Por outro lado, a presença de um CT prolongado
no INTEM e normal no EXTEM aponta para 2 possibilidades: neutralização insuficiente da heparina ou
deficiência de fatores da coagulação da via intrínseca.
Para fazer esta diferenciação, deve-se lançar mão do
HEPTEM. Se o CT for normal neste traçado, está confirmado o efeito residual da heparina. Se for igualmente
prolongado, deve-se repor estes fatores de coagulação
com plasma fresco.5,10 É importante frisar que o uso de
protamina em excesso também pode levar a um distúrbio hemostático clinicamente relevante, levando a um
prolongamento do CT no INTEM de forma semelhante
à heparina.6
Caso o paciente apresente uma deficiência na via intrínseca associada ao efeito residual da heparina, o CT
do INTEM e HEPTEM estarão prolongados, entretanto,
no HEPTEM, este será menor.5
Outro parâmetro importante a ser avaliado é a lise máxima em 60 minutos (ML) no EXTEM. Este reflete o efeito
do sistema fibrinolítico sobre o coágulo. Caso seja maior
que 15%, o diagnóstico provável é de hiperfibrinólise. O
achado de um ML normal no APTEM confirma a hipótese
e indica a necessidade do uso de antifibrinolítico. Caso o
ML no HEPTEM permaneça alterado, pode-se tratar de
deficiência do fator XIII ou disfunção plaquetária.5,6 É importante diferenciar adequadamente uma hiperfibrinólise
patológica da retração normal do coágulo, que é representada por um ML menor que 15%.10
Uma limitação importante da tromboelastometria diz
respeito à avaliação da hemostasia primária. A coagulopatia decorrente da doença de von Willebrand ou do uso
de medicações antiplaquetárias (ácido acetilsalicílico,
2015|12
Flores, MP et al. Teoria da coagulação baseada em superfícies celulares e terapia guiada
por tromboelastometria. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 8-14.
clopidogrel, abciximabe, dentre outras), por exemplo,
pode não ser evidenciada por este método.5 Entretanto,
na vigência de um MCF normal no EXTEM, a ocorrência
de plaquetopenia menor que 50.000/mm3 é pouco provável, não podendo se afastar desordens funcionais.6
Conclusão
A evolução do conhecimento acerca dos mecanismos da coagulação in vivo tem possibilitado um melhor
entendimento do papel de cada componente neste complexo sistema, sobretudo o componente celular, bem
como a interação entre eles. Atualmente, a melhor ferramenta disponível para avaliar este processo de forma
rápida e eficiente é a tromboelastometria, a qual fornece dados extremamente relevantes para o diagnóstico
diferencial das coagulopatias no cenário perioperatório.
Já é consenso na literatura que testes como TP e TTPA
são inadequados para guiar a terapia hemostática perioperatória. Por outro lado, algoritmos transfusionais
baseados na tromboelastometria proporcionam uma
melhor otimização do tratamento e racionalização no
uso dos recursos disponíveis. Esta estratégia reduz a
necessidade de transfusão de hemocomponentes, bem
como seus efeitos deletérios, e melhora os desfechos
dos pacientes, além de reduzir custos.
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1- Serviço de Anestesiologia do Hospital Santa Izabel
Endereço para correspondência:
[email protected]
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Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral
isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21.
Atualização em Neurologia
Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral
isquêmico agudo: um marco histórico
Autores: Mateus Santana do Rosário1, Pedro Antonio Pereira de Jesus1
Palavras-chave: AVC- I, terapia trombolítica, endovascular
Key words: ischaemic stroke, thrombolytic therapy, endovascular
INTRODUÇÃO
O acidente vascular cerebral isquêmico é uma das
principais causas de internamentos, morbidade e mortalidade no mundo e também no Brasil1. Sua fisiopatologia consiste em diminuição de fluxo sanguíneo para
determinada área cerebral, seja por embolia à distância,
formação de placa aterosclerótica, alteração de pequenos vasos ou qualquer outra condição que propicie fenômenos trombóticos. Suas manifestações clínicas são
variadas e dependem de qual área do sistema nervoso
foi afetada2. Por ser uma entidade incapacitante, diversas terapias voltadas para a restauração do fluxo sanguíneo em tempo hábil, a fim de que não ocorra dano
cerebral permanente, têm sido propostas.
A terapia de reperfusão na prática clínica teve seu
início após o estudo NINDS3. Nesse estudo, o grupo de
paciente que usou o ativador de plasminogênio tecidual recombinante (rt-PA), comparado ao grupo placebo,
teve melhora dos desfechos clínicos em 3 meses, quando a terapia era realizada em 3 horas. Outros estudos
como o STARS, SITS-MOST e ECASS III corroboraram
com tal evidência, além do último ter provado que a ampliação do tempo do início dos sintomas até o inicio da
trombólise para 4,5 horas era viável, segura e efetiva 4–7.
Entretanto, apesar do avanço conseguido até então,
a trombólise venosa sofre restrições devido a sua janela terapêutica limitada, contraindicações (como cirurgias recentes, uso de anticoagulantes orais, história de
sangramento intracraniano) e ação trombolítica limitada
nas oclusões de grandes artérias cerebrais, que correspondem a dois terços dos casos de AVC de circulação
anterior e denotam as maiores taxas de incapacidades
e mortalidade8,9 .
Em 2015, houve uma mudança de paradigmas
quanto ao tratamento do AVC isquêmico agudo quando
o estudo holandês MR CLEN mostrou uma redução sig-
nificativa de incapacidades em 90 dias, após comparar
a terapia padrão com rt-PA venoso com a terapia associada rt-PA venoso e trombectomia mecânica10. Desde então, diversos outros estudos tiveram que acessar
seus dados a fim de avaliar a segurança dos sujeitos
em seus estudos. Desde então, incluindo o MR CLEAN, cinco trabalhos foram publicados em periódicos
de alto impacto, todos mostrando benefício da terapia
endovascular quando comparada à terapia padrão nos
casos de AVC isquêmico com oclusão de grandes artérias, culminando com modificação do nível de evidência
da terapia endovascular no AVC isquêmico agudo10–15.
REVISÃO DA ANATOMIA DA CIRCULAÇÃO CEREBRAL
Quatro grandes artérias são as principais fontes
de irrigação do cérebro: duas carótidas e 2 vertebrais.
Pode-se dividir, anatomicamente, as circulações como
anterior (sistema carotídeo) e posterior (sistema vértebro-basilar), que irrigam diferentes partes do cérebro.
Sintomas específicos podem denotar, a partir apenas
das manifestações clínicas, qual sistema vascular está
alterado. Essas artérias ascendem a partir da aorta e
seus ramos principais e entram no crânio formando
uma complexa rede vascular com anastomoses entre
si [FIGURAS 1 E 3].
A circulação anterior tem como suas artérias principais as carótidas internas (ACI). Elas derivam da bifurcação das carótidas comuns, entram no canal carotídeo do osso temporal e se subdividem, didaticamente,
em partes petrosa, cavernosa e craniana16. Sua porção craniana, por fim, subdivide-se em artéria cerebral
anterior e artéria cerebral média. Interrupção do fluxo
nessa artéria denota doença extremamente grave.
A artéria cerebral anterior (ACA) irriga a porção
ântero-medial do cérebro (FIGURA 1) e possui as divi2015|15
Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral
isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21.
sões anatômicas a seguir: A1, da terminação da artéria
carótida interna até a junção com a comunicante anterior; A2, término de A1 até a origem da artéria calosomarginal; A3, a partir do final de A2 até suas porções
terminais16 [FIGURA 2].
A artéria cerebral média (ACM) é o ramo mais calibroso da artéria carótida interna. Irriga a face súpero-lateral do telencéfalo (hemisférios cerebrais), sendo a
mais importante artéria craniana. Subdivide-se em: M1
da terminação da ACI até a bifurcação (ou trifurcação);
M2: segmento que corre lateral à fissura de Sylvius
(sulco lateral); M3: parte que sai da lateral da fissura
sylviana; M4: são as porções corticais16 [FIGURA 1].
A circulação posterior constitui-se do sistema vértebro-basilar. As 2 artérias vertebrais ascendem a partir
das artérias subclávias, quando se juntam na transição
bulbopontina para formar a artéria basilar. As artérias
vertebrais e a basilar, juntamente com seus ramos, irrigam o tronco encefálico, cerebelo e parte posterior do
cérebro [FIGURA 3].
Os ramos terminais do sistema vértebro-basilar são
as artérias cerebrais posteriores. Estas subdividem-se
em P1, da bifurcação da basilar até a artéria comunicante posterior; P2, da comunicante posterior até a
cisterna perimesencefálica; P3 até o final do sulco calcarino. [FIGURA 3]16.
Percebe-se, então, que a partir de lesões arteriais
específicas diversos sintomas podem ter sua gênese
no AVC isquêmico. Lesões em artérias mais proximais,
como a ACI e artéria basilar, podem ter consequências
catastróficas e, portanto, terapias efetivas devem ser
implementadas para evitá-las.
ESTUDOS EM TERAPIA ENDOVASCULAR PARA
AVC ISQUÊMICO
A terapia endovascular consiste na utilização de dispositivos que são introduzidos no sistema arterial, em
sala de hemodinâmica, utilizando-se da arteriografia
digital por subtração como navegador anatômico. O
restabelecimento do fluxo sanguíneo pode ser realizado
através da liberação do trombolítico “in loco” (trombólise
intra-arterial), onde se observa a interrupção do fluxo
sanguíneo na arteriografia, ou através da remoção do
trombo através de catéteres específicos (trombectomia
mecânica). Os dispositivos podem ser por retração por
mola (eg. MERCI – dispositivos de 1ª geração), dispositivos de aspiração (eg. PENUMBRA – 2ª geração) ou os
mais recentes stents retráteis (eg. SOLITAIRE FR – 3ª
geração). Os dispositivos de última geração têm taxas
de recanalização maiores que os primeiros17.
O uso da terapia endovascular foi estudada com os
estudos PROACT I e PROACT II18,19. Nesses estudos,
o inibidor do plasminogênio tecidual pro-uroquinase foi
liberado através de catéter de terapia endovascular.
Essa medida foi mais eficaz quando comparada com
o placebo em pacientes com oclusão de ACM em até 6
horas do início dos sintomas, com taxas de recanalização (TICI 2-3) de 66%. Frente a esses estudos, surge
uma nova maneira de se tentar a reestruturação do fluxo sanguíneo, além da trombólise venosa convencional,
e por muito tempo esta estratégia fora utilizada em casos não elegíveis ao tratamento convencional.
Em 2013, três estudos frustraram os entusiastas sobre a terapia endovascular. O SYNTHESIS-EXP, IMS 3
e MR RESCUE falharam em demonstrar benefício da
trombectomia mecânica sobre a terapia padrão 20–22.
Diversas críticas convergiram nesses três estudos.
O SYNTHESIS-EXP, que randomizou paciente para
trombectomia mecânica, comparando à terapia padrão,
falhou provavelmente por não exigir nenhum protocolo concernente à terapia endovascular, não selecionar
os pacientes comprovadamente com oclusão de grandes artérias e por usar catéteres de tecnologia anterior
(MERCI). Havia também uma demora na randomização
do grupo intervenção, selecionando-o mais tardiamente,
o que poderia ter comprometido os desfechos em longo
prazo22. A utilização da seleção dos pacientes por imagem de penumbra (tecido ainda viável) foi um marco do
MR RESCUE. Entretanto, o mesmo não obteve resultados positivos. A utilização de catéteres de gerações anteriores (MERCI ou PENUMBRA), além do início tardio
para o início da terapia (mediana de 5,5 horas), pode ter
contribuído com esses desfechos, haja vista que a taxa
de recanalização (TICI 2b/3) foi de apenas 27%20.
No mesmo ano (no mesmo número do periódico),
era publicado o IMS III 21. Este foi um grande estudo, realizado nos Estados Unidos, envolvendo 656 pacientes
randomizados de maneira 2:1 para terapia endovascular mais trombólise venosa ou trombólise venosa isolada. Este estudo também mostrou-se incapaz de mostrar
benefício da estratégia endovascular sobre a trombólise
venosa isolada. Entretanto, análises de subgrupo neste
estudo já mostravam uma tendência de benefício quando a embolectomia era realizada em tempos menores
(em menos de 90 minutos após a realização do rt-PA)
2015|16
Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral
isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21.
ou quando o trombolítico era realizado abaixo de 60 minutos dos sintomas. Os motivos de não serem mostrados benefícios da terapia em teste eram semelhantes
aos dos estudos anteriores supracitados: uso de catéteres de tecnologia anterior (Merci e Penumbra), a despeito do uso de catéteres retráteis (Solitaire FR – 1,5%
de uso neste estudo); tempo prolongado para o início
da terapia endovascular; seleção de pacientes não baseada na identificação de oclusão de grandes artérias
(critério de seleção por imagem)15.
MR CLEAN: O marco histórico para terapia endovascular em AVCi agudo
Apesar dos estudos de 2013 se mostrarem frustrantes no que tange o uso da embolectomia em AVCi
agudo, os dados do IMS III21, além de diversos outros
pequenos estudos sobre este tema23 suscitaram, a realização de trabalhos mais elaborados, com seleção de
pacientes mais adequada (seja através da confirmação
de oclusão de grandes artérias a partir de estudo de vasos por TC ou RNM, no momento da entrada na emergência ou com atenção maior para técnicas de identificação precisa da área de penumbra isquêmica e “core”
isquêmico). Teve-se atenção maior para implementação
mais rápida da terapia endovascular nos pacientes selecionados e também o uso de técnicas e dispositivos
mais avançados, a fim de se obter uma reperfusão mais
rápida e bem-sucedida10.
Eis que surge o MR CLEAN, apresentado no 9th
World Stroke Congress (WSC), em outubro de 2014,
em Istambul, onde seus autores conseguem mostrar
o benefício da terapia endovascular sobre a trombólise
venosa nos pacientes com AVCi agudo e com oclusão
proximal de grandes artérias da circulação anterior. Tal
apresentação trouxe impacto relevante na comunidade
científica e sobre os outros estudos em terapia endovascular que estavam em curso: todos tiveram que analisar seus resultados interinamente, a fim de avaliar a
eficácia e a segurança dos pacientes24.
Publicado em janeiro de 2015 (onlinefirst em dezembro de 2014), no New England Journal of Medicine
(NEJM), o MR CLEAN, que fora um estudo multicêntrico
conduzido na Holanda, analisou 500 pacientes randomizados em 1:1 para a trombólise venosa associada à
terapia endovascular. Os pacientes que eram randomizados para o grupo intervenção deveriam ser passíveis
de tratamento em até 6 horas do início dos sintomas, ter
oclusão proximal (M1 ou M2) da artéria cerebral média
ou anterior (A1 ou A2) comprovadas a partir de angiografia por tomografia computadorizada (angioTC), por
ressonância nuclear magnética (angioRNM) ou arteriografia digital por subtração (ADS). Seu desfecho principal era a análise da escala de Rankin modificada, uma
escala de 7 pontos que varia de 0 (sem sintomas) até
6 (morte), sendo que um escore entre 0-2 significa independência funcional25. O quadro clínico do paciente
com acesso a escalas funcionais (mRs, NIHSS) no dia
da randomização, 24 horas e de 5-7 dias ou na alta.
As avaliações 90 dias após o ictus eram feitas a partir
de entrevistas por telefone com pacientes ou cuidadores. As imagens eram avaliadas considerando a TC do
baseline através do ASPECTS (Alberta Stroke Program
Early Computed Tomography Score), um escore que
varia de 0-10, onde 1 ponto é tirado a partir da evidência de isquemia em áreas predefinidas. As angioTC, angio RNM e ADS eram avaliadas no baseline e 24 horas
após para avaliação de reperfusão.
A terapia mecânica foi utilizada em 84% do grupo
randomizado para a intervenção e o uso de catéteres de
nova geração foi utilizado em 81,5%.
O grupo intervenção teve uma melhora importante
dos desfechos em todas as categorias de mRs, exceto
por morte (mRs 6). Houve uma redução de risco absoluto para desfecho favorável (mRs 0-2) entre os grupos
de 13,5%, com um número necessário para tratar (NNT)
de 8%. Os escores NIHSS foram menores, em média 2,9
pontos no grupo intervenção 5-7 dias após os eventos.
Evidências de recanalização no momento da trombectomia (TICI 2b/3) foram evidenciadas apenas em 58,7%
dos pacientes. Entretanto, a evidência de recanalização
após 24 horas (avaliada pela angioTC) foi observada em
75,4% no grupo intervenção e em 32,9% no grupo trombólise isolada. Houve também diminuição do volume do
infarto no grupo intervenção. Os eventos adversos graves em 90 dias não diferiram entre os grupos.
Tais dados mostram que a terapia endovascular por
trombectomia mecânica para os pacientes com AVCi
agudo com evidência de oclusão proximal de grandes
artérias e elegíveis para realização do tratamento em 6
horas é viável, eficaz e segura e deve, portanto, ser realizada nos centros em que tal estratégia é disponível10.
ESCAPE, EXTEND IA, REVASCAT E SWIFT-PRIME: perpetuação da evidência de benefício
da terapia endovascular
2015|17
Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral
isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21.
Após a divulgação dos resultados apresentados em
outubro de 2014, no 9th World Stroke Congress, os estudos em andamento sobre terapia endovascular tiveram
que analisar seus resultados interinamente, a fim de avaliar a eficácia e segurança dos pacientes no estudo.
ESCAPE
Estudo realizado no Canadá (e com centros no Canadá, EUA e Europa), o ESCAPE publicado em fevereiro de 2015, na NEJM, era focado em pacientes com
AVCi com menos de 12 horas de início de sintomas,
porém selecionados a partir de critérios de imagem (ASPECTS e angioTC para confirmação de oclusão proximal). Eram esperados 500 pacientes para o início da
análise, entretanto, devido aos resultados do MR CLEAN, 315 pacientes foram analisados. Este estudo prezou pela rapidez da instituição da terapia, com metas de
60 minutos para a punção arterial e de 90 minutos para
a reperfusão a partir da primeira imagem de TC.
A mediana de tempo neste estudo da primeira imagem de TC para a punção arterial foi de 51 minutos.
Quando analisados os desfechos primários (mRs 0-2
em 90 dias) houve uma redução de risco absoluto de
24%, tendendo ao grupo intervenção com um NNT de
4. Não houve diferença estatística entre os desfechos
de segurança e neste estudo pode-se observar uma redução de mortalidade significativa no grupo intervenção
(10,4% X 19%)11.
EXTEND IA
O EXTEND IA, este é um estudo de fase II, foi
também publicado em fevereiro de 2015, no NEJM, e
contou apenas com 70 pacientes para análise, devido
às questões de segurança após a publicação do MR
CLEAN. Para a seleção dos pacientes foram utilizados critérios semelhantes aos estudos anteriores para
comprovação de oclusão proximal em grandes artérias.
Entretanto, o mesmo inovou com a seleção de pacientes baseada numa técnica automatizada baseada em
TC para avaliação de tecido viável (RAPID, versão não
comercial de pesquisa, Universidade de Stanford). Esta
técnica também permite avaliar as taxas de reperfusão
após a implementação da terapia escolhida. Tal estratégia pode melhorar os desfechos, uma vez que seleciona
os pacientes que se beneficiariam realmente da terapia
de reperfusão e excluiria os pacientes com grandes áreas de tecido não viável, prevenindo assim complicações
inerentes ao tratamento (hemorragia e uso de contraste
de maneira indevida)12.
O benefício da terapia endovascular também foi
comprovado neste pequeno estudo, com 71% dos pacientes com mRs 0-2 em 90 dias, comparados com 40%
no grupo controle (NNT = 4). Neste estudo, os tempos
para o início da terapia de reperfusão (seja ela a venosa
ou trombectomia mecânica) foram bastante reduzidos
(mediana do início do AVCi até reperfusão com sucesso
– TICI 2b/3 = 248 minutos; mediana do início da punção
arterial até reperfusão com sucesso – 43 minutos). Esta
rapidez pode ter desempenhado papel importante no
alcance dos desfechos primários. Houve também uma
das maiores taxas de reperfusão no momento da terapia endovascular (TICI 2b/3 86%), além de uma taxa
de reperfusão em 24 horas, comparando-se as imagens
iniciais de angioTC com as de 24 horas do tratamento
de 100% no grupo intervenção. Este estudo também se
utilizou de 100% de catéteres de última geração (Solitaire FR)12.
REVASCAT
Em abril de 2015, outro estudo conduzido em Barcelona, o REVASCAT, randomizou 206 pacientes, que
poderiam chegar em até 8 horas do início dos sintomas,
entre a trombectomia mecânica com o catéter Solitaire
FR ou terapia com rt-PA isolada. O estudo era previsto
para 690 pacientes, entretanto, fora terminado precocemente, como os estudos anteriores, por motivos já
supracitados. Os pacientes eram selecionados para o
tecido cerebral viável, através do escore ASPECTS, e
as oclusões proximais, confirmadas por angioTC ou angioRNM13.
Os desfechos primários para este estudo eram semelhantes aos anteriores. O grupo intervenção, atingiu
desfechos para independência funcional (mRs 0-2) em
90 dias em 43,7% dos casos, comparados a 28,2% no
grupo controle (NNT 6,5). No grupo intervenção 65,7%
dos pacientes tiveram reperfusão com sucesso (TICI
2b/3). Os desfechos de segurança também não diferiram entre os grupos neste estudo13.
SWIFT-PRIME
Por fim, foi publicado também no NEJM, em abril
de 2015, o SWIFT-PRIME, estudo multicêntrico conduzido em 39 centros nos EUA e Europa. Os pacientes selecionados deveriam ter o local de oclusão proximal confirmado por angioTC ou angioRNM e eram
alocados para o grupo intervenção (trombectomia
com o catéter Solitaire FR) ou terapia trombolítica
isolada14.
2015|18
Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral
isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21.
Dos pacientes que foram submetidos à trombectomia mecânica, 60% estavam independentes funcionalmente em 90 dias, comparados com 35% do grupo controle (RRA = 25%; NNT =4). Reperfusão com sucesso
foi atingida em 88% dos pacientes do grupo trombectomia (TICI 2b/3). Os tempos para intervenção neste estudo também foram bastante animadores: 224 minutos
do ictus até a punção arterial; 77 minutos do rt-PA até
a punção arterial e 57 minutos da imagem inicial até a
punção arterial14. Não houve, em semelhança com os
outros estudos, diferenças de mortalidade ou de eventos adversos entre os grupos estudados.
pacientes e na organização dos serviços que lidam com
essa modalidade de doença.
Figuras
Figura 1 - Áreas de irrigação das principais artérias
cerebrais
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por ser uma doença prevalente e incapacitante,
terapias na tentativa de diminuição de sequelas neurológicas em pacientes acometidos por AVCi são indispensáveis. No início dos anos 90, os estudos que implementaram o uso do rt-PA modificaram expressivamente
a visão e a instituição de cuidados aos pacientes com
AVCi3,6,7. Entretanto, apesar do benefício inquestionável
do uso da trombólise venosa em AVCi hiperagudo (com
janela entre 3-4,5 horas), muitos pacientes ainda pendiam de ser beneficiados, seja por chegarem à emergência fora da estreita janela de trombólise venosa, seja
por contraindicações ao uso da terapia ou por fatores
relativos à localização da oclusão2,9,15. Apesar dos resultados iniciais frustrantes, a trombectomia mecânica
para pacientes selecionados (oclusão proximal de grandes artérias e com pequeno “core” isquêmico) se mostrou uma terapia viável, eficaz e segura. Pacientes que
outrora não se beneficiariam da terapia de reperfusão
com trombolítico venoso, como aqueles que tivessem
fora da janela de 4,5 horas, ou estivessem em uso de
anticoagulantes (ou outras contraindicações, a trombólise venosa), atualmente podem se beneficiar desta
nova modalidade terapêutica. A tabela 1 mostra o desfecho agrupado dos principais estudos que mostram a
eficácia da trombectomia e o impacto na qualidade de
vida dos pacientes submetidos a essa técnica. Ainda
há muito a ser estudado no que concerne às técnicas
para trombectomia mecânica, uso de novos catéteres,
tempo para implementação da terapia e uso em outras
situações (“wake-upstroke” , tempo prolongado de ictus,
seleção de pacientes por métodos mais avançados)15,26.
Pode-se dizer, portanto, que em 2015 vivenciamos mais
uma mudança de paradigma para o tratamento do AVCi
hiperagudo e que, sem dúvidas, estes novos estudos
e novas evidências trarão impacto no manejo desses
Artéria Cerebral Anterior
Artéria Cerebral Média
Artéria Cerebral Posterior
Modificado do Netter Atlas of Neuroanatomy and Neurophysiology. 2002.
Figura 2 - Irrigação cerebral: circulação anterior
Artéria Cerebral Anterior
Artéria Cerebral Média
Modificado do Netter Atlas of Neuroanatomy and Neurophysiology. 2002.
2015|19
Rosário, MS e Jesus, PAP. Terapia endovascular para o acidente vascular cerebral
isquêmico agudo: um marco histórico. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 15-21.
Figura 3 - Irrigação do cérebro: circulação posterior
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Intravenous tissue-type plasminogen activator for
treatment of acute stroke: The standard treatment
with alteplase to reverse stroke (stars) study. JAMA.
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http://dx.doi.org/10.1001/
jama.283.9.1145.
Artéria Cerebral Posterior
Artéria Basilar
Artérias Vertebrais
Modificado do Netter Atlas of Neuroanatomy and Neurophysiology. 2002.
TABELAS
Tabela 1 - Comparação dos desfechos nos 5 estudos
mais recentes em terapia endovascular para AVCi
agudo.
MR
CLEAN
EXTENDIA
ESCAPE
REVASCAT
500
70
315
206
196
mRs 0-2 –
controle
19,1%
40%
29,3%
28,2%
35%
mRs 0-2
endovascular
32,6%
71%
53%
43,7%
60%
TICI 2b-3
58,7%
86%
72,4%
65,7%
88%
8
4
4
6,5
4
N
(randomizados)
SWIFT
PRIME
Resultados
NNT mRs em
90 dias
1587. doi:10.1056/NEJM199605233342114.
mRs – Escala de Rankin modificada; TICI – Trombólise no infarto cerebral;
NNT – número necessário para tratar
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2015|21
Santana, FR et al. Impactos do envelhecimento humano na ortopedia. A especialidade está
preparada? Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 22-25.
Atualização em Ortopedia
Impactos do envelhecimento humano na ortopedia.
A especialidade está preparada?
Flávio Robert Santana1, Aleixo Abreu Tanure1, Marcos Almeida Matos1
Palavras-chave: osteoporose, envelhecimento, tratamento
Key words: osteoporosis, aging, treatment
Considerações iniciais
O aumento da população idosa no mundo é um assunto que toda hora alguém fala a respeito. Esta constatação reveste-se de especial impacto na economia,
na saúde e em particular na especialidade de ortopedia.
Mesmo em países em desenvolvimento, como o Brasil,
a vida média está chegando perto dos 75 anos. Em países mais desenvolvidos, entretanto, esta temática tem
sido ponto importante da agenda social e econômica há
muito mais tempo.
A crise financeira da previdência social assume destaque especial, tendo em vista que o número de pensionistas (aposentados) vem crescendo ano a ano e
o número de trabalhadores contribuintes, ao contrário,
vem diminuindo. Neste contexto temos a eterna briga
que põe, de um lado, as iniciativas sociopolíticas governamentais para alterar a idade da aposentadoria (novas
regras de cálculos, etc) e a reação da sociedade organizada, que pleiteia proventos como políticas sociais compensatórias. O problema é matematicamente simples:
se os governantes não tomarem cuidado, em pouco
tempo não haverá recursos para pagar os aposentados e isso será o CAOS DO ENVELHECIMENTO! Esta
situação exige discernimento e clarividência da classe
governante para encontrar medidas de equilíbrio, mas
estas não são qualidades comumente observadas nos
gestores, nem da previdência e nem da saúde.
Mas, não vamos mais divagar nesta linha, para que
não saiamos do nosso propósito. Vamos nos ater ao
lado médico, apresentando as múltiplas condições de
saúde, que também se agigantam com o envelhecimento e para as quais os gestores deveriam estar preparados. Comecemos pelas morbidades clínicas de alta
prevalência: o brasileiro está ficando obeso, diabético
e hipertenso e, evidentemente, esses fatores na terceira idade vão acarretando consequências cada vez
mais complexas. Por este motivo, os governos federal
e estaduais já gastam milhões fornecendo não só tra-
tamento, mas também algumas drogas, gratuitamente,
para o controle destas condições na população carente.
Isto nem de longe cobre o total de gastos que um idoso
tem para comprar mensalmente todo medicamento que
precisa, ficando o resto por conta própria.
Mas, chegando na ORTOPEDIA, os dois grandes
problemas que afetam os idosos são a OSTEOPOROSE e a OSTEOARTROSE. A última destas é a doença
articular mais comum no mundo, afetando aproximadamente cerca de 10 a 15% das pessoas do planeta sem
considerar a idade, mas com taxa de 60% em mulheres
e 70% em homens acima de 65 anos1. A OSTEOPOROSE, por sua vez, é uma doença osteometabólica, caracterizada por diminuição da massa óssea e deterioração
da microarquitetura do tecido ósseo com consequente
aumento da fragilidade óssea e da susceptibilidade a
fraturas2 (ver detalhe na figura 1).
Figura 1 - Tecido ósseo normal (sólido) e osteoporótico (fraco), susceptível a fraturas do colo femoral.
Estima-se que cerca de 50% das mulheres e 20%
dos homens com idade igual ou superior a 50 anos sofrerão uma fratura osteoporótica ao longo da vida. Apro-
2015|22
Santana, FR et al. Impactos do envelhecimento humano na ortopedia. A especialidade está
preparada? Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 22-25.
ximadamente, 5% dos indivíduos que apresentam fratura
de quadril morrem durante a internação hospitalar, 12%
morrem nos 3 meses subsequentes e 20% morrem no
ano seguinte ao da fratura, conforme dados norte-americanos3. É, pois, sobre esta verdadeira epidemia, a osteoporose e suas consequências em populações mais idosas, que queremos nos deter. É nosso objetivo despertar
a atenção para os seus principais aspectos e também
apresentar um panorama local desta realidade, que deixa evidente a fragilidade dos gestores em lidar com este
grave problema de saúde pública do idoso.
Características clínicas da osteoporose
Para compreender a fisiopatologia da osteoporose
deve-se ter em mente que o osso não é uma estrutura
estática, mas encontra-se submetido a uma constante remodelação. O equilíbrio entre a formação e a reabsorção óssea depende do funcionamento adequado dos osteoclastos e osteoblastos. Na osteoporose
senil ocorre diminuição da atividade osteoblástica,
aumento na atividade osteoclástica ou de uma combinação de ambas. A menor atividade física associada ao envelhecimento, imobilização ou paralisia eleva
ainda mais o ritmo da perda óssea. As mulheres estão
em especial risco, pois após a menopausa diminuem
drasticamente o nível de hormônios sexuais. Baixos
níveis de estrógeno resultam em maior secreção de
IL-1, que é conhecido como estimulador mais potente
dos osteoclastos4.
O diagnóstico da osteoporose é dado pela densidade mineral óssea medida pela absormetria radiológica de dupla energia ou DEXA (DualEnergy X-ray
Absorptiometry). A Organização Mundial da Saúde
(OMS) define a osteoporose como uma condição em
que a densidade mineral óssea é igual ou inferior a 2,5
desvios-padrão abaixo do pico de massa óssea encontrada no adulto jovem, e a osteopenia ou baixa massa
óssea, como uma condição em que a densidade mineral óssea encontra-se entre 1 e 2,5 desvios-padrão
abaixo do pico de massa óssea encontrada no adulto
jovem. Assim, o número de desvios-padrão abaixo do
normal, também conhecido como escore T, deve ser
usado para definir a doença5.
O rastreio para a osteoporose com densitometria
óssea está indicado para todas as mulheres com idade
igual ou superior a 65 anos e homens com idade igual
ou superior a 70 anos, independentemente da presen-
ça de fatores de risco; mulheres na pós-menopausa e
homens com idade entre 50 e 69 anos com fatores de
risco para fratura (índice de massa corporal, estilo de
vida e história familiar); mulheres na perimenopausa,
se houver fatores de risco específicos associados a
aumento de fratura, tais como baixo peso corporal, fratura prévia por pequeno trauma ou uso de medicamentos que causam perda óssea; adultos que sofrerem
fratura após os 50 anos; indivíduos com anormalidades vertebrais radiológicas; e adultos com condições
associadas à baixa massa óssea ou perda óssea,
como artrite reumatoide ou uso de glicocorticoides na
dose de 5 mg de prednisona/dia ou equivalente por
período igual ou superior a 3 meses6.
Como exposto na introdução deste artigo, o envelhecimento da população já é também uma realidade
brasileira. Em 1991, o total de idosos, pessoas com
60 anos ou mais era de 10,7 milhões ou 7,2% da população, em 2011 esse grupo somou 23,5 milhões ou
12,1% da população7. O custo do tratamento das fraturas osteoporóticas nestes idosos também assumiu
proporções alarmantes. Ao analisarmos o dispêndio do
Ministério da Saúde com o tratamento de osteoporose
no Sistema Único de Saúde (SUS) no triênio 2008 –
2010, foram realizados 3.252.756 procedimentos relacionados ao tratamento de osteoporose em idosos
do Brasil no triênio 2008 – 2010, que totalizaram R$
288.986.335,15. Sendo 106 milhões de reais somente
com pacientes com 80 anos ou mais8.
O tratamento da osteoporose não é somente cirúrgico e pode ser divido em medicamentoso e não medicamentoso. A atividade física contribui para a redução
do risco de fratura de duas formas: uma, porque a força
biomecânica que os músculos exercem sobre os ossos
é capaz de aumentar a densidade mineral óssea e outra, porque a atividade física regular pode ajudar a prevenir as quedas que ocorrem, devido a alterações do
equilíbrio e diminuição de força muscular e de resistência. Além dos exercícios físicos já citados, a estratégia
de prevenção deve incluir a revisão de medicamentos
psicoativos e outros associados ao risco de quedas,
avaliação de problemas neurológicos, correção de distúrbios visuais e auditivos e medidas de segurança ambiental conforme protocolos de prevenção de quedas. O
tabagismo deve ser rigorosamente desencorajado, bem
como a ingestão excessiva de álcool.
O tratamento medicamentoso tem como padrão
para todos os idosos a suplementação de cálcio e vitamina D, devendo ser garantida a ingestão diária mí-
2015|23
Santana, FR et al. Impactos do envelhecimento humano na ortopedia. A especialidade está
preparada? Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 22-25.
nima em todos os casos. Aconselha-se ingestão equivalente a 1.200-1.500 mg de cálcio elementar por dia.
Caso o consumo seja inferior a essa quantidade, o que
é frequente, o cálcio deve ser suplementado. No entanto, considera-se razoável que o aporte da quantidade
diária recomendada se faça primariamente por meio da
dieta sempre que possível, principalmente na presença
de doença cardiovascular.
A vitamina D tem importância fundamental e não influi só na absorção do cálcio e na saúde óssea, mas
também no desempenho muscular, equilíbrio e risco de
queda. Recomenda-se a ingestão diária de 800-1.000
UI de vitamina D para adultos com 50 anos ou mais.
Com essa dose, alguns estudos mostraram redução
de fraturas de quadril e não vertebrais, especialmente
na população com risco aumentado de quedas, como
idosos frágeis institucionalizados. A exposição solar da
face, tronco e braços antes das 10 horas ou após as 16
horas por no mínimo 15 minutos, 2-4 vezes por semana, também é recomendada, salvo por contraindicação
dermatológica.
Em relação ao tratamento da osteoporose propriamente dita, temos medicações de primeira linha (alendronato de sódio, risedronato de sódio, pamidronato
dissódico) e segunda linha (raloxifeno, estrógenos conjugados, calcitonina teriparatida, ácido zoledrônico, ranelato de estrôncio, ibandronato e mais recentemente
denosumabe) que não entraremos em mais detalhes,
pois não é o intuito deste artigo6.
Com a queda natural dos hormônios femininos,
as mulheres podem perder de 2% a 4% do cálcio dos
seus ossos por ano. Sendo assim, é fundamental que
se faça a prevenção. As mulheres menstruam em
média por 35 anos e então é só fazer as contas: a 1ª
menstruação (menarca) aos 12 anos, mais 35 anos e
a menopausa começará a dar sinais aos 47 anos em
diante (às vezes, menos). Para a prevenção é primordial realizar todo ano um perfil hormonal feminino (marcadores de perda óssea, dosagem de cálcio e fósforo
e ainda dosagem de vitamina D) e, em seguida, uma
DENSITOMETRIA para definir com segurança a massa óssea da paciente (esse exame, de um modo geral,
é feito da região da coluna lombar e colo do fêmur, mas
alguns profissionais acrescentam o exame do punho).
Considerações finais
Mas, porque toda essa preocupação com o tratamento da osteoporose? Pelo simples fato de que po-
deríamos evitar as fraturas típicas da osteoporose, tais
como as que ocorrem na coluna vertebral, fêmur proximal, fratura do punho (rádio distal) e fratura do úmero
proximal. Desta forma, seria possível não só diminuir
custos econômicos com tratamentos de alta complexidade, mas também diminuiríamos o sofrimento humano
com menor prevalência de morbidades, internamentos,
incapacidade física e também de mortalidade. A maior
parte dessas fraturas osteoporóticas tem indicação de
cirurgia de alto custo e alta complexidade e aí se iniciam as complicações. As fraturas da região proximal do
fêmur, infelizmente, têm elevada taxa de mortalidade.
Portanto, é melhor “prevenir do que remediar”.
Em um contexto mais próximo da nossa realidade,
no Hospital Santa Izabel, foram realizadas pelo serviço
de ortopedia 412 cirurgias para tratamento de fraturas
osteoporóticas desde 2010 até o presente momento. Logicamente, um idoso com uma fratura sempre causa um
transtorno familiar enorme, principalmente se ele fica
acamado; e nas classes menos favorecidas, o problema, às vezes, é quase insolúvel.
O Sistema Único de Saúde (SUS) permite a realização de todas as cirurgias para fraturas osteoporóticas,
porém paga em torno de R$ 250,00 de honorários para
toda equipe cirúrgica (cirurgião, 2 auxiliares e anestesista). Uma cirurgia desse porte (alta complexidade) demora em média 3 horas para ser realizada, não sendo fácil
também encontrar profissionais para realizar o procedimento, visto que o cirurgião ganha em média R$ 100,00.
O equivalente a um corte de cabelo! (sem menosprezar
o profissional do salão, é claro).
Há algum tempo, a Prefeitura de Salvador, sabedora
da situação, fez uma contratualização com o Hospital
Santa Izabel para que fossem realizadas cirurgias (artroplastias) de joelho e de quadril, sendo realizadas em
torno de 961 procedimentos. É claro que muitos destes
procedimentos não foram exclusivamente por osteoporose. Novamente, a osteoartrose, uma parceira do envelhecimento na ortopedia, também contribuiu em grande
monta. Mesmo assim, a contratualização teve que ser
suspensa por falta de numerário e isto ocasionou até
o momento 88 pacientes aguardando para cirurgia de
quadril, 292 para cirurgias do joelho, sem qualquer perspectiva de solução.
Este exemplo mostra que precisamos muito mais do
que dinheiro para enfrentar as demandas da população
idosa. Precisamos de ações que sejam efetivas na prevenção e terapêutica e que ainda não foram encontradas pelos gestores da saúde. Não é possível à mente
2015|24
Santana, FR et al. Impactos do envelhecimento humano na ortopedia. A especialidade está
preparada? Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 22-25.
comum, entretanto, saber se estas soluções realmente
não existem ou se não é desejo encontrá-las. E, enquanto isto, a saúde, a segurança e a educação estão
no mesmo barco, num imenso oceano sem rumo!
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1- Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital
Santa Izabel.
Endereço para correspondência:
[email protected]
2015|25
Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da
hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30.
Atualização em Pneumologia
Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação
da hipertensão pulmonar
Marcel Lima Albuquerque1, Jamocyr Moura Marinho1
Palavras-chave: hipertensão pulmonar, diagnóstico, dessaturação
Key words: pulmonary hypertension, diagnosis, desaturation
Hipertensão pulmonar é uma doença relacionada a
um grupo amplo de patologias que têm como fator comum a elevação da resistência vascular pulmonar culminando em hipertrofia e posterior falência do ventrículo
direito, que, se não abordado de forma específica, pode
evoluir em um curto espaço de tempo para a morte.
Manifestações clínicaS
Sintomas e sinais de hipertensão pulmonar (HP)
podem ser difíceis de reconhecer, devido à inespecificidade. Inicialmente, os pacientes se apresentam com
dispneia e fadiga. Como a HP é progressiva, as manifestações clínicas evoluem ao longo do tempo, de modo
que os pacientes podem, eventualmente, desenvolver
os sinais e sintomas de hipertensão pulmonar grave
com insuficiência manifesta do ventrículo direito (por
exemplo, dor no peito ao esforço, síncope e congestão,
incluindo edema periférico, ascite e derrame pleural).
O diagnóstico é frequentemente adiado porque os sintomas são atribuídos incorretamente à idade, falta de
condicionamento ou a outra condição médica. Como
resultado, a HP muitas vezes não é suspeitada até que
os sintomas se tornem graves. Estima-se que mais de
20% dos pacientes apresentem sintomas de HP por um
período superior a dois anos antes do diagnóstico. Isto
é particularmente prevalente entre os pacientes com
menos de 36 anos e naqueles com condições médicas
coexistentes.1
Sintomas - Os sintomas iniciais da HP são resultados de uma incapacidade para aumentar adequadamente o débito cardíaco durante o exercício, sendo os
mais importantes a dispneia, letargia e fadiga. Os sintomas adicionais acontecem com a progressão da doença e o desenvolvimento da hipertrofia do ventrículo
direito, com posterior insuficiência.2
A dor no peito (angina) é geralmente secundária à
hipoperfusão subendocárdica causada por aumento do
estresse da parede do ventrículo direito e demanda de
oxigênio do miocárdio. No entanto, pode ser ocasionalmente causada pela compressão dinâmica da artéria
coronária esquerda por uma artéria pulmonar alargada;
este risco é maior para os pacientes com um tronco da
artéria pulmonar com, pelo menos, 40 mm de diâmetro.3
A síncope é devido à incapacidade de aumentar o
débito cardíaco durante a atividade ou bradicardia reflexa secundária à ativação dos mecanorreceptores no
ventrículo direito.
O edema periférico é devido à falência do ventrículo
direito, elevação das pressões de enchimento no lado
direito das câmaras cardíacas e expansão do volume
extracelular.4
E a anorexia e/ou dor abdominal no quadrante superior direito, devido à congestão hepática passiva.
Entre os sintomas menos frequentes encontramos
tosse, hemoptise e rouquidão (síndrome de Ortner). A
rouquidão é causada pela compressão do nervo laríngeo recorrente esquerdo pela dilatação do tronco da
artéria pulmonar.
Exame físico - Pacientes com HP podem desenvolver os seguintes sinais no exame físico, à medida
que progridem de HP sozinho para HP associada à falência do ventrículo direito:
• O primeiro achado no exame físico do paciente
com HP geralmente é o aumento da intensidade do
componente pulmonar da segunda bulha, que pode até
tornar-se palpável.
• Com o desenvolvimento da hipertrofia ventricular
direita, ocorre o surgimento do pulso venoso jugular.
Isto pode ser acompanhado por um quarto som cardíaco direito ou por incursão paraesternal.
• Falência do ventrículo direito (ou bloqueio de ramo
direito) amplia a divisão da segunda bulha. A ausculta
pode revelar um sopro holossistólico de insuficiência
tricúspide e, ocasionalmente, em doença mais grave,
2015|26
Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da
hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30.
um sopro de regurgitação pulmonar diastólico. Estes
sopros e galopes do lado direito aumentam com a inspiração. A hipertensão venosa sistêmica causada por falência do ventrículo direito pode levar a uma variedade
de resultados, como a elevada pressão venosa jugular,
uma terceira bulha em ventrículo direito e uma onda V
proeminente no pulso venoso jugular. Hepatomegalia,
fígado pulsátil, edema periférico, ascite e derrame pleural também podem existir.
Alguns pacientes com HP, devido à doença pulmonar obstrutiva crônica grave (DPOC), desenvolvem
edema, mesmo na ausência de insuficiência cardíaca
direita. A patogênese de edema nestes doentes não é
bem compreendida.
Alguns pacientes podem também ter os sinais e sintomas da causa subjacente de HP (por exemplo, doença do tecido conjuntivo, insuficiência cardíaca, DPOC).5
Avaliação diagnóstica
Testes diagnósticos são indicados sempre que houver suspeita de HP. O propósito do teste de diagnóstico
é confirmar o diagnóstico, determinar a sua gravidade e
identificar a sua causa.
Sugere-se começar a avaliação com um ecocardiograma.6
Quando o ecocardiograma não sugere HP, os clínicos precisam ser guiados pela suspeita clínica. A avaliação diagnóstica deve ser dirigida para diagnósticos
alternativos se a suspeita clínica de HP é baixa, ao passo que o cateterismo cardíaco direito deve ser considerado, se a suspeita clínica de HP ainda for alta.
Quando o ecocardiograma é sugestivo de HP, devese determinar se há ou não doença cardíaca esquerda
no ecocardiograma o suficiente para explicar o grau de
HP estimado:6
• Os pacientes com doença cardíaca esquerda no
ecocardiograma o suficiente para explicar o grau de HP
estimado não necessitam de mais testes para determinar a etiologia da HP. Isto pode ser mais evidente em
pacientes com disfunção sistólica ventricular esquerda
grave, doença mitral grave ou doença da válvula aórtica. Pode ser menos evidente em pacientes com disfunção diastólica ou insuficiência cardíaca diastólica (insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada). Se
houver incerteza, o cateterismo cardíaco pode ser útil.
• Os pacientes que não possuem nenhuma doença
do coração esquerdo, que pareça suficiente para explicar o grau de HP estimado, ou uma potencial segunda
etiologia, devem fazer testes de diagnósticos adicionais para procurar uma causa alternativa da HP. Os
testes podem incluir testes de função pulmonar, ventilação-perfusão, oximetria, polissonografia e/ou testes
de laboratório (por exemplo, sorologias autoimunes,
sorologia para HIV e testes de função hepática). A
sequência dos testes devem ser priorizada de acordo com a história e exame físico do paciente. Como
exemplo, teste de função pulmonar é um teste inicial
adequado em um tabagista importante.
Para pacientes nos quais existe suspeita de doença
pulmonar crônica, o cateterismo cardíaco direito geralmente é reservado para aqueles nos quais a gravidade
da HP ao ecocardiograma não é explicada pela gravidade da sua doença pulmonar subjacente ou para aqueles
nos quais existe suspeita de uma etiologia alternativa.
Quando a disfunção pulmonar é grave o suficiente para
explicar o grau de HP ao ecocardiograma, cateterismo
cardíaco direito não é indicado.
Cateterismo cardíaco direito é indicado para confirmar a HP e avaliar a sua gravidade, embora isso muitas
vezes é feito no momento em que a terapia é iniciada. A
prova de esforço pode ser realizada, também para determinar a gravidade da doença funcional.
Testes diagnósticos
Radiografia de tórax - A radiografia de tórax
clássica de um paciente com HP mostra alargamento
das artérias pulmonares centrais com atenuação dos
vasos periféricos, resultando em campos pulmonares
oliguêmicos. Alargamento do ventrículo direito (espaço
retroesternal diminuído) e dilatação do átrio direito também podem ser vistos. Ocasionalmente, a causa subjacente da HP é aparente na radiografia de tórax (por
exemplo, doença pulmonar intersticial).
Eletrocardiograma - O eletrocardiograma
(ECG) de um paciente com HP pode demonstrar sinais
de hipertrofia ventricular direita, incluindo desvio do
eixo para direita, relação entre onda S e onda R maior
do que um em V1, bloqueio de ramo direito completo
ou incompleto ou aumento da amplitude da onda P na
derivação II (P pulmonale), devido ao aumento do átrio
direito. A maioria dos sinais de ECG é específica, mas
não é sensível para a detecção da doença ventricular
direita. Alterações eletrocardiográficas não se correlacionam com a gravidade da doença ou prognóstico.7
Ecocardiograma - O ecocardiograma é realizado para estimar a pressão sistólica da artéria pulmonar e
para avaliar o tamanho do ventrículo direito, espessura
e função. Além disso, a ecocardiografia pode avaliar o
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Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da
hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30.
tamanho do átrio direito, função sistólica e diastólica do
ventrículo esquerdo e disfunções valvares, assim como
derrames pericárdicos e comunicações intracardíacas.
Para estimar a pressão da artéria pulmonar no ecocardiograma, utiliza-se da regurgitação tricúspide, que
geralmente existe nesses casos. A velocidade máxima
de regurgitação tricúspide é registrada e a pressão sistólica da artéria pulmonar (PSAP) é então calculada:
PSAP = (4 x [TRV] 2) + RAP
Onde TRV é a velocidade de regurgitação tricúspide máxima e RAP é a pressão atrial direita estimada
a partir do tamanho e da variação respiratória do fluxo
na veia cava inferior. O ecocardiograma com Doppler é
limitado quando um jato adequado de regurgitação tricúspide não pode ser identificado.8
Pacientes com HP podem ter sinais ecocardiográficos de sobrecarga do ventrículo direito, incluindo abaulamento paradoxal do septo para o ventrículo esquerdo
durante a sístole e hipertrofia da parede livre do ventrículo direito. Quando houver falha do ventrículo direito, irá
ocorrer dilatação e hipocinesia, achatamento do septo,
dilatação do átrio direito e regurgitação tricúspide. A regurgitação tricúspide não é devido a uma anormalidade
intrínseca da valva tricúspide, e sim uma manifestação
secundária de dilatação do anel tricúspide e ventrículo
direito (ou seja, insuficiência tricúspide funcional). Outros achados associados à hipertensão pulmonar são a
insuficiência pulmonar e fechamento mesossistólico da
válvula pulmonar.9
Com base em um estudo ecocardiográfico com Doppler, pode ser determinado se a HP é provável, improvável ou possível:10
• HP é provável se a PSAP é > 50 e o TRV é > 3.4.
• HP é improvável se a PSAP é ≤ 36, o TRV é ≤ 2.8
e não há outros achados sugestivos.
• HP é possível com as outras combinações de resultados.
Ecocardiograma pode ser falho na avaliação de
pacientes com suspeita de HP, especialmente quando
uma regurgitação tricúspide é inadequada.
Testes de função pulmonar - Provas de
função pulmonar são realizadas para identificar e caracterizar doença pulmonar subjacente que pode estar
contribuindo para HP. Um padrão obstrutivo é sugestivo
de DPOC, enquanto a doença restritiva sugere doença
intersticial pulmonar, fraqueza neuromuscular ou doença da parede torácica.
Geralmente, doença intersticial pulmonar grave (com
volumes pulmonares abaixo de 50 por cento do previsto)
e doença pulmonar obstrutiva produzem HP. Na maioria
das circunstâncias, HP não deve ser atribuído à doença
pulmonar se as provas de função pulmonar são apenas
levemente anormais, já que a própria HP pode causar
anormalidades.11,12
Oximetria - Dessaturação noturna da oxiemoglobina pode ser identificada por oximetria. É comum em
pacientes com HP e pode levar à terapia de oxigênio
suplementar durante o sono. Oximetria não é um teste de diagnóstico aceitável para distúrbios respiratórios
relacionados com o sono, como a apneia obstrutiva do
sono.13
Polissonografia - A polissonografia é o teste
de diagnóstico padrão-ouro para distúrbios respiratórios
relacionados com o sono, como a apneia obstrutiva do
sono. Ela deve ser realizada quando a suspeita clínica é
alta ou os resultados da oximetria são discordantes com
a expectativa clínica.
Cintilografia Ventilação-perfusão (V/Q) - É
o estudo de imagem preferencial para avaliar pacientes com doença tromboembólica crônica (hipertensão
pulmonar tromboembólica crônica). Cintilografia V/Q
normal exclui doença tromboembólica crônica com
uma sensibilidade de 96-97% e uma especificidade
de 90-95%. Quando a cintilografia V/Q sugere que a
doença tromboembólica crônica existe, a angiografia
pulmonar é necessária para confirmar o diagnóstico e
definir a extensão da doença. Cintilografia V/Q é uma
parte importante na avaliação diagnóstica da HP, devido à doença tromboembólica crônica ser potencialmente reversível com a cirurgia.14
Exames laboratoriais - Os exames de sangue realizados durante a avaliação diagnóstica de hipertensão pulmonar incluem:
• Sorologia para o HIV.
• Testes de função hepática para triagem de hipertensão portopulmonar.
• Anticorpo antinuclear (FAN) para triagem de HAP
devido a doenças do tecido conjuntivo; considerar fator
reumatoide (FR) e anticorpo anticitoplasma de neutrófilos (ANCA), se clinicamente indicados.
No contexto clínico adequado, estudos de laboratório em busca de evidência de anemia hemolítica crônica
(por exemplo, anemia falciforme) ou esquistossomose
são adequados. Péptido natriurético cerebral N-terminal
(NT-proBNP) é o precursor do péptido natriurético do
2015|28
Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da
hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30.
cérebro (BNP). Ambos os peptídeos são liberados do
tecido miocárdico do ventrículo direito e esquerdo quando dilatados. O NT-proBNP e o BNP são úteis no diagnóstico de insuficiência cardíaca. No entanto, eles não
fazem distinção entre a insuficiência ventricular esquerda ou direita. Eles também desempenham um papel
prognóstico em pacientes com HP, embora a precisão
diminua se há presença de disfunção renal.15,16
Teste ergométrico - O teste ergométrico é
normalmente realizado através do teste de caminhada
de seis minutos (TC6), ecocardiograma de estresse ou
teste de esforço cardiopulmonar (ergoespirometria).17
Cateterismo cardíaco direito - Necessário
para confirmar o diagnóstico de HP e determinar com
precisão a gravidade dos distúrbios hemodinâmicos.
O cateterismo cardíaco direito também é útil em pacientes que têm HP distintas, devido à doença do coração esquerdo, como disfunção sistólica, disfunção diastólica ou doença cardíaca valvular (hipertensão venosa
pulmonar). Esses pacientes têm uma pressão média de
oclusão da artéria pulmonar (POAP) ≥15 mmHg, medida
pelo cateterismo cardíaco direito.18 No entanto, só essa
medida é insuficiente para diagnosticar definitivamente HP, devido à doença do coração esquerdo, pois ela
pode estar falsamente elevada, devido à dilatação das
artérias pulmonares e a incompleta oclusão do catéter-balão. Para evitar este dilema, os pacientes com uma
POAP ≥15 mmHg devem ter medido diretamente a pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (PDFVE), através de cateterismo cardíaco esquerdo. Não realizar esse
procedimento pode significar em erros diagnósticos (HP
devido à doença do coração esquerdo erroneamente), o
que têm importantes implicações terapêuticas.19
Um benefício adicional da cateterização do coração
direito é analisar a presença e/ou a gravidade de uma
derivação da esquerda para a direita congênita ou adquirida, que pode ser confirmada quando estudos não
invasivos não são definitivos.
Critérios diagnósticos - O diagnóstico definitivo de hipertensão pulmonar (HP) requer cateterismo
cardíaco direito. HP é confirmada quando a pressão
média da artéria pulmonar é ≥25 mmHg em repouso. A
pressão da artéria pulmonar média de 8 a 20 mmHg em
repouso é considerada normal, enquanto a pressão da
artéria pulmonar média de 21 a 24 mmHg em repouso
tem implicações clínicas incertas.6, 19
Classificação:6
• Grupo 1 - HAP (hipertensão arterial pulmonar).
• Grupo 2 - HP devido à doença do coração esquerdo.
• Grupo 3 - HP devido à doença pulmonar crônica e/
ou hipoxemia.
• Grupo 4 - Hipertensão pulmonar tromboembólica
crônica (HPTEPC).
• Grupo 5 - HP devido a mecanismos multifatoriais
pouco claros.
Grupo 1 - Hipertensão arterial pulmonar - O diagnóstico de HAP exige cateterismo cardíaco direito para demonstrar uma pressão média da artéria pulmonar ≥25
mmHg em repouso. Vários critérios adicionais para excluir as restantes categorias de HP também devem ser
atendidos:
• Pressão capilar pulmonar <15 mmHg (para excluir
HP devido à doença do coração esquerdo).
• Doenças pulmonares crônicas e outras causas de
hipoxemia são leves ou ausentes (para excluir HP devido à doença pulmonar crônica ou hipoxemia).
• Doença tromboembólica venosa está ausente
(para excluir HP tromboembólica crônica).
• Excluir doenças sistêmicas (exemplo: sarcoidose), doenças hematológicas e doenças metabólicas
(exemplo: doença de armazenamento de glicogênio).
O objetivo é excluir HP com mecanismos multifatoriais
pouco claros.
O diagnóstico de HAP também é suportado por um
aumento da resistência vascular pulmonar e gradiente
transpulmonar (diferença entre a pressão arterial pulmonar média e a pressão capilar pulmonar média).
Grupo 2 - HP devido à doença do coração esquerdo - Cateterismo direito com pressão arterial média pulmonar (PAP) ≥25 mmHg, pressão capilar pulmonar ≥15
mmHg e um débito cardíaco normal ou reduzido. Informações complementares importantes são a presença
de aumento do átrio esquerdo visto no ecocardiograma.
Aumento do átrio esquerdo é um “biomarcador” para a
presença de hipertensão atrial esquerda crônica.
Grupo 3 - HP devido à doença pulmonar crônica e/
ou hipoxemia - O diagnóstico de HP devido à doença
pulmonar crônica e/ou hipoxemia é feito pela demonstração de HP no cateterismo direito ou ecocardiograma
e provas de moderada a acentuada disfunção pulmonar
e/ou hipoxemia. Todas as outras causas de HP também
devem ser descartadas.
Grupo 4 - HP devido à hipertensão pulmonar tromboembólica crônica - Hipertensão pulmonar tromboembólica crônica é diagnosticada por HP no cateterismo
2015|29
Albuquerque, ML e Marinho, JM. Manifestações clínicas, diagnóstico e classificação da
hipertensão pulmonar. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 26-30.
direito que ocorre na presença de oclusão tromboembólica da vasculatura pulmonar proximal ou distal e na
ausência de outras causas de HP.
Grupo 5 - HP devido a mecanismos multifatoriais Pacientes com HP que não se enquadram claramente
em uma classificação da OMS ou têm etiologias combinadas podem se enquadrar neste grupo (exemplo: anemia falciforme).
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1- Serviço de Pneumologia do Hospital Santa Izabel
Endereço para correspondência:
[email protected]
2015|30
Muccini, PH et al. Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem contraste: relato de
caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 31-33.
Relato de Caso – Bioimagem
Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem
contraste: relato de caso
Paulo Henrique Muccini1, Luiz Eduardo Lago de Castro1,
Marianna Machado Oliveira1.
Palavras-chave: tomografia computadorizada de crânio, policitemia, diagnóstico
Key words: computer tomography of brain, polycythemia, diagnosis
Introdução
O aumento da atenuação dos vasos cerebrais e
seios venosos na tomografia computadorizada sem
contraste (TCSC) é uma característica de imagem de
condições que levam à hemoconcentração, como a
policitemia. Contudo, pode mimetizar trombose venosa cerebral e trazer dificuldades diagnósticas.1
RELATO DE CASO
Paciente do sexo feminino, 12 anos, portadora de
cardiopatia: dupla via de saída de ventrículo direito com
ampla comunicação interventricular com hipertensão
pulmonar grave, dependente de oxigênio suplementar
e síndrome de Eisenmenger. Apresentava policitemia
secundária à hipoxemia e vinha recebendo hidratação
venosa contínua para hemoconcentração.
A paciente encontrava-se em internação hospitalar
prolongada, fora de proposta cirúrgica, e estava em programação de alta hospitalar com O2 domiciliar e sildenafil, quando apresentou episódio súbito de crise convulsiva focal, com nistagmo e liberação esfincteriana,
acompanhada de desconforto respiratório e bradicardia.
Foi intubada e estabilizada, encaminhada para realizar
tomografia computadorizada (TC) do crânio e posteriormente para UTI. A sua hemoglobina encontrava-se em
20,2 g/dL e o hematócrito em 60,5%, uma semana antes do ocorrido.
A TC do crânio foi realizada em aparelho multidetectores de 16 canais em uma única fase: sem contraste,
sendo observada hiperdensidade vascular difusa, incluindo os vasos do polígono de Willis (figura 1) e sobretudo do sistema venoso cerebral (figura 2), mensurada
em cerca de 60 UH na região da confluência dos seios.
Não havia alterações no parênquima encefálico. A paciente foi tratada com anticoagulantes.
Figura 1 - Irrigação do cérebro: circulação posterior
Figura 2 - Irrigação do cérebro: circulação posterior
2015|31
Muccini, PH et al. Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem contraste: relato de
caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 31-33.
DISCUSSÃO
HEMATÓCRITO E ATENUAÇÃO DE VASOS NA TC
O hematócrito normal varia entre 42 e 52% em adultos e entre 37 e 47% em neonatos. O sangue circulante,
quando o paciente apresenta um hematócrito de 45%,
apresenta densidade aproximada de 40 UH. Desta
forma, os grandes vasos e seios venosos durais apresentam-se isodensos ou levemente hiperdensos em relação à substância cinzenta, que nos adultos normais
apresentam densidade de cerca de 39 UH.2
O conceito de que a hemoconcentração leva a um
aumento da atenuação dos feixes de raio X no interior
de vasos cerebrais é amplamente aceito.1 New et al. demonstraram uma relação linear entre o valor de atenuação na TC e o hematócrito em preparações de sangue
total. A atenuação na TC da hemoglobina foi associada
ao seu conteúdo proteico, com o conteúdo de ferro contribuindo apenas com 7% do total da atenuação.3,4
Muitos autores relataram casos de policitemia que
apresentam hiperdensidade vascular difusa, incluindo o
polígono de Willis e seios venosos durais na TCSC.2,3,5,6
Em muitos casos, o achado de hiperdensidade vascular
difusa é o primeiro achado num paciente sem diagnóstico prévio de policitemia, que faz o exame por queixas
de cefaleia, por exemplo.
POLICITEMIA X TROMBOSE
Policitemia é um dos estados de hipercoagulabilidade que predispõem a trombose. Desta forma, seios
hiperdensos relacionados ao aumento de hematócrito
podem ser difíceis de diferenciar de trombose venosa
dural. O envolvimento simétrico, homogeneidade da hiperdensidade e o envolvimento de virtualmente todos
os seios venosos durais e estruturas vasculares principais podem sugerir que a policitemia está presente, ao
invés de trombose venosa.3
O diagnóstico de trombose venosa cerebral é feito
quando se encontra uma hiperdensidade vascular seletiva. Como o hematócrito de um trombo/coágulo agudo
é muito alto (acima de 90%) e a globina apresenta massa de alta densidade, coágulos sanguíneos recentes
apresentam-se hiperdensos na TC. O “cord sign” representa a direta visualização da veia cortical trombosada,
vista como uma hiperdensidade linear, outro achado de
trombose venosa cerebral.3 Contudo, a policitemia pode
também se apresentar com uma hiperdensidade isolada de seio venoso em TC sem contraste, mimetizando uma trombose venosa cerebral em pacientes sem
trombose.3,7 Nestes casos, a angio-RM ou a angio-TC
podem ajudar a confirmar a presença ou ausência de
trombos, mas a RM é mais sensível na detecção de alterações parenquimatosas recentes.2,3
Black D. F. et al realizaram a mensuração da densidade dos seios venosos durais (na região da confluência dos seios) em 166 exames de TCSC e correlacionaram com o valor da hemoglobina e hematrócrito
destes pacientes. Foram também avaliados 8 pacientes
com trombose venosa. Os autores observaram que 7
dos 8 pacientes com trombose apresentaram valores de
atenuação dos seios > 70UH, mas nenhum dos indivíduos normais. Eles também avaliaram a relação entre a
densidade tomográfica do seio e o nível de hematócrito
(H:H) e demonstraram que, quanto maior a diferença
entre um alto valor de UH no seio e um valor baixo de
hematócrito, mais provavelmente o paciente tem uma
trombose venosa. O valor médio da relação H:H nos
casos de trombose foi 2,2. Apenas 4% dos pacientes
sem trombose apresentaram valores H:H entre 1,8-1,9
e nenhum foi maior ou igual a 2,0. O número reduzido
de casos deste estudo limita a conclusão precisa sobre
valores de corte para trombose baseados na mensuração da atenuação vascular na TC sem contraste.1
OUTROS DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
Além da policitemia e da trombose venosa, outros
diagnósticos devem ser aventados num paciente com
hiperdensidade vascular difusa, entre eles: aspecto normal no crânio neonatal, edema cerebral difuso, hemorragia subaracnoide e subdural. No crânio neonatal, a
hiperdensidade dos vasos pode estar associada a um
parênquima cerebral de menor densidade, devido ao
processo incompleto de mielinização, além de estar associada a uma policitemia fisiológica. Da mesma forma,
em pacientes com edema cerebral difuso, há redução
da densidade do parênquima e então os vasos aparentam estar hiperdensos, bem como o cerebelo, chave
para o diagnóstico. Pacientes com hemorragia subdural
ou subaracnoide ao longo do tentório e foice cerebral
podem apresentar uma falsa hiperdensidade dos seios
venosos durais. A presença de sangue nos sulcos cerebrais, coleções subdurais, hipodensidades parenquimatosas e história de trauma ou hipertensão usualmente
ajudam no diagnóstico correto.2
CONCLUSÃO
O conceito de que a hemoconcentração leva a um
aumento da atenuação dos feixes de raio X no interior
2015|32
Muccini, PH et al. Hiperdensidade vascular difusa na TC de crânio sem contraste: relato de
caso. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 31-33.
de vasos cerebrais é amplamente aceito. Em pacientes
com policitemia, a hiperdensidade vascular difusa e simétrica pode estar relacionada à hemoconcentração na
ausência de trombose venosa. A presença de hiperdensidade vascular seletiva é mais indicativa de trombose,
contudo, há casos relatados de policitemia sem trombose com esta apresentação. Tentativas de quantificar a
densidade do seio que indica trombose foram realizadas, mas ainda necessita-se de estudos com maior volume amostral. Desta forma, a angio-RM ou a angio-TC
podem ajudar a confirmar a presença ou ausência de
trombos nestes casos.
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1- Serviço de Bioimagem do Hospital Santa Izabel
Endereço para correspondência:
[email protected]
2015|33
Pinho, JA et al. Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo)-Relato de caso.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 34-36.
Relato de Caso – Cardiologia
Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo) - Relato de caso
Joel Alves Pinho1, Thiago Carvalho Pereira1, Joberto Pinheiro Sena1,
Thales Costa Cardoso1, Vitor Maia Teles Ruffini1, Leonardo Pereira Santana1
Palavras-chave: Takotsubo, síndrome coronariana aguda, insuficiência cardíaca aguda
Key words: Takotsubo, acute coronary syndrome, heart failure
INTRODUÇÃO
Essa entidade clínica foi descrita inicialmente no
Japão, em 1991, e a partir daí passou a ser reconhecida em todo o mundo. Várias denominações têm
sido dadas, síndrome do coração partido, síndrome
do balonamento apical, cardiomiopatia neuroadrenérgica, etc; cardiomiopatia do estresse (Takotsubo),
nos últimos anos, ganhou a preferência. Takotsubo é
uma palavra japonesa para armadilha de pegar polvo (Octopus pot). Como o formato assumido pelo VE
nessa patologia lembra tal artefato, pelo balonamento
do apex do VE, o termo foi usado na descrição inicial
dessa patologia.
A doença se caracteriza por uma disfunção sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo (VE) de caráter
transitório, com uma variedade de alterações da contratilidade da parede ventricular.
CASO CLÍNICO
Paciente ESA, 75 anos, feminina, aposentada, procedente de Salvador, admitida na emergência do HSI
em 27/02/13, com dor retroesternal em queimação, associada a náuseas, palidez e dispneia há 5h da admissão. A dor teve uma duração de 5 minutos e recorreu
2h após com as mesmas características, fazendo-a
buscar o nosso hospital. Informava ser hipertensa em
uso de Losartan 50mg/dia e em tratamento de depressão havia 2 anos. Ex-tabagista há 30 anos e em tratamento de osteoporose.
No exame físico estava em bom estado geral, lúcida e eupneica. PA: 130/80 mmHg, P- 88 bpm, rítmico.
O precórdio era calmo, com o ictus no 5º EIE, LMC. As
bulhas estavam hipofonéticas, em dois tempos e não
havia sopros. Os pulmões estavam limpos e não apresentavam alterações em outras áreas. O ECG reali-
zado de imediato revelou supradesnível do segmento
ST nas derivações precordiais direitas e a paciente foi
encaminhada para coronariografia, que revelou lesão
proximal e isolada de 50% na descendente anterior e
ventriculografia esquerda, assinalando grande hipocontratilidade difusa, incompatível com o padrão coronariográfico. Foi mantida na unidade coronariana sob
tratamento para SCA, com níveis elevados de troponinas (de 1,22 a 1,70) e submetida à ecocardiografia que
evidenciou acinesia das porções medial e apical de todas as paredes, preservando a contratilidade das porções basais e FE de 26%. O diagnóstico de Takotsubo
foi assim estabelecido, tendo a paciente boa evolução
hospitalar e normalização do ecocardiograma antes da
alta, com FE de 78%.
DISCUSSÃO
Esse caso ilustra bem o problema do Takotsubo.
Houve manifestação clínica de SCA, aparentemente
sem um gatilho identificado, mas havendo história de
tratamento para depressão numa idosa, menopausada. O diagnóstico inicial foi de SCA com supra do segmento ST, ocorrendo imediata realização de coronariografia que não revelou obstruções compatíveis com
o quadro eletrocardiográfico de IAM com supra de ST
e grande disfunção ventricular identificada na ventriculografia esquerda. O padrão ecocardiográfico clássico
subsequente e a elevação discreta dos marcadores de
necrose, com total recuperação ecocardiográfica da
contratilidade ventricular após uma semana, confirmaram o diagnóstico.
Apesar dos esforços realizados, o entendimento dos
fatores etiológicos e fisiopatológicos envolvidos nessa
doença ainda permanece limitado, parecendo haver
uma relação entre o eixo cérebro-coração2,3, com um
excesso de catecolaminas sendo o responsável pela
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Pinho, JA et al. Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo)-Relato de caso.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 34-36.
cardiomiopatia, podendo haver vasoespasmo em múltiplos vasos coronarianos, anormalidades na função microvascular e cardiotoxidade das catecolaminas.
A doença se caracteriza por uma disfunção sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo (VE) de caráter transitório, com uma variedade de alterações da
contratilidade da parede ventricular. Na fase aguda se
apresenta como um quadro de síndrome coronariana
aguda (SCA), com achados clínicos, eletrocardiográficos e enzimáticos muito similares, associados a diferentes graus de disfunção ventricular, com insuficiência cardíaca aguda variável. Os principais achados
clínicos são a presença de dor torácica, dispneia e
síncope. Alterações eletrocardiográficas são comuns,
como supradesnivelamento do segmento ST (34 a
56%), ondas Q patológicas, inversão da onda T com
QT prolongado, além de alterações inespecíficas da repolarização. Com esses achados, o diagnóstico inicial
é de SCA, entretanto, a angiografia coronariana é normal ou revela alterações discretas incompatíveis com
a importância do quadro clínico. A elevação dos níveis
de troponinas cardíacas é frequente, embora discreta,
contrastando com as importantes anormalidades contráteis e hemodinâmicas. A ventriculografia esquerda
e/ou estudo ecodopplercardiográfico demonstra(m)
abaulamento apical com acinesia ou discinesia acometendo de metade a dois terços do VE associada à
hiperdinamia dos segmentos basais.
No Japão, ocorre mais frequentemente nos homens4, contudo, nos países ocidentais, predomina nas
mulheres5-7, com uma relação de 9/1. Essa variação
não tem razões conhecidas até o momento. Tem sido
progressivamente mais diagnosticada nos pacientes
com disfunção ventricular aguda nas salas de emergência. As mulheres idosas menopausadas representam o principal grupo de risco (em torno de 80% dos
casos), sendo que a cardiomiopatia é frequentemente
desencadeada por intenso estresse físico ou emocional, perdas financeiras, desastres naturais e, por vezes, secundária a estresse provocado por outras doenças. Entretanto, pode ocorrer na ausência desses
fatores. Mais da metade dos pacientes com Takotsubo
apresentam uma desordem neurológica ou psiquiátrica
aguda, antiga ou crônica, podendo aparecer no contexto de hemorragia subaracnoidea, epilepsia, trauma
craniano, AVC, ansiedade e depressão8-10.
internacional recentemente publicado7, ela tem uma
evolução aguda semelhante à da doença coronariana
convencional, podendo recorrer mesmo anos após o
evento inicial.
A ressonância cardíaca com gadolíneo é útil para diferenciá-la do IAM e da miocardite, por não demonstrar
presença de edema miocárdico ou realce tardio. O acometimento do ventrículo direito pode ocorrer em 25% dos
casos. As principais complicações agudas são: insuficiência cardíaca, taquicardia ventricular, fenômenos tromboembólicos, regurgitação mitral e choque cardiogênico.
O tratamento tem como base manter o suporte clínico-hemodinâmico, para permitir a recuperação espontânea do miocárdio. Na ausência de hipotensão arterial
ou sinais de baixo débito cardíaco, podem ser utilizados
betabloqueador, inibidor da enzima conversora e diurético. Pacientes que cursam com hipotensão arterial necessitam de suporte hemodinâmico com uso cauteloso
de inotrópicos, como dobutamina, e vasopressores na
presença de hipotensão refratária. Em pacientes que
estejam evoluindo com choque refratário, medidas excepcionais, como o emprego do balão intra-aórtico e da
circulação extracorpórea (ECMO), podem ser realizadas, na expectativa de uma reversão do quadro clínico,
dada a natureza transitória da síndrome.
No registro internacional de Takotsubo7, a maior experiência publicada sobre o tema, num consórcio de
25 centros na Europa e Estados Unidos, 1.750 pacientes foram estudados e um grupo de 455 foi pareado
com semelhante população com síndrome coronariana aguda. Dos 1.750 pacientes, 89,9% eram do sexo
feminino, com idade média de 66,8 anos. Gatilhos
emocionais ocorreram em menor proporção que os
físicos (27,7% versus 36,0%) e 28,5% não tiveram gatilhos identificados. Comparados com pacientes com
SCA, desordens neurológicas ou psiquiátricas foram
mais comuns (55,8% vs 25,7%) e a FE do VE média
foi menor (40,7% vs 51,5%). Complicações hospitalares, incluindo choque e morte, foram semelhantes (p=
0,93). Na evolução em longo prazo, a taxa de eventos
cardíacos e cerebrovasculares maior foi de 9,9% por
paciente-ano e a taxa de morte, 5,6% por paciente-ano. Dessa maneira, Takotsubo deve ser visto como
uma condição com substancial morbimortalidade.
É considerada uma condição benigna, com recuperação total da função ventricular dentro de duas a
quatro semanas, entretanto, de acordo com o registro
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Pinho, JA et al. Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo)-Relato de caso.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 34-36.
FIGURAS
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Figura 1 - ECG compatível com SCA com supra do
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1- Serviço de Cardiologia do Hospital Santa Izabel
Endereço para correspondência:
[email protected]
Figura 3 - Imagem ecocardiográfica revelando morfologia típica do balonamento apical na sístole.
2015|36
Santos, ARN et al. Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 37-39.
Relato de Caso – Cirurgia
Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero
Adson Roberto Neves Santos1, Isadora Teles Sanjuan1, Mirlaine Carvalho
Muniz de Souza1, Thiago Franchischetto Ribeiro1, Fábio Oliveira Neves1,
André Ney Menezes Freire1.
Palavras-chave: câncer de colo de útero, tratamento cirúrgico, terapia de radiação
Key words: cancer of the uterine cervix, surgical treatment, radiation therapy
O câncer de colo de útero é a mais frequente neoplasia genital feminina em países subdesenvolvidos. Representa o terceiro câncer mais comum entre as brasileiras,
atrás apenas dos tumores de mama e colorretal (exceto
os casos de câncer de pele não melanoma) e a quarta
causa de morte em mulheres por câncer no Brasil, segundo dados do INCA. No Brasil, a estimativa para o ano
de 2014 é de 15.590 mil novos casos, dentre 5.430 mortes, e na Bahia, 1.300 novos casos para o mesmo ano.
Esta neoplasia, que habitualmente está associada a
infecção pelo HPV (papiloma vírus humano), acomete a
faixa etária dos 20 - 29 anos com aumento da incidência
até os 50 - 60 anos. Geralmente, ela se desenvolve lentamente e por isso tem alta possibilidade de cura quando tratada nos estágios iniciais. O método de rastreio
recomendado é o exame preventivo - Papanicolau.1,2
Infelizmente, no Brasil, mais de 50% das mulheres têm
o diagnóstico da neoplasia já na fase avançada, com estadiamento igual ou superior a II.3
Histologicamente, há dois tipos principais de câncer
de colo do útero: os carcinomas de células escamosas
(CEC), que representam entre 80% e 90% dos casos, e
os adenocarcinomas, de 10% a 20% do total, com pior
prognóstico. O estadiamento do câncer de colo do útero é padronizado pela FIGO (Federação Internacional
de Ginecologia e Obstetrícia) e é baseado na avaliação
clínica que envolve toque retal e vaginal, colposcopia e
exames radiológicos. A partir do estadiamento, cada paciente terá seu tratamento determinado.4,5
Tabela 1 - TRATAMENTO CLÁSSICO
NIC III / IA1: Conização / Traquelectomia/
Histerectomia simples
IA2 / IB1: Traquelectomia radical/ Histerectomia
Radical (Whertheim Meigs)
IB2 - IVA : Radioterapia e Quimioterapia concomitante
IVB : Quimioterapia Paliativa
Apesar do avanço da radioterapia e quimioterapia
nos últimos anos, a incidência de recidiva da doença
ainda é alta. Dependendo do estágio clínico inicial, há
relatos de até 80%.2,4
Um estudo revelou a localização destas recidivas e
este é um aspecto fundamental para estabelecer uma
nova estratégia de tratamento. Neste trabalho, cerca
de 29% das pacientes apresentaram recidiva do tumor,
das quais 35% somente na pelve, 56% extrapélvico e
7% intra e extrapélvicos. As pacientes com recidivas
pélvicas locais são elegíveis para cirurgia de resgate
– exenteração pélvica, pois não poderão realizar nova
radioterapia e o controle com quimioterapia isolada não
apresenta bons resultados.6
A exenteração deve ser muito bem indicada e possuir uma seleção cuidadosa, frente a sua complexidade.
A sobrevida geral em 5 anos com o tratamento cirúrgico
permeia 20-60% e a mortalidade relacionada ao procedimento, menos que 10%.6 Este procedimento cirúrgico
foi descrito pela primeira vez em 1948, por Brunchwig,
uma ressecção pélvica multivisceral para o tratamento
de neoplasias pélvicas avançadas.2,7
Podemos classificá-la em três tipos. Na exenteração
anterior há ressecção em monobloco dos órgãos genitais
femininos e trato urinário inferior (bexiga e uréteres); na
posterior há ressecção dos órgãos genitais e retossigmoide; e na total procede-se ao esvaziamento pélvico, com
a realização simultânea da exenteração anterior e posterior. Além da ressecção ampliada, a cirurgia também
contempla derivações pélvicas, a exemplo da reconstrução das vias excretoras sob técnica de Bricker (urostomia
- anastomose de uréteres em segmento de delgado) ou
colostomia úmida (dupla derivação – fezes e urina).7
Conforme já fundamentado na literatura, esta cirurgia radical é o tratamento de escolha para pacientes que apresentarem recidivas locais após tratamento
radioterápico e quimioterápico, sendo nesses casos a
única chance de cura para estas pacientes.7
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Santos, ARN et al. Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 37-39.
RELATO DE CASO
CASO 1
Paciente S.A.S., 31 anos, G3P3A0, iniciou acompanhamento no HSI em dezembro/2007, com queixa
de sangramento vaginal há 4 meses antes da primeira
consulta. Ao exame ginecológico observou-se sangramento e lesão ulcerada, infiltrativa em colo de útero e
o exame físico determinou EC IIIB. Foi submetida à
biópsia, com resultado de Carcinoma Escamocelular
bem diferenciado. Foram solicitados exames adicionais para estadiamento, dentre os quais apenas a TC
de abdome de janeiro/2008 mostrava alterações: lesão
expansiva infiltrativa, acometendo corpo e colo de útero + formação cística septada de contornos lobulados
em região anexial direita, indissociada à lesão anterior.
Iniciado, ainda naquele mês, tratamento radioterápico + quimioterápico concomitantes, seguido de braquiterapia. A paciente evoluiu com boa tolerância ao
tratamento, terminando esquema proposto 03 meses
depois, assintomática, sem queixa. Em junho/2008 não
apresentava queixas, nem sinais de doença residual.
Porém, em setembro/2008, evoluiu com dor pélvica
leve e recorrência do sangramento genital, sendo investigada e encontrada recidiva local. Novos exames
de imagem foram solicitados, TC confirmou a recidiva
pélvica com invasão da bexiga, porém sem evidência
de doença extrapélvica. Frente ao quadro clínico de
recidiva e falha terapêutica com RxTQt, em dezembro/2008 foi submetida à exenteração anterior com
anatomia patológica revelando margens cirúrgicas livres. Há aproximadamente 7 anos vem sendo acompanhada ambulatorialmente com bom estado clínico,
assintomática e sem sinais de recorrência tumoral.
CASO 2
Paciente S.S.M.S., 44 anos, G7P4A3, iniciou acompanhamento no HSI em março/2013, com queixa de
sangramento vaginal há cerca de 2 anos da primeira
consulta, com exame preventivo daquele mesmo ano,
sugestivo de adenocarcinoma. Optou-se por realizar
nova biópsia, onde houve diagnóstico de adenocarcinoma mucinoso, moderadamente diferenciado do colo
uterino, do tipo endocervical. Possuía história prévia de
cesária, histerectomia subtotal e plástica vaginal em outro serviço. Solicitada RNM de pelve, que mostrou lesão
de aspecto expansiva, infiltrativa em projeção de colo
uterino, envolvendo cúpula vaginal e parede anterior da
vagina, com extensão parametrial.
Classificada como EC IIB e iniciados, ainda naquele
mês, tratamentos radioterápico e quimioterápico concomitantes. Não realizou a braquiterapia por ausência
de condições geométricas. Apesar de 4 meses de tratamento, a paciente não obteve resposta adequada e ao
fim do período contatou-se doença persistente.
Novos exames de imagem foram solicitados, sem
evidência de doença extrapélvica. Devido à falha terapêutica com RxTQt e persistência da doença pélvica,
em outubro/2013 foi submetida à exenteração pélvica
total, obtendo-se margens livres e sucesso terapêutico.
Desde então, vem sendo acompanhada ambulatorialmente há 2 anos, com bom estado clínico, assintomática e sem sinais de recidiva da doença.
Figura 1 - Tomografia para reestadiamento, mostrando recidiva pélvica com invasão da bexiga.
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Santos, ARN et al. Papel da exenteração pélvica no câncer de colo de útero.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 37-39.
1- Serviço de Cirurgia do Hospital Santa Izabel
Endereço para correspondência:
[email protected]
Figura 2 - Exenteração pélvica total
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Souza, GX et al. Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico
permanente. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 40-42.
Relato de Caso – Neurologia
Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo
pós-cirúrgico permanente
Gabriel Xavier-Souza1, Matheus Mendes Pires 1, Jamile Seixas Fukuda1,
Thiago Gonçalves Fukuda1, Jamary Oliveira Filho1
Palavras-chave: hipoparatireoidismo, hipocalcemia, calcificações intracranianas
Key words: hypoparathyroidism, hypocalcemia, brain calcification
introdução
Paciente de 67 anos, destra, com história de que
há três meses da admissão passou a apresentar alteração cognitiva caracterizada por amnésia anterógrada, desorientação têmporo-espacial e dificuldade
para realizar tarefas rotineiras, como abotoar roupas
e manipular utensílios domésticos. Há 21 dias da admissão, apresentou um episódio de crise convulsiva
tônico-clônica generalizada (CCTCG) autolimitada,
tendo procurado atendimento médico em unidade de
emergência e liberada em seguida. Nos 21 dias seguintes até a chegada ao Hospital Santa Izabel (HSI),
os familiares testemunharam cinco episódios de parada comportamental associada a automatismos, com
duração menor que 5 minutos, seguidos de períodos
de desorientação, atribuídos a crises epilépticas, com
atendimentos em vários pronto-atendimentos, porém
sem realizar investigação etiológica do quadro.
No dia da admissão, a paciente foi trazida à emergência do HSI com relato de uma nova CCTCG, com
duração de 5 minutos, seguida de desorientação durante cerca de 20 minutos.
Paciente com histórico de hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia e hipotireoidismo pós-cirúrgico
relatou duas abordagens cirúrgicas cervicais em 1992
(tireoidectomia) e 1993 (paratireoidectomia), devido à
tumoração benigna em tireoide (estudo anatomopatológico indisponível).
Na admissão, a paciente apresentava-se vigil, desatenta, desorientada no tempo e orientada no espaço,
com pressão arterial de 146x91mmHg, FC de 108bpm,
FR de 18ipm, saturação de oxigênio, 96% em ar ambiente. Notava-se postura flexora em tetania em membros superiores (Sinal de Trousseau espontâneo). Disártrica, sem alterações de linguagem. As pupilas eram
fotorreagentes e isocóricas. Motricidade ocular extrínseca preservada. Força muscular grau 5/5 em todos os
segmentos. Notava-se também placa ovóide em face
medial do terço distal da perna direita, medindo 10cmx5cm de consistência pétrea, não aderida a planos profundos, aparentemente contida no tecido subcutâneo.
Durante a avaliação, a paciente apresentou rebaixamento do nível de consciência seguida de nova CCTCG,
evoluindo com status epilepticus, sendo sedada com midazolam e submetida à intubação orotraqueal (IOT).
Os exames laboratoriais da admissão evidenciavam ureia 35mg/dL, creatinina 0,7mg/dL, sódio
134mmol/L, potássio 3,1mmol/L, magnésio 1,5mg/dL,
fósforo 7,9mg/dL, cálcio sérico 4,7mg/dL, cálcio iônico
0,49mmol/L (VR>1,16mmol/L), TSH 0,005µUI/mL (VR
> 0,270µUI/mL), T4 livre 10,2µg/dL. À tomografia de
crânio era possível identificar calcificações em substância branca cerebelar e em coroa radiada perpendicularmente aos ventrículos laterais (Figura 1). Ainda
nesse estudo de imagem foram identificadas calcificações esféricas em todo espaço subcutâneo.
A paciente foi admitida na unidade de terapia intensiva neuroclínica, sendo imediatamente realizada reposição de cálcio com infusão em dose de ataque e manutenção de gluconato de cálcio intravenoso e carbonato
de cálcio via oral. Houve recuperação progressiva dos
níveis de cálcio (Ca ionizado diário: 0,49 > 0,86 > 1,06
> 1,15 mmol/L), sendo possível suspender a sedação
após cerca de 24 horas após a IOT, levando-se em
conta o diagnóstico presuntivo de status epilepticus secundário à hipocalcemia. Dessa forma, com parâmetros
ventilatórios mínimos e nível de consciência adequado,
a paciente foi extubada 30 horas após a admissão. A
paciente apresentou laringoespasmo e broncoespasmos recorrentes após a extubação, que resultaram no
prolongamento de sua internação em unidade fechada.
2015|40
Souza, GX et al. Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico
permanente. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 40-42.
A paciente permaneceu internada no total de 16
dias, período em que foi mantida a reposição de cálcio
associada à calcitriol, ambos via oral. Adicionalmente,
a paciente fez uso de levotiroxina sódica e foi necessário a introdução de salmeterol e fluticazona para controle dos episódios intermitentes de broncoespasmos.
A investigação adicional do quadro endocrinológico
revelou tireoglobulina de 125,22ng/mL (VR<35,0ng/
mL), antitireoglobulina de 1UI/mL (VR<4UI/mL), 25-hidroxivitamina D de 38,30ng/mL (VR para suficiência >
30,0ng/mL) e PTH de 1pg/mL (VR>4pg/mL). Foi realizada radiografia do membro inferior esquerdo para
documentar as áreas de calcificações (Figura 2).
A avaliação cognitiva padronizada foi prejudicada,
tendo em vista que a enferma ainda estava hospitalizada e com menos de um mês de estabilização metabólica. Ao exame, entretanto, era possível constatar que
a paciente encontrava-se lúcida e orientada no tempo
e no espaço, reconhecendo seus familiares, sem déficits de linguagem, incluindo semântica e abstração. A
paciente ainda relatou que se recordava de diversos
episódios em que se apresentava confusa e incapacitada ainda em seu domicílio, descrevendo que sentia
“lentificação do pensamento” nesse período.
A paciente recebeu alta hospitalar em uso de carbonato de cálcio, calcitriol, lexotiroxina e fenitoína (em
transição para carbamazepina), com orientação de
acompanhamento com endocrinologista e neurologista.
Discussão
O hipoparatireoidismo é definido como a secreção
inadequada de hormônio paratireoidiano (PTH), resultando em homeostase ineficaz dos níveis de cálcio,
permitindo, assim, hipocalcemia. Essa condição pode
ser congênita ou adquirida1, 2.
O hipotireoidismo pós-cirúrgico se configura como a
principal etiologia dessa entidade. Isso se deve à grande incidência de alterações na secreção do PTH após
abordagens cirúrgicas cervicais, em especial a tireoidectomia3. Os índices de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico chegam a 50%, porém a maior parte dos casos
se configura como alterações transitórias da atividade
das glândulas paratireoides, geralmente associadas a
edema ou hemorragias glandulares1, 3. De 0,9% a 9,0%
dos pacientes submetidos às mais diversas técnicas
para exérese total ou subtotal da tireoide apresentarão
uma função paratireoidiana insuficiente para manter
os níveis séricos de cálcio, mesmo após 6 meses da
cirurgia, condição denominada de hipoparatireoidismo
pós-cirúrgico permanente2, 3.
As complicações associadas ao hipoparatireoidismo pós-cirúrgico permanente devem-se à hipocalcemia
crônica a qual esse paciente será exposto. Dessa forma,
o quadro clínico clássico será composto preferencialmente por alterações da contração muscular, incluindo
tetania, broncoespasmo, laringoespasmo, cólica biliar
e intestinal, disfunção do músculo detrusor, parto prematuro. Parestesiasperiorais e na posta dos dedos são
queixas frequentes. Adicionalmente, o paciente pode
apresentar prolongamento do intervalo QT, insuficiência
cardíaca (raros casos), catarata precoce, osteoporose,
alterações dentárias, além de lesões cutâneas psoriasiformes1, 2, 4.
Do ponto de vista neurológico, a hipocalcemia
crônica resulta em calcificações intracranianas, síndromes extrapiramidais (parkinsonismo e coreia),
papiledema, encefalopatia, alucinações, demência e
convulsões5-9. A deposição de cálcio encontrada no
hipoparatireoidismo ocorre predominantemente nos
núcleos da base, tálamo e cerebelo, porém pode acometer coroa radiada em menor frequência8. O status
epilepticus induzido por alterações hidroeletrolíticas é
pouco frequentes e apresenta baixa taxa de resposta
à terapia anti-convulsivante convencional, de forma
que a identificação e correção do distúrbio deve ser
realizada de forma mais rápida possível9, 10.
Em um paciente apresentando hipocalcemia verdadeira (através da correção do cálcio total excluindo-se
hipoalbuminemia ou dosando-se o cálcio ionizado),
deve-se levar em consideração os diagnósticos etiológicos diferenciais de hipoparatireoidismo adquirido,
dentre eles: hipomagnesemia grave (Mg < 1mg/dL);
síndrome poliglandularauto-imune tipo I; hipoparatireoidismo autoimune (presença de anticorposanti receptor sensor de cálcio); e pseudo-hipoparatireoidismo
(resistência periférica dos receptores à ação do PTH);
deficiência de vitmina D; insuficiência renal crônica;
pancreatite; e sepse1, 4.
No caso descrito, a paciente apresentava cálcio
ionizado baixo, níveis séricos de magnésio, acima de
1mg/dL, e como condição predisponente, o histórico
de paratireoidectomia em 1993. A dosagem sérica de
PTH corroborou para o diagnóstico presuntivo realizado na admissão de hipocalcemia secundária, a hipoparatireoidismo pós-cirúrgico, permanente, resultando
em síndrome demencial e status epilepticus secundários à hipocalcemia crônica. Ponto que chama a aten-
2015|41
Souza, GX et al. Apresentação neurológica de hipoparatireoidismo pós-cirúrgico
permanente. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 40-42.
ção para o diagnóstico neste caso foi a instalação de
quadro demencial rapidamente progressivo, associado
a crises convulsivas. No exame físico, a presença de
postura distônica característica de membros superiores e calcificações metastáticas em subcutâneo reforçaram a suspeita clínica.
Figuras
Figura 1 - Tomografia axial de crânio evidenciando
calcificações em substância branca em ambos os
hemisférios cerebelares.
Figura 2 - Radiogradia de membro inferior esquerdo
em que se pode observar zona de calcificação no
terço distal da perna, já descrita ao exame físico.
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1- Serviço de Neurologia do Hospital Santa Izabel
Endereço para correspondência:
[email protected]
2015|42
Andrade, MVC. Heart Failure Survival Score em pacientes com Doença de Chagas:
correlação com variáveis funcionais. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 43-45.
Resumo de Artigo – Cardiologia
Heart Failure Survival Score em pacientes com Doença de
Chagas: correlação com variáveis funcionais
Marcus V. S. Andrade ¹
Artigo Original: Heart Failure Survival Score in Patients With Chagas Disease: Correlation
With Functional Variables. Luiz E. Ritt, Antonio Carlos Carvalho, Gilson S. Feitosa, Joel
A. Pinho-Filho, Cristiano R.B. Macedo, Fabio Vilas-Boas, Marcus V.S. Andrade, Gilson S.
Feitosa-Filho, Augusto J.G. Almeida, Marcos Barojas, Renato D. Lopes. L.E. Ritt.
Rev. Esp. Cardiol. 2012;65(6): 538–543
RESUMO
Introdução e objetivos: a doença de Chagas é
uma causa prevalente de insuficiência cardíaca na
América Latina e seu prognóstico é pior do que outras
etiologias. O Heart Failure Survival Score (HFSS) tem
sido utilizado para avaliar o prognóstico em pacientes
com insuficiência cardíaca; no entanto, este escore
ainda não foi estudado em pacientes com cardiopatia
chagásica. Métodos: o Heart Failure Survival Score
foi calculado em 55 pacientes com grave disfunção
sistólica do ventrículo esquerdo, devido à doença de
Chagas. As correlações foram avaliadas entre o HFSS
e variáveis obtidas a partir de ecocardiogramas, testes
de exercício cardiopulmonar, medidas de qualidade de
vida e testes de caminhada de 6 minutos. Resultados:
os pacientes foram distribuídos entre as classes New
York Heart Association II-IV; 89% estavam em uso de
inibidores da enzima de conversão da angiotensina ou
bloqueadores dos receptores da angiotensina, 62%
estavam usando betabloqueadores, 86% estavam
usando diuréticos e 74% estavam em uso de bloqueadores dos receptores de aldosterona. A média do
HFSS foi de 8,75 (0,80). O escore teve boa correlação
com variáveis do teste cardiopulmonar, tais como a absorção de oxigênio pico (0,662; P < 0,01), consumo de
oxigênio no limiar anaeróbio (0,644; P < 0,01), a inclinação da eficiência ventilatória de dióxido de carbono
(0,417; P < 0,01), o pulso de oxigênio (0,375; P < 0,01),
a inclinação da eficiência ventilatória do consumo de
oxigênio (0,626; P < 0,01), o teste de caminhada de 6
minutos (0,370; P < 0,01), a fração de ejeção do ventrículo esquerdo (0,650; P = 0,01) e o diâmetro do átrio
esquerdo (0,377; P < 0,01). Se observou também no
limite da significância estatística uma correlação entre
a pontuação do HFSS e a qualidade de vida (0,283; P
<0,05). Conclusões: em pacientes com insuficiência
cardíaca por doença de Chagas, o Heart Failure Survival Score mostrou boa correlação com as principais
variáveis prognósticas dos testes funcionais.
Palavras-Chave: miocardiopatia, insuficiência
cardíaca, prognóstico.
Key Words: cardiomyopathy, heart failure, prognosis.
Comentários
Ainda que se tenha observado uma significativa
redução na incidência da Doença de Chagas na forma aguda no Brasil, ainda temos principalmente na
região Norte e Nordeste uma grande prevalência de
pacientes com IC de etiologia Chagásica. A Insuficiência Cardíaca (IC) é o estágio final para quase todas as
doenças que afetam o coração. Apesar dos progressos na prevenção primária e secundária de doenças
cardíacas, a IC ainda é uma causa predominante de
mortalidade e hospitalização¹. A Doença de Chagas é
uma causa prevalente de IC no Brasil e em outros países latino-americanos4. O prognóstico dos pacientes
com IC secundária à Doença de Chagas parece ser
pior que em outras etiologias5,6. Um escore prognóstico em Doença de Chagas foi recentemente publicado7.
Embora o teste cardiopulmonar e suas variáveis e o
teste de caminhada de 6 minutos tenham sido amplamente avaliados em pacientes com IC, o escore HFSS
em portadores de IC por Doença de Chagas ainda não
foi avaliado. Assim, o objetivo desse estudo foi avaliar
a correlação entre o HFSS e testes prognósticos clássicos em IC em uma população sintomática e com IC
avançada por Chagas8-13.
2015|43
Andrade, MVC. Heart Failure Survival Score em pacientes com Doença de Chagas:
correlação com variáveis funcionais. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 43-45.
O estudo tem grande relevância, devido ao tema,
pois a Doença de Chagas é muito prevalente na nossa região, tendo um elevado impacto na estratégia de
políticas de saúde pública para as regiões Norte e Nordeste. Esse estudo trata da avaliação da correlação
entre variáveis prognósticas em Insuficiência Cardíaca
(IC) e o escore HFSS. Esse escore é um dos mais estudados na prática clínica, entretanto ainda não havia
essa correlação na literatura entre essa etiologia de IC
e testes prognósticos.
Foram estudados 55 pacientes com IC devido à
Doença de Chagas, que já participavam de dois protocolos de pesquisa no ambulatório de insuficiência cardíaca do Hospital Santa Izabel. Os pacientes tinham
idade entre 18 e 75 anos e tinham sorologia positiva
para Doença de Chagas confirmada por dois métodos distintos, bem como grave disfunção ventricular
esquerda (fração de ejeção < 35%) e sintomas (New
York Heart Association [NYHA] classes II -IV) após um
período estável de terapia farmacológica. Os pacientes com doenças pulmonares, doença valvular cardíaca primária, lesões coronarianas obstrutivas > 50% ou
aqueles não aderentes ao tratamento medicamentoso
foram excluídos. Todos os pacientes realizaram exames laboratoriais, eletrocardiograma, Holter 24h, teste
cardiopulmonar, ecocardiograma, teste de caminhada
de 6 minutos, avaliação clínica e tiveram sua qualidade
de vida avaliada pelo Minnesota Living with Heart Failure Questionnaire (MLHFQ). O protocolo foi aprovado
pelo comitê de ética em pesquisa da instituição e todos os pacientes assinaram o termo de consentimento
livre e esclarecido¹³. O HFSS foi calculado de acordo
com as publicações originais, utilizando as variáveis
inerentes para cada paciente avaliado na visita inicial e
exames basais3-7. A maioria dos pacientes era do sexo
masculino (69%). Além disso, 89% dos pacientes estavam em uso dos inibidores da enzima conversora da
angiotensina (IECA) ou dos antagonistas dos receptores da angiotensina (BRA) e 62% utilizavam betabloqueadores. A pontuação média para o escore HFSS foi
de 8,75 (0,80). Entre as variáveis deste escore, os valores médios para sódio, pressão arterial média, fração
de ejeção e pico de VO2 foram, respectivamente, de:
138 mEq/L, 78 mmHg, 27,6% e 17,3 ml/Kg/min. Distúrbio da condução intraventricular ou ritmo de marcapasso estava presente em 47 pacientes (85%). Nenhum
dos pacientes tinha doença arterial coronariana. A média da distância percorrida no teste de caminhada de
6 minutos foi < 400 m. O valor médio da pontuação no
escore de qualidade de vida pelo Minnesota Living with
Heart Failure Questionnaire (MLHFQ) foi de 38. Em relação aos dados do teste cardiopulmonar, a relação de
troca foi significativa (1,08), que era compatível com
um exercício máximo para o ponto de vista metabólico
(relação de troca > 1,05), a média de VE/VCO2 foi de
36 (>34) e a percentagem média do pulso de oxigênio foi de 74%. Os pacientes tiveram uma frequência
cardíaca de recuperação atenuada < 16 bpm. Nosso
estudo tem algumas limitações. O tamanho amostral
foi pequeno, realizado em um único centro e não foram
coletados dados da função do ventrículo direito, onde
já foi demonstrado ser de valor para prever a capacidade funcional em pacientes chagásicos. Portanto, não
foi possível testar as correlações entre o escore HFSS
e a função ventricular direita nesta população. Concluímos que em pacientes com Insuficiência Cardíaca
(IC) secundária à doença de Chagas, o Heart Failure
Survival Score (HFSS) se correlacionou bem com as
principais variáveis prognósticas de testes funcionais,
mas teve uma fraca correlação com a mensuração da
qualidade de vida. Como esperado, os pacientes com
classes funcionais menores tiveram uma pontuação no
HFSS menor. O HFSS pode ser uma ferramenta útil
para avaliação prognóstica na IC, devido à doença de
Chagas. Estudos longitudinais e de acompanhamento clínico são necessários para melhor determinar os
pontos de corte ótimos do HFSS para tomada de decisão nessa população específica.
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2015|45
Ferreira, LSM et al. Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal: considerações
técnicas de resultados preliminares da primeira experiência brasileira.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 46-48.
Resumo de Artigo – Coloproctologia
Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal:
considerações técnicas de resultados preliminares da primeira
experiência brasileira
Luciano Santana de Miranda Ferreira¹, Carlos Ramon Silveira Mendes¹,
Ricardo Aguiar Sapucaia¹, Meyline de Andrade Lima¹, Sérgio Eduardo¹
Alonso Araújo¹, Eduardo Costa Cobas¹, Luiz Carlos Araújo Amoedo¹.
Artigo original publicado: video-assisted anal fistula treatment: technical considerations
and preliminary results of the first brazilian experience. Arq. Bras. Cir. Dig. 2014. Jan-Mar,
27(1):77-81. Mendes, CRS; Ferreira, LSM; Sapucaia, RA; Lima, MA; Araújo, SEA.
RESUMO
Racional: a fístula anorretal é um trajeto epitelizado
que estabelece comunicação de origem infecciosa entre o
reto ou o canal anal com a região perineal. Representa a
fase crônica de um abscesso anorretal. Objetivo: descrever a técnica empregada na experiência preliminar nos primeiros casos realizados no Brasil. Técnica: as principais
etapas da operação são visualização do trajeto fistuloso
através da fistuloscopia sob irrigação, empregando o fistuloscópio Karl Storz, identificação do orifício interno sob
visão direta, tratamento endoscópico do trajeto com eletrocoagulação e tratamento do orifício interno, que pode ser
feito com grampeador, avanço de retalho ou sutura simples. Resultados: a distância mínima entre a borda anal
e o orifício interno foi de 5.5cm. O tempo operatório foi de
31,75min (18-45) em média. Em todos os casos, o orifício interno pôde ser identificado após fistuloscopia completa, sendo tratado por sutura simples. Não ocorreram
complicações intra ou pós-operatórias. Após seguimento
de cinco meses, um (12,5%) caso evoluiu com recidiva.
Conclusão: o tratamento vídeoassistido da fístula anorretal mostrou-se factível, seguro e reprodutível. Possibilita
estudo direto do trajeto fistuloso e identificação e trajetos
acessórios que, inclusive, poderiam passar desapercebidos na cirurgia convencional, bem como o orifício interno.
Palavras-Chave: fístula anal, tratamento videoassistido, cirurgia.
Key Words: anal fistula, videoassisted treatment,
surgery
INTRODUÇÃO
A fístula anorretal consiste em um trajeto epitelizado
que comunica o canal ou o reto com a região perianal.
Em cerca de 90% dos casos têm origem criptoglandular.
Nos 10% restantes, as causas podem ser devido à doença de Crohn, trauma, radioterapia ou malignidade.
Sua incidência é estimada em 8.6 para 100.000, com
predominância no sexo masculino (2:1), sendo mais
prevalente entre a terceira e quarta década de vida. O
quadro clínico consiste em dor, tumoração perianal e drenagem recorrente de exsudato seropurulento e, às vezes,
sanguinolento. Seu diagnóstico é feito após história clínica
e exame físico e confirmado com ultrassonografia endoanal ou ressonância magnética para avaliação do trajeto
fistuloso e sua relação com o aparelho esficnteriano.
O tratamento da fístula anorretal é iminentemente cirúrgico, não sendo possível cicatrização da fístula de outro modo. Os objetivos da cirurgia são controle dos sintomas e manutenção da continência anal. As técnicas mais
frequentemente utilizadas são fistulotomia em um tempo
ou fistulotomia em dois tempos, com incisão ou drenagem com seton. Ambas necessitam transsecção de um
segmento do esfíncter anal, o que pode levar a graus
variados de comprometimento da função esfincteriana¹.
Foi a necessidade de reduzir o trauma ao esfíncter
anal que levou ao desenvolvimento de técnicas alternativas, como o plug de colágeno, cola de fibrina e sintética
com cianoacrilato, técnicas de avanço mucoso e mais
recentemente a ligação do trajeto fistuloso interesfincteriano (LIFT).
A combinação da abordagem videoendoscópica a um
procedimento minimamente invasivo levou à proposta do
tratamento videoassistido da fístula anal, como descrito
por Meinero em 2006². Um dos passos mais importantes
para o sucesso do procedimento é a exata localização do
orifício interno. O VAAFT (video-assisted anal fistula treatment) utiliza um equipamento inovador, o fistuloscópio
rígido, para estudar o trajeto fistuloso, buscando identifi-
2015|46
Ferreira, LSM et al. Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal: considerações
técnicas de resultados preliminares da primeira experiência brasileira.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 46-48.
car abscessos crônicos, trajetos secundários e o orifício
interno da fístula.
O maior benefício da técnica VAAFT é a realização
do procedimento sem trauma ao aparelho esfincteriano
e, portanto, sem risco de incontinência pós-operatória³,
além de resultar em uma ferida cirúrgica menor, enquanto as técnicas tradicionais estão associadas a um risco
de incontinência fecal de até 45%.
Apesar de não comprometer a incontinência fecal, o
VAAFT está associado a um índice de recidiva de 30%.
Contudo, os casos de recidiva podem ser reabordados
pela mesma técnica. O objetivo deste artigo é descrever a técnica e a experiência inicial da técnica VAAFT
para tratamento da fístula analno Brasil por este método. Todos os casos foram operados por dois dos autores
(CRSM e LSMF). Oito cirurgias VAAFT foram realizadas
até julho de 2013.
O critério de inclusão foi o diagnóstico de fístulas complexas (não tratáveis com fistulotomia simples). Em todos
os casos, a etiologia da fístula era doença criptoglandular.
Os critérios de exclusão foram suspeita de malignidade,
doença de Crohn e histórico de radioterapia pélvica. Nenhum caso foi submetido à ostomia derivativa. Todos os
casos foram submetidos à colonoscopia e ressonância
magnética no pré-operatório. Foi utilizada a classificação
de Parks. O seguimento pós-operatório foi feito com 15
dias, dois meses e depois com 6 e 12 meses. Em todos
os casos foram utilizados antibióticos profiláticos.
A técnica VAAFT foi realizada com a utilização do
fistuloscópio fabricado pela Karl Storz (Tuttligen, Alemanha – figura 1), conectado à câmera com equipamento cirúrgico completo de videoendoscopia. O fistuloscópio tem diâmetro de 3,3x4,7mm, mede 14cm de
comprimento, com 8° de angulação da óptica e tem
um canal de trabalho e irrigação, sendo conectado a
um sistema fechado de solução de glicina para dilatar
e irrigar o trajeto fistuloso.
DIAGNÓSTICO
Nesta fase é realizada a fistuloscopia, iniciando
pelo orifício externo da fístula, e tem como objetivo
a progressão através da fístula, identificando o trajeto principal, buscando trajetos acessórios, abscessos
crônicos e atingir o orifício interno. O paciente é posicionado em litotomia sob anestesia espinhal.
Com infusão contínua de solução de glicina/manitol, o fistuloscópio progride através do trajeto fistuloso,
sob visão direta. A identificação de trajetos secundários
é uma das principais vantagens da técnica (figura 2),
quando comparada com a exploração às cegas com
estilete ou injeção de azul de metileno. A etapa final da
fase diagnóstica é a saída pelo orifício interno da fístula.
Figura 2 - Aspecto da fistuloscopia intraoperatória,
identificando a bifurcação do trajeto fistuloso.
TRATAMENTO
Esta fase consiste na destruição do trajeto fistuloso e
desbridamento, seguido de abordagem do orifício interno.
Para destruir o trajeto é utilizado o eletrodo monopolar, sob visão direta, cauterizando centímetro a
centímetro, iniciando ao nível do orifício externo até o
orifício interno. A irrigação contínua e uma escova removem o material necrosado. O fechamento do orifício
interno é outro passo crítico. É realizado com a utilização de um grampeador, com avanço de retalho ou com
sutura simples.
RESULTADOS
A técnica VAAFT é dividida em duas etapas: diagnóstico e tratamento.
Figura 1 - Fistuloscópio Karl Storz.
Apenas uma paciente era do sexo feminimo
(12,5%). A idade média foi de 43 (29-66) anos. A distância média entre os orifícios externo e interno foi de
5,5cm (4-9). Seis fístulas tinham trajeto transesfínctérico e duas extraesfínctérico. Dois casos eram fístulas
recidivadas, com mais de um orifício externo. O orifício
2015|47
Ferreira, LSM et al. Tratamento cirúrgico videoassistido da fístula anal: considerações
técnicas de resultados preliminares da primeira experiência brasileira.
Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 46-48.
interno foi identificado em todos os casos e foi abordado com sutura simples em todos os casos. Não houve
complicações intra ou pós-operatórias. Após um período médio de seguimento de 5 meses, foi observado
recidiva em um caso (12,5%).
DISCUSSÃO
Nessa série preliminar, foi demonstrada a segurança, eficácia e reprodutibilidade da técnica VAAFT. Seu
maior benefício é a preservação do aparelho esfincteriano, associado à visão direta do trajeto fistuloso, com
identificação de trajetos acessórios e coleções, bem
como do orifício interno.
São poucos os estudos sobre o tratamento cirúrgico da fístula anal com a técnica VAAFT, disponíveis
na literatura mundial. Esse relato é pioneiro no Brasil e
tem a maior casuística nacional.
Fístulas simples são preferencialmente tratadas
através de fistulotomia em um tempo, procedimento mais simples e bastante eficaz. Porém, as fístulas
complexas, que comprometem a musculatura esfincteriana, estão associadas a elevado risco de distúrbios
da continência. Para esses casos, é necessário lançar
mão de técnicas de preservação esfincteriana.
O maior obstáculo à utilização dessas técnicas é o
alto índice de recidiva4,⁵. A utilização de cola de fibrina
está associada a recidivas de mais de 50%⁶. As técnicas de avanço de retalho têm índices de recidiva em
torno de 54%. A despeito da alta recorrência, ambas as
técnicas podem ser repetidas. A técnica LIFT tem sido
utilizada mais recentemente, com sucesso de 97% no
seu relato inicial⁷, porém no LIFT não é possível a identificação do trajeto e de coleções crônicas.
A técnica VAAFT inclui a identificação precisa do
trajeto fistuloso e do orifício interno, com seu fechamento e completa destruição do trajeto fistuloso. Até
o presente momento, a maior série foi publicada pelos
idealizadores da técnica, com 136 pacientes, relatando
sucesso em 73,5% dos casos no primeiro procedimento e 87,1% após a segunda abordagem². A grande inovação da técnica é a abordagem da fístula sob visão
direta, com identificação do trajeto e do orifício interno,
com preservação esfincteriana.
catrização do tratamento cirúrgico da fístula anal, isso
ainda permanece indefinido. A técnica VAAFT para fístulas complexas é segura e reprodutível e permite a
visualização direta do trajeto fistuloso e eventuais trajetos secundários, bem como do orifício interno.
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3. Mendes, CRS; Ferreira, LSM, Sapucaia, RA;
Lima, MA; Araújo, SEA. VAAFT - Videoassisted anal
fistula treatment: a new approach for anal fistula. J Coloproctol 2014:34(1): 62-64.
4. Mizrahi, N; Wexner, SD; Zmora, O; Da Silva, J;
Efron, EG; Weiss, A; Vernava, M. Endorrectal advancement flap: are there predictors of failure? Dis Colon
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intersphincteric fistula tract (LIFT): a sphincter-saving
technique for fistula-in-ano. Dis Colon Rectum 2010;
53(1): 39-42.
1. Serviço de Coloproctologia do Hospital Santa Izabel.
Endereço para correspondência:
[email protected]
CONCLUSÃO
A fistuloscopia rígida permanece a técnica mais
inovadora. Como esse recurso afetará as taxas de ci-
2015|48
Matos, MA. Avaliação dos efeitos da terapia de reposição enzimática na função motora de
pacientes com mucopolissacaridoses. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 49.
Resumo de Artigo – Ortopedia
Avaliação dos efeitos da terapia de reposição enzimática na
função motora de pacientes com mucopolissacaridoses.
Autor: Marcos Almeida Matos¹
Resumo do artigo: Matos MA, Barreto R, Acosta AX. Evaluation of motor response
in mucopolysaccharidosis patients treated with enzyme replacement therapy. Orthop
Traumatol Rehabil. 2013, 31;15(5):389-93. Doi: 10.5604/15093492.1084240.
Palavras-chave: mucopolissacaridose, resposta motora, tratamento
Key words: mucopolysaccharidosis, response motor, treatment
As mucopolissacaridoses (MPS) compõem um grupo de doenças caracterizadas pela deficiência de enzimas lisossomais necessárias para a degradação dos
mucopolissacarídeos ou glicosaminoglicanos (GAG),
como são atualmente denominados. Os GAGs são componentes do material extracelular de vários tipos de tecidos, dentre eles: o nervoso, cardiovascular, conjuntivo e
osteoarticular. Estas substâncias estão constantemente
sendo sintetizadas e metabolizadas pelas células no interior dos lisossomos, em um processo contínuo de turn
over. A ausência de uma destas enzimas interrompe a
degradação dos GAGs e determina o acúmulo deste
“lixo” tóxico dentro das células, ocasionando disfunção
e apoptose. Cada tipo de mucopolissacaridose tem a
falta de uma enzima específica que determina suas
particularidades, contudo, todas guardam uma série de
características clínicas comuns. As MPSs são doenças
letais e multissistêmicas que produzem deformidades
ósseas em coluna e membros com nanismo (denominadas disostose múltipla), alterações cardiopulmonares e
desordens variadas no sistema nervoso central, dentre
outras graves alterações que podem levar à morte dos
pacientes antes ou durante a adolescência. Há aproximadamente dez anos, surgiu um tratamento de base
para as MPSs que consiste na reposição da enzima que
se encontra deficiente, conhecido como terapia de reposição enzimática (TRE). Este tratamento vem sendo
cada vez mais utilizado e seus benefícios para órgão
e sistemas vitais já estão adequadamente estudados,
tais como diminuição de infecções pulmonares, melhora
da função cardiovascular e diminuição de importantes
comorbidades clínicas potencialmente letais, associadas à doença. As alterações motoras, por sua vez, correspondem a um conjunto de deformidades que define
indiretamente a gravidade da doença, causando incapacidade, restrição da mobilidade e marcante diminuição da qualidade de vida dos pacientes. Entretanto, a
avaliação deste quadro motor ainda não havia sido ade-
quadamente realizado após o advento da TRE. Desta
forma, o artigo apresentado é pioneiro em apresentar os
resultados de melhora no quadro motor ortopédico em
pacientes com mucopolissacaridoses após um ano de
tratamento com reposição enzimática específica. Foram
avaliados vinte e dois pacientes portadores de MPSs do
tipo I, II e VI, antes e após um ano de terapia. Os indivíduos foram estratificados de I a V pela classificação
de função motora grosseira e foram avaliados quanto
à condição neuromuscular, amplitude de movimentos
em ombro, cotovelo e joelho, além de função da mão e
os reflexos miotendinosos. Considerando que a doença
é crônica e rapidamente progressiva, definiu-se como
bom quando a terapia foi capaz de barrar a evolução
da doença ou melhorar a progressão do quadro clínico.
38% dos pacientes apresentaram piora leve do quadro
clínico, enquanto que 14,3% apresentaram melhora e
47,6% mantiveram seu quadro inalterado. A função da
mão e o exame neurológico, incluindo-se reflexos, mantiveram-se inalterados. Já a amplitude de movimentos
melhorou globalmente nos pacientes, sendo que foi estatisticamente significante para os ombros. Os resultados deste estudo demonstraram pela primeira vez que a
terapia de reposição enzimática é capaz de barrar a progressão motora das MPSs ou melhorar o quadro em até
61% dos casos e também que a TRE produz melhora
global da amplitude de movimentos, especialmente em
ombros e membros superiores. Por estes achados ficou
evidente o impacto que a terapia tem sobre a função
motora, capacidade física e de mobilidade do paciente
para realização de atividades de vida diária.
1 - Serviço de Ortopedia do Hospital Santa Izabel
Endereço para correspondência:
[email protected]
2015|49
Oliveira, LSRB et al. Diagnóstico de câncer na perspectiva de pessoas do interior
e capital da Bahia. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 50-52.
Artigo Multiprofissional – Farmácia
Diagnóstico de câncer na perspectiva de pessoas do interior e
capital da Bahia
Ludymilla Silva Ramos Batista de Oliveira1, Jamile de
Oliveira Andrade1, Larissa Ferreira Lucas2
Resumo
Os linfomas são um conjunto de doenças linfoproliferativas variadas, morfologicamente divididas em linfomas de Hodgkin (LH) e linfoma não-Hodgkin (LNH).
Há algumas condições que predispõem o aparecimento dessa patologia, como: o vírus Epstein-Barr e HIV,
transplante de órgãos, doenças autoimunes, doenças
intestinais como a celíaca e exposição a fatores ambientais, como: exposição à radiação ionizante, herbicidas,
solventes orgânicos e resinas de cabelo. O número de
mortes no Brasil de pessoas com linfomas não-Hodgkin
no ano de 2013 foi de 4.033 óbitos1. Esses altos valores chamam a atenção dos profissionais de saúde que
atuam na onco-hematologia e sobre o tratamento oferecido aos pacientes. Assim como as possíveis reações
que venham a desenvolver. Sendo assim, foi realizado
acompanhamento ao paciente com LNH na nossa instituição, ao protocolo instituído e às reações que o mesmo viesse a ter.
Palavras-chave: linfoma não-Hodgkin, Linfoma
não-Hodgkin da Zona Cinzenta, R-EPOCH.
Key words: non-Hodgkin lymphoma,
Hodgkin lymphoma the Grey Zone, R-EPOCH.
Non-
Introdução
Os linfomas são um conjunto de doenças linfoproliferativas variadas, morfologicamente divididas em linfomas de Hodgkin (LH) e linfoma não-Hodgkin (LNH).
O linfoma não-Hodgkin apresenta um aumento de incidência entre 50 e 65 anos, mas pode aparecer em qualquer faixa etária, inclusive em crianças. Há mais de 40
formas distintas. O número de mortes no Brasil de pessoas com linfomas não-Hodgkin no ano de 2013 foi de
4.033 casos, sendo 2.231 homens e 1.802 mulheres. A
estimativa de novos casos para o ano 2014 foi de 9.790,
sendo 4.940 homens e 4.850 mulheres. Por razões ainda desconhecidas, o número de casos duplicou nos últimos 25 anos, principalmente entre pessoas com mais
de 60 anos1. Há algumas condições que predispõem o
aparecimento dessa patologia, como: o vírus EpsteinBarr, HIV, HTLV-1, Helicobacter Pylori, Vírus Herpes-8,
que é o vírus do sarcoma de Kaposi em pacientes com
SIDA/HIV, transplante de órgãos devido ao uso prolongado de imunossupressores, doenças autoimunes por
levarem ao estado de hiperproliferação dos linfócitos B,
doenças intestinais como a celíaca, que pode levar ao
aumento de linfoma intestinal e exposição a fatores ambientais, como: exposição à radiação ionizante, herbicidas, solventes orgânicos e resinas de cabelo.
Os linfomas não-Hodgkin podem ser classificados em
dois grandes grupos: os indolentes e os agressivos. Os
indolentes evoluem de uma forma insidiosa, com sobrevida média entre 5-10 anos, porém não respondem bem
à quimioterapia. Já os agressivos, se não tratados, evoluem a óbito no período de meses a semanas, porém
respondem bem ao tratamento quimioterápico.
A atual classificação das neoplasias linfoides baseiase na morfologia, na informação clínica, imunofenotipagem e características genéticas e moleculares2. A maioria
dos linfomas podem ser classificado com precisão. No
entanto, alguns linfomas presentes com características
de transição entre linfoma difuso de grandes celulas B
(LDGCB) e linfoma de Hodgkin clássico (LHC) ou LDGCB e linfoma de Burkitt (LB), sendo estes difíceis de classificá-los3. Mas na 4ª edição da Classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS) para as Neoplasias dos
Tecidos Hematopoiético e Linfoide, publicada em 2008,
incluiu a categoria Linfoma de Células B, não classificável, com características intermédias entre Linfoma Difuso
de Grandes Células B e linfoma de Hodgkin Clássico4,5.
Essa inclusão abrange ao Linfoma não-Hodgkin da Zona
2015|50
Oliveira, LSRB et al. Diagnóstico de câncer na perspectiva de pessoas do interior
e capital da Bahia. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 50-52.
Cinzenta (LMZC), este sendo mais comum em adultos
jovens do sexo masculino, apresentando um curso clínico mais agressivo, extremamente raro, pior prognóstico
quando comparado com o Linfoma de Hodgkin, subtipo
Esclerose Nodular (LH-EN) e Linfoma Primário do Mediastino (LPM). O objetivo deste trabalho é descrever um
relato de caso de Linfoma não-Hodgkin de células B da
Zona Cinzenta, seguido de discussão do tema.
Caso Clínico
Paciente C.A.J., 46 anos, sexo masculino, natural e
procedente de Salvador (BA), profissional enfermeiro,
iniciou tratamento quimioterápico em agosto/2015, com
programação de R-EPOCH para 6 ciclos com intervalo
de 21 a 28 dias. Passando por implante de porth-cath
em 07/08/15 e com realização de biópsia de Medula Óssea (MO) para fechamento de diagnóstico com Linfoma
não-Hodgkin B agressivo (Grey Zone), com características entre LDGCB e LB. Sendo que as tomografias não
mostravam linfonodos aumentados no tórax, abdome
ou pescoço. Primeiro ciclo em 11/08/15 e após primeiro dia paciente negou náuseas, vômitos e sem reação
infusional ao anticorpo monoclonal, o rituximabe. Ao
final do ciclo, o paciente apresentou lesão expansiva
em região de face medial do braço direito com cerca
de 5x3cm, sem flogose, com redução do tamanho da
lesão em eixo perpendicular ao membro, hiperemia em
mão e antebraço direito sem outros sinais flogísticos.
Recebendo alta hospitalar em 18/08/15, com resultado
de hemograma (Hemoglobina 12mm/dL; Hematócrito
36%; Leucócitos 2420 cels/mm3; Segmentados 2580
cels/mm3; Plaquetas. 211.000). Realizou segundo ciclo sem intercorrências entre 05/09/15 e 11/09/15 com
resultado de hemograma (Hemoglobina 12,9mm/dL;
Hematócrito 38%; Leucócitos 2800 cels/mm3; Segmentados 2232cels/mm3; Plaquetas 224.000), sem demais
toxicidades relacionadas à quimioterapia, negando algia, febre, náuseas, linfonodomegalias ou outras queixas, houve diminuição significativa do volume tumoral
que o paciente apresentou em membro superior direito.
No terceiro ciclo, o paciente realizou entre dias 05/10/15
e 12/10/15 com atraso de 3 dias para início da quimioterapia, devido à febre baixa, porém intermitente, relatada em casa pelo paciente, utilizando Moxifloxacino e
Sulfametoxazol e Pirimetamina de caráter profilático.
Paciente teve alta hospitalar com resultados laboratoriais (Hemoglobina 10mm/dL; Hematócrito 28%; Leucócitos 2440cels/mm3; Segmentados 2098cels/mm3);
Raio-X de tórax normal e urocultura negativa e com boa
tolerabilidade à quimioterapia, sem mais intercorrências
relevantes. Paciente segue em programação para seu
quarto ciclo de R-EPOCH nessa instituição no mês de
novembro.
Discussão
É sabido que em linfomas agressivos a sobrevida
sem tratamento é de meses a semanas. Sendo assim
a importância do diagnóstico precoce e início do tratamento o mais rápido possível, pois os linfomas agressivos, diferentemente dos indolentes, respondem melhor
à quimioterapia, com uma taxa de cura de 40-85%, dependendo do tipo histológico.
As características do Linfoma não-Hodgkin de células B do mediastino da Zona Cinzenta (LMZC): tem
distribuição etária entre adultos jovens, com maior incidência entre os 20-40 anos, acometendo mais homens
do que mulheres, localizando-se no mediastino anterior,
com crescimento da “ sheet-like” de células pleomórficas tumorais e fibrose6.
O tratamento instituído para esse paciente foi o
R-EPOCH (Rituximabe 375mg/m2) IV no D1, seguido
de Doxorrubicina 15 mg/m2, Etoposídeo 65 mg/m2 e
Vincristina 0,5mg/m2 por infusão contínua do D2 ao
D4, Ciclofosfamida 750mg/m2 no D5 e prednisona
60mg/m² por VO de D1-D14, de um a seis ciclos com
intervalo de 21 a 28 dias entre os ciclos.
Desde o desenvolvimento do protocolo CHOP (ciclofosfamida, vincristina, prednisona), há 25 anos, têm
sido feitos muitos esforços para melhorar o tratamento
de linfomas agressivo. Estes esforços conduziram ao
desenvolvimento de regimes que eram mais complexos
e muitas vezes mais tóxicos, porém nenhum demonstrou ser mais eficaz do que o CHOP para o tratamento
de linfomas agressivos. Infelizmente, com a terapia padrão CHOP, apenas um terço dos pacientes permanece
livre de progressão de doença no período de 5 anos. O
mesmo relata que inúmeros estudos, por um período
de aproximadamente 10 anos, resultaram no protocolo
EPOCH (etoposídeo, prednisona, vincristina, ciclofosfamida, doxorrubicina) com uma infusão intravenosa
contínua durante 96 horas. O EPOCH foi inicialmente
avaliado em 131 pacientes com linfomas recidivos ou
refractário e mostrou uma alta taxa de resposta (74%)
em geral e toxicidade tolerável7.
Num estudo realizado in vitro, o rituximabe foi utilizado para regular a expressão do gene conhecido como
Bcl-2, responsável por codificar uma proteína envolvida
no processo de controle da apoptose e sensibilizar as
células do linfoma para os agentes citotóxicos, visto que
2015|51
Oliveira, LSRB et al. Diagnóstico de câncer na perspectiva de pessoas do interior
e capital da Bahia. Rev. Saúde HSI. 2015; 2 DEZ (4): 50-52.
os pacientes que possuem a expressão do Bcl-2 possuem taxa de resposta de sobrevida livre de progressão
em torno de 50%, e os que não possuem essa taxa aumentam para 82%8.
Em um seguimento de 33 meses com 50 pacientes
em uso de Rituximabe-EPOCH (R-EPOCH), tratados
previamente com outro protocolo, realizaram uma média de 4 ciclos, variando de um a seis ciclos, sendo que
catorze pacientes tiveram remissão completa e vinte
pacientes, remissão parcial9. O paciente C.A.J. encontra-se no seu terceiro ciclo, apresentando remissão das
lesões de pele no braço direito, baixa toxicidade ao protocolo e boa tolerabilidade às infusões de quimioterapia.
Além de não serem observadas as reações como febre,
broncoespasmos e calafrios durante a primeira infusão
do rituximabe, já conhecido como medicamento capaz
de produzir tais reações no paciente.
Em outro estudo com 24 pacientes com LMZC entre nov/1999 e fev/2013, foi avaliada a toxicidade em
todos os 145 ciclos de dose ajustada - etoposideo, doxorrubicina, ciclofosfamida, vincristina, prednisona e rituximabe ( DA- EPOCH –R). O alvo farmacodinâmico
dos neutrófilos absolutos (ANC)<500 células/mm3 foi
conseguida em 53% dos ciclos, com baixa frequência
de ANC < 100 células/mm3 (9%) e trombocitopenia <
25.000 céls/mm3 (2%). Febre e neutropenia ocorreu em
12% dos ciclos. Grau 3 ou toxicidades não-hematopoiéticas superiores incluindo íleo e toxicidade neurosensorial ocorreu em < 4% dos doentes. Não houve mortes
relacionadas ao tratamento10.
Comparando com os dados clínicos do paciente
C.A.J, o mesmo não apresentou neutropenias como
as relatadas no estudo anterior, sendo considerado um
bom tolerante à quimioterapia e por consequência com
poucas possibilidades de desenvolver uma infecção
oportunista, que poderia acarretar em um prejuízo ao
tratamento do mesmo. E com boas expectativas para o
quarto ciclo, que será realizado no mês de novembro.
Referências
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(INCA). Estimativas de linfoma não-hodgkin 2014. Disponível em:http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/
tiposdecancer/site/home/linfoma_nao_hodgkin]. Acesso em out/2015.
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Lymphomas: Lymphomas with Intermediate Features.
Advances in Hematology. France. 2012
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around diffuse large B cell lymphoma. Conclusions based on the workshop of the XIV meeting of the European Association for Hematopathology and the Society of
Hematopathology in Bordeaux, France. Journal of Hematopathology, vol. 2, no. 4, 2009. Disponível em [http://
www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20309430]. Acesso em
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OMS: padronização da nomenclatura em língua portuguesa, 4ª edição. Jornal Brasileiro de Patologia e
Medicina Laboratorial. v. 47. Rio de Janeiro. 2011. Disponível em: [http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1676-24442011000600011&script=sci_arttext]. Acesso em
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5. CAMPO, E. et al. The 2008 WHO classification
of lymphoid neoplasms and beyond: evolving concepts
and practical applications. Blood. 2011.
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Hospital de Santo António – Centro Hospitalar do Porto,
Portugal. 2011. Disponível em: [http://repositorio-aberto.
up.pt/bitstream/10216/66291/2/93213.pdf] Acesso em
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8. WILSON, W.H. et al. WPhase II study of dose-adjusted EPOCH-rituximab in untreated high risk large
B-cell lymphomas. Blood. 2001.
9. JERMAN, M. et al. Rituximab–EPOCH, an effective salvage therapy for relapsed, refractory or transformed B-cell lymphomas: results of a phase II study. Annals de Oncology, 2004.
10. WILSON, W.H. et al.. A prospective study of
mediastinal gray-zone lymphoma. Blood. 2014. Disponível em: [http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/
PMC4155269/]. Acesso em out/2015.
1 - Serviço de Farmácia da Oncologia do Hospital
Santa Izabel
2 - Serviço de Hematologia do Hospital Santa Izabel
Endereço para correspondência:
[email protected]
2015|52
Protocolo de atendimento
Síndrome Coronariana Aguda sem SUPRA de ST
1. OBJETIVO
Oferecer aos pacientes que procuram o serviço de
emergência de adulto do Hospital Santa Izabel com
Síndrome Coronariana Aguda um atendimento rápido
e organizado e um tratamento adequado, baseado em
diretrizes atuais.
2. TERMOS E DEFINIÇÕES
2.1. IAM SST- INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO
SEM SUPRADESNIVELAMENTO DO SEGMENTO ST
Os critérios eletrocardiográficos sugestivos de IAM
sem supra de ST na presença de sintomas compatíveis com síndrome coronariana aguda são: Infra de ST
horizontal ou descendente > = 0,05 mV (0,5 mm) em
duas derivações contíguas da mesma parede e/ou inversão de onda T > = 0,1 mV (1 mm) em duas derivações contíguas da mesma parede.
3. META
Diagnóstico precoce e realização do eletrocardiograma em 10 minutos.
4. ELEGIBILIDADE
4.1. Critérios de Inclusão
Pacientes com dor torácica ou sintoma considerado
equivalente isquêmico.
5. PONTOS CRÍTICOS
Identificar precocemente os pacientes com dor torácica. Análise imediata do eletrocardiograma por parte do médico plantonista.
Reconhecer que paciente com dor torácica típica,
mesmo com ECG normal e troponina negativa, poderá
ter síndrome coronariana aguda.
6. MARCADORES DO PROCESSO
Reconhecimento precoce de paciente com dor torácica – 100%.
Realizar eletrocardiograma em 10 minutos – 100%.
Taxa de uso de aspirina na alta.
Média de permanência hospitalar dos pacientes
que entram no protocolo.
7. INDICADORES DE RESULTADO
Taxa de mortalidade dos pacientes que entram no
Protocolo. Comparar a mortalidade hospitalar com a
mortalidade predita pelo escore GRACE.
8. PÚBLICO-ALVO
Pacientes assistidos com suspeita de IAM sem supra de ST no Hospital Santa Izabel.
9. MEDIDAS GERAIS E TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
1- Repouso no leito nas primeiras 24 horas, podendo
se prolongar à medida que estejam presentes sintomas
ou achados ao exame físico ou em exame complementar
que caracterize instabilidade clínica.
2- Monitorização cardíaca contínua.
3- Oxigenioterapia apenas para pacientes dispneicos,
com saturação < 90% ou com fatores de risco para hipoxemia.
4- Nitrato – usar apenas:
• em pacientes com isquemia persistente;
• em pacientes com insuficiência cardíaca;
• em pacientes hipertensos.
Dinitrato de Isossorbida, 5mg sublingual a cada 5 minutos em três oportunidades, se necessário.
Nitroglicerina IV, 5 a 10 mcg/min. em infusão contínua, podendo-se aumentar a dose em 10mcg/min a cada
10 minutos até o alívio do sintoma ou o aparecimento
de efeitos adversos (cefaleia, hipotensão arterial PAS <
100mmHg e/ou aumento da frequência cardíaca para
>10% do basal.
Contraindicado o uso na presença de hipotensão arterial (PAS < 90 mmHg), bradicardia (FC < 50bpm) e para
pacientes que fizeram uso recente de inibidores da fosfodiesterase (24 horas para sildenafila ou vardenafila e 48
horas para tadalafila).
5- Morfina: indicada para pacientes que persistam
com sintomas anginosos a despeito do uso da terapêutica anti-isquêmica apropriada. Morfina de ser empregada
na dose de 1 a 5 mg, por via intravenosa, podendo ser
repetida a cada 5 ou 30 minutos, se for necessário.
6- AAS: usar dose de ataque de 200mg, mastigado
ou macerado (caso não tenha feito na sala de emergência ou hemodinâmica) e depois manter indefinidamente,
desde que não tenha contraindicações (sangramento ativo, anafilaxia, etc.). A dose de manutenção pode variar
de 100 a 200mg dia (usar sempre uma dose > ou = a 1
mg/Kg/dia), administrado por via oral, em dose única.
7- Inibidores P2Y12: em associação com AAS ou isoladamente em pacientes com contraindicações ao uso do
AAS, deve-se utilizar pelo período de pelo menos 1 ano:
• Clopidogrel: 300 mg ou 600 mg (perspectiva de in-
53
tervenção dentro de 6 horas) de dose de carga (caso não
tenha feito na sala de emergência ou hemodinâmicas),
seguida de 75 mg/dia por via oral.
• Ticagrelor: dose de ataque de 180 mg (caso não
tenha feito na sala de emergência ou hemodinâmicas),
seguida de 90 mg duas vezes ao dia.
• Prasugrel: em pacientes que vieram do Laboratório
de Hemodinâmica e que fizeram uso de dose de ataque
de 60 mg de prasugrel, deve-se manter a dose de 10 mg/
dia por via oral.
8- Inibidores da GlicoproteinaIIbIIIa: pacientes que em
uso da terapêutica antiplaquetária dupla e que estejam
evoluindo com recorrência de isquemia pode-se lançar
mão de um inibidor da glicoproteína IIbIIIa, até que se
providencie a realização de procedimento de revascularização (cirurgia ou angioplastia). Nestas situações, a
escolha recai sobre o Tirofiban a dose recomendada é de
0,4 mg/kg/min, por 30 minutos, seguida da dose de manutenção de 0,1 mg/kg/min, podendo ser mantido por até
96 horas. Em caso de cirurgia deve-se suspender a droga 4 a 6 horas antes do procedimento cirúrgico, enquanto que, se o paciente for para angioplastia, a droga não
deve ser suspensa e deve ser mantida por, no mínimo,
12 horas após o término do procedimento percutâneo.
9- Tratamento Anticoagulante: o tratamento anticoagulante deve ser mantido ao menos nas primeiras 48
horas ou até a realização da angioplastia coronária nos
pacientes que foram estratificados de forma invasiva. As
opções disponíveis são:
• Enoxaparina – 1 mg/Kg de peso a cada 12 horas,
administrado por via subcutânea. Pacientes com clearance de creatinina estimado menor que 30 mL/min deve
ajustar a dose para 1 mg/Kg de peso uma vez ao dia.
• Fondoparinux – 2,5 mg/dia por via SC. Melhor opção
para aqueles pacientes que são mantidos em terapêutica
clínica e naqueles com elevado risco de sangramento.
• Heparina não fracionada – dose de ataque de 60 IU/
kg de peso (dose máxima de 4000 IU), com infusão inicial
de 12 IU/kg/h e ajustando a dose conforme o TTPa.
10- Betabloqueador: deve ser iniciado nas primeiras
24 horas, em pacientes sem sinais de IC aguda, sinais
de baixo débito, bloqueio AV de 1° grau com PR > 240
mseg, BAV de II ou III grau sem uso de MP, história de
asma ou reatividade brônquica. Deve-se iniciar o uso de
metoprolol por via oral, podendo a dose variar de 25 a
200 mg/dia, de acordo com a frequência cardíaca e a
pressão arterial. Em pacientes com quadro de IC estabilizada, recomenda-se o uso oral do metoprolol ou carvedilol, este último em dose que pode variar de 3,125 mg a
25 mg, de 12/12 horas.
O betabloqueador IV pode ser utilizado em situações
onde seja seguro fazê-lo e, também, seja desejável a
rápida redução da FC, como por exemplo em pacientes
isquêmicos com hipertensão e taquicardia. Em pacientes
com indicação de uso de betabloqueador em que seja
desejável o uso de uma droga de ação rápida e de meia
vida curta (p. ex.: pacientes instáveis, pacientes com contraindicações relativas, etc) pode-se optar pelo uso de
esmolol por infusão venosa contínua. Dilui-se 1 ampola
de Brevbloc (2500mg) em 250 ml de SG a 5% (concentração de 10 mg/ml) e a dose varia de 50 a 200 mcg/kg/
min (0,05 a 0,2 mg/kg/min).
Os pacientes que não possuem contraindicação definitiva e que não utilizaram betabloqueador por alguma
outra circunstância clínica, devem ter reavaliada diariamente a indicação de uso da droga.
11- Antagonista dos Canais de Cálcio – Diltiazem está
indicado para pacientes que apresentem recorrência de isquemia e que têm contraindicação ao uso de betabloqueadores, desde que não estejam presentes: sinais de IC,
instabilidade hemodinâmica, bloqueio AV de 1° grau com
PR > 240 mseg ou BAV de II ou III grau sem uso de MP.
O Diltiazem deve ser utilizado por via oral, em doses que
podem variar de 30 a 60 mg, administradas a cada 3 ou 4
vezes ao dia. Também pode estar indicado para pacientes
que evoluam com persistência de isquemia, apesar do uso
de betabloqueadores e nitratos. Nesta situação em que o
paciente está em uso de betabloqueador deve-se preferir
Anlodipino oral, na dose de 5 a 10 mg/dia.
12- IECA – Inibidores da ECA devem ser iniciados e
mantidos a longo prazo, em pacientes com FE < 40%,
assim como naqueles com HAS ou DM. Pode-se optar
por captopril em doses que variam de 12,5 a 50 mg a
cada 8 horas, Enalapril de 5 a 10 mg a cada 12 horas e
Ramipril de 2,5 a 10 mg a cada 12 horas.
13- Bloqueadores dos Receptores de Angiotensina
(BRA): estão indicados para pacientes com intolerância a
IECA. Pode-se optar por losartana em doses que variam
de 25 a 50 mg a cada 12 horas e valsartana de 80 a 160
mg a cada 12 horas.
14- Espironolactona: indicada para pacientes com IC
ou pós IAM com FE< 40% e em uso de betabloqueador e
IECA. Constitui-se contraindicação ao seu uso disfunção
renal significativa (creatinina> 2,5 mg / dL em homens
ou > 2,0 mg / dL em mulheres) ou hipercalemia (K > 5,0
mEq / L).
15- Estatina: atorvastatina 80 mg/dia, por via oral,
deve ser administrada a partir das primeiras 24 horas, a
todos os pacientes, salvo existam contraindicações.
16- Balão de Contra – pulsação aórtica: deve ser utilizado em pacientes que estejam cursando com instabilidade hemodinâmica ou com isquemia refratária e que
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estejam na perspectiva de realizar um procedimento de
revascularização miocárdica (cirurgia ou angioplastia).
17- Fisioterapia – Todos os pacientes internados na
UCO deverão ter prescrição de fisioterapia respiratória. A UCO tem como objetivo geral a ser perseguido a
mobilização do paciente fora do leito, se possível, decorridas as primeiras 24 horas de evolução. Porém, na
visita multiprofissional pela manhã, baseado nos parâmetros clínicos de evolução de cada paciente e na relação risco-benefício envolvida, deverá ser definida a
liberação ou não do paciente para movimentação fora
do leito, assim como o tipo de mobilização permitida.
18- Acompanhamento Psicológico – Será utilizado
como critério de solicitação para acompanhamento psicológico dos pacientes com SCA sem supra:
• Pacientes com SCA em que foi indicado procedimentos invasivos (cirurgia de revascularização miocárdica, angioplastia coronária ou CATE).
• Histórico psiquiátrico prévio (depressão, esquizofrenia, transtorno bipolar, etc).
• Pacientes portadores de deficiência prévia (cognitiva, visual ou auditiva).
• Identificação de demandas por parte da equipe.
Na primeira manhã após a admissão: colesterol total,
HDL, triglicérides, hemograma completo, glicemia, ureia,
creatinina, Na e K.
Diariamente: hemograma completo, glicemia, ureia,
creatinina, Na e K.
9.3.ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO
Os pacientes internados com SCA tem um risco
aumentado de novos eventos no primeiro ano após o
internamento inicial. Este risco é particularmente maior
no primeiro mês após o internamento com SCA. Assim, algumas características clínicas e eletrocardiográficas, além da elevação dos marcadores de necroses
miocárdicas, permitem identificar pacientes com perfil
de maior risco de eventos futuros. Para classificar os
pacientes quanto ao seu risco têm sido utilizados alguns escores, sendo o escore GRACE um dos mais
utilizados e o que tem apresentado melhor capacidade
de predição. Assim, em todo paciente admitido com
SCA sem supra de ST deve ser obtido o escore de
risco GRACE.
9.1. ELETROCARDIOGRAMA
O eletrocardiograma de pacientes internados em
unidade fechada (UCO/UTI) com SCA deve ser realizado a cada 8 horas no primeiro dia de admissão hospitalar com o diagnóstico de SCA. A partir daí, o ECG
deve ser repetido diariamente pela manhã.
Pacientes que apresentem recorrência de sintomas
devem ter o ECG repetido mais frequentemente.
Pacientes que chegaram à unidade após a realização de intervenção coronária percutânea deve ter
ECG realizado logo após a sua chegada na UCO e
repetido a critério do médico plantonista.
O primeiro na admissão do paciente com SCA na
UCO deve incluir o registro das derivações V7 e V8.
9.2. EXAMES LABORATORIAIS
Os pacientes internados no HSI com SCA deverão realizar rotineiramente os seguintes exames de laboratório:
Na Admissão: CK-Mb massa, hemograma completo, glicemia, ureia, creatinina, Na, K, TP, TTPa. Troponina e CK-Mb massa: pelo menos duas dosagens,
desde que o intervalo entre elas não seja inferior a 9
horas. Depois, solicitar apenas em situação de necessidade de caracterização de curva compatível com
IAM, em casos de recorrência de isquemia ou após
intervenções percutâneas.
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Pacientes que evoluam com sinais de instabilidade clínica ou com isquemia refratária devem realizar o
CATE em caráter de urgência.
A partir da soma de pontos obtida, os pacientes têm
sido separados em três estratos de risco:
• Baixo Risco: até 108 pts. (mortalidade hospitalar < 1%).
• Risco Intermediário: de 109 a 140 pts. (mortalidade
hospitalar entre 1 e 3%).
• Alto Risco: ≥ 140 pts. (mortalidade hospitalar > 3%).
9.4. REALIZAÇÃO DE CATETERISMO CARDÍACO
Buscando aperfeiçoar a estratificação do risco de
novos eventos pelos pacientes, o cateterismo cardíaco
(CATE) é o método invasivo utilizado para identificar
os pacientes com anatomia coronária de maior risco e
que possam se beneficiar de procedimentos de revascularização miocárdica (angioplastia ou cirurgia). No
nosso serviço indicamos CATE precoce (primeiras 48
horas) como modo preferencial de estratificação nas
seguintes situações:
• Pacientes de risco moderado ou alto.
• Pacientes que evoluíram com recorrência de isquemia identificada por angina e/ou por alterações isquêmicas no ECG.
• Por indicação do médico assistente.
Estes pacientes devem ter o seu exame agendado na rotina para o dia subsequente a sua chegada.
Quando o paciente chegar em finais de semana e feriados e o escore GRACE for ≥ 140 pontos, um exame deve ser agendado para o dia seguinte e deve-se
chamar o cardiologista intervencionista de sobreaviso para realizar o procedimento. Nos pacientes com
GRACE intermediário (entre 109 e 139) ou baixo, mas
que tenha se definido por estratégia invasiva, o exame
deve ser agendado para o primeiro dia útil após o feriado. Todavia, caso o paciente apresente recorrência
de isquemia, clínica ou silenciosa (caracterizada pelo
ECG), o CATE deve ser antecipado.
9.5.ESTRATIFICAÇÃO SELETIVA INVASIVA
Neste cenário, os pacientes são acompanhados
com o tratamento clínico e realizam CATE apenas se
apresentarem recorrência espontânea de isquemia ou
se em testes funcionais (TE, ECO estresse ou cintilografia miocárdica), realizados durante o internamento, apresentarem sinais ou sintomas compatíveis com
isquemia miocárdica. No nosso Serviço indicamos a
estratificação seletivamente invasiva nas seguintes situações:
• Pacientes de baixo risco.
• Indicação do médico assistente.
Em casos de pacientes com outras comorbidades
que limitem o prognóstico, o manejo clínico deve ser
individualizado, com discussão conjunta pela equipe
multiprofissional, junto às outras especialidades e profissionais assistentes envolvidos.
9.6. ECOCARDIOGRAMA
Deve ser realizado nas seguintes situações:
• Todos os pacientes que tiveram IAM.
• Pacientes sem nenhuma avaliação recente da
função ventricular esquerda.
• Pacientes com manifestações de IC.
• Pacientes que forem encaminhados para realizar
CATE sem ventriculografia.
OBS.: em muitas situações, os exames poderão ser
realizados após a alta para unidade aberta e antes da
alta hospitalar, sem prejuízos aos pacientes.
9.7. CRITÉRIO DE ALTA
Os pacientes com SCA sem supra de ST devem
ter alta para unidade aberta decorridas 48 horas da
última manifestação de isquemia miocárdica ou de outra manifestação clínica julgada relevante (congestão,
arritmia, etc.).
10. REFERÊNCIA NORMATIVA
2013 ACCF/AHA Guideline for the Management of
ST-Elevation Myocardial Infarction.
Diretrizes Brasileiras de Antiagregantes Plaquetários e Anticoagulantes em Cardiologia.
Third universal definition of myocardial infarction,
European Heart Journal (2012) 33, 2551–2567.
Acute Myocardial Infarction in patients presenting
with ST-segment elevation, ESC Clinical Practice Guidelines, European Heart Journal (2012) 33, 2569–2619.
REVISTA DE SAÚDE DO HOSPITAL
SANTA IZABEL
SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DA BAHIA
56
11. Membros elaboradores
Dr. Marcus Vinícius Matos
Dr. Joberto Sena
Dr. Paulo Barbosa
Dr. Antônio Neri
Dr. José Carlos Brito
Dra. Andrea Karolinne
Dr. Paulo Adriano Leão
Enfa. Lucimare Passos
Enfa. Joselma Reis
Enfa. Olga Novaes
Enfa. Aridea Mamédio
Enfa. Isilda Queiroz
Bioquímica Jussara Silveira
Farmacêutica Bárbara Kely
12. Consenso
Camilla Cumming
Dr. Luís Afonso
Lígia Wanke
Jaqueline Noronha
57
EVENTOS
Eventos Fixos
NOME DO EVENTO
LOCAL
DIA DA SEMANA
HORÁRIO
SESSÃO DE HEMODINÂMICA
AUDITÓRIO JORGE FIGUEIRA
2ª FEIRA
07 ÀS 09 HORAS
SESSÃO DE CASOS CLÍNICOS E
ARTIGOS EM CLÍNICA MÉDICA
AUDITÓRIO JORGE FIGUEIRA
3ª FEIRA
10 ÀS 12 HORAS
SESSÃO DE ATUALIZAÇÃO EM
CLÍNICA MÉDICA
AUDITÓRIO JORGE FIGUEIRA
5ª FEIRA
11 ÀS 12 HORAS
SESSÃO MULTIDISCIPLINAR DE
ONCOLOGIA
AUDITÓRIO JORGE FIGUEIRA
5ª FEIRA
07 ÀS 09 HORAS
SESSÕES DE
OTORRINOLARINGOLOGIA
SALA DE TREINAMENTO 04
3ª E 6ª FEIRA
07 ÀS 09 HORAS
SESSÃO DE TERAPIA INTENSIVA SALA DE TREINAMENTO 04
4ª FEIRA
11 ÀS 13 HORAS
SESSÃO DE RADIOLOGIA
TORÁCICA (PNEUMOLOGIA)
SALA DE TREINAMENTO 04
4ª FEIRA
07 ÀS 09 HORAS
SESSÕES DE NEUROLOGIA
SESSÕES DE UROLOGIA
AUDITÓRIO DO SENEP
4ª FEIRA
17 ÀS 19 HORAS
SALA DE TREINAMENTO 04
5ª FEIRA
16 ÀS 19 HORAS
AUDITÓRIO DO SENEP
3ª FEIRA
07 ÀS 08 HORAS
AUDITÓRIO DO SENEP
4ª A 6ª FEIRA
07 ÀS 09 HORAS
SESSÃO DE CIRURGIA GERAL
AUDITÓRIO DO SENEP
3ª FEIRA
08 ÀS 10 HORAS
SESSÕES DE ANESTESIOLOGIA
SALA DE TREINAMENTO 01
2ª A 6ª FEIRA
07 ÀS 09 HORAS
SESSÃO DE PNEUMOLOGIA
AUDITÓRIO DO SENEP
5ª FEIRA
08 ÀS 10 HORAS
SESSÕES DE CARDIOLOGIA
PEDIÁTRICA
SALA DE TREINAMENTO 02
5ª FEIRA
07 ÀS 09 HORAS
SALA DE TREINAMENTO 03
6ª FEIRA
07 ÀS 09 HORAS
SESSÃO DE ARRITMOLOGIA
SALA DE TREINAMENTO 03
4ª FEIRA
13 ÀS 15 HORAS
SALA DE TREINAMENTO 02
4ª FEIRA
07:30 ÀS 09:00 HORAS
SALA DE TREINAMENTO 01
5ª FEIRA
09:00 ÀS 10:30 HORAS
SESSÕES DE REUMATOLOGIA
INSTRUÇÕES AOS AUTORES
Especificações do Editorial - Normatização Geral
Classificação manuscritos
Nº máximo de autores
TÍTULO: Nº máximo de
RESUMO: Nº máximo
caracteres com espaço
de palavras
Editorial
2
100
0
Atualização de tema
4
100
250
Resumo de artigos publicados pelo HSI
10
100
250
Relato de casos
6
80
0
Continuação:
Classificação manuscritos
Nº máximo de palavras
Nº máximo de
Nº máximo de
com referência
referências
tabelas ou figuras
Editorial
1.000
10
2
Atualização de tema
6.500
80
8
Resumo de artigos publicados pelo HSI
1.500
10
2
Relato de casos
1.500
10
2
58
Download