1 CREMEPE CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO

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CREMEPE
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
PARECER Nº 10/14
CRM-PE
PROCESSO CONSULTA Nº 5/14
PROTOCOLO Nº 464/214
INTERESSADO: Dr. J. G. de F.
ASSUNTO: Conceito de morte violenta e de quem seria atribuição de realizar necropsia em caso concreto,
se do SVO OU DO IML.
PARECERISTA: Conselheiro Horácio Mário Fittipaldi Junior
EMENTA: Nos casos de morte de natureza violenta ou
suspeita, o exame cadavérico, realizado pelo perito
médico-legal é obrigatório e indispensável. Essa obrigação
independe do tipo de violência e do tempo decorrido entre
a produção da ação externa, não natural e o êxito letal.
CONSULTA: Atendendo à solicitação do Conselheiro Vice-Presidente, através do ofício Nº 506/2014, para
análise e emissão de parecer acerca das questões formuladas e encaminhadas a este Conselho, pelo Dr.
J. G. de F., passo a fazê-lo.
Em carta, datada de 06 de janeiro de 2014, protocolada na Secretaria do CREMEPE sob o nº
464/2014, o Dr. J. nos relata que “considerando o teor da Portaria nº 1.405 de 29 de junho de 2006, que
instituiu a rede nacional de SVO, e apenas prevê em seu artigo 8º, inciso II, três situações em que os
casos devem ser transferidos ao IML, quais sejam: a) casos confirmados ou suspeitos de morte por
causas externas, verificados antes ou no decorrer da necropsia; b) corpos em estado avançado de
decomposição; c) morte natural de identidade desconhecida, no que se refere ao alcance do conceito de
“morte por causas externas”, passamos a fazer alguns questionamentos e para tanto, trazemos uma
situação concreta, recentemente acontecida. Em seguida, o Dr. J. nos relata a história de uma senhora de
77 anos, seqüelada de AVC, que sofre uma queda da própria altura e fratura o fêmur. Foi internada para
se submeter a tratamento cirúrgico da fratura. No pós-operatório, contraiu uma infecção e insuficiência
respiratória, vindo a falecer 36 dias após ter sido internada. O consulente informa que o corpo foi enviado
ao SVO, com história de choque séptico e infecção respiratória, argumentado-se de que se tratava de uma
morte natural. Entretanto, como em sua origem, teve causa externa (queda da própria altura e fratura
óssea), o corpo foi encaminhado do SVO ao IML. O Dr. J., então, nos questiona:
1) Que elementos justificam a transferência do SVO ao IML, em casos de morte de causa natural, em
que possa haver nexo causal com evento externo, ainda que tal evento tenha sido precipitado por
doença prévia ou simples acidente, e sem que o corpo apresente qualquer outro sinal externo de
violência e sem que haja qualquer indício de ocorrência de qualquer infração penal a se apurar?
2) Todos os corpos, em que possa haver eventual nexo causal entre morte de causa natural, com
fratura óssea, devem ser encaminhados indistintamente ao IML?
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3) Tal situação acima relatada pode ser considerada “morte violenta” ou não se justifica o
encaminhamento do corpo ao IML, devendo a necropsia, em casos similares, ser realizada pelo
SVO?
4) Nas situações em que o corpo se encontra no SVO e que por motivo qualquer (morte suspeita ou
de causa externa), seja encaminhado ao IML, e considerando que a atribuição legal para requerer
a perícia tanatoscópica é da autoridade policial, indagamos se é necessário, o médico do SVO
justificar perante esta autoridade os motivos que o levaram a encaminhar o corpo ou bastaria o
simples encaminhamento do SVO ao IML, para que a necropsia seja realizada?
5) Como deve proceder o médico legista, quando diante de situação similar, em que considere não
haver elementos que justifiquem o encaminhamento de um corpo do SVO ao IML e não haja um
pedido oficial para a realização da perícia pela autoridade policial?
FUNDAMENTAÇÃO: O Código de Processo Penal Brasileiro determina em seu artigo 158: “Quando a
infração deixar vestígios será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo
supri-lo a confissão do acusado”. Assim sendo, nos casos de morte de natureza violenta ou suspeita, o
exame cadavérico, realizado pelo perito médico-legal é obrigatório e indispensável. É preciso ressaltar que
essa natureza violenta, atribuída a uma ação externa, não natural, pode se expressar de várias maneiras,
desde um manifesto crime de homicídio, praticado com requintes de crueldade até “um simples acidente”,
como uma queda da própria altura, segundo relatou o médico consulente. A legislação não estabelece um
prazo de validade para que a ação externa e violenta seja considerada. O que importa, o que caracteriza a
causa básica do óbito é o evento inicial, o fator desencadeante que deflagrou a sucessão de eventos
mórbidos, interligados, culminando com a causa final ou imediata da morte. No caso reportado pelo Dr.
Jorgenildo, a causa básica foi a queda da própria altura e a causa imediata a septicemia, como
complicação do tratamento cirúrgico a que foi submetida a paciente. É a causa básica, o acontecimento
inicial que determina o destino do cadáver, não importando o intervalo de tempo decorrido entre a
produção da ação externa e o êxito letal. Dessa maneira, sempre em que houver qualquer história ou
suspeita de violência, o corpo deve ser encaminhado ao IML. Essa determinação precisa ser respeitada,
mesmo que o corpo não apresente sinais externos evidentes de violência, como aconteceria, por exemplo,
numa suspeita de envenenamento ou num caso de asfixia mecânica por sufocação direta com um corpo
mole. De maneira análoga, pacientes internados por causas naturais, como um processo infeccioso, que
sofreram intercorrencias externas, como uma queda do leito ou a administração incorreta de um
medicamento, alterando a evolução de sua patologia e lhe produzindo a morte, também deverão ser
submetidos a uma perícia tanatoscópica, no IML.
As fraturas ósseas, na maioria das vezes são produzidas por uma ação traumática. Existem casos
entretanto, em que as fraturas podem ser produzidas espontaneamente ou quando o osso é submetido a
pequenos esforços, que em situações normais, não seriam capazes de produzir o dano. São as chamada
fraturas patológicas. Elas podem ocorrer quando o osso se encontra comprometido por um processo
infeccioso, como em casos de osteomielite, quando há rarefação da matriz óssea, como nos casos de
osteoporose ou quando parte do tecido ósseo é substituída por outro tecido, como nos casos de
neoplasias malignas com metástases ósseas. Dessa maneira, afastada a possibilidade de que se trate de
uma fratura patológica, todos os corpos que apresentarem fraturas serão considerados como possíveis
vítimas de trauma. Por isso, esses corpos devem ser encaminhados ao IML. Naturalmente, como
estabelece a legislação em vigor, os corpos transferidos do SVO ao IML precisam estar acompanhados de
documentação específica, incluindo a guia apropriada, assinada por uma autoridade policial. Essa
determinação se encontra disposta na Portaria Conjunta SDS/SES Nº 001, de 30 de dezembro de 2010. A
referida portaria instituiu a utilização da Pulseira de Identificação de Cadáver – PIC –, o Boletim de
Identificação de Cadáver – BIC – e o Número de Identificação de Cadáver – NIC – no âmbito do Estado de
Pernambuco, que passam a ser considerados elementos da identificação de todos os cadáveres humanos
decorrentes de mortes de interesse policial, quer sejam mortes violentas, inclusive acidentais, ou com
suspeita de violência (mortes a esclarecer). Nesta portaria ficou definido em seu artigo 3º, incisos III e IV
que “As providências decorrentes das mortes de interesse policial consumadas em unidades de saúde
providas de posto policial ativado (PP-PC) serão de responsabilidade do policial do posto, que preencherá
o BIC e entregará a PIC ao profissional responsável pelo necrotério ou no caso de sua ausência, ao
responsável pelo preparo do cadáver da referida unidade de saúde para que a coloque no cadáver,
conforme determinado no POP-3, fazendo-se cumprir as disposições complementares relativas à atuação
dos servidores do IML. Na falta de posto policial da PC em unidades de saúde onde ocorrerem mortes de
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interesse policial, as providências decorrentes serão de responsabilidade da Delegacia de Polícia (DP)
Circunscricional ou de Plantão da PC, segundo competência advinda do horário da ocorrência”. O artigo 4º
da referida portaria determina que “No caso das mortes violentas, inclusive acidentais, ou com suspeita de
violência (mortes a esclarecer), em que o auxiliar de necropsia do Serviço de Verificação de Óbito – SVO –
necessitar encaminhar o corpo ao IML, o procedimento operacional padrão a ser adotado será o do POP4, a que se refere o artigo 3º, inciso IV da presente Portaria.
Dessa maneira, os responsáveis pelo SVO deverão acionar a polícia civil informando que existe uma
vítima fatal de morte violenta, inclusive se for acidental, ou com suspeita de violência (morte a esclarecer).
O profissional responsável pelo necrotério ou, na sua ausência, o responsável pelo preparo do cadáver
apresentará ao policial que se prontificar na Unidade de Saúde a Guia de Remoção Hospitalar do cadáver
(GRH). O Policial Civil procederá ao preenchimento do Boletim de Identificação do Cadáver (BIC) –
consultando a GRH – e entregará a Pulseira de Identificação de Cadáver (PIC) e a 1ª e 4ª vias do BIC ao
profissional do SVO, responsável pelo transporte do corpo. Na delegacia, o Policial Civil encarregado de
lavrar o Boletim de Ocorrência (BO-PC) deverá registrar o Número de Identificação de Cadáver (NIC) no
campo aberto do histórico da ocorrência (COMPLEMENTO) e depois arquivará a 3ª via do Boletim (BIC).
No IML, o responsável da remoção do
cadáver deverá entregar ao setor administrativo do IML a GRH e a 1ª via do
Boletim (BIC), que terá validade como documento oficial de encaminhamento
do corpo para aquele órgão. O Médico Legista só realizará o exame tanatoscópico a cadáveres
encaminhados pela PC que venham acompanhados da 1ª via do Boletim (BIC).
CONCLUSÃO: Nos casos de morte de natureza violenta ou suspeita, o exame cadavérico, realizado pelo
perito médico-legal é obrigatório e indispensável. Essa obrigação independe do tipo de violência e do
tempo decorrido entre a produção da ação externa, não natural e o êxito letal. Corpos enviados para
exame necroscópico no SVO que apresentem evidências físicas ou suspeição de violência, ocorrida a
qualquer tempo, devem ser encaminhados ao IML, a fim de serem submetidos a uma perícia
tanatoscópica. A identificação de fraturas ósseas, sem evidências de patologias que justifiquem a sua
origem, devem ser consideradas como suspeitas de ação externa e violenta. Assim sendo, o corpo que
apresente tal achado deve ser submetido a uma perícia médico-legal, no IML. A transferência do corpo do
SVO ao IML deverá obedecer legislação específica, que determina a comunicação do fato à polícia civil,
que procederá o fornecimento da documentação necessária à realização desse procedimento. O corpo só
será recebido no IML e o médico-legista só procederá à realização do exame cadavérico, quando
atendidas essas exigências legais.
Este é o meu parecer, S.M.J.
Recife, 24 de março de 2014
Horácio M. Fittipaldi Júnior
Conselheiro Parecerista
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