XIV Congresso Paulista de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais - CONPAVEPA - São Paulo-SP Infecção do trato urinário em endocrinopatas: sempre tratar? Luciano Henrique Giovaninni A infecção do trato urinário (ITU) corresponde a colonização bacteriana das vias urinárias (rins, ureteres, bexiga ou uretra), que acarreta em manifestações clínicas, tais como hematúria, disúria, polaquiúria, periúria e piúria. As infecções fúngicas do trato urinário são raras, e ainda não se identificou importância clinica para a possibilidade de infecção viral. Sugere-se que a ITU seja a doença infecciosa mais comum em cães, pois de cada dez cães que são levados para atendimento; um apresenta ITU, e também, aproximadamente 14% de todos os cães apresentarão pelo menos um episódio de ITU durante a vida. Sendo que a ITU ocorrerá em um único episódio em 75% destes casos, mas em outros casos a ITU poderá ocorrer em múltiplos episódios. A via de infecção mais comum é a uretral ascendente, por isso a maioria dos casos de ITU bacteriana é causado pela microbiota intestinal ou cutânea, e as cadelas (por apresentarem o trajeto uretral mais largo e curto) são mais frequentemente afetadas em relação aos machos. Bactérias originarias de outros ambientes (ambiente externo, vulva, vagina, prepúcio, etc.) também podem ascender a uretra, e alcançar a bexiga, causando. A possibilidade de ascensão uretral bacteriana, se associada a comprometimentos dos mecanismos de defesa inerentes ao paciente, favorece ainda mais a colonização urinária, e proliferação bacteriana, e por fim a ITU. Dentre estas situações citam-se as seguintes, que podem inclusive se apresentar combinadas em alguns casos: 1) Diminuição das propriedades antibacterianas da urina, como por exemplo quando ocorre redução da osmolalidade da urina. Esta condição favorece o crescimento bacteriano pois diminui a concentração de ácidos orgânicos, amônia e ureia, que impedem este crescimento. Situação que pode ocorrer em doenças que cursam com diabetes insipidus nefrogênico secundário (doença renal crônica, hiperadrenocorticismo, hipertireoidismo, diabetes melitus) ou diabetes insipidus central. 232 XIV Congresso Paulista de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais - CONPAVEPA - São Paulo-SP a. ITU ocorre em 46% dos cães com hiperadrenocorticismo b. ITU ocorre em 37% dos cães com diabetes melitus 2) Redução da capacidade de micção, quer seja patológica (doença do disco intervertebral) ou mesmo comportamental (cães que esperam o passeio na rua para urinar), que favorece o crescimento bacteriano por literalmente não expulsar bactérias que porventura tenham alcançado a bexiga urinária. 3) Presença de anormalidades anatômicas, quer sejam em trato urinário (ureter ectópico, divertículo vesical, carcinomas vesicais, etc.) ou em trato genital (vulva infantil, dermatite perivulvar, balanopostite, prostatite). Porém, em alguns casos, mesmo que seja em pacientes que apresentem alguns destes fatores predisponentes, poderá haver bactérias na urina, na ausência de manifestações clínicas, bem como de alteração ultrassonográficas em trato urinário, situação definida como bacteriúria assintomática, a qual sugere-se que ocorra em 8% dos cães em geral, e em até 10% dos cães hospitalizados. Alguns autores sugerem que a bacteriúria assintomática possa promover proteção contra a colonização do trato urinário por cepas bacterianas mais patogênicas. E a colonização experimental do trato urinário por cepas de Escherichia coli 2-12, pouco patogênicas tem sido avaliada em cães pela Dra Jodi Westropp como uma possível opção terapêutica para ITU recorrente, o que sugere que a bacteriúria assintomática pode não necessitar de tratamento (vide http://www.vetmed.ucdavis.edu/faculty/results.cfm?fid=14819). Escherichia coli é o patógeno mais comumente isolado em pacientes com bacteriuria assintomática, e o tratamento dos casos de bacteriúria assintomática pode contribuir para aumento da resistência microbiana e colonização da bexiga por cepas bacterianas ainda mais patogênicas. Assim, deve-se buscar a diferenciação entre ITU e bacteriúria assintomática; e as recomendações para tratamento de ITUs bacterianas dependem de uma série de fatores, e devem ser adequadas individualmente, principalmente para os casos que apresentem fatores predisponentes, como nos casos das endocrinopatias, devendo-se considerar fatores como: 1) Classificação da ITU: 233 XIV Congresso Paulista de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais - CONPAVEPA - São Paulo-SP a. complicada, b. não complicada i. Persistente ii. Recidivante iii. Reinfecção iv. Superinfecção 2) Localização da infecção (bexiga, rim, próstata) 3) Fatores que possam causar outras complicações: a. Resposta inadequada ao tratamento (ex. aumento da resistência bacteriana e piora dos eventos sintomáticos). b. Toxicidade medicamentosa (ex. nefrotoxicidade). c. Seleção microbiana sistêmica. d. Eliminação de bactérias multirresistentes no ambiente. Podemos concluir que o diagnóstico da ITU deve se basear predominantemente no histórico clinico (queixa e sintomas), associado a realização dos exames físico, urina, urocultura/antibiograma e imagem; e a terapia da bacteriuria assintomática deve ser reconsiderada caso a caso. Alguns autores sugerem que o tratamento deva ser efetuado nos casos em que há risco aumentado de infeção renal ascendente ou sistêmica, mas ainda não há consenso, daí a importância de se individualizar a abordagem. 234