UMA BREVE HISTÓRIA DO ÁTOMO Prof. Vanderley Tudo começou na Grécia O esquema a seguir mostra uma imagem que é bastante familiar a muitas pessoas. Trata-se do modelo atômico proposto na segunda década do século XX, como resultado dos estudos dos cientistas Emest Rutherford e Niels Bohr. Esse modelo ainda vale atualmente, mas, antes de estudá-lo, vamos fazer uma retrospectiva histórica. A primeira noticia sobre alguém que tivesse se preocupado com o universo minúsculo data do século VI a.C. Conta-se que o filósofo Tales (640-546 a.C.), que vivia na cidade grega de Mileto, afirmava que todas as substâncias se originam na água, e, tanto quanto possivel, retomam à égua. Tales e outros filósofos gregos da Antigüidade defendiam a idéia de que todas as coisas tinham uma origem única, que chamavam de arché. Na concepção de Tales, essa origem seria a água. Somos obrigados a reconhecer que isso diz muito pouco, mas uma coisa é certa: fica evidente que havia por trás da afirmação um questionamento, uma indução à investigação. É claro que isso não aconteceu por acaso pois tem muito a ver com o espirito dos gregos, que na Antigüidade propiciaram um bom avanço ao conhecimento. A nota histórica seguinte data do século V a.C., e vem de Abdera, porto maritimo da Ásia Menor, situado na costa norte do mar Egeu, fundado por refugiados gregos. O filósofo Leucipo ali se fixou por volta de 478 a.C. Ele defendia que o universo é constituido por elementos indivisíveis cujo movimento produz ou destroi os objetos, por união ou separação - e pelo vazio. Leucipo não deixou registros de suas idéias, e sua teoria sobreviveu graças a seu seguidor, Demócrito (460-370 a.C.), que melhorou o conceito, afirmando que o universo é formado por um número infinito de elementos invisíveis, por serem muito pequenos e indivisíveis, pois se fossem divisíveis ao infinito, confundir-se-iam com o vazio. As teorias de Leucipo e Demócrito deram origem ao conceito de que a matéria é constituida por partículas muito pequenas e indivisíveis, chamadas de átomos (do grego, a: 'não' e tomo: 'divisível'). O conceito deles estava certo, no que diz respeito ao tamanho, mas incorreto no que se refere à indivisibilidade. Todavia, foram necessários mais de dois mil anos para que alguém conseguisse provar que não estavam completamente certos, como veremos mais adiante. O filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.), de Estagira, também propôs uma teoria para a constituição da matéria, considerada inadequada nos dias atuais, diante de tudo que se conhece através das ciências. Simpatizante das idéias de outros filósofos (Anaximandro, Heráclito, Empédocles e Platão), Aristóteles acreditava que a base do mundo material era uma entidade para nós misteriosa, por ele clamada de "matéria primitiva", que não era percebida enquanto não tomasse forma. A forma viria a se materializar no que ele definiu cano os quatro elementos básicos: fogo, ar, terra e água. Tais elementos eram representados por qualidades físicas, assim denominadas: calor, frio, secura e umidade. A convicção de que a essência das coisas materiais estaria em alguma entidade etema, imutável, à parte da matéria, era a base do pensamento metafísico grego (metafísica: palavra de origem grega que designa o pensamento que não se refere diretamente às coisas materiais). Os filósofos metafísicos acreditavam que os nossos sentidos não seriam capazes de conhecer completamente as coisas e que os conhecimentos que adquirimos através delas são incompletos, falhos. Eles pensavam que a existência do mundo material só seria completamente compreendida com o conhecimento das essências. Nelas deveria estar a verdadeira origem de tudo. Para eles, essas essências se materializariam em objetos constituidos pelos quatro elementos, para compor o mundo fisico. Por defender essa postura, Aristóteles não apoiou a teoria atomista, que considerava materialista e simplória, e ainda condenou-a, atacando as idéias de Leucipo e Demócrito. Ele não admitia a possibilidade de existirem espaços vazios, como propunha Leocipo. O conceito aristotélico atravessou o tempo, perdurando por muitos séculos e exercendo notável influência no periodo a seguir. As idéias de Leucipo e Demócrito tiveram repercussões no Ocidente, defendidas pelos filósofos Epicuro (341-271 a.C.) e Leucrécio (97-54 a.C.), mas acabaram sendo soterradas, permanecendo na obscuridade por quase dois mil anos. O químico inglês John Dalton (1766- 1844), no inicio do século XIX, estudando resultados de experiências não somente suas, mas também de outros colegas, teve a feliz idéia de resgatar os conceitos de Leucipo e Demócrito, e formulou três postulados: I - A matéria é constituida por partículas extremamente pequenas, os átomos, que não se subdividem e preservam sua individualidade nas transformações químicas II - Átomos idênticos constituem um mesmo elemento químico, de tal forma que cada elemento se caracteriza pelo peso de seu átomo. III - Os compostos químicos são formados pela união de átomos de diferentes elementos, em proporções numéricas simples e determinadas. Perto do final do século XIX, o inglês William Crookes (1832-1919) inventou uma ampola que permitiu realizar descargas elétricas através do ar a baixa pressão em seu interior (ar rarefeito). Quando se estabelece a corrente elétrica através do gás, são produzidos raios, ditos raios católicos, que vão incidir na extremidade da ampola que contém o pólo positivo da fonte de a'lta tensão. Com isso, aparece uma luminosidade no vidro. Em 1897, o inglês Joseph John Thomson (l856-1940), usando uma ampola de Crookes modificada, realizou uma experiência que lhe permitiu concluir que as cargas elétricas atraidas pelo pólo positivo estão concentradas em pequenas partículas, que ficaram depois conhecidas por elétrons. Mais do que isso, Thomson foi o primeiro a propor um modelo atômico que levava em consideração as cargas (positivas e negativas). De acordo com sua concepção, o átomo seria constituído por uma quantidades de cargas positivas homogeneamente distribuídas numa esfera, com elétrons (negativos) recheando seu interior. Para maior clareza, comparou sua idéia a um pudim que estivesse recheado de passas. É por isso que o modelo atômico de Thomson é conhecido como o modelo do pudim de passas. De 1907 a 1911, o físico neozelandês Ernest Rutherford (1871-1937), ex-assistente de J. J. Thomson na Universidade de Cambridge, realizou na Universidade de Manchester uma série de experiências que contribuíram, definitivamente, para entender o átomo tal como se conhece hoje. Usando uma fonte que emite partículas alfa (partículas que possuem carga elétrica positiva), Rutherford fez com que elas incidissem sobre uma finíssima lâmina da ouro. Verificou que três coisas aconteciam: muitas partículas passavam direto através da lâmina, outras poucas eram desviadas e algumas eram rebatidas para trás. A partir do observado. Rutherford concluiu que o átomo possui um núcleo muito pequeno e compacto, onde se concentram cargas elétricas positivas. Ao redor desse núcleo, circulam os elétrons que possuem cargas elétricas negativas. É importante destacar que o número de prótons e elétrons precisa ficar empatado para que o átomo esteja no estado neutro, também conhecido como estado fundamental. Mas não ficou só nisso: concluiu também que o núcleo é muito pequeno e que as órbitas descritas pelos elétrons são tão grandes, em comparação com o núcleo, que o átomo é praticamente vazio. Em outras palavras, é como se o núcleo fosse a bola colocada no centro de um grande estádio de futebol (Fonte Nova ou Maracanã), e os elétrons ficassem dando voltas pelo lado de fora do estádio vazio. (Esta comparação está fora de escala). O modelo de Rutherford fez com que a humanidade adentrasse o século XX com uma idéia bastante realista da estrutura atômica. A exemplo do que acontece com os planetas ao redor do Sol, Rutherford imaginou que os elétrons gravitassem em torno do núcleo em órbitas circulares. Só que essa hipótese contrariava uma lei clássica da física. De acordo com as leis de Maxwell para o eletromagnetismo, para que o elétron se movimentasse em torno do núcleo, ele estaria constantemente irradiando luz, o que o levaria a perder sua energia e colidir com o núcleo. Em 1913, o físico dinamarquês Niels Bohr (1885-1962) resolveu o impasse, propondo uma reformulação no modelo de Ruthertord. A partir de experiências realizadas com hidrogênio, Bohr supôs que os elétrons giram em torno do núcleo em órbitas definidas e que as leis da física clássica não se aplicam aos átomos. Propôs ainda que os elétrons se distribuem em camadas, batizadas por letras (K, L, M, N, O, P, Q ), que podem abrigar números limitados de elétrons. A tabela a seguir mostra o número máximo de elétrons em camadas que é aceito nos dias de hoje (com comprovações experimentais). CAMADA K L M N O P Q Nº MÁXIMO 2 8 18 32 32 18 2 Depois de 1913, o modelo planetário resultante dos estudos de Rutherford e Bohr se consolidou, e, embora se conheça muito mais atualmente a respeito da estrutura atômica, ele não foi abandonado porque ajuda a compreender os fatos. Graças a esses brilhantes cientistas, temos uma idéia bastante consistente de como se comportam as partículas no interior da matéria. Em 1916, Sommerteld provou que os elétrons giravam em torno do núcleo realizando órbitas elípticas. E de que são feitos os núcleos? Foi o próprio Rutherford, em 1919, que abriu mais um caminho para responder a essa pergunta. Rutherford conseguiu, pela primeira vez, provocar a transformação de um elemento em outro, ou seja, a transmutação de um núcleo estável em outro tipo de núcleo. Na experiência original, fazia-se um feixe de partículas alfa passar através de uma camada de nitrogênio gasoso. Ruthertord observou que um núcleo de nitrogênio, ao ser atingido por uma partícula alfa, capturava essa partícula transformando-se num núcleo de oxigênio e emitindo uma partícula diferente da que incidira. A partícula emitida, cuja massa é: mp = 1,6725 x 10-27 kg e cuja carga é +e (ou seja igual e contrária à do elétron), foi chamada de próton. Essa experiência foi extremamente importante não só porque mostrou a possibilidade de transformar um elemento em outro mas também porque permitiu a conclusão de que o próton é uma das partículas que constituem o núcleo atômico. Com o desenvolvimento das ciências, algumas definições interessantes apareceram. Assim, chama-se número atômico ao nuvem de prótons que existe no núcleo de um átomo. Retomando o conceito de Dalton, pode-se dizer que átomos de mesmo número atômico pertencem ao mesmo elemento químico. Exemplo: lodos os átomos do elemento químico oxigênio possuem 8 prótons no núcleo. Isso equivale a dizer que o número atômico do oxigênio é 8. A propósito. o número atômico é simbolizado pela letra Z. Logo, o oxigênio tem Z = 8. Até aproximadamente 1930, os cientistas já estavam razoavelmente habituados com a idéia de que os átomos possuíam prótons e elétrons. Sabiam, inclusive, que o próton é bem maior que o elétron (um próton equivale, em massa, a aproximadamente 1 840 elétrons). Todavia, não conseguiam explicar o porquê de átomos de um mesmo elemento químico possuírem massas diferentes. Essa questão se acentuou quando o cientista F. W. Astan constatou experimentalmente que o gás neônio possuía dois tipos de átomos com massas atômicas diferentes. Para isso ficar mais bem entendido, vamos dizer assim: os dois átomos possuem o mesmo número de prótons (10) e o mesmo número de elétrons (10). O que os leva a ter massas diferentes? Como não poderia deixar de ser, quem deu uma explicação para essa diferença foi Ernest Rutherford. Ele supôs que deveria haver no núcleo uma outra partícula, além dos prótons. Presumindo que essa partícula não tinha carga, os cientistas passaram a fazer inúmeras experiências que comprovassem sua existência. Em 1932, Chadwick fez uma descoberta de importância excepcional. Bombardeando berílio com partículas alfa, ele descobriu que os núcleos desses elementos se desintegravam e emitiam uma partícula, até então não observada. Essa partícula devia ser aquela que fora prevista por Rutherford o nêutron, como foi chamada essa partícula, revelou ser eletricamente neutra e possuir massa um pouco maior que a do próton mn = 1,6748 x 10-27 Kg Hoje em dia, para nos referirmos indiferentemente a um nêutron ou a um próton, usamos a palavra núcleo. A descoberta do nêutron permitiu elucidar a estrutura do núcleo. Ele é constituído de um certo número de prótons e de nêutrons, que exercem mutuamente entre si forças atrativas de um novo tipo, chamadas forças nucleares. Com a descoberta do nêutron foi possível explicar o que acontece com o neônio. Era o seguinte: um dos átomos que Aston estudou tinha 10 prótons e 10 nêutrons, perfazendo 20 partículas no núcleo. O outro exemplar tinha 10 prótons e 12 nêutrons, perfazendo 22 partículas no núcleo. Com essas constatações, ficou comprovado que o número de nêutrons pode variar em átomos de um mesmo elemento químico. Segundo uma teoria proposta pelo físico norte-americano Murray GellMann, em 1964, existem partículas chamadas quarks, com carga menor que a do elétron. Apesar de essa teoria ter recebido inúmeras confirmações, nenhuma experiência conseguiu até agora observar um quark livre. Os quarks existem, mas se apresentam sempre ligados por forças extremamente poderosas para formar outras partículas chamadas hádrions (prótons e nêutrons, por exemplo). Admite-se a existência de cerca de 18 quarks. No modelo original de Gell-Mann, todos os hádrions poderiam ser construídos com três tipos de quarks e seus antiquarks. Nesse meio tempo, entretanto, os físicos tiveram de postular quarks adicionais, de modo a poder explicar a grande variedade de padrões de hádrions. Os três quarks originais foram designados, arbitrariamente, por u, d e s, iniciais de "up" (para cima), "down" (para baixo) e "strange" (estranho). A primeira extensão do modelo, que emergiu da aplicação detalhada da hipótese quark a todo o conjunto de dados relativos a partículas, foi a exigência de que cada quark aparecesse em três variedades ou "cores" diferentes. O uso do termo cor é, naturalmente, muito arbitrário e nada tem a ver com o significado habitual de cor. De acordo com o modelo quark colorido, os prótons e nêutrons consistem em três quarks de cores diferentes. A introdução da cor elevou a nove o número total de quarks e, mais recentemente, foi postulado um quark adicional, novamente aparecendo em três cores. Com a inclinação usual dos físicos para nomes fantasiosos. esse novo quark foi designado por c, inicial de "charm" (charme). Isso elevou a doze o número total de quarks - quatro tipos, cada um deles aparecendo em três cores. Para distinguir os diferentes tipos de quarks de diferentes cores, os físicos logo introduziram o termo "sabor", e falam agora de quarks de diferentes cores e sabores. Durante a última década, o modelo quark teve de ser ampliado e refinado consideravelmente à medida que novas partículas iam sendo descobertas em experiências de colisão efetuadas com energias progressivamente mais altas. Como foi anteriormente analisado, exigiu-se que cada um dos três quarks, postulados originalmente e rotulados com os sabores "para cima", "para baixo" e "'estranho", aparecesse em três diferentes cores; então foi postulado um quarto quark, aparecendo igualmente em três cores e rotulado com o sabor "charme". Mais recentemente, dois novos sabores foram acrescentados ao modelo, e denotados por t e b, iniciais de top (topo) e bottom (fundo), ou, mais poéticamente, de true (verdadeiro) e beatiful (belo); isso elevou a dezoito o número total de quarks - seis sabores e três cores.Para alguns físicos, e isso não deve causar surpresa; não acham nada simpático esse alto número de "pedras fundamentais". Sugeriram, então, que chegara a hora de pensar em componentes menores, que fossem "realmemte elementares" e com os quais os próprios quarks seriam feitos. É interessante ressaltar que cada quark tem o seu próprio anti-quark. O núcleo contém dois tipos de hádrions: os prótons e os nêutrons. Ambos são constituídos de dois tipo de partículas: os quarks u (de carga +2e/3) e os quarks d (de carga -1e/3). Nesse modelo corpuscular, os elétrons e os quarks são as partículas fundamentais do átomo. O próton é formado por dois quarks u ( de carga +2e/3) e um quark d (de carga -1e/3). Por esta razão o próton tem carga + e unitária: _2_ _2_ _1_ p= e+ ee=e 3 3 3 O nêutron, por sua vez, é constituído de um quark u (de carga +2E/3) E dois quarks d (cada um com carga -1E/3). A soma dessas cargas é zero, e isso está em concordância com o fato de o nêutron ser neutro: _2_ _1_ _1_ n= eee=0 3 3 3