Quando se origina a vida

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN
Campus Avançado do Seridó - Governadora Wilma Maria de Faria
Faculdade de Filosofia
Curso: Licenciatura em Filosofia
Prof. Galileu Galilei Medeiros de Souza
Discussões de Bioética
Prof. Ms. Galileu Galilei Medeiros de Souza1
Quando se origina a vida?
Perspectivas de pesquisa com células tronco.
Introdução
Evidências atuais: a ciência inegavelmente tem dado à humanidade instrumentos
poderosíssimos que podem transformar seu destino.
A evolução da biologia, em especial da engenharia genética, possibilitou a
fecundação in vitro, a clonagem, a modificação das espécies, a decifração do código
genético seguida de promessas de diagnóstico e de prevenção de doenças e, em sua
aliança com a química, revolucionou a indústria farmacêutica com a produção de
vacinas e novas drogas como antibióticos de última geração e as pílulas que interferem
no processo de reprodução humana.
Estes avanços trouxeram novas preocupações para a ética, para a filosofia, para a
teologia, para a antropologia, para a política, para a psicologia, para o direito.
É necessário avaliar o modo como a cultura contemporânea, a partir da
revolução científica operada por Galileu, Descartes e Newton, dentre outros, nos séc.
XVII e XVIII, manifesta novas relações do homem consigo mesmo e com os outros,
com a sociedade e com o mundo. É necessário compreender os pressupostos filosóficos
subjacentes em determinados posicionamentos que marcam o modo como os homens
pensam sua vida e agem sobre ela.
Digamos de início que a mídia é uma das principais responsáveis pela
proliferação de idéias, pela formação de opiniões. A mídia não pode escapar de uma
séria revisão ética, necessária para se estabelecer a divulgação de idéias e
argumentações sobre assuntos com pesos influenciadores de nossas escolhas, de modo
sincero, honesto e verdadeiro.
A seguir, serão expostos alguns pontos de vistas, a respeito da questão que dá
significado a este seminário, que constituem parte da maioria dos artigos publicados,
cujos pressupostos são admitidos como evidentes sem qualquer crítica.
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O Prof. Galileu Galilei Medeiros de Souza é mestre em filosofia pela Pontifícia Universidade
Gregoriana de Roma, mestre em bioética pela Universidade Pontifícia Regina Apostolorum de Roma e
professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.
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Em 2005, logo após a aprovação da lei de biossegurança, escreve um articulista:
(GRAZIANO, X. Fronteira da Ciência, in O Globo, 15-03-2005):
Outro artigo, apresenta pareceres de parlamentares e cientistas sobre a ação,
junto ao STF, de inconstitucionalidade da aprovação de pesquisa com células tronco
retiradas de embriões humanos congelados:
(Vasconcelos, A. et al. Ciência e Vida, in O Globo, -1-06-2005)
E ainda:
(Gleiser, M. Células-tronco e a medicina do futuro, in Folha de
São Paulo, 29-05-2005).
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Dentro destes e de outros artigos publicados sobre o assunto, sobressaem alguns
pressupostos que podem ser identificados em quase todos eles:
a) uma confiança no poder indiscutível da ciência, reconhecendo nela o meio
privilegiado, senão único de compreensão e conhecimento do mundo, seja ele
físico ou humano.
b) identificação das questões éticas referentes à ciência com questões de fé
religiosa, ou seja, a consideração de que, no juízo o impacto que o progresso da
ciência e da tecnologia exerce na vida dos homens, da sociedade e da natureza, o
apelo à ética tem sentido apenas no âmbito da religião
Simplificando: a ciência é a verdadeira fonte do conhecimento humano e outros
critérios de julgamento das ações e decisões humanas advindos da ética, da filosofia, da
antropologia, e por que não da religião, são subestimados frente ao status superior que a
ciência adquiriu em nossa sociedade. É necessário nos perguntarmos sobre as bases
epistemológicas que justificam discursos de tal tipo.
De fato, o ponto de vista sobre a ciência e seu papel na sociedade, defendido na
maioria dos artigos publicados é julgado e aceito por boa parte da sociedade, sem que
seja colocada a questão do alcance cognitivo da ciência, e de quais sejam seus limites.
Este modo de encarar a ciência como a suprema sede dos juízos de verdade
traduz um desconhecimento de quase tudo o que ocorreu em filosofia da ciência no
século XX, tendo suas origens no tipo de epistemologia expressa nos séculos 17 e 18 e
pelo neo-positivismo do início do século passado.
Na tentativa de simplificar ao máximo este discurso, tentaremos uma
aproximação, a título de exemplo de algumas conquistas no âmbito da epistemologia.
Os cientistas e filósofos do círculo de Viena, conhecidos como neo-positivistas, põem
em dúvida a existência de problemas genuinamente filosóficos, e por conseguinte
questionam a validade da filosofia. Separam as proposições em dois conjuntos: o das
proposições significativas, ou dotadas de sentido, identificadas com as proposições
científicas; o segundo, das proposições metafísicas, consideradas pseudo-proposições.
Estas não poderiam ser base para um conhecimento verdadeiro porque lhes falta o
critério que assegura a genuinidade do primeiro grupo: a verificabilidade pela
experiência (verificabilidade empírica), ou seja, a evidência apoiada nos sentidos, tendo
como modelo principal o sentido da visão. Assim, os discursos da psicanálise e da
filosofia ou da teologia, por exemplo, embora obedeçam as regras da sintaxe e da
gramática, não são passíveis de verificação pela experiência, e portanto não podemos
considerá-los nem verdadeiros nem falsos.
O Neo-positivismo, porém, começa a decair diante das críticas de outros
filósofos da ciência. Um dos mais representativos a este respeito é, sem dúvida, K.
Popper. Este não aceita a verificabilidade como critério de demarcação de sentido e nãosentido e nem o considera adequado para demarcar o campo da ciência. O método
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próprio da ciência não é o indutivo, que não se justifica logicamente, dado que por mais
numerosas e bem sucedidas que sejam nossas experiências, estas jamais poderão
transformar nossas hipóteses em leis definitivas, absolutamente verdadeiras, dado a
impossibilidade de determinar o número de experiências realizadas indutivamente para
se chegar a uma verdade. A ciência seria baseada na sua natureza aberta a refutação, ao
menos em princípio. O método da ciência empírica é o método hipotético dedutivo e se,
ao negar a indução, a experiência deixa de ser critério para demonstrar a verdade de
qualquer proposição, ela poderá, no entanto, ao refutá-la, mostrar, logicamente sua
falsidade. As experiências repetidas e bem sucedidas não podem sustentar com absoluta
certeza nenhuma afirmação, mas podem negar as certezas, que, equivocadamente,
julgávamos ter encontrado; o que define a racionalidade é a atitude crítica que nos leva
a aprender com nossos erros. O método crítico, ou seja, o que nos leva a colocar sob
avaliação dos argumentos e contra-argumentos todas as nossas teorias, mesmo as mais
caras, é comum quer à ciência empírica, quer à filosofia e às metafísicas.
Nenhum dos filósofos que colocaram com suas críticas por terra as pretensões
do neo-positivismo negam o valor da ciência. Eles a valorizam, mas apontam para seus
limites, considerando-a como um dos recortes possíveis em nossa busca de
compreender a realidade, mas não o único.
Esperamos então contribuir com estas reflexões a partir de um olhar sobre as
ciências, mas também levando em conta a filosofia e um recorte metafísico da realidade.
1. Ponto de partida: o recorte das ciências naturais.
O que nos diz a ciência a respeito do embrião humano?
a) É um organismo novo. Possui 46 cromossomos, 23 de cada gameta. Não é uma
continuação do corpo da mãe, mas necessita do espaço uterino para a sua
nutrição, respiração etc, ou seja, para a sua conservação e desenvolvimento. Mas
todos nós necessitamos de um ambiente assim para a nossa conservação e
desenvolvimento. O nosso grande útero é o nosso planeta Terra.
b) É um organismo humano. Pertence à espécie biológica do homem.
c) É um organismo programado e não apenas um amontoado de células. Ele possui
um DNA próprio. Caso lhe seja dado o ambiente ele continuará a se conservar e
desenvolver naturalmente.
d) O seu desenvolvimento ocorre de modo: 1. unitário (todas as partes do
organismo embrionário trabalham em função do todo); 2. coordenado (o
desenvolvimento não é realizado ao acaso, mas é organizado); 3.contínuo (o
desenvolvimento ocorre em uma perfeita continuidade, não havendo saltos
qualitativos ou mutações substanciais. O DNA possui já o projeto de tudo e este
se realizará, garantindo-se tão somente a nutrição e a respiração) e 4. gradual (é
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evidente que a forma definitiva se alcança gradualmente, implicando num
processo. O embrião porém conserva a sua individualidade).
Sendo assim, definitivamente o embrião humano é um novo indivíduo que se
forma após a concepção.
O problema é o de se saber se o embrião é também uma pessoa humana.
Entretanto, logo após articular uma pergunta deste tipo nos deparamos com uma aporia:
como um indivíduo humano não seria uma pessoa humana? Afirmar tal possibilidade é
dizer que alguns seres humanos são pessoas enquanto outros não o são. Mas qual seriam
os critérios para determinar tais divisões? Não estaria sendo negada a própria igualdade
entre os homens?
Não se pode estabelecer logicamente uma dicotomia entre o “eu pessoal” e a
“vida corporal”. A vida não pode ser reduzida a uma descrição científica de suas partes,
porque por mais que se procure os seus fundamentos a vida é sempre um plus, que
escapa da simples soma das suas partes. Entretanto, a vida é sempre a vida corporal,
adaptada a se manifestar de acordo com as possibilidades corporais. A pessoa adulta é
certamente mais madura na sua dimensão biológica, psicológica e moral que quando da
sua fase embrional, mas tal maturação ocorre no âmbito da mesma identidade de pessoa.
Não se pode afirmar com coerência lógica que uma pessoa com trinta anos seja
mais pessoa do que um embrião, ou do que uma criança, ou mais do que qualquer outro
homem. Não se pode sustentar com verdade que não há pessoa onde ainda não se dão
manifestações da pessoa. Um indivíduo não é pessoa porque se manifesta como tal,
mas, ao contrário, se manifesta como tal porque é pessoa. O ser humano é pessoa por
sua natureza racional, não se transforma em pessoa em força da posse atual de certas
propriedades ou do exercício efetivo de certas funções. Em outras palavras, aquilo que
é relevante para o reconhecimento do ser pessoal é o pertencer, por natureza, à espécie
humana racional, independentemente da manifestação exterior em ato de certas
características ou comportamentos.
Além destas razões, existe a profunda razão metafísica: a vida humana é a vida
de uma unidade de corpo e espírito. Nem mesmo na fase adulta os elementos naturais,
meramente físicos e biológicos, não são suficientes para explicar o mistério da vida
humana e dos atos racionais (espirituais) de que o homem é capaz. Em relação ao
embrião este já é dotado de um princípio vital que não tem condições de se manifestar
plenamente, mas nem por isto pode-se negar o seu princípio espiritual.
Assim, a reflexão filosófica atesta que o embrião humano:
a) Não é um homem em potência, não é uma pessoa em potência.
b) É uma pessoa humana real e atual.
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c) Todo ser humano é pessoa humana.
d) Um indivíduo não é pessoa porque se manifesta como tal, mas se manifesta
assim porque é pessoa.
Conclusões
O tipo de racionalidade que insiste em vigorar em nossa era é aquele em que a
razão deixa de comparar os seus produtos com as exigências elementares do ser humano
e passa a compará-los com as exigências do mercado e estas estão voltadas para a
produção do lucro e do poder.
O mercado coloniza o mundo da vida, dita as normas de procedimento para os
estados; dita o que deve ser procurado pelos indivíduos (Veja-se o comportamento dos
EUA e da China quanto a necessidade de diminuição da emissão de gazes poluentes na
atmosfera).
O conhecimento em seu horizonte é também conquistado pelo mercado: somente
vale a pena conhecer o que pode proporcionar algum poder ou lucro.
O problema do uso de células tronco não está no simples uso destas células em
experimentos, mas no modo como estas células são recolhidas. Os fins são justificados,
o uso de células para o desenvolvimento de tratamentos. Entretanto, urge perguntar não
só se realmente é necessário a destruição de embriões humanos em vista da aquisição de
material de pesquisa, mas também se tal destruição é ética. Se como vimos, o embrião
humano é pessoa, devemos nos perguntar se é realmente lícito a destruição da vida de
pessoas em benefício da vida de outras pessoas. A resposta a esta pergunta é
naturalmente: Não!
TERAPIA GENÉTICA
Produz células e tecidos para transplantar
Problema ético: de onde vem as células estaminais?
Células tronco adultas
Células tronco embrionárias
 Medula
 Placenta
 Cordão umbilical
Sem problemas éticos: são recolhidas
sem danos para a pessoa.
Embrião mesmo
Com grandes implicações éticas:
provocam a morte do embrião.
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