A importância da Filosofia do Direito Filosofia, a Amiga do Conhecimento: Num primeiro momento, torna-se necessário, a análise da origem da palavra filosofia para que se possa compreendê-la de forma ampla e eficaz. Ela origina-se do grego filo, que quer dizer amigo, e sofia, que significa conhecimento. Assim, filosofia é a “amizade ou amor pela sabedoria.” Diferentemente do que se pensa, a filosofia não se traduz no ato de pensar e, sim, é através dele que ela se manifesta. Possui, como essência, o amor pela verdade que se busca constantemente, a partir de algo que se conhece. Não se satisfaz com respostas seqüenciais que não atinjam a essência do saber sobre um determinado problema. Fundamenta-se na realidade com o fito de atingir o sentido das coisas vivas e do ser humano. Uma atitude filosófica se constitui, desta forma, “da não aceitação de plano do que é colocado e pressupõe uma atitude positiva – a da investigação, e uma negativa – a não aceitação.” A Filosofia é dinâmica, pois dinâmico é o ser humano, em conseqüência, as sociedades que dele derivam, perpetuando-se e modificando-se conforme as necessidades que se lhes apresentem. O objetivo da filosofia é o de suscitar perguntas, levantar o porquê das coisas, instigando a respostas diversas, por este motivo, enriquecedoras e atuais. Respostas iguais destituiriam a filosofia de seu próprio cerne. O ser humano se enriquece quando em contato com as diferenças de outro ser humano, em que os pensamentos se interagem, amoldando-se. As diferenças são o que igualam o ser, levando-o à busca do conhecimento, e, na medida em que é alcançado, o desenvolvimento se favorece. A Filosofia do Direito: Ressaltando que, o direito existe onde quer que exista a sociedade . Isto porquê, parece que a própria vida depende de se viver em sociedade. Depreende-se, então, que a perpetuação da espécie, talvez o instinto mais predominante do ser humano esteja em íntima co-relação com o do viver social. E esta convivência não se dá sem uma regulamentação, devido às idiossincrasias de cada um. Daí, a fundamental e absoluta importância do direito, que, por seu caráter universal, torna-se passível de uma investigação filosófica em busca da realidade jurídica. A filosofia do direito parte de dogmas pré-estabelecidos para indagações, transcendendo o conhecimento positivo através de uma análise crítica, que levará a um conhecimento mais completo e justo tanto da interpretação como da aplicabilidade das leis. Esta análise se dará através do ato de pensar, que nada mais é do que “uma forma de aprender, básica para qualquer atividade futura que exija reflexão, conclusão, julgamento, avaliação.” O acadêmico de direito não deve se afastar, assim, do estudo da filosofia do direito, sob pena de “(...) uma hipertrofia do conhecimento teórico, em detrimento da prática, que impede ao aluno inferir, estabelecer relações e concluir de sua aplicabilidade na vida.” Reconhecendo-se, portanto, a importância da filosofia do direito, deduz-se que deveria ser disciplina atuante em todos os níveis do curso de ciências jurídicas e sociais. E enquanto esta necessidade dista da realidade, “(...) o estudante tem de se convencer que sua aprendizagem é uma tarefa eminentemente pessoal.” O acadêmico deve, além desta atitude autodidata, saber que o saber leva à conhecida conclusão socrática: “Toda autoridade que tenho repousa apenas em meu conhecimento de quão pouco sei.” A Missão da filosofia do direito: Ao nos depararmos com casos alarmantes, a sociedade nutre uma ânsia por justiça. Entretanto, a noção de justiça pode ser muito mais complexa do que a simples prisão e punição de criminosos. Definir adequadamente o que seria algo justo e equilibrado é motivo de muitas controvérsias, tanto no meio social comum, como no meio dos próprios operadores do Direito. Surgem outras questões que muitas vezes não seriam solucionadas pelos filósofos em geral como, por exemplo: o que é justo ou injusto? Existe norma ou lei absoluta? As normas devem sempre serem seguidas? O que é o Direito? Qual o melhor modelo de sociedade? Por que existe uma sociedade e devemos seguir as normas por ela imposta? Qual o limite da moral e do Direito? Tais questionamentos não são freqüentemente objeto de estudo dos filósofos. Com a necessidade de apresentar tais conceitos de temas controversos relevantes ao direito surgiu um ramo especifico e novíssimo da filosofia conhecido como a Filosofia do Direito. Também chamada Filosofia Jurídica ou jus-filosofia e que alguns encaram como Filosofia Política e até uma parte da ética. Trata-se justamente de um ramo da filosofia cujo enfoque está no pensamento e questionamento das ações de normas e do direito tanto em uma sociedade quanto universalmente. Entretanto, tal disciplina não se encarrega da simples análise material do direito, tendo em vista que esse é mutável e variável, assim como a sociedade. Como bem escreve o jus-filósofo Paulo Dourado Gusmão em seu livro Filosofia do Direito, a finalidade de filosofia aplicada ao Direito consiste em “despertar a dúvida sobre as “verdades” jurídicas, geralmente ideológicas, e, como tal, históricas; abrir a mente para a realidade jurídica, imperfeita, e, quase sempre, injusta; incentivar reformas jurídicas, criando a consciência de a lei ser obra inacabada, em conflito permanente com o direito. E, acima de tudo, dar ao jurista, enfadado com os modelos que a sociedade lhe impõe, momentos de satisfação espiritual, compensadores da perda da crença na capacidade criadora do homem no terreno jurídico.” Sendo assim, a jus-filosofia se encarrega de levar a reflexão racional das noções do justo ou injusto ou do certo ou errado perante a sociedade e gerar em conseqüência a mudança social através de suas conclusões, se assemelhando em alguns aspectos à filosofia ética e social. Esclarece Miguel Reale em seu livro Filosofia do Direito que “O direito é realidade universal. Onde quer que exista o homem, aí existe o direito como expressão de vida e de convivência. É exatamente por ser o direito fenômeno universal que é ele suscetível de indagação filosófica. A filosofia não pode cuidar senão daquilo que tenha sentido de universalidade. Esta é a razão pela qual se faz filosofia da vida, filosofia do direito. filosofia da história ou filosofia da arte. Falar em vida humana é falar também em direito, daí se evidenciando os títulos existenciais de uma filosofia jurídica”. O Direito como estudo filosófico foi até Hegel, objeto dos Filósofos ( como Platão, Aristóteles, Santo Agostinho de Hipona, Santo Tomás de Aquino, Kant, Karl Marx, Habermas, John Rawls), caminhando junto com as idéias dos grandes pensadores; passando aos juristas-filósofos modernamente. Rudolf Stammler (1856-1938), juristafilósofo, foi precursor ao construir um sistema filosófico do direito distinto da filosofia comum e na tentativa de superar o positivismo do direito ou dogmatismo vigente em sua época. Posteriormente surgiram nomes notáveis que podemos destacar: Friedrich Carl von Savigny, Rudolf Von Ihering, Radbruch, Carl Schmitt, Hans Kelsen, Norberto Bobbio, Carlos Cossio, Chaim Perelman, e renomados brasileiros como Tércio Sampaio Ferraz Jr, Miguel Reale, Ives Gandra Martins e Pontes de Miranda. O direito como ciência humana é considerado por alguns como dogmática. As normas devem ser cumpridas como está escrito e pormenorizadamente. A filosofia do direito surge justamente para contrapor essa tendência. O direito como elemento cultural humano deve ser parte questionável e mutável conforme as aspirações da sociedade em que se adequar. Salienta o ilustre Tércio Ferraz Jr em Introdução ao Estudo do Direito, o direito como ciência evolui de modo diverso das demais ciências já que não é possível a separação entre a história da ciência jurídica e a história do próprio direito. Nas demais ciências o objeto é um dado enquanto na ciência jurídica o objeto é um resultado, que só se realiza numa prática. Sobre tais pontos o autor apresenta dois elementos a Dogmática e a Zetética. O primeiro como significado de ensinamento, doutrina. O segundo como elemento questionador, a busca e investigação de conceitos e idéias. A dogmática se aplica em aspectos de cumprimento do ordenamento jurídico em aspectos práticos; já a Zetética inclui a filosofia do direito como uma "Zetética analítica pura" em que "o teórico se ocupa com os pressupostos últimos e condicionantes bem como com a crítica dos fundamentos formais e materiais do fenômeno jurídico e de seu conhecimento”. Miguel Reale chega à conclusão que a missão da filosofia do direito é de crítica da experiência jurídica, no sentido de determinar as suas condições transcendentais. Sendo assim de fundamental importância não apenas para os juristas, mas para todas as pessoas que procuram entender e criticar as experiências jurídicas da sociedade ao longo do tempo. A filosofia do direito então se torna importante à medida que se analisa os conceitos do ordenamento jurídico e social tentando se adequar a uma realidade e por fim o esperado por todos. PAULO DOURADO DE GUSMÃO denuncia no capítulo introdutório de seu livro dedicado à Filosofia do Direito: "é normal nas universidades serem suprimidos cursos ou matérias que não despertam o interesse profissional, apesar de seu alto valor cultural, como entre nós, por exemplo, o Direito Romano, o latim e a Filosofia... a grande (1) maioria quer dominar o saber que dê sucesso na vida profissional" Desta forma, as disciplinas que não proporcionem um conteúdo técnico-pragmático são desprezadas pelos acadêmicos. Além daquelas já citadas pelo referido autor, no rol das disciplinas relegadas constam, ainda, Sociologia e, pasmem, Ética geral e profissional. Não seria a Filosofia do Direito um "saber que a tribo recusa ?" Questionar, problematizar, criticar, rever, rediscutir são verbos que dominam a inquietação incessante do filósofo. A atitude filosófica compromete-se em perquirir "o que", "como" e "por que?" das coisas, dos fatos, das idéias e das condutas humanas. Não se resigna com as explicações fornecidas pelo senso comum, pelo conhecimento vulgar que qualquer um de nós temos da realidade que se nos apresenta. Envolve, portanto, um determinado posicionamento diante do mundo em torno. Uma atitude de espanto deve permear a atividade do filósofo, espanto enquanto "choque com uma realidade que não domina". O Filósofo necessita de uma certa dose de "infantilidade", curiosidade infantil, como diria GARCÍA MORENTE. Não está no centro das suas atenções fornecer respostas para as perguntas que ele mesmo faz, mesmo que responda algumas vezes. A Filosofia pretende apreender seus objetos de estudo de forma totalizante e o mais universal possíveis. Decorre daí que, nada fica alheio às indagações dos filósofos. Como sabemos, nos primórdios, a filosofia reunia a totalidade dos conhecimentos humanos, abrangendo desde o estudo das coisas da natureza até o ente divino. Penso que a grande tarefa dos simpatizantes da Filosofia do Direito talvez seja a de demonstrar como o saber filosófico pode ser um poderoso instrumento a serviço do labor dos juristas, já que a rejeição pela filosofia é grande entre aqueles que aspiram entrar no mundo jurídico. Postula-se a existência de uma certa "uma preguiça mental" dos estudantes, que os imobilizam em torno das disciplinas puramente dogmáticas, afastando-os de disciplinas mais reflexivas que visem a apreender o fenômeno jurídico numa dimensão mais ampla. Não podemos deixar de creditar razão diante da triste realidade nacional de baixos índices de aprovação no exame de ordem da OAB e nos mais diversos concursos públicos. A reflexão crítica dos diversos institutos jurídicos tem cedido espaço a memorização destes e das soluções processuais. Tomam-se apontamentos das aulas, decora-se e estuda-se para as avaliações de rotina. Para PAULO DOURADO DE GUSMÃO compreender seria captar o que há por trás das aparências, recriar, reviver um ato criador. A Filosofia do Direito não se propõe a finalidades práticas, a abordagens reducionistas do direito. Antes, e mais importante, engendra uma atitude de questionamento, de problematização, rediscutindo premissas, propondo novas abordagens do fenômeno jurídico. Em BITTAR e ALMEIDA colhemos lição que pela transparência é digna de transcrição: "a filosofia do direito é, em meio ao emaranhado de contribuições científicas do direito, a proposta de investigação que valoriza a abstração conceitual, servindo de reflexão crítica, engajada e dialética sobre as construções jurídicas, sobre os discursos jurídicos, sobre as práticas jurídicas, sobre os fatos e normas jurídicas". É por isso que a filosofia, quando bem estudada, é uma das disciplinas mais valiosas das humanidades, precisamente porque dá aos seus estudantes uma competência crucial em qualquer actividade: ser . capaz de tomar decisões, pesar alternativas, fazer escolhas, considerar argumentos, resolver problemas" Que é a prática forense senão um duelo de argumentos, alternativas, escolhas, tudo culminando num processo decisório? Que faz o advogado na petição inicial senão articular argumentos de fato e de direito na defesa de uma tese perante o órgão jurisdicional? Que fazem o criminalista e o promotor de justiça na tribuna do júri senão sustentar suas respectivas teses visando adesão e solidariedade dos jurados? Para PERELMAN, os estudantes de direito devem além da lógica estudar retórica "que não é a arte de falar bem, num estilo florido e empolado: é a arte de persuadir e de convencer, que pode manifestar-se por um discurso ou por um texto escrito e que, para os juristas, consiste essencialmente no uso da argumentação. "Só os tolos, os ingênuos, os superficiais, os pragmatistas empedernidos insensíveis, encastelados nas disciplinas dogmáticas, não vêem a importância dos estudos de filosofia para o profissional do direito (...) o conhecimento de filosofia instrumentará o retorno, pelo profissional do direito, à perspectiva dogmática das ciências especializadas, seus problemas específicos, com um rigor e profundidade desconhecidas pelos novos juristas-práticos, praxistas", adiante arremata "quem alimenta o espírito só com a especialização tende a converter-se num pobre de espírito". Como vimos, não só para aumentar sua cultura jurídica serve a Filosofia do Direito : é um oxigênio extra para seu raciocínio prático.