Efeitos da interação entre aflatoxicoses e doença infecciosa bursal

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Efeitos da interação entre aflatoxicoses
e doença infecciosa bursal sobre níveis
de enzimas de função hepática, colesterol
e triglicerídeos em frangos de corte
Adriana Borsa
Aguemi Kohayagawa
Lígia Pedroso Boretti
Mere Erica Saito
RESUMO
Fatores de ordem infecciosa ou tóxica podem interferir no metabolismo orgânico das aves
de produção agindo de forma sinérgica potencializando assim seus efeitos sobre as mesmas.
Com o objetivo de avaliar os efeitos da interação entre a aflatoxicose, doença infecciosa bursal
(DIB) e vacinação contra a DIB nos níveis de enzimas de função hepática AST e GGT (aspartato
aminotransferase e gama glutamiltransferase), colesterol e triglicerídeos, foram avaliados
semanalmente os níveis séricos destes componentes em frangos de corte de criação industrial
distribuídos em cinco grupos: grupo A (controle): animais sem vacinação, desafio e aflatoxina na
ração; grupo B (aflatoxina): animais somente intoxicados com 1,25 ppm de aflatoxinas na ração do
primeiro ao 42° dia de vida; grupo C (vacinação): animais somente vacinados; grupo D (desafio):
animais somente desafiados com o vírus da DIB; e grupo E (interação): frangos intoxicados com
aflatoxina na ração do primeiro ao 42° dia de vida, vacinados no primeiro e 12° dia com vacina
comercial contra a DIB e desafiados ao 14°dia com cepa de campo. Como resultados, verificouse que somente as aflatoxinas influenciaram os níveis de colesterol e das enzimas AST e GGT,
provocando diminuição e aumento, respectivamente; e que a interação entre aflatoxicoses, desafio
viral e vacinação provocaram hipertrigliceridemia aos 7 dias após o desafio, provavelmente devido
diminuição de consumo de ração potencializado pelo desafio viral. Contudo, a partir dos 28 dias,
verificou-se apenas efeito da aflatoxina sobre os níveis de triglicerídeos.
Palavras-chave: Aflatoxinas. Doença de Gumboro. Triglicerídeos. Colesterol.
Effects of interaction between aflatoxicosis and infectious bursal disease
on enzyme levels, liver function, cholesterol and triglycerides in broilers
ABSTRACT
Infectious or toxic factors can interfere with the metabolism of organic poultry production
acting synergistically thereby boosting its effects on them. Aiming to evaluate the effects of
Adriana Borsa – Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária (FAMEV) – CLIMEV – UFMT – Cuiabá/MT.
E-mail: [email protected]
Aguemi Kohayagawa e Lígia Pedroso Boretti – Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia – FMVZ –
Departamento de Clínica Veterinária – UNESP – Botucatu/SP.
Mere Erica Saito – Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC – Centro de Ciências Agroveterinárias
– CAV – Lages/SC.
132Veterinária em Foco Veterinária
v.8 v.8, n.2,
n.2 jan./jun.
p.132-142
Canoas em Foco,
2011
jan./jun. 2011
the interaction between aflatoxicosis, infectious bursal disease (IBD) and vaccination against
DIB levels of liver function enzymes GGT and AST (aspartate aminotransferase and gamma
glutamyltransferase), cholesterol and triglycerides, were assessed weekly in serum levels of these
components in broiler breeding industry divided into five groups: group A (control): animals without
vaccination, challenge and aflatoxin in diet, Group B (aflatoxin): animals intoxicated with only
1.25 ppm of aflatoxin in feed of the first 42 days of life, group C (vaccination) vaccinated animals
only, group D (challenge) animals only challenged with the virus of DIB and group E (interaction):
chickens intoxicated with aflatoxin in the ration from the first to 42 day of life, vaccinated in the
first and 12th day with commercial vaccine and challenged the DIB to day 14 with field strain.
The results showed that only aflatoxins influenced cholesterol levels and liver enzymes AST and
GGT, resulting in decrease and increase, respectively, and that the interaction between aflatoxicosis,
vaccination and viral challenge led to hypertriglyceridemia 7 days after challenge, probably due
decreased intake potentiated by viral challenge. However, after 28 days, there was only effect of
aflatoxin on the levels of triglycerides.
Keywords: Aflatoxins. IBD. Cholesterol. Triglycerides.
INTRODUÇÃO
A criação intensiva de frangos de corte busca o pico de produtividade em
condições máximas de desenvolvimento genético e manejo. No entanto, surgem
diversos desafios expondo os lotes a quedas na produção. Estes desafios podem estar
relacionados simplesmente a aspectos de manejo técnico ou podem ser de ordem tóxica
ou infecciosa.
Após ingeridas, as aflatoxinas são absorvidas no trato gastrintestinal e
biotransformadas primariamente no fígado, o qual é órgão alvo da aflatoxicose nas aves.
Os animais acometidos sofrem importantes alterações no metabolismo hepático afetando
o metabolismo das gorduras (TUNG et al., 1972).
De acordo com Bernardino (2000) e Van Den Berg (2000), a doença infecciosa bursal
(DIB), também conhecida como doença de Gumboro, provocada por um agente viral, é
considerada uma das principais enfermidades infecciosas em aves, causando prejuízos
intensos, particularmente em sua forma subclínica. Embora tenha como alvo principal
a bursa de Fabrício, podem ocorrer alterações em outros órgãos, tais como baço, timo,
rim e fígado (LEY et al., 1983).
Triglicerídeos e colesterol são componentes analisados nos testes de avaliação do
metabolismo lipídico. O lipídeo padrão do organismo é o triglicerídeo, que constitui, em
média, 95% de toda a gordura que existe no corpo. O colesterol é constituinte fundamental
na estrutura das membranas celulares, síntese de ácidos biliares e hormônios esteroides
(RIEGEL, 1996).
Na medida em que o organismo está processando uma certa quantidade de
gordura que tomou como alimento, os triglicerídeos ingeridos são hidrolisados e
organizados em unidades lipoproteicas denominadas quilomicras (QM), sendo desta
forma absorvidos pelo sistema linfático tendo assim acesso ao plasma. Além disso,
a síntese de gorduras (lipogênese) ocorre no tecido adiposo e fígado, que são os
tecidos lipogênicos que existem no organismo, sintetizando triglicerídeos que são
Veterinária em Foco, v.8, n.2, jan./jun. 2011
133
secretados na corrente sanguínea para a utilização em outros tecidos (RIEGEL, 1996;
MARZZOCO; TORRES, 1999).
Porém, nas aves, a lipogênese ocorre apenas no fígado; o tecido adiposo funciona
apenas como reservatório lipídico (O’HEA; LEVEILLE, 1969; TUNG et al., 1972;
LEVEILLE et al., 1975). Desta forma, alterações nos processos enzimáticos que regulam
a síntese hepática podem ocasionar distúrbios no metabolismo das gorduras.
Interações entre agentes tóxicos e infecciosos na avicultura industrial podem ser
responsáveis por grandes perdas produtivas. Poucos estudos foram realizados avaliando
os efeitos destas interações (GIAMBRONE et al., 1978; CHANG; HAMILTON, 1982;
BORDIN, 1995).
Tendo em vista a importância do estudo das variáveis fisiopatológicas no contexto
de doenças com disseminada ocorrência na avicultura em geral, o objetivo deste trabalho
foi avaliar os efeitos da interação entre a aflatoxicose subaguda e doença infecciosa bursal
no metabolismo das gorduras em frangos de corte de criação industrial.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram utilizados 800 frangos de corte, machos, linhagem comercial. Para cada
grupo de 160 aves foram ministrados os seguintes tratamentos: grupo A (controle): aves
sem receber vacinação para DIB, com ração isenta de aflatoxina e sem inoculação viral;
grupo B: aves vacinadas para DIB no primeiro e décimo-segundo dia de vida, com ração
isenta de aflatoxina e sem inoculação viral; grupo C : aves sem receber vacinação para
DIB, com ração isenta de aflatoxina, desafiados com cepa de campo da DIB, ao 14° dia de
vida; grupo D: aves sem receber vacinação, recebendo ração com 1,25 ppm de aflatoxinas
do 1° ao 42° dia de vida, sem inoculação viral; grupo E: aves vacinadas para DIB no
primeiro e décimo-segundo dia de vida, recebendo ração com 1,25 ppm de aflatoxinas
do 1° ao 42° dia de vida, desafiadas com cepa de campo da DIB, ao 14° dia de vida.
As rações consideradas isentas de aflatoxinas foram analisadas previamente no
Lamic1.
O delineamento experimental foi o inteiramente casualizado, sendo utilizadas cinco
repetições e 7 momentos (7, 14, 18, 21, 18, 35 e 42 dias de vida). Cada repetição era
formada por um número variável de aves (unidades experimentais), conforme a idade
das mesmas, devido à necessidade de obtenção de quantidade suficiente de soro para o
processamento das análises.
Para tanto, eram realizados pools de amostras de soro para cada idade. Assim, aos
sete dias de idade, foram usadas 10 aves por amostra, aos 14, cinco, aos 21 e 28 dias, três,
e aos 35 e 42 dias, duas, totalizando 125 aves. A utilização de 160 aves para cada grupo
experimental foi necessária considerando-se índices normais de mortalidade de frangos
em criações industriais em até 4% (LANA, 2000).
1
LAMIC, Centro de Ciências Rurais, Universidade Federal de Santa Maria/RS.
134
Veterinária em Foco, v.8, n.2, jan./jun. 2011
Os frangos foram criados em galpão experimental dividido em boxes de acordo com
o tratamento ministrado. Aqueles pertinentes aos grupos submetidos à inoculação viral
foram transferidos para isoladores de pressão negativa (Isolador PN300® – LNF Comércio
e Indústria) em infectório, no dia da inoculação (14 dias de vida), sendo mantidas neste
local até o término do experimento, no 42° dia.
As aves receberam ração comercial de acordo com as exigências nutricionais por
faixa etária (NRC, 1994) e água ad libitum. As rações comerciais foram previamente
analisadas pelo Lamic, não sendo detectadas outras micotoxinas presentes.
As aflatoxinas utilizadas nas rações dos grupos experimentais foram produzidas no
Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Universidade Federal de Santa Maria
no Lamic, segundo técnica de Shotwell et al. (1966) modificada por West et al. (1973).
A incorporação à ração foi realizada em misturador de premix por 10 minutos. Após a
mistura, as amostras de ração ficaram contendo 1,25 ppm de aflatoxinas (B1=69,64%,
B2= 0,56%; G1= 29,22% e G2=0,48%) de acordo com resultados de análises realizadas
no Lamic.
Para o desafio viral, foi utilizada uma amostra variante de vírus de campo isolada
por Kondo (1998) e classificada pelo laboratório Simbios22, conforme técnica proposta
por Jackwood & Jackwood (1994), como pertencente ao grupo molecular 15. A dose
infectante (DIE50) foi de 103,0 por ave, por via oral, baseando-se em diversos trabalhos
que utilizaram doses que variam de DIE50 de 102,0 a 104,0 (LUCIO; HITCHNER, 1980;
SALAZAR et al., 1995).
A vacinação contra a DIB foi realizada com vacina comercial3, cepa intermediária,
no primeiro e 12° dia de idade (via sub-cutânea e oral, respectivamente), por ser este o
esquema vacinal utilizado na região.
As colheitas de sangue realizadas nos momentos mencionados foram realizadas
por punção da veia ulnar, utilizando-se seringas e agulhas de calibre 25X7 descartáveis,
acondicionando-se em frascos de vidro sem anticoagulante para a obtenção do soro.
Avaliou-se a função hepática das aves analisadas por meio de dosagem das enzimas
de função hepática AST e GGT, as quais foram determinadas por método colorimétrico
utilizando-se kit comercial4. O metabolismo das gorduras foi avaliado por meio da
dosagem de colesterol e triglicerídeos no soro, determinados pelo mesmo método, porém
utilizando-se outra marca de kit comercial5.
Os resultados foram submetidos à análise de variância pelo teste F e as médias
comparadas pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade (BANZATTO;
KRONKA, 1995).
2
Simbios Biotecnologia – Porto Alegre/RS.
Laboratório Merial Saúde Animal.
4
CELM – Cia. Equipadora de Laboratórios Modernos, São Paulo.
5
BIOCLIN – Químico Básica Ltda. Belo Horizonte/MG.
3
Veterinária em Foco, v.8, n.2, jan./jun. 2011
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RESULTADOS
As alterações referentes aos níveis de triglicerídeos foram observadas aos 18, 21 e
28 dias de idade (4; 7 e 14 dias após o desafio viral), não apresentando variações antes
ou após este período (Tab.1).
TABELA 1 – Níveis de triglicerídeos (mg/dL) no soro de aves controle (grupo A), intoxicadas com aflatoxina
(grupo B), somente vacinadas (grupo C), somente desafiadas com vírus (grupo D) e na interação entre desafio,
vacinação e aflatoxina (grupo E). Valores entre parênteses indicam a variabilidade dos níveis encontrados.
Idade (Dias)
Grupos
7
14
18
21
28
35
42
21.8a±7.2
18.2 a±12.3
26,0c±12.5
16,2b±6.9
12,0 b ±4.5
45,0 a ±23.6
54,6 a ±7.8
(15-32)
(7-32)
(12-44)
(8-27)
(4-17)
(14-77)
(49-66)
B
16.2 a±17.3
15.8 a±17.2
34,8b,c±6.4
6,9 b ±2.3
37,5 a ±7.2
25,6 a ±2.7
61,8 a ±10.4
(5-47)
(7-52)
(30-44)
(5-11)
(30-49)
(22-29)
(54-80)
C
16.6 a±15.9
29.0 a±18.4
25,4c± 11.3
17.4 b ±6.7
24,0 ab ±17.1
15,8 a ±2.9
56,2 a ±9.0
(4-44)
(7-52)
(16-45)
(8-27)
(6-46)
(12-20)
(42-65)
D
-
-
62,4ab±29.8
24,0 b ±7.3
31,0 ab ±12.9
33,4 a ±7.4
51,0 a ±11.2
(18-99)
(14-34)
(12-46)
(30-42)
(40-68)
E
14.4 a±10.2
14.2 a±7.7
65,8a±20.2
58,5 a ±24.4
23,0 ab ±12.4
42,2 a ±13.2
56,6 a ±12.0
(3-30)
(6-23)
(43-92)
(24-93)
(10-39)
(22-59)
(45-59)
A
a,b –médias seguidas de letras diferentes diferem estatisticamente pelo teste de Tukey a 5%.
Aos 18 dias de idade, o grupo E apresentou níveis de triglicerídeos superiores
aos grupos A, B e C (controle, intoxicadas por aflatoxinas e somente vacinadas,
respectivamente), não apresentando, contudo, diferenças em relação ao grupo D
(somente desafiado), o qual por sua vez não revelou diferenças em relação ao grupo B,
indicando que tanto a aflatoxicose como o desafio viral interferiram no metabolismo dos
triglicerídeos.
Aos 21 dias, observou-se provável efeito sinérgico entre aflatoxicoses, vacinação
e desafio viral, detectando-se no grupo E níveis de triglicerídeos superiores a todos os
grupos; porém aos 28 dias de idade, verificou-se que somente o grupo B apresentou níveis
superiores ao controle, não havendo diferenças entre este e os demais grupos. Como
não houve diferenças entre o grupo E o controle, verificou-se que somente o efeito da
aflatoxina interferiu em relação a este parâmetro.
Em relação ao colesterol, observaram-se alterações aos 21, 28 e 35 dias de idade
(Tab.2).
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Veterinária em Foco, v.8, n.2, jan./jun. 2011
TABELA 2 – Níveis de colesterol (mg/dL) no soro de aves controle (grupo A), intoxicadas com aflatoxina
(grupo B), somente vacinadas (grupo C), somente desafiadas com vírus (grupo D) e na interação
entre desafio, vacinação e aflatoxina (grupo E). Valores entre parênteses indicam a variabilidade
dos níveis encontrados.
Idade (Dias)
Grupos
7
14
18
21
28
35
42
A
45.0±2.1
90.4±21.2
167.4±29.7
155.4 a ±23.9
124.0 a ±21.8
126.6 a ±16
55.4±22
(42-48)
(86-114)
(135-215)
(120-188)
(90-140)
(103-148)
(33-69)
B
39.6±9.0
62.3±7.0
176.2±172.7
59.00 b ±25.2
57.4 c ±25.3
91.8 b ±14
89.6±44
(29-52)
(56-72)
(77-482)
(41-96)
(26-85)
(84-116)
(31-144)
C
94.2±69.9
86.6±32.6
206.4±71
137.3 a ±30.5
112.4 a ±33.1
113.8 a ±,21.2
105.2±33.5
(32-208)
(44-121)
(135-319)
(117-184)
(66-150)
(86-139)
(71-154)
D
-
-
203.8±45.2
140.3 a ±21.5
102.6 a ±,29.4
112.8 a,± 6
73.8±20.5
(159-280)
(117-164)
(62-143)
(105-121)
(58-102)
E
110.8±76.8
81.0±19.0
140.4±43.2
46.9 b ±5.5
69.2 b ±,18.2
116.4 a ±,10.6
115.6±42.3
(44-198)
(53-102)
(92-187)
(41-55)
(52-99)
(101-118)
(78-168)
a,b –médias seguidas de letras diferentes diferem estatisticamente pelo teste de Tukey a 5%.
Aos 21 dias de idade, ocorreu redução dos níveis séricos de colesterol nos grupos
intoxicados (B e E) em comparação aos outros grupos; no entanto, como os grupos
C e D (grupos somente vacinado e somente desafiado, respectivamente) não tiveram
diferença significativa em relação ao controle, verificou-se que somente a aflatoxina
possa ter influenciado neste parâmetro.
Aos 28 dias, novamente não houve diferença significativa entre o grupo controle
e os grupos C e D, indicando que o efeito da vacinação ou do desafio viral não tiveram
influência sobre este parâmetro também nesta idade, contudo observaram-se níveis
reduzidos de colesterol nos grupos B e E em relação ao controle; sendo que, ainda, o
grupo D e E não tiveram diferenças entre si; indicando desta forma, o efeito somente
da aflatoxina.
Aos 35 dias de idade, verificou-se que o grupo B apresentou níveis inferiores
somente ao grupo controle, não tendo diferenças em relação aos outros grupos; como os
grupos C, D e E não tiveram diferenças em relação ao controle, é provável que somente
as aflatoxinas tenham influenciado no metabolismo do colesterol nesta idade.
Em relação aos resultados das análises das enzimas de função hepática aspartato
aminotransferse (AST) e gama glutamiltransferase (GGT), verificou-se que somente
houve alterações aos 18 e 21 dias de idade, respectivamente aos 7 e 14 dias após o
desafio viral (Tabela 3). Não foram observadas alterações em relação à enzima ALT
entre os diferentes tratamentos.
Veterinária em Foco, v.8, n.2, jan./jun. 2011
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TABELA 3 – Níveis de aspartato aminotransferase (AST) e gama glutamiltransferase (GGT) em U/I no soro de
aves controle (grupo A), intoxicadas com aflatoxina (grupo B), somente vacinadas (grupo C), somente desafiadas com vírus (grupo D) e na interação entre desafio, vacinação e aflatoxina (grupo E) aos 18 e 21 dias de
idade. Valores entre parênteses indicam a variabilidade dos níveis encontrados.
Idade (Dias)
Grupos
18
21
AST
GGT
AST
GGT
A
231.9 ± 26.3
15.40 ± 7.64b
221.1 ± 60.3ª
14.20 ± 3.9
(196-264)
(6-23)
(202-325)
(9-17)
B
176.3 ± 57.7
27.80 ± 10.8ª
130.7 ± 41.3b
17.40 ± 4.5
(110- 262)
(14-42)
(95-130)
(14-26)
C
222.6 ± 35.7
15.20 ± 5.7b
162.0 ± 12.3ªb
13.74 ± 1.9
(180 – 279)
(10-25)
(152-177)
(11-16)
D
221.8 ± 11.8
17.80 ± 3.8ªb
165.0 ± 40.6ªb
18.6 ± 4.7
(203-233)
(12-21)
(108-202)
(16-27)
E
206.08 ± 43.3
16.80 ± 3.9ªb
117.5 ± 19.0b
17.80 ± 3.6
( 149-259)
(12-21)
(98-142)
( 13-23)
a,b –médias seguidas de letras diferentes na coluna diferem estatisticamente pelo teste de Tukey a 5%.
Aos 18 dias de idade observou-se que o grupo B (aflatoxinas) apresentou os níveis da
enzima gama glutamiltransferase (GGT) superiores aos demais, contudo, sem diferenças
significativas em relação aos grupos D e E, os quais, por sua vez não tiveram diferenças
em suas médias em relação ao grupo controle. Verifica-se assim que, o vírus, a aflatoxicose
ou a associação entre vírus, aflatoxicose e vacinação podem causar alterações nos níveis
da enzima GGT, mas não a vacinação isoladamente.
Aos 21 dias verificou-se que os grupos B e E apresentaram níveis da enzima
AST (aspartato aminotransferase) significativamente inferiores ao controle, porém sem
diferenças em relação aos grupos C e D, os quais por sua vez não apresentaram diferenças
em relação ao controle. Desta forma, observou-se que a aflatoxina foi responsável pela
diminuição dos níveis de AST nesta idade.
DISCUSSÃO
O estudo dos mecanismos das ações tóxicas das aflatoxinas torna-se difícil pela
diversidade de seus efeitos. Determinar que ação é crítica na citotoxicidade e quais efeitos
são secundários é uma tarefa difícil; porém o fígado é considerado como principal órgão
alvo (VIEIRA, 1995).
Diversas pesquisas ao longo dos anos analisaram o comportamento dos níveis
de colesterol durante a aflatoxicose, concluindo que, mesmo em pequenas dosagens,
a intoxicação por aflatoxina provocou uma redução desses níveis (MAURICE et al.,
1983; HUFF et al., 1986; GIROIR et al., 1991; RAINA et al., 1991; MANI et al., 1993,
138
Veterinária em Foco, v.8, n.2, jan./jun. 2011
SHUKLA; PACHAURI., 1995, SANTURIO et al., 1999; FRANCISCATO, 2006). Os
resultados de nossas pesquisas aos 21, 28 e 35 dias concordaram com estes autores,
observando-se hipocolesterolemia nestas idades e, ainda, aumento dos níveis da enzima
AST aos 18 dias e redução dos níveis de AST aos 21 dias, evidenciando lesão hepática.
Na doença infecciosa bursal, embora possa ocorrer lesão hepática, a mesma foi
considerada como transitória (LEY et al., 1983). No presente estudo, observou-se que
o vírus ou a aflatoxicose podem ter causado aumento dos níveis da enzima GGT, a
qual pressupõe a proliferação de ductos biliares, lesão típica de aflatoxicoses, porém o
desafio viral não exerceu influência sobre os níveis séricos de colesterol, o que se opõe
aos resultados encontrados na literatura, que por sua vez divergem entre sí. Ley et al.
(1983) verificaram níveis reduzidos de colesterol no terceiro dia após o desafio viral,
sugerindo consequência de lesão hepática; enquanto Panigrahy et al. (1986) e Saukas
(1993) encontraram aumento dos níveis, cinco dias após o desafio, levantando a hipótese
de hipoproteinemia pelo menor consumo de ração ou menor absorção de nutrientes.
A variação entre os resultados apresentados acima e os obtidos no presente
estudo pode ser devido à variação antigênica das diferentes cepas virais utilizadas nos
experimentos, pois os vírus de campo da doença infecciosa da bursa, pressionados com
o grau de imunização, começaram a sofrer mutações (BERNARDINO, 2000). Desta
forma, a patogenicidade pode variar de acordo com a cepa viral, o que se refletirá nas
lesões, sinais clínicos e até mortalidade dos lotes. A cepa viral utilizada no presente
experimento foi classificada como pertencente ao grupo molecular 15 (G15), tendo
sido relatada por Lunge et al. (1997) e geralmente relacionada com casos subclínicos da
doença, cuja patogenicidade depende do manejo adotado e de outros fatores associados
(BERNARDINO, 2000).
Dentre os trabalhos pesquisados, os níveis séricos de triglicerídeos variaram:
Giroir et al. (1991) e Panigrahy et al. (1986) não observaram alteração neste parâmetro
em aves intoxicadas por aflatoxinas; enquanto Huff et al. (1986) e Santurio et al. (1999)
encontraram níveis aumentados.
Na presente pesquisa, observaram-se alterações dos níveis de triglicerídeos aos 18,
21 e 28 dias de idade. Aos 18 dias de idade, verificou-se que tanto a aflatoxicose quanto o
desafio viral provocaram aumento desses níveis; aos 21 dias, observou-se efeito sinérgico
entre aflatoxicose, desafio viral e vacinação; porém aos 28 dias, verificou-se que somente
o efeito da aflatoxina interferiu em relação a este parâmetro.
A hipertrigliceridemia observada, provocada tanto pela aflatoxicose como pelo
desafio viral (4 dias após o desafio) como pela interação entre os agentes aos 21 dias (7
dias após o desafio), pode ser devido a uma possível diminuição do consumo de ração
(não mensurada no presente experimento), pois de acordo com Marzzoco e Torres
(1999), em condições de baixa ingestão calórica, há o estímulo para a degradação dos
triglicerídeos que estão nos tecidos adiposos a fim de suprir a demanda energética dos
tecidos, ocorrendo assim a hidrólise dos triglicerídeos com consequente liberação de
ácidos graxos na corrente sanguínea e, por conseguinte, aumento de seus níveis, detectados
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pela dosagem sérica. Aos 28 dias, não mais se observou o efeito do vírus, provavelmente
devido às condições experimentais de manejo controladas, não permitindo desta forma
a exacerbação de seus efeitos.
CONCLUSÕES
O desafio viral não exerceu efeitos sobre os níveis de colesterol, porém refletiu-se
em aumento dos níveis de triglicerídeos em associação com a aflatoxicose. A aflatoxicose,
por sua vez, influenciou tanto nos níveis de colesterol como triglicerídeos nas aves
analisadas.
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Recebido em: fev. 2011
Aceito em: maio 2011
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