Revista Eletrônica Novo Enfoque, ano 2011, v. 12, n. 12, p. 32 – 38 ADESÃO AO TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO DO PACIENTE HIPERTENSO ASSISTIDO POR UM PROGRAMA DE HIPERTENSÃO DE UM HOSPITAL MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO Mônica Vieira Mano de Souza, Etiene de Aguiar Picanço, Gisele Moura Messias, Andréa Bittencourt de Santana Teixeira – UCB/RJ RESUMO Em um ambulatório público de cardiologia, 100 (cem) pacientes com Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) foram acompanhados para controle da pressão arterial e foram abordadas as intervenções não farmacológicas como parte do tratamento. Como resultado após o diagnóstico da HAS, os pacientes mudaram o estilo de vida, como abandono do tabagismo e do consumo de álcool, mudaram o hábito alimentar e iniciaram a prática de atividade física. Os programas de hipertensão com os grupos são importantes para a sedimentação e adesão ao tratamento não farmacológico. Outras pesquisas complementares são necessárias, relacionando o estilo de vida com o controle da pressão arterial. Palavras-chave: hipertensão, tabagismo, álcool, atividade física e dieta. ABSTRACT In a cardiology public ambulatory, one hundred patients with Systemic Arterial Hypertension were accompanied to control blood pressure and not pharmacological interventions were approached as part of the treatment. As a result, patients after being diagnosed changed their life style as smoking and alcohol abandonment, their food habit and they started to practice physical activity. The programs of hypertension, with the groups, are important for the sedimentation and adherence to non-pharmacological treatment. Other studies are needed, linking the lifestyle to control blood pressure. Key words: hypertension, smoking, alcohol, physical activity and diet. INTRODUÇÃO A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma doença altamente presente na população adulta, cuja prevalência no Brasil oscila entre 22% e 44%. 1, 23 A HAS é uma doença que atinge aproximadamente 30 milhões de brasileiros e cerca de 50% destes não sabem que são hipertensos por serem muitas vezes assintomáticos, sendo considerada importante fator de risco para as doenças cardiovasculares ateroscleróticas, incluindo acidente vascular cerebral, doença coronariana, insuficiência vascular periférica e cardíaca. Mesmo a população portadora de hipertensão leve está sob o jugo do risco aumentado. 2,3 O hipertenso é todo indivíduo adulto, maior de 18 anos, com valores de pressão arterial sistólica igual ou maior do que 130 mmHg ou com pressão arterial diastólica igual ou superior a 85 mmHg, em pelo menos duas medidas realizadas em ocasiões diferentes. 4 O controle da hipertensão arterial envolve o tratamento farmacológico e não farmacológico. O tratamento farmacológico é indicado para hipertensos moderados e graves, e para aqueles com fatores de risco para doenças cardiovasculares e/ou lesão importante de órgãosalvo. No entanto, poucos hipertensos conseguem o controle ideal da pressão com um único agente terapêutico e, muitas vezes, faz-se necessária a terapia combinada, principalmente em indivíduos idosos e com comorbidades relevantes. 5 A terapia medicamentosa, apesar de eficaz na redução dos valores pressóricos, da morbidade e da mortalidade, tem alto custo e pode ter efeitos colaterais motivando o abandono do tratamento. 6 Intervenções não farmacológicas têm sido apontadas na literatura pelo baixo custo, risco mínimo e pela eficácia na diminuição da pressão arterial. Entre elas estão: a redução do peso corporal obtida através das mudanças na dieta habitual, a restrição alcoólica, o abandono do tabagismo e a prática regular de atividade física7, moderação no consumo de álcool, implementação de atividades físicas, redução do consumo de sal, aumento do consumo de frutas e hortaliças e a diminuição do consumo de alimentos gordurosos. 13, 24 Diante do exposto, é imperativo que pesquisas sobre a adesão ao tratamento não farmacológico do paciente hipertenso sejam realizadas em âmbito nacional, a fim de intensificar o controle da pressão arterial e de reduzir as complicações provocadas pela hipertensão arterial. 33 MÉTODO Trata-se de um estudo transversal, com cerca de 100 indivíduos hipertensos de ambos os sexos, com idade igual ou superior a 25 anos, residentes na área urbana do Município do Rio de Janeiro, Brasil, que faziam acompanhamento em ambulatório de cardiologia em um Hospital da rede municipal do Rio de Janeiro, inseridos no Programa de Hipertensão. Os indivíduos da amostra foram classificados e agrupados por sexo e faixa etária e as informações foram obtidas por meio de questionário aplicado por entrevistadores. O questionário foi composto por questões fechadas, nas quais foram abordados temas sobre a dieta, tabagismo, consumo de bebida alcoólica e prática de atividade física. Os indivíduos assinaram um termo de consentimento Livre e esclarecido, nos termos da Resolução 196/96 do CNS, autorizando a utilização dos seus dados na elaboração deste artigo. RESULTADOS A amostra foi composta por 100 pacientes hipertensos, sendo desses 80% do sexo feminino e 20% do sexo masculino. Segundo a faixa etária, 42% estavam com idade entre 51 a 60 anos, enquanto que 45% da amostra eram compostos por pacientes com idade superior a 60 anos (Tabela 1). Tabela 1. Distribuição percentual do perfil apresentado pelos pacientes entrevistados de um Hospital Municipal do Rio de Janeiro INDICADORES DEMOGRÁFICOS TAMANHO DA AMOSTRA (%) SEXO Masculino 20 Feminino 80 FAIXA ETÁRIA 25 – 30 1 31 – 40 1 41 – 50 11 51 – 60 42 > 60 45 Quanto ao estilo de vida, após o diagnóstico da HAS, 8% dos pacientes relataram ainda serem tabagistas, contudo, 35% relataram o abandono deste hábito; 19% continuaram a consumir 34 algum tipo de bebida alcoólica; 71% ainda não praticavam atividade física, enquanto que 78% mudaram seus hábitos dietéticos. DISCUSSÃO Foi constatada a predominância do sexo feminino, e este dado pode ser justificado pela maior utilização dos serviços de saúde por mulheres, assim como foi demonstrado em alguns inquéritos brasileiros. As mulheres geralmente têm maior percepção das doenças, apresentam maior tendência para o autocuidado e buscam mais assistência médica do que os homens, o que tenderia a aumentar a probabilidade de ter a hipertensão arterial diagnosticada. 8 A maioria dos entrevistados apresentava idade superior a 60 anos (45%), o que retrata maior prevalência dessa patologia na população idosa, merecendo atenção especial por parte dos profissionais de saúde e governo, uma vez que esse grupo etário é mais suscetível a complicações, devido ao acúmulo dos fatores de risco. 9 O tabagismo é a maior causa de mortalidade cardiovascular no mundo. 10 Embora a cessação do tabagismo não reduza a pressão arterial,11 o abandono do hábito é, provavelmente, a medida isolada mais efetiva para a redução do risco de doenças cardiovasculares.12,13 O consumo abusivo de álcool está associado ao maior risco de acidente vascular cerebral,14 que representa a complicação mais grave da hipertensão arterial.15 Por essas razões, a cessação do tabagismo e a moderação do consumo de álcool são recomendadas, tanto para a prevenção primária quanto para a prevenção secundária. A literatura aponta que a ingestão de bebidas alcoólicas em excesso (três ou mais doses ou mais de 40g de etanol por dia) está associada ao aumento da pressão arterial. 16 Supõe-se que o álcool quando ingerido em altas doses, seja um vasoconstritor, contribuindo desta maneira para a elevação da pressão arterial. 17 Inúmeros benefícios da prática de atividade física foram encontrados nos estudos, tais como: diminuição da tensão emocional, diminuição da pressão arterial, redução dos lipídios plasmáticos e controle do peso corporal. Recomenda-se a prática de exercícios físicos assistidos por um profissional qualificado, composta de preferência por exercícios de intensidade leve ou moderada, de forma que possibilitem prevenir a hipertensão arterial e auxiliar no controle da hipertensão já instalada. 13 35 A mudança nos hábitos alimentares, como integrante do tratamento não farmacológico é de suma importância, pois estudos mostram que cada quilo perdido corresponde à diminuição de um milímetro de mercúrio da pressão arterial19, enquanto outros autores verificaram que o excesso de peso resultaria no aumento do risco de desenvolver hipertensão arterial em 2 a 6 vezes. 20 Os pacientes deste estudo inseridos no programa de controle da hipertensão arterial aderiram às orientações fornecidas pelos profissionais, já que 78% relataram mudanças nos hábitos alimentares. Dietas ricas em frutas e hortaliças e com produtos com baixo teor de gorduras diminuem o risco cardiovascular, contribuem para a redução do peso e atuam diretamente na redução da pressão arterial. 13 Como estratégia de prevenção primária e secundária, recomenda-se a ingestão diária de cinco ou mais porções de frutas e hortaliças, correspondendo a cerca de 400 g.13,21 A restrição de sal tem efeito anti-hipertensivo, sobretudo, se combinada a outros hábitos alimentares saudáveis, e pode levar à redução da dose da medicação empregada para reduzir a pressão arterial. 13 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os programas de hipertensão com os grupos são importantes para a sedimentação e adesão ao tratamento não farmacológico, já que este tem menor custo e engloba mudanças comportamentais que provavelmente irão influenciar diretamente no controle da pressão arterial. Outras pesquisas complementares são necessárias, relacionando o estilo de vida com o controle da pressão arterial. REFERÊNCIAS 1. 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