Costa brasileira Amazônia no mar ONU autoriza Brasil a avançar seu território marítimo em 712,5 mil km² , mas governo pleiteia uma extensão maior, de olho na retirada de petróleo e gás, além da proteção do litoral e preservação ambiental Ullisses Campbell Da equipe do Correio O Brasil está prestes a ter uma área equivalente a Amazônia em pleno mar. O governo pleiteia junto às Organizações das Nações Unidas (ONU) estender seu patrimônio marítimo em 950 mil km². Atualmente, o território brasileiro no Oceano Atlântico tem 3,6 milhões km² de extensão. Com o acréscimo, as águas sob jurisdição do Brasil ficarão com 4,5 milhões km² , mesma dimensão da Floresta Amazônica. Faz 17 anos que o Brasil vem realizando estudos na área marítima requisitada à ONU. Em agosto de 2004, o governo apresentou formalmente o pedido e, no mês passado, saiu uma decisão: foram concedidas 75% (712,5 mil km²) da extensão pretendida em forma de recomendações, ou seja, o Brasil assume a área requisitada, mas com uma série de compromissos que ainda não foram revelados. Agora, o governo federal vai reformular o pedido para tentar conseguir os 25% restantes. O Brasil é o primeiro país do mundo a conseguir aumentar seu território marítimo desde que a ONU criou a Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC), em 1982. A Rússia formalizou recentemente solicitação semelhante, mas teve seu pleito negado por entrar em divergências com outros países. No caso brasileiro, a CLPC levou três anos para avaliar o pleito. A comissão do governo é formada por diplomatas e especialistas da Marinha e da Petrobras, além de representantes da comunidade científica. Interesses Segundo o governo, o Brasil possui interesses importantes e distintos na área que está sendo requisitada. Cerca de 95% do comércio exterior brasileiro, por exemplo, passam por essa massa líquida, envolvendo mais de 40 portos e mais de 20 mil embarcações de importação e exportação e movimentando um valor superior a US$ 229 bilhões por ano. O governo brasileiro também está de olho na retirada de petróleo e gás, elementos de fundamental importância para o desenvolvimento do país, na área marítima a ser estendida. Há outros interesses no setor econômico. O Brasil retira atualmente do mar cerca de 85% do petróleo que consome. Em números, são 1,6 milhões de barris por dia que, ao ano, somam cerca de US$ 35 bilhões. Já os grandes depósitos de gás natural também dependem do oceano, principalmente da bacia de Santos e do litoral do Espírito Santo. Atualmente, a produção de gás natural, no mar, é da ordem de 17 mil m3 por dia. A atividade pesqueira é outra potencialidade da chamada Amazônia Azul. No mundo, o pescado representa valiosa fonte de alimento e de geração de empregos. Em termos de futuro, estima-se que, até 2020, a produção pesqueira mundial cresça 40%, saindo das atuais 100 milhões de toneladas para 140 milhões. No Brasil, a aqüicultura é a principal aposta da produção pesqueira, com o cultivo de espécies em fazendas no litoral e em águas interiores. Para o pesquisador Humberto Cassini, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), se o país conseguir aumentar a zona marítima, a atividade pesqueira será beneficiada também. “Poderemos explorar e aproveitar os recursos minerais do solo e subsolo marinhos, entre eles os nódulos e sulfetos polimetálicos, crostas e hidratos de gás, importantes para a indústria”, enumera Cassini. Proteção O comando da Marinha destacou que há uma cobrança crescente do governo e da sociedade para uma maior proteção do litoral. Os países tecnologicamente mais bem sucedidos já adotaram algumas iniciativas concretas para a conservação de seus mares. No Brasil, esse trabalho ainda é capenga. É comum, por exemplo, a guarda costeira flagrar embarcações estrangeiras pescando na Zona Econômica Exclusiva (ZEE). “A Marinha do Brasil está pronta para gerenciar e controlar áreas marítimas. Mas, precisamos estar bem aparelhados, equipados e com os meios e os recursos financeiros que se fazem necessários”, enfatiza o comando da Marinha. De acordo com o Centro de Comunicação Social da Marinha, há 10 anos o orçamento da área “tem ficado aquém do que é preciso, impossibilitando a disponibilização de valores suficientes ao funcionamento, preparo e aparelhamento, acarretando a perda da nossa capacidade operacional”. A instituição militar prevê que, em médio prazo, caso seja mantida a tendência de redução no orçamento, “a situação do aprestamento do Poder Naval tornar-se-á crítica, provocando o esgotamento da vida útil de numerosos meios, com a sua conseqüente baixa”. E acrescenta: “Desse modo, serão canalizados os maiores esforços para recuperar significativamente o seu patamar, de tal forma que atenda às nossas demandas, já que o orçamento de 2007 é de R$ 1,250 bilhão e o patamar anual necessário e desejável para a Força é de cerca de R$ 1,8 bilhão”. Na Amazônia Azul, os limites das águas jurisdicionais são linhas sobre o mar que não existem fisicamente. O que define esses limites é a existência de navios patrulhando-as ou realizando outros tipos de ações. O Ministério da Marinha reconhece que a proteção desse espaço é uma tarefa complexa. São 4,5 milhões km² de área a serem vigiados. Se a ação for tímida, pode ocorrer todo tipo de ação criminosa, como pirataria, contrabando, exploração da fauna e até despejos ilegais de material poluente. Apesar de não ter saído uma decisão final na ONU sobre toda área que o Brasil almeja, a Marinha já começou a demarcar o espaço que foi liberado no primeiro momento. Para os defensores do meio ambiente, o maior benefício será a proteção das nove espécies de baleias que freqüentam o litoral em busca de águas quentes, que são ideais para a reprodução. “Essas baleias são caçadas por navios baleeiros logo que saem da área de jurisdição brasileira. Com a nova extensão, a fiscalização será mais eficiente”, diz o biólogo Carlos Chagas, do projeto Baleia Franca. Jornal CORREIO BRAZILIENSE-08/06/2007