AS SUGESTÕES HIPNÓTICAS

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AS SUGESTÕES HIPNÓTICAS
Joel Priori Maia
Consideremos SUGESTÃO todo e qualquer estímulo sonoro emitido pelo profissional
ao paciente antes, durante e depois da instalação do estado hipnótico, capaz de gerar
neste último uma mudança em suas atitudes e em seu comportamento. Nas áreas da
saúde em que é aplicada a hipnose o estímulo sonoro mais utilizado é constituído pela
PALAVRA geralmente pronunciada de maneira débil, rítmica, monótona e persistente.
Historicamente, o pioneirismo na utilização desse termo coube a José Custodio de Faria,
que concluiu da inexistência do magnetismo, afirmando que todo o procedimento obtido
durante o sono mesmérico era na realidade fruto de sugestão recebida pelo sujeito sob o
comando do agente que o induzia e o mantinha sob “transe”.
São descritas na atualidade as seguintes categorias de SUGESTÃO:
a) INDUTORAS– as que são feitas desde o rapport até a instalação do estado
hipnótico.
b) MANTENEDORAS – as que mantém o indivíduo em estado hipnótico.
c) PÓS - HIPNÓTICAS – as que levam o paciente a executar determinadas ações
após o término da hipnose.
As sugestões podem ainda ser classificadas em DIRETAS e as DIRETIVAS DE
ESCLARECIMENTO. As primeiras são consideradas impositivas e foram muito
empregadas para a modificação de sintomas e as segundas são consideradas permissivas
permitindo melhor participação do paciente no processo e abreviando o tempo de
aplicação, com melhores resultados.
A sugestão direta tem aplicação em situações de urgência e emergência, sendo
utilizada também em vários setores da clinica médica, anestesia, cirurgia, obstetrícia, e
pronto socorro, fornecendo o apoio necessário ao paciente que se sente seguro com o
hipnotizador no comando do procedimento. É também comumente utilizada em
odontologia e na fisioterapia.
Algumas técnicas baseadas na hipnoterapia diretiva de esclarecimentos, têm sido
utilizadas com sucesso na profilaxia das doenças psíquicas dos desajustes dos grupos
sociais e familiares provenientes de uma série de reações emocionais como recalques,
inibições, tensões e complexos.
A sugestão direta geralmente é considerada como impositiva e a diretiva de
esclarecimentos como permissiva.
Na primeira, o profissional impõe sugestões que acredita visando obter os resultados
que espera e na segunda, conta com a colaboração do paciente para obter as respostas
esperadas, dando-lhe maior liberdade de expressão e participação no processo.
Descrevem-se três tipos de sugestão hipnótica:
a) Ideomotoras – determinam ações particulares, como a que se obtém na
levitação do braço ou na catalepsia palpebral.
b) Desafiadoras - Testam o controle sobre o sistema motor volitivo do paciente
(não conseguir abaixar o braço ou abrir as pálpebras).
c) Cognitivas – Envolvem atividade mental cognitiva (amnésia, alucinação,
confabulação, delírio, conversar sem acordar, anestesia, hiperestesia, etc).
As sugestões dependem da imaginação ou seja, da atenção, concentração e memória
ativadas no sentido do paciente sentir-se desenvolvendo determinada ação ideomotora.
Dependem também da motivação e do relacionamento profissional – paciente (rapport)
antes e durante o desenvolvimento do estado hipnótico.
Ainda, podem ser desinibidoras ou ativadoras em relação às atitudes desempenhadas
pelo paciente durante o estado hipnótico.
As inibidoras inibem atos e ações que o paciente apresenta naturalmente no dia a dia,
como por exemplo, no tratamento de hábitos mentais como onicofagia, tricotilomania,
transtornos obsessivos e compulsivos, uso de chupeta e drogadicção.
As ativadoras produzem liberação e desinibição do comportamento que o paciente
naturalmente apresenta naturalmente durante sua vida, como por exemplo, passar da
timidez à extroversão, do medo à coragem.
Emile Coué desenvolveu determinados postulados para a utilização da sugestão e que
permanecem atuais:
1) LEI DA ATENÇÃO CONCENTRADA: “Concentre toda a sua atenção e o
seu esforço de maneira firme e contínua e o seu subconsciente trabalhará para
que se realize”.
2) LEI DO ESFORÇO CONTRÁRIO: “Se você acredita ser incapaz de realizar
alguma coisa, quanto mais tentar fazê-la, mais distante ficará de sua realização.
Portanto, convença a si mesmo de que é capaz”
3) LEI DO SENTIMENTO DOMINANTE: “Se sua realização estiver associada
a um sentimento ou a uma emoção, ela ocorrerá com maior rapidez e
intensidade”. Exemplo: Pessoa à margem de um rio, vê alguém se afogando.
Atira-se na água e o resgata. Só depois se lembrará que não sabe nadar.
Esta lei explica também porque, durante um surto de agitação psicomotora, um
psicótico franzino adquire força descomunal, necessitando do concurso de várias
pessoas para ser contido.
Estes fatos nos remetem aos circuitos ativados pela sugestão através da imaginação e
dos fenômenos observados durante o estado hipnótico, como os alucinatórios, por
exemplo.
Estudos recentes demonstraram estreita relação entre a sugestão e o girus anterior do
cíngulo, que participam tanto na fixação quanto na evocação da memória,
desempenhando importante papel no planejamento e na realização dos atos.
O Giro Anterior do Cíngulo (GAC) tem uma série de atribuições entre as quais se
destacam:
a) Durante a ativação de uma imagem mental (com ou sem o concurso de emoção),
ativa-se o sistema víscero - motor (SNA) no procedimento hipnótico, através da relação
entre os circuitos do GAC e da substância cinzenta peri-aquedutal;
b) O GAC participa do processamento das informações cognitivas, modulando-as com
as que geram comportamento emocional;
c) Participa também das emoções relacionadas com a dor física. O sofrimento que
decorre das emoções negativas surgem da associação com o hemisfério cerebral direito;
d) Descreveu-se circuitos que se relacionam com a nocicepção no tálamo, ínsula, córtex
pré- frontal, córtex somato - sensitivo e GAC direito;
e) Estímulos nociceptivos estimulam o GAC esquerdo;
f) O aprendizado na defesa em situações de perigo depende da plasticidade do giro
cíngulo e do tálamo sob a modulação do núcleo amidalóide do sistema límbico. A
estimulação do GAC direito o ativa modificando esta resposta durante a
dessensibilização dos comportamentos fóbicos.
Palavra
como som
Estímulo
débil
rítmico
Contínuo
monótono
persistente
Ativação
da audição
Percepção do
conteúdo
forma
consistência
semântica
da palavra
Supressão
de uma série
de estímulos
proprioceptivos
(visão,audição,
tato e olfato)
Ativação da
imaginação
através da
sugestão
Distorção
das
sensações
Relaxamento
muscular
(catalepsia)
imobilidade
Inibição do
analisador
cinestésico
Fases
Etapas progressivas
Hípnicas
até o sonambulismo
A PALAVRA COMO VEÍCULO DE TRANSMISSÃO DA SUGESTÃO
Desde que consideremos o que ocorre durante a hipnose como uma atividade neuro psico - fisiológica integrada e interativa, é de fácil entendimento compreender-se que as
vias e estruturas nervosas regulam, dirigem, encaminham e “permitem” a produção do
estado de “transe”.
O estado de hipnose em que o paciente se encontra quando sob a ação de
estímulos originados de um hipnotista e que é semelhante ao sono, resulta da interação
entre o profissional e o cliente. O sono se diferencia do transe pela ocorrência neste de
uma série de fenômenos de variada natureza,.
Muitos são os estímulos que podem ser utilizados pelo hipnotista, mas o
instrumento fundamental desta inter-relação geralmente é a palavra, pronunciada de
modo débil, rítmico, monótono e persistente. Consideremos ainda, que a palavra é um
som emitido pelas cordas vocais e modulado pela cavidade oral e pelas fossas nasais
que atuam como ressonadores, pela língua e até mesmo pelos dentes.
Como som pronunciado e emitido, tem as suas qualidades fisiológicas (altura,
timbre e intensidade) e esta forma de comunicação tem que ser ouvida, entendida e
compreendida pelo paciente levando-o do estado hipnoidal, aos mais profundos graus
do procedimento, de acordo com a sua sensibilidade e susceptibilidade.
Instala-se o estado hipnótico com sugestão, solicitando-se ao paciente concentrar sua
atenção sobre um determinado estímulo que pode ser a voz suave, monótona, rítmica,
repetida e persistente do profissional. Sua voz pode ser substituída por outros estímulos
sensoriais impessoais (auditivos, visuais, táteis ou olfativos), desde que sejam de baixa
intensidade, monótonos, repetitivos e persistentes. Os estímulos psíquicos e
proprioceptivos pertencem à mesma categoria, mas estes por si só não produzem os
fenômenos que se observam durante a instalação e manutenção do estado hipnótico. È
necessária a utilização da imaginação, concentração e atenção tanto do profissional
quanto do paciente. Conte-se ainda as reações emocionais de ambos quando se propõem
a utilizar o procedimento. Isto pode ser conseguido através do rapport, com as
explicações e bom entendimento entre os participantes. O profissional deve estar
consciente do procedimento que vai utilizar no paciente.
Por sua vez, o paciente deve estar motivado internamente ou afetivamente inclinado
para tal concentração, situação em que o estímulo hipnogênico é isolado na consciência
excluindo-se a maioria dos outros estímulos que possam desfocalizar a atenção. Esta
ocorrência é denominada de "atenção seletiva" e é produzida pela formação reticular
ascendente (FRA), que é também responsável pela manutenção da vigília, bem como
pelas atividades do hipotálamo e sistema límbico. (1)
O conjunto Formação Reticular Ascendente, hipotálamo e sistema límbico atua
simultaneamente e por essa razão é também denominado de Sistema Reticular
Ascendente (SRA).
As emoções e seus estereótipos
comportamentais localizam-se no
sistema límbico, e na expressão
visceral intervém o hipotálamo,
controlando as vísceras e o
comportamento instintivo através dos
sistemas
nervoso autônomo e
neuroendócrino.
A Formação Reticular Ascendente é o
elemento de interligação entre o
sistema límbico, o hipotálamo e o
neocórtex (1)
Toda informação sensorial é percebida
pelo córtex consciente e esta
informação também vai à formação
reticular através de fibras colaterais
oriundas das vias sensoriais ascendentes. Através da FRA as informações sensoriais são
também comunicadas ao sistema límbico e ao hipotálamo, e aí as emoções associadas e
as reações viscerais e instintivas são elaboradas,sendo então adicionadas à experiência
cognitiva do córtex, integrando o mosaico emocional e as motivações básicas (7,8). O
córtex tem a possibilidade de retroagir sobre esta energia afetiva motivacional e
modular cognitivamente o comportamento(1).
No estado hipnótico os fenômenos observados têm origem notadamente límbica. Os
fenômenos de rememoração (recuperação de memórias esquecidas ou reprimidas) e
revivificação (ressurgência da experiência emocional vivenciada em evento
rememorado), são comumente reunidos no termo "regressão". As amnésias espontâneas
experimentadas quando se sai do estado hipnótico; a aprendizagem acelerada que ocorre
neste estado; as analgesias; a estimulação do sistema imunológico; as alterações
subjetivas do esquema corporal e as vivências alucinatórias induzidas por sugestão, são
fenômenos típicos associados à formação hipocampal do sistema límbico. Esta região é
cresponsável pela formação da memória, pela aprendizagem, pela imagem do corpo
(esquema corporal) e pela regulação do sistema imunológico (3).
Compreende-se, agora, como a hipnose favorece a liberação de emoções reprimidas
juntamente com a memória do evento que a gerou. A repressão de lembranças
desagradáveis e as defesas que impedem que elas aflorem é um processo ativo do córtex
pré-frontal (sede do ego e da personalidade), e este processo consome energia e
desequilibra o balanço energético das funções psíquicas e viscerais reguladas pelo
sistema nervoso central. O sistema límbico se vê, assim, impedido de descarregar a
estase energética e regular o equilíbrio e a distribuição da energia dinâmico-afetiva.
Por outro lado, o indivíduo hipnotizado é levado a relaxar, soltar-se,despasmodizar-se,
recuperando o tônus normal e o controle psicomotor, e como conseqüência, tranqüiliza
seu terreno mental. Estes efeitos estão relacionados à regularização da atividade da
amígdala, núcleo associado ao hipocampo e funcionalmente ligado ao hipotálamo e
sistema nervoso autônomo. Quando a amígdala está irritada (a neurose é uma de suas
causas, talvez por provocar focos hiperativos no neocórtex) ela produz medo, ansiedade,
ira, comportamento agressivo, e alterações no comportamento sexual (6). A
neutralização desta irritação produz uma reação parassimpática global do organismo que
também amortece a hiperatividade cortical produzindo uma sensação de serenidade e
tranquilidade generalizadas na esfera mental.
A Formação Reticular constitui um “embalse internuncial” localizado nos
metâmeros medulares, cumprindo função dentro do Sistema Reticular Ativador
Descendente, com a propriedade de inibir certos estímulos nocifensivos subliminares
que perturbam o Sistema Nervoso Autônomo. Assim, sem tomarmos consciência,
mudamos de posição, quando esta é incômoda, movendo músculos que se contraem.
Não temos consciência desta estimulação que, entretanto, produz aferência estimulante
inespecífica que determina o tônus funcional da córtex cerebral.(4)
O Sistema Reticular é ativado por meio das vias colaterais que por sua vez são ativadas
pelos estímulos periféricos. O Sistema de Projeção Específico (vias especificas) não tem
por si só a capacidade de estimular a córtex no sentido de ativá-lo difusamente
produzindo vigília.(3)
Conclui-se que a hipnose constitui um método de escol para o tratamento de
transtornos de natureza física ou emocional podendo ou não ser associada ao uso de
medicamentos ou outros procedimentos psicoterápicos.
Os estudos da neuropsicofisiologia fazem com que a hipnose não seja simplesmente um
tratamento psicoterápico, mas sim neuropsicossomático, se levarmos em consideração o
relacionamento mente-corpo e as relações do indivíduo com o ambiente em que se
insere.
Referências Bibliográficas
1. Câmara Fernando Portella –Neurofisiologia da Hipnose e Estados Correlatos –
Apostila de aulas – Hemeroteca da Soc. de Hipnose Médica de São Paulo - 1-6, 1995.
2– Akstein David – Hipnologia – vol 1 – Ed. Hypnos Ltda R.J. – 1973.
3. Gilman, S. & Newman, S.W. Clinical Neuroanatomy and neurophysiology. Davis
Co, Filadélfia, cap. 23 e 25, 1992.
4. Maia Joel P.- Aspectos Neurofisiológicos da Hipnose –Manual Brasileiro de Hipnose
Clinica- Editor Marlus Vinicius Costa Ferreira- 3 .55-69- Ed. Atheneu- SP 2013
5. Guyton, A.C. Neurociência Básica. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, cap. 20 e 21,
1993.
6.Marto J.M., Maia J.P., Pereira E.-Elementos Anatomicos e neurofuncionais do Estado
Hipnótico – .4. 97:119- Lidel Edições Tecnicas – Lisboa- 2013
7.LeDoux, J.E. The Amygdala: Contributions to fear and Stress. The Neuroconsciences,
6: 231-237, 1944.
8. MacLean, P.D. Psychosmatic Disease and the "Visceral Brain". Psychos. Medicine,
11: 338-353, 1949.
9. Papez, J.W. A proposed Mechanism of Emotion. Arch. Neurol & Psychiat., 38: 725743, 1937.
10. Pavlov, I.La Psychopatologia et la Psychiatrie: Ouevres choises. Edition en Langues
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11. Moraes Passos A. C. – Isabel C. Labate – Hipnose Considerações Atuais – Ed.
Atheneu – S.P. – 1998
12. Burza, J.B. Cérebro; Neurônio, Sinapse: Teoria do Sistema Funcional de K. Anokin,
Ícone, São Paulo, 1986
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