O Idoso Renal Crônico em Hemodiálise: a Severidade da Doença e

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Artigo Original
O Idoso Renal Crônico em Hemodiálise: a Severidade da Doença e sua
Relação com a Qualidade de Vida
Chronic Kidney Disease in the Elderly on Hemodialysis: Severity of
Disease and Relationship with Quality of Life
Fabiana de Souza Orlandi
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, MS, Brasil
RESUMO
Introdução: O número de idosos renais crônicos é expressivo em nosso país. Objetivo: O objetivo da pesquisa foi verificar em uma população de idosos
com Insuficiência Renal Crônica Terminal (IRCT) em hemodiálise ambulatorial, a relação entre uma medida genérica de qualidade de vida (SF-36) e a
medida de severidade da IRCT (ESRD-SI – Índice de Severidade da IRCT). Métodos: Trata-se de um estudo correlacional de corte transversal, realizado
em duas clínicas de terapia renal substitutiva, com 100 idosos portadores de IRCT, em tratamento hemodialítico há pelo menos seis meses. Resultados:
A análise mostrou que as dimensões do SF-36 correlacionaram-se negativamente com a severidade da IRCT. Discussão/Conclusões: Em relação à
magnitude das correlações, observou-se correlação negativa de moderada magnitude com a capacidade funcional, e de fraca magnitude com aspectos
físicos, estado geral de saúde e aspectos emocionais. Além disso, metade das dimensões conseguiu discriminar os sujeitos com severidade suave e nãosuave da IRCT, com exceção dos aspectos físicos, vitalidade, aspectos emocionais e saúde mental.
Descritores: Qualidade de vida. Insuficiência renal crônica. Idoso.
ABSTRACT
Introduction: There is a large number of elderly with chronic kidney disease in our country. Objective: The objective of this research was to identify, in an
elderly population with end-stage renal disease (ESRD) undergoing ambulatory hemodialysis, the correlation between a generic index of quality of life (SF36) and the severity index of the ESRD-SI. Methods: This was a cross-sectional study conducted at two clinics of renal replacement therapy which involved
100 elderly patients with ESRD in hemodialysis for at least six months. Results: The SF-36 showed a negative correlation with the severity of the ESRDSI. Discussion/Conclusions: this study has demonstrated a moderate negative correlation with the functional capacity and a weak negative correlation with
physical aspects, overall health and emotional aspects. In addition, half of the dimensions successfully distinguished subjects with mild and severe ESRD,
with the exception of physical and emotional aspects, vitality and mental health.
Keywords: Quality of life. Chronic renal failure. Elderly.
INTRODUÇÃO
O envelhecimento populacional é um fato incontestável1 e torna as pessoas mais vulneráveis aos processos patológicos, decorrentes de múltiplos fatores,
levando o idoso a apresentar doenças como as cardiovasculares, respiratórias, neoplásicas, cerebrovasculares,
osteoarticulares e endócrinas, que podem, ou não, estar
associadas, caracterizando as co-morbidades2.
Nos últimos 20 anos, observa-se um crescimento
no número de idosos com insuficiência renal, que ocorre
concomitante ao número de co-morbidades. Conforme o
Censo da Sociedade Brasileira de Nefrologia, em 2007,
foram registrados 73.605 pacientes em tratamento
dialítico. Desse total, 25,5% apresentavam idade superior
a 65 anos3.
A proposta da terapia renal substitutiva
fundamenta-se na melhora da Qualidade de Vida (QV)
dos pacientes, resgate do bem-estar físico, da capacidade
cognitiva, além de manter a inserção no contexto social4.
Essa proposta, entretanto, esbarra nas alterações da vida
diária que o tratamento hemodialítico desencadeia, pela
falta de suporte familiar e da equipe de saúde para a
manutenção do tratamento.
Recebido em 27/07/08 / Aprovado em 17/10/08
Endereço para correspondência:
Fabiana de Souza Orlandi
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Rua Passeio Cambará 306
15385-000, Ilha Solteira, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
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Qualidade de Vida e Severidade da Insuficiência Renal no Idoso
Os idosos, em tratamento dialítico, geralmente, apresentam comprometimento funcional, o que remete à necessidade de assistência em suas atividades de vida diária5.
Associado ao comprometimento físico, os pacientes renais crônicos, e em particular, os idosos, costumam
sofrer alterações no desempenho dos seus papéis sociais e
dos aspectos psicológicos decorrentes da situação do
adoecer6,7.
Assim, a análise da QV do idoso com Doença Renal
Crônica (DRC) em tratamento hemodialítico é importante
para orientar medidas de intervenção que contemplem
prioritariamente os aspectos mais comprometidos da QV
neste grupo de pacientes.
A maioria dos estudos que abordam o paciente
idoso com DRC tem empregado instrumentos genéricos
para a medida da QV relacionada à saúde.
Dentre os instrumentos genéricos disponíveis, o
SF-36, desenvolvido em 19928 e validado no Brasil em
19979, é uma escala que possui diversas vantagens em seu
uso em estudos sobre QV relacionada à saúde.
Na avaliação da QV relacionada à saúde, não
apenas a medida do constructo deve ser objetivada, mas
também a dos fatores que permitem a hipótese de uma
relação estreita com a QV, ou de influência sobre o seu
curso, como a avaliação sistemática da condição clínica
dos pacientes.
Na avaliação clínica do paciente, em particular de
uma doença crônica, como a DRC, acredita-se na importância de os profissionais de saúde conhecerem a gravidade da afecção, ou melhor, avaliarem as complicações
físicas trazidas por essa afecção, e que correspondem à
sua severidade, e se estão relacionadas à QV. Medidas de
gravidade de uma doença são necessárias para avaliar e
prever a qualidade dos cuidados10.
Neste contexto, foi construído o End-Stage Renal
Disease – Severity Index (ESRD-SI), um instrumento que
deve ser preenchido pelo médico que assiste o paciente, e
corresponde a uma medida objetiva para caracterizar a
gravidade global da DRC11.
Portanto, considerando-se que a pesquisa da
influência (ou associação) de fatores objetivos, como a
severidade da doença sobre a QV, pode fornecer subsídios
importantes para o direcionamento de intervenções que
levem à melhora da QV, o presente estudo teve como
objetivo geral: verificar a relação entre uma medida
genérica de QV e a medida de severidade da doença, em
grupo de idosos com DRC em programa de hemodiálise
ambulatorial. Os objetivos específicos foram: 1. Testar a
correlação entre a medida da QV e de severidade da DRC;
e 2. Comparar a medida da QV, mensurada pelo SF-36,
entre os pacientes distribuídos em duas categorias de
severidade da DRC.
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MÉTODOS
No estudo, participaram idosos com idade igual ou superior a 60 anos, com diagnóstico de DRC, em programa de hemodiálise ambulatorial, atendidos em duas clínicas de terapia renal
substitutiva (hemodiálise) do Estado de São Paulo, nas cidades de
Campinas e São Carlos, no período de janeiro a março de 2003.
Constituíram critérios de inclusão: estar em programa de
hemodiálise há pelo menos seis meses; apresentar capacidade de
compreensão e de comunicação verbal e concordar em participar da pesquisa, com a assinatura do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido. Os critérios de exclusão foram: apresentar
alterações cognitivas ou distúrbios psiquiátricos; ser portador de
neoplasias ou ter antecedência pessoal de transplante renal.
Considerando-se os valores de coeficiente de correlação
r≥0,40, e de α=0,05 e β=0,05, estimou-se um número mínimo
de 75 sujeitos para compor a amostra. Como esse número foi
muito próximo do total de pacientes da população-alvo, optouse por incluir todos os idosos, das duas clínicas eleitas para essa
investigação, que atendiam aos critérios de inclusão e nenhum
dos de exclusão, totalizando cem sujeitos.
Em relação dos instrumentos de coleta de dados, foram
utilizados: o SF-36 e o ESDR-SI. O SF-36, desenvolvido em
19928 e validado no Brasil em 19979, consta de 36 questões, das
quais uma questão avalia comparativamente as condições de
saúde atual e aquelas de um ano atrás e as 35 restantes abordam
oito dimensões: capacidade funcional, estado geral de saúde,
saúde mental, aspectos físicos, vitalidade, aspectos emocionais,
aspectos sociais e dor.
No presente estudo, os valores de coeficiente de alfa de
Cronbach (α) obtidos na aplicação do SF-36 revelaram os
seguintes resultados: instrumento global = 0,90; capacidade
funcional (CF) = 0,89; aspectos físicos (AF) = 0,79; dor (D) =
0,91, estado geral de saúde (EGS) = 0,64; vitalidade (V) = 0,65;
aspectos sociais (AS) = 0,56, aspectos emocionais (AE) = 0,80;
saúde mental (SM) = 0,79. Sendo assim, a maioria das
dimensões obtive valores de alfa maiores ou iguais a 0,70,
apontando uma consistência satisfatória, valendo ressaltar que
as dimensões EGS e V estiveram próximas do desejável e que a
dimensão AS, como é avaliada por apenas dois itens, pode ter
seu valor de alfa reduzido.
Já o ESRD-SI, desenvolvido nos Estados Unidos da
América em 199116 e traduzido e verificada a confiabilidade no
Brasil em 200512, é composto de 11 categorias que incluem
doenças, suas complicações, e as condições mais comuns do
paciente renal crônico, como: insuficiência cardíaca, acidente
vascular cerebral, doença vascular periférica, neuropatia
periférica, neuropatia autonômica e distúrbios gastrointestinais,
acesso e eventos da diálise, diabetes mellitus, entre outras.
A classificação desse instrumento corresponde a valores
numéricos, calculados proporcionalmente para cada categoria, e
obtém em seu somatório um índice de gravidade global, que
pode variar de zero a 94. Nesse índice, “zero” representa a
ausência de doenças associadas (além da DRC), e 94 corresponde à severidade grave da DRC, tendo em vista a associação
de todas as condições clínicas comumente manifestas no renal
crônico em suas formas mais graves, previstas no instrumento.
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Quanto ao procedimento, inicialmente foi realizada uma
entrevista individual com os idosos, previamente à terapia renal
substitutiva (hemodiálise) ou, na sua impossibilidade, nas duas
primeiras horas do tratamento. Nessa entrevista, foi aplicado o
SF-36, sob a forma de entrevista, considerando-se a possibilidade de os pacientes apresentarem queda da acuidade visual e
baixo nível instrucional.
Posteriormente, foi solicitado ao médico nefrologista que
atendia os idosos o preenchimento do ESRD-SI (Índice de
Severidade da Insuficiência Renal Crônica Terminal) de cada
idoso.
O estudo foi formalmente autorizado pelos diretores das
respectivas clínicas de nefrologia e aprovado pelo Comitê de
Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da
Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP (Parecer CEP
nº 417/2002).
Em relação às análises estatísticas, os dados coletados
foram digitados em uma planilha de dados do programa Excel
for Windows 98 e, então, para o programa SAS System for
Windows (Statistic Analysis System) versão 8.02, para as
seguintes análises: 1. descritiva (tabelas de freqüência, medidas de posição e dispersão, bem como os casos válidos e omitidos); 2. de correlação (coeficiente de Correlação de
Spearman, para verificar a correlação entre os instrumentos
SF-36 e ESRD-SI); e 3. de comparação (Teste de MannWhitney, para verificar o poder de discriminação dos itens do
SF-36 em relação à severidade da DRC). O nível de significância foi de 5%.
RESULTADOS
Os cem idosos estudados caracterizaram-se pelo
equilíbrio entre os sexos (51,0% do sexo masculino);
idade entre 60 e 86 anos (média=68,3 ±6,4); tempo médio
de escolaridade de 3,2 anos de estudo (±3,4;
mediana=3,0); e predomínio da cor branca (81,0%). A
maioria dos pacientes (67,0%) possuía um parceiro.
Quanto à renda mensal familiar informada, a média foi de
3,3 salários mínimos (SM) (±5,2; mediana=2,0),
oscilando entre 0,5 e 42 SM.
O tempo médio de tratamento hemodialítico dos
pacientes foi 26,7 meses (±21,7; mediana=20,5), com
variação entre seis e 117 meses. As condições clínicas
associadas que se mostraram mais prevalentes no grupo
estudado foram: Diabetes mellitus tipo 2 (42,0%) e
hipertensão arterial sistêmica (79,0%). Estas condições
também corresponderam ao fator etiológico da DRC para
38,0% e 22,0% dos pacientes respectivamente. Outras
condições clínicas freqüentes, como o déficit visual e a
insuficiência cardíaca, destacaram-se em 25,0% e 15,0%
dos pacientes respectivamente. Uma proporção
significativa de idosos (45,0%) apresentava duas ou três
condições clínicas associadas.
A avaliação da gravidade da DRC, por meio do
ESRD-SI, nas categorias originais, mostrou que 87,0%
dos casos de DRC foram categorizados como sendo de
grau leve de severidade, 12,0% como grau leve a moderado, e somente 1,0% como grau moderado. A média do
escore do ESRD-SI foi 14,0 (±9,9), com mediana = 14,0.
Como houve uma grande concentração dos
pacientes na categoria leve (87,0%) e uma dispersão entre
as categorias leve/moderada e moderada, optou-se, neste
estudo, pela aglutinação das duas últimas categorias,
dando origem à seguinte classificação: “leve” para os
idosos que obtiveram pontuação ≤ 24 e “não leve” > 24.
Na tabela 1, é apresentada a distribuição dos pacientes de
acordo com as categorias do ESRD-SI.
A Tabela 2 mostra que o ESRD-SI correlacionouse negativamente com todas as dimensões da QV
avaliadas pelo SF-36. Em relação à magnitude das
correlações existentes entre o ESRD-SI e as dimensões do
SF-36, verificou-se correlação negativa de moderada
magnitude com a capacidade funcional e de fraca
magnitude com aspectos físicos, estado geral de saúde e
aspectos emocionais.
Tabela 1. Distribuição dos 100 pacientes de acordo com as
categorias do ESRD-SI.
ESRD – IS
Categorias Originais %
Leve
87,0%
Leve / Moderada
12,0%
Moderada
1,0%
Moderada / Grave
-Grave
-TOTAL
100,0%
ESRD – IS
Categorias Modificadas %
Leve
87,0%
Não Leve
13,0%
100,0%
* pontuação ≤88; ** pontuação >88
Tabela 2. Coeficiente de Correlação de Spearman dos escores
das dimensões do SF-36 com o ESRD-SI.
Dimensões do SF-36
Capacidade Funcional
Aspectos físicos
Dor
Estado Geral de Saúde
Vitalidade
Aspectos Sociais
Aspectos Emocionais
Saúde Mental
ESRD-IS
r = -0,46
p < 0,0001
r = -0,26
p = 0,0086
r = -0,13
p = 0,1841
r = -0,22
p = 0,0260
r = -0,16
p = 0,1028
r = -0,12
p = 0,2286
r = -0,23
p = 0,0204
r = -0,15
p = 0,1356
r = Coeficiente de Correlação de Spearman; p = p-valor.
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Na Tabela 3, é descrita a comparação entre os itens
do SF-36 e as duas categorias do ESRD-SI (leve e não
leve) criadas neste estudo. Nota-se que o SF-36 conseguiu
discriminar os pacientes com severidade leve e não leve
da DRC em 50,0% das dimensões, com exceção dos
aspectos físicos, vitalidade, aspectos emocionais e saúde
mental, sendo que, nesta última dimensão, exibiu uma
tendência de significância estatística.
DISCUSSÃO
A severidade da DRC na vida do idoso
O ESRD-SI foi desenvolvido com o propósito
de avaliar, por meio de uma variável de controle, a
severidade da DRC com a mínima influência das
variáveis psicossociais 11. O fato de não incluir, em
sua estrutura, variáveis psicossociais torna o ESRDSI um instrumento útil para medir hipóteses psicossociais 11.
A análise dos dados da presente investigação
indica que a maioria dos pacientes obteve um índice de
severidade médio de 14,0 (±9,9), o qual é considerado
leve. Do total de pacientes estudados, 87,0% tiveram a
sua doença categorizada como de severidade leve, ou
seja, houve uma homogeneidade dos idosos em relação ao
ESRD-SI.
Em estudo realizado com pacientes submetidos a
diversas formas de tratamento dialítico, obteve-se uma
pontuação média do ESRD-SI da ordem de 10,2.
Especificamente na faixa etária entre 63 e 80 anos, esse
índice médio subiu para 12,413.
No presente estudo, a média do escore do índice de
severidade da DRC foi equivalente ao índice médio (15,5)
registrado em pacientes submetidos a diálise peritoneal
intermitente e mostrou um valor superior ao registrado
nos pacientes em tratamento hemodialítico (8,1)13.
Já uma investigação sobre distúrbios do sono em
pacientes dialisados, a qual incluiu o ESRD-SI como
instrumento de avaliação, obteve um escore médio para
severidade da DRC de 16,3 (±11,5)14. No Brasil, Morsch
et al.10 realizaram um estudo com pacientes em tratamento hemodialítico e obtiveram uma pontuação média
no ESRD-SI de 2510.
Neste contexto, embora o ESRD-SI tenha mostrado originalmente propriedades satisfatórias, chama a
atenção a grande concentração de pacientes na categoria
leve no presente estudo, corroborando com o estudo de
Griffin et al.13 e Mucsi et al.14 e diferindo da pesquisa de
Morsch et al10.
Essa homogeneidade na severidade da DRC pode,
de certa forma, indicar uma falta de sensibilidade do
instrumento para distinguir os pacientes portadores dessa
afecção que se enquadram na categoria leve.
Acredita-se que um refinamento do ESRD-SI, que
possibilitasse a melhor discriminação dos pacientes na
categoria leve, poderia resultar numa maior sensibilidade
nas correlações entre a severidade da doença e as
variáveis psicossociais.
A correlação e a comparação entre a QV (SF-36) e a
severidade da DRC
Em relação à severidade da DRC, metade das
dimensões do SF-36 foi capaz de discriminar os idosos,
Tabela 3. Comparação entre os valores dos escores obtidos do SF-36 entre os pacientes com ESRD-SI leve (n=87) e não-leve (n=13)
(Teste de Mann-Whitney).
Dimensões do SF-36
Capacidade Funcional
Aspectos Físicos
Dor
Estado Geral de Saúde
Vitalidade
Aspectos Sociais
Aspectos Emocionais
Saúde Mental
p=p-valor
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Média (±dp)
Mediana
Média (±dp)
Mediana
Média (±dp)
Mediana
Média (±dp)
Mediana
Média (±dp)
Mediana
Média (±dp)
Mediana
Média (±dp)
Mediana
Média (±dp)
Mediana
ESRD-IS Leve
52,7(± 28,6)
55,0
38,2 (± 37,7)
25,0
62,1 (± 29,0)
62,0
57,2 (± 19,1)
57,0
57,8 (± 18,7)
55,0
84,8 (± 22,7)
100,0
81,6 (± 32,0)
100,0
70,4 (± 19,4)
76,0
ESRD-IS Não-Leve
25,4 (± 22,1)
20,0
21,1 (± 30,4)
0
45,8 (± 28,7)
41,0
45,1 (± 14,0)
40,0
48,5 (± 12,6)
50,0
69,2 (± 29,6)
75,0
66,7 (± 45,1)
100,0
56,9 (± 23,8)
64,0
p-valor
p< 0,0019
p= 0,1304
p= 0,0434
p= 0,0203
p< 0,0698
p= 0,0368
p= 0,2812
p= 0,0521
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exceto as dimensões aspectos físicos, vitalidade,
aspectos emocionais e saúde mental. O SF-36 exibiu
correlação negativa significante, estatisticamente, nas
dimensões capacidade funcional, aspectos físicos,
estado geral de saúde e aspectos emocionais. Dessa
forma, associando-se a capacidade discriminante e
divergente do SF-36 em relação às categorias do ESRDSI, pode-se afirmar que as melhores dimensões do SF-36
foram a capacidade funcional e o estado geral de saúde,
uma vez que, além de discriminar os pacientes, elas
apresentaram uma correlação negativa estatisticamente
significante.
Vale ressaltar que as dimensões aspectos sociais e
dor discriminaram os idosos, mas não mostraram
correlação, o que aponta para a existência de aglomerados
de sujeitos nos extremos de pontuação de ambas as
escalas. Já as dimensões aspectos emocionais e aspectos
físicos, embora revelem correlação negativa com a
severidade, não conseguiram discriminar os pacientes
quanto às categorias da severidade da DRC. Vale destacar
a dimensão saúde mental e vitalidade que exibiu menor
sensibilidade, tendo em vista que não discriminou e nem
se correlacionou significativamente. Na literatura
nacional e internacional identificam-se poucos estudos
que correlacionam a severidade da DRC com a QV dos
pacientes renais crônicos.
Na aplicação de três medidas de QV em pacientes
em diálise: a técnica “time trade off”, a QV relacionada à
saúde e o SF-36, e com o emprego do ESRD-SI, os autores
encontraram correlação negativa entre o ESRD-SI e os
componentes físico e mental do SF-36, correspondendo a
forte (r=-0,60; p-valor= 0,0001) e moderada magnitude
(r=-0,39; p-valor= 0,0033) respectivamente15.
Em outro estudo com pacientes em tratamento
hemodialítico, no qual correlacionou-se o escore médio
do ESRD-SI e das dimensões do SF-36, verificou-se que
os aspectos físicos apresentaram correlação negativa
significante estatisticamente com o ESRD-SI (r=-0,538,
p-valor<0,001)16.
Os dados do presente estudo apontam para a
existência de correlação com magnitude mais acentuada
entre a severidade da doença e os componentes físicos da
QV (capacidade funcional e estado geral de saúde), em
relação ao aspecto mental, ratificando os achados da
literatura15,16.
Neste sentido, embora não tenha havido uma
correlação linear entre todas as dimensões do instrumento
SF-36 e a severidade da doença, ao se compararem os
pacientes com severidade leve e severidade não leve,
observou-se que, em todas as dimensões, houve diferença
na QV, apontando o grupo de severidade não leve como o
mais comprometido na medida da QV.
CONCLUSÕES
Finalizando, a análise desta pesquisa em um grupo
de pacientes renais crônicos idosos em hemodiálise
ambulatorial permite concluir, em relação à severidade da
DRC, que: 1) o SF-36 exibiu correlação negativa significante estatisticamente nas dimensões capacidade
funcional, aspectos físicos, estado geral de saúde e
aspectos emocionais; 2) metade das dimensões do SF-36
foi capaz de discriminar os idosos, exceto as dimensões
aspectos físicos, vitalidade, aspectos emocionais e saúde
mental; 3) a associação da capacidade discriminante e
divergente do SF-36 permitiu afirmar que as melhores
dimensões do SF-36 foram a capacidade funcional e o
estado geral de saúde.
Esses achados e a escassez de literatura sobre o
tema remetem a futuros estudos em outros grupos e
culturas, a fim de possibilitar as respectivas comparações
e outras que forneçam elementos importantes para orientar medidas de intervenção nas dimensões da QV que se
mostram comprometidas nesse grupo populacional.
Remetem, ainda, a estudos longitudinais que avaliem o
efeito das intervenções clínicas sobre a medida da QV
desses pacientes.
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