A CRISE DO IMPÉRIO ROMANO NO OLHAR DE LACTÂNCIO

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A CRISE DO IMPÉRIO ROMANO NO OLHAR DE LACTÂNCIO
Douglas Raphael Machado Gobato (UEM)
Renata Lopes Biazotto Venturini ( UEM)
RESUMO: De mortibus persecutorum, escrita por Lactâncio aproximadamente entre os
anos 313 e 314 d. C., representa uma importante fonte escrita sobre os acontecimentos
que marcaram os últimos anos do século III d. C. no Império Romano, particularmente
no que se refere às perseguições. Em sua obra, Lactâncio se apropria do conceito
essencialmente pagão de “mal” imperador, sinônimo de governo anti-senatorial, e lhe dá
um novo significado, a saber, de perseguidores do cristianismo e alvos da cólera divina.
Sua narrativa histórica estava baseada na crença de que Deus interferiu nos
direcionamentos do Império de modo a levar o cristianismo à vitória sobre seus
perseguidores.
Para compreender o direcionamento de Lactâncio em sua construção é fundamental
considerar o contexto mais amplo no qual está inserido o Império a partir de finais do
séc. II d. C., quando começaram a aparecer às primeiras manifestações da crise e da
transformação da organização social entre os romanos. Essa crise, motivada por fatores
externos e internos, levou ao empobrecimento das camadas inferiores, contribuindo para
a difusão dos ideais do cristianismo em finais do século III d. C. Intimamente
relacionada com a crise estava à ideia de decadência que permeava o imaginário de boa
parte dos indivíduos, e que no caso dos cristãos, segundo sua visão escatológica dos
acontecimentos, levou a uma recusa em compartilhar de certas práticas pagãs que
acreditavam os romanos poderem reverter o quadro de anormalidade. Neste contexto,
intensificaram as perseguições, que esporadicamente e em determinadas regiões do
Império tiveram suas primeiras incidências ainda no século I d. C. Esse conjunto de
transformações constituirá o contexto da obra de Lactâncio no início do século IV d. C.
Palavras-chave: Crise do Império Romano – Lactâncio – Perseguições
A CRISE DO IMPÉRIO ROMANO NO OLHAR DE LACTÂNCIO
Douglas Raphael Machado Gobato (UEM)
Renata Lopes Biazotto Venturini ( UEM)
Introdução
Em meados do século II d. C., começaram a aparecer às primeiras manifestações
da crise e da transformação da organização social entre os romanos. É interessante
ressaltar que a crise não ocorreu igualmente em todas as partes, o que aconteceu foram
expressões variadas nas diferentes regiões do Império. Ainda assim, é possível verificar
uma crise generalizada, cujos principais fatores se evidenciaram na instabilidade do
sistema, na transformação acelerada das estruturas, enfim, nas modificações que se
manifestaram em oposição à ordem anterior. As mudanças ocorridas, por sua vez,
permearam todas as áreas da vida dos indivíduos, promovendo alterações de grande
alcance na estrutura da sociedade.
A crise foi motivada por fatores externos, entre eles a invasão bárbara, e por
fatores internos de ordem social, política e econômica. As consequências das frequentes
guerras e da crise econômica afetaram a população mais humilde, a pobreza e a miséria
se alastravam por todo o Império. A situação econômica das demais camadas sociais
também foi abalada, inclusive das classes privilegiadas, entretanto, as camadas
inferiores da população eram as que suportavam, sem escolha, as consequências mais
pesadas da crise.
É justamente neste contexto de crise que o cristianismo apresenta uma grande
difusão, atraindo muitos adeptos, ofertando esperança e consolo de uma vida eterna no
porvir. Como observa Funari:
“[...] muitos romanos, assustados com as consequências da crise,
procuraram consolos nas crenças religiosas. A religião oficial já não lhes
propiciava paz de espírito e foram, portanto, procurar certezas e
tranquilidades em outras religiões, rompendo com as tradições romanas. O
cristianismo era uma das opções e atraiu muita gente dando esperança”
(2001, p.130-131).
A princípio, esse progresso cristão aterrorizou os imperadores romanos, que
acabaram, muitas vezes, por persegui-los, sendo que as primeiras medidas contra os
adeptos do cristianismo remetem ao governo de Nero (século I d. C.). Em finais do
século III d. C., entretanto, os governantes passaram a ver que seria uma boa estratégia
não se opor a nova religião e sim aliar-se a ela com a finalidade de manter o poder.
Neste sentido, por meio do chamado Edito de Milão (313 d. C.), o imperador
Constantino concedeu liberdade de culto aos seguidores de Cristo. Todavia, o apogeu
do cristianismo se deu somente após a época do imperador Teodósio I, no final do
século IV d. C., quando foi concedido aos cristãos diversos privilégios e o cristianismo
foi transformado de religião do imperador para religião oficial do Império.
O cristianismo foi fundamental para a mudança da sociedade romana, mostrando
sua influência no campo das ideias dos homens, uma vez que por meio de suas crenças
questionava os valores morais de uma sociedade pagã, bem como o mos maiorum,
legitimador da tradição da aristocracia senatorial.
Dentro desse conjunto de transformações fomentadas pelo contexto de crise do
Império e da ascensão do cristianismo, De mortibus persecutorum, escrito por Lactâncio
aproximadamente entre os anos 313 e 314 d. C., representa uma importante fonte escrita
sobre os acontecimentos que marcaram os últimos anos do século III d. C.,
particularmente no que se refere às perseguições.
Em sua obra, Lactâncio se apropria do conceito essencialmente pagão de “mal”
imperador, sinônimo de governo anti-senatorial, e lhe dá um novo significado, a saber,
de perseguidores do cristianismo e alvos da cólera divina. Sua narrativa estava baseada
na crença de que Deus interferiu nos direcionamentos do Império de modo a levar o
cristianismo à vitória sobre seus perseguidores.
Lactâncio e o De mortibus persecutorum
As informações sobre a vida de Lactâncio são bastante escassas, resumindo-se
ao que ele próprio deixou em suas obras e ao que São Jerônimo escreveu sobre ele.
Tudo indica que seu nome era Lactancio Caecilius Firmianus e viveu por volta do
século III e início do século IV d. C. O que mais se sabe sobre ele é que era africano, de
Numídia, onde como discípulo de Arnóbio tornou-se um retórico.
A experiência no campo da retórica fez com que fosse chamado pelo imperador
Diocleciano para ensinar retórica latina em Nicomédia, cidade que tornou-se a capital
do império neste período. Sobre a conversão de Lactâncio ao cristianismo não se pode
determinar nem a data nem o local, o fato é que na época da perseguição de Diocleciano
contra os cristãos – decretada em fevereiro de 303 – Lactâncio já era cristão. Alguns
anos mais tarde, a chamado de Constantino, foi convidado a ir a Gália para educar o
filho do imperador, Crispo. Essa proximidade com Constantino, apesar de ser durante
poucos anos, uma vez que Lactâncio já se encontrava em idade avançada, é refletida de
forma bastante acentuada no De mortibus persecutorum, onde o autor vê o imperador
romano como aquele que definitivamente venceu os inimigos da “verdadeira religião”.
Lucio Cecílio Firmino Lactâncio
Fonte: www.panoramacatolico.com/pc/201003-7/padreiglesia.htm
Sobre a obra de Lactâncio as informações novamente se devem a São Jerônimo,
que deixou uma lista de livros atribuídos a ele. Entre estas obras, além de algumas de
caráter profano que foram perdidas, destacam-se duas: a primeira e mais importante é a
Divinae institutiones, um extenso tratado apologético onde Lactâncio procura combater
os filósofos pagãos que haviam escrito contra o cristianismo durante o começo da
perseguição de Diocleciano. A outra é De mortibus persecutorum, escrita por volta de
finais de 313 e inicio de 314 d. C., onde o autor, já no crepúsculo de sua vida, procura
conciliar o poder político e o religioso, sem deixar, no entanto, de fazer apologia as suas
crenças e destacar a oposição entre a religião cristã e seus perseguidores.
Em De Mortibus Persecutorum, segundo Ramón Teja, responsável pela tradução
e comentários da edição escolhida para este trabalho, está presente:
“la idea central de Lactancio, la providencia que rige el mundo y todas las
acciones humanas; una idea que al principio es en él principalmente
filosófica para acabar siendo religiosa en concordancia con la evolución de
sus sentimientos, que terminarán por responder a una vivencia ardiente del
cristianismo” (2000, p. 11).
Outro ponto fundamental sobre o De mortibus persecutorum, é o
desenvolvimento feito por Lactâncio de um novo conceito para aquilo que a literatura
pagã entendia por “mal” imperador – sinônimo de imperador anti-senatorial. Ramón
Teja, afirma em sua introdução: “Para confirmar su tesis, Lactancio precisa demostrar
dos hechos: por un lado, que todos los emperadores perseguidores tuvieron una muerte
meserable; por outro, que todos ellos fueran <<malos>> emperadoes” (2000, p. 24).
Dessa forma, Lactâncio se apropria de um conceito pagão, e o concilia ao
pensamento cristão, oferecendo uma nova perspectiva, onde, todos aqueles imperadores
perseguidores, “coincidentemente” tirânicos e independentes do senado, foram
castigados e mortos, dando lugar a uma nova era, iniciada com a vitória do cristianismo
e o governo de Constantino.
A crise da sociedade romana e a ascensão do cristianismo
A crise que atingiu a sociedade romana a partir do século II d. C., fez sentir,
mais ou menos de acordo com a época e a região, seus efeitos em todos os segmentos da
sociedade. As camadas superiores e inferiores, imperadores e funcionários do Estado,
todos, de alguma forma, perceberam alguma mudança em seu modo de vida.
A revolução militar, representada pelos imperadores advindos do exército,
modificou grandemente o modelo de governo em meados do século III d. C.; “Raras
vezes a sociedade chegara a cortar o poder das classes superiores com tanta coragem
[...]” (BROWN, 1972, p. 26).
Apesar da transformação, a crise do século III d. C. “manifestava-se com maior
evidência nas catastróficas relações externas do Império” (ALFÖLDY, 1989, p. 173).
Após um período de pausa nos avanços bárbaros nas fronteiras, representado pela
contraofensiva bem sucedida de Marco Aurélio contra os Germanos, o Império foi
constantemente atacado no tempo de Severo Alexandre (222-235 d. C.), de Maximino
(235-238 d. C.) e novamente com Décio (249-251 d. C.) e Valeriano (253-260 d. C.)
(ALFÖLDY, 1989, p. 173). No plano interno, a necessidade de manter a dispendiosa
máquina de guerra levou a um endurecimento do governo, como destaca Alföldy: “No
novo sistema político, o dominado, o Estado tornou-se uma instituição todo-poderosa,
que exigia dos seus súbditos uma submissão total e os governava muitas vezes com
brutalidade” (1989, p. 174).
Os efeitos representados pela política de dominação dos imperadores militares
foram imediatamente sentidos pelas camadas superiores da sociedade. Os senadores
perderam seu poder político dentro do escol governamental, sendo substituídos por
órgãos e funcionários estatais mais eficientes. Diante desse recuo, a ordem dos
cavaleiros (ordo equester) passou a representar a pedra angular na administração
imperial. Se até então estiveram renegados a um segundo plano, com o advento dos
imperadores soldados os cavaleiros passaram a ocupar os mais altos cargos na
administração. Ainda, “o consequente aumento do poder dos equites foi também
resultante do facto de as tarefas de defesa e de administração do Império serem cada vez
mais pesadas” (ALFÖLDY, 1989, p. 180).
Economicamente, a camada social mais atingida com o novo delineamento
político foi a dos decuriões, composta pelos cidadãos ricos das cidades que tinham por
obrigação zelar por sua manutenção. O enfraquecimento da ordo decurionum deveu-se,
principalmente, a face econômica da crise, que atingiu de forma mais severa as cidades:
“Os sectores econômicos urbanos foram os mais atingidos. A produção de
mercadorias decresceu consideravelmente [...] o comércio era cada vez mais
difícil, principalmente nas províncias fronteiriças onde se encontravam os
combates. A inflação era incontrolável; e por volta de meados do século III
assumiu dimensões catastróficas” (ALFÖLDY, 1989, p. 174).
Os decuriões também sofriam por ser a classe mais tributada do Império, já que
os senadores, grandes proprietários de terras, e os cavaleiros, em grande parte
funcionários do Estado, gozavam de maiores privilégios econômicos. Quanto à
população, tanto a urbana como a dos campos, era demasiado pobre para que dela se
obtivesse algo.
Após o governo dos imperadores soldados e a acentuada crise que envolveu todo
o século III d. C., houve um período de certa estabilidade no século IV d. C. Esse breve
momento de ressurgimento, porém, teve seu ocaso com o governo de Valentiniano I
(364-375 d. C.), que segundo Peter Brown (1972, p. 126) foi o último grande imperador
do Ocidente. Os acontecimentos que seguiram a sua morte levaram a administração do
Império a cair novamente nas mãos da aristocracia senatorial, o que no século V d. C.,
representou o desmoronamento do Império Romano do Ocidente.
Intimamente relacionada com a crise que atingiu a sociedade romana esteve à
crise no campo das ideias, um momento de renascimento das decadentes tradições
religiosas pagãs e do aparecimento de novas correntes filosóficas e espirituais. Como
afirma Alföldy:
“E quanto mais depressa se decompunham a organização social tradicional
e o sistema de governo que a acompanhava, maior era o vácuo ideológico e
moral, o que favorecia o aparecimento de novas correntes espirituais, como
as religiões orientais dos mistérios, o cristianismo e a filosofia
neoplatônica” (1989, p.175).
A crise do Império trouxe consigo um resgate das velhas práticas pagãs como
meio de solucionar a instabilidade. Santo Mazzarino (1991, p.16-17) chama a atenção
para o fato de os romanos já conceberem ideias de decadência da sociedade no contexto
das lutas entre patrícios e plebeus na transição da República para o Império, em meados
do século II a. C. Segundo o autor “[...] a crise do poderio romano foi temida e, dir-seia, diagnosticada desde o século II a. C., ou seja, desde os tempos das conquistas
mediterrâneas” (1991, p. 16). O patriciado evocava o retorno às velhas práticas como
modo de conter a degradação dos costumes, e não menos, manter sua dominação sobre
os plebeus. Fustel de Coulanges, em A cidade antiga, aborda essa questão:
“Pode calcular-se a surpresa e indignação do patriciado quando os plebeus
manifestaram pela primeira vez a pretensão também de serem cônsules. A
religião parecia ameaçada. Deu-lhes muito trabalho fazerem compreender
isto à plebe; disseram-lhe da importância assumida pela religião na cidade;
como a religião fundara a urbe, presidia todos os atos públicos, dirigia as
assembleias deliberantes e dava à república os seus magistrados.
Acrescentou-se ainda ser esta religião, de acordo com a regra antiga (more
majorum), patrimônio dos patrícios, não podendo ser conhecidas nem
praticados os seus ritos senão por patrícios [...]” (1998, p. 343-344).
Interessante notar que, findadas as perturbações que envolveram o século II a.
C., e à medida que o Império florescia como a nova estrutura de governo, os ânimos em
relação às ideias de crise da sociedade romana arrefeceram, dando lugar a um período
de otimismo. Mazzarino trata desta questão da seguinte forma:
“Com o advento de Augusto, a estrutura política se transformou e os grandes
medos desapareceram: Roma e a Itália estavam salvas, as províncias
organizadas de forma definitiva. Muitas pessoas da geração que
testemunhou tal renascimento – a segunda geração a partir de Augusto – não
queriam mais ouvir falar em decadência dos costumes e outras crendices do
gênero” (1991, p. 33).
Essas ideias de crise só voltariam a povoar a mentalidade das pessoas a partir de
finais do século II d. C. com a crise do Império. Neste momento, no entanto, com um
novo e decisivo elemento, o cristianismo.
Com a retomada das velhas ideias de decadência, houve um embate entre as
concepções pagãs e cristãs a respeito da crise. Os cristãos acreditavam que “[...] o
conceito do fim de Roma estava intimamente ligado à ideia do fim do mundo: o
Anticristo chegaria em breve, o sopro do Senhor o destruiria” (MAZZARINO, 1991,
p.38). Devido a essa crença escatológica e a intransigência frente às práticas religiosas
dos romanos, no imaginário de parte da população os cristãos tornaram-se obstáculos
para o retorno à estabilidade. Como mostram Marcel Simon e André Benoit, em sua
obra El judaísmo y el cristianismo antiguo: de Antíoco Epifanes a Constantino:
“Fueron muchos los emperadores que creyeron encontrar la savación em la
vuelta a las antiguas tradiciones religiosas, que en el pasado habían
assegurado la properidad y la furza de Roma: si todos los ciudadanos
volvieran a praticar la religión del passado, acaso el Império podría
recobrar su unidad, su estabilidade y su fuerza” (1972, p. 75,76).
No século III d. C., em meio aos acentuados problemas enfrentados pelos
imperadores soldados, a fé cristã atingiu uma nova amplitude e experimentou um
progresso mais rápido. No entanto, diante de um cenário de maior acirramento das
dificuldades enfrentadas pelos romanos, seja nas fronteiras do Império com os bárbaros
ou com a instabilidade política e econômica interna, os cristãos passaram a ser
transferidos para o primeiro plano como os grandes reesposáveis pelo momento de
desagregação. Deste modo, no final do século III e início do IV d. C., decretaram-se
medidas de perseguição de caráter geral e sistemático, com o objetivo de eliminar o
cristianismo do mundo romano. Simon e Benoit falam da importância que tiveram a
questão do retorno às antigas práticas religiosas dos romanos nas perseguições neste
momento:
“Tales princípios conservadores y reacionários estuvieron em el origen de
las persecuciones generales de la segunda mutad del siglo III y comienzos
del IV, ya que la Iglesia se presentaba a los ojos de los emperadoers y el
pueblo como la principal responsable del abandono de las antiguas
costumbres religiosas” (1972, p. 76).
As perseguições gerais, apesar da severidade com que foram aplicadas em
algumas regiões, foram de curta duração, sendo a primeira grande investida contra os
cristãos em todo o Império tomada por Décio, em 250. Alguns anos mais tarde, o
imperador Valeriano voltou a perseguir os seguidores de Cristo (257-258), seguido por
um período de paz entre 260 e 303. A terceira onda geral de perseguição deu-se com
Diocleciano entre os anos de 303-305. Após essa data, o Ocidente experimentou
algumas mudanças: “[...] Constancio mantuvo la norma de dejar que los cristianos
vivieran em paz, y quando le sucedió Constantino, em 306, éste continuó la miesma
política de su padre. Em los domínios que correspondían a Severo. La calma se
restablució poco a poco” (BENOIT e SIMON, 1972, p. 82). No Oriente, entretanto,
houve perseguições até 311, e só terminaram com o Edito de Galério. “Este edicto
señaló el fin de las persecuciones y demonstro el fracaso de las medidas tomadas para
eliminar a la Iglesia del mundo romano; liquidó el pasado y abrío el caminho a una
nueva política religiosa que Constantino puso em prática” (BENOIT e SIMON, 1972,
83). Assim, Constantino acabou por reconhecer a existência da Igreja, com o intuito de
convertê-la em aliada, dando assim o primeiro passo à aceitação do cristianismo como
religião oficial do Império.
Considerações finais
Para compreender o direcionamento de Lactâncio em sua construção, é
fundamental considerar o contexto mais amplo no qual está inserido o Império a partir
de finais do séc. II d. C., quando começaram a se manifestar os primeiros sinais de uma
crise que aos poucos se generalizaria por todas as regiões e acabaria, finalmente, por
desestruturar completamente o Império Romano Ocidental no século V d. C. Essa crise,
motivada por fatores externos e internos, levou ao empobrecimento das camadas
inferiores da sociedade, contribuindo para a maior difusão dos ideais do cristianismo em
meados do século III d. C e para as perseguições gerais nos séculos III e IV d. C.
Nesse sentido, De mortibus persecutorum oferece uma rica narrativa a respeito
das perseguições, iniciadas por alguns imperadores romanos ao longo dos os três
primeiros séculos, mas que à medida que o cristianismo crescia, adquiriu um caráter
mais amplo nos séculos III e IV d. C. com os editos de perseguições gerais. A obra de
Lactâncio termina com a ascensão de Constantino, visto como o grande baluarte na
vitória do cristianismo sobre seus perseguidores, que em 313 d. C. retirou a religião da
ilegalidade.
Com a promulgação do edito de Galério (305-311 d. C) que pôs fim as Grandes
Perseguições, um novo período teve início na história das relações entre o Império e a
Igreja em formação. A partir de Constantino (306-337 d. C) haveria um processo de
aproximação do Estado romano com a Igreja cristã, pois para esse imperador o
cristianismo seria a nova fonte de coesão do Império. Sua ação não deve ser vista como
puro cálculo político, mas também como expressão de crença no cristianismo. Como
salientou Mazzarino, com a conversão de Constantino toda uma época se encerra a
época das perseguições.
Lactâncio buscou um espírito de conciliação entre a filosofia pagã e a doutrina
cristã, entre a Igreja e o Estado, entre o poder político e o poder religioso. Esta postura
do escritor cristão, segundo Teja, se explica pelo apego e entusiasmo à grandeza de
Roma, que fez do apologista um defensor da religião cristã frente à criminalização desta
pelo Estado e imperadores pagãos e da romanidade diante da barbarização do poder
imperial romano.
REFERÊNCIAS
Fonte Impressa
LACTANCIO, Lucius Caecilius Firmianus. Sobre la muerte de los perseguidores.
Madrid: Editorial Gredos, 2000.
Bibliografia
ALFÖLDY, Géza. História social de Roma. Lisboa: Presença, 1989.
BENOIT, André; SIMON, Marcel. El judaísmo y el cristianismo antiguo: de Antíoco
Epífanes a Constantino. Barcelona: Editorial Labor, 1972.
BROWN, Peter. O fim do mundo clássico: de Marco Aurélio a Maomé. Lisboa:
Editorial Verbo, 1972.
COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
FUNARI, Pedro Paulo. Grécia e Roma. São Paulo: Contexto, 2001.
MAZZARINO, Santo. O fim do mundo antigo. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
Imagéticas
Disponível em www.panoramacatolico.com/pc/201003-7/padreiglesia.htm. Acesso em
05/12/2012.
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