ANEXO 4 E 5 TERÇA-FEIRA, 26 DE AGOSTO DE 2014 GREG SALIBIAN, DIVULGAÇÃO FRONTEIRAS DO PENSAMENTO Programe-se Miguel Nicolelis A Fifa interpretou de maneira errada. Foi um trabalho que começou do zero, um feito que entrou para a história. Mas já me conformei com a selvageria. santa.com.br Leia as entrevistas na íntegra Entrevistas do neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis e do psicólogo canadense Paul Bloom adiantam temas que serão abordados em suas conferências hoje e amanhã, em Florianópolis O neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, referência no mundo nas pesquisas sobre a interação entre cérebro e computadores, é forte candidato a trazer um Prêmio Nobel para o Brasil. Formado em Medicina pela Universidade de São Paulo, é codiretor do Centro de Neuroengenharia da Universidade de Duke, na Carolina do Norte, nos Estados Unidos, onde lidera um grupo de cientistas empenhados em ferramentas computacionais, robótica e métodos neurofisiológicos na pesquisa do desenvolvimento de próteses neurais para a reabilitação de pacientes que sofrem de paralisia. Bem-humorado e torcedor fanático do Palmeiras, Nicolelis, que participa hoje do ciclo de estudos Fronteiras do Pensamento, em Florianópolis, falou com a reportagem por telefone. Aberto ao diálogo, em uma conversa de quase 30 minutos respondeu todas as perguntas, inclusive sobre o polêmico episódio da apresentação do exoesqueleto, que integra o projeto Andar de Novo, durante a abertura da Copa do Mundo, que recebeu pouco destaque por parte da Fifa. Ele falou ainda a respeito da tecnologia que funciona por meio do pensamento e de trabalhos futuros. Citou os benefícios dos avanços tecnológicos, mas frisou que eles podem também prejudicar o homem. Confira trechos da entrevista. Em 2011/2012 você fez apresentações do projeto Andar de Novo, inclusive palestras emocionadas como na Flip. Tem funcionado essa intenção de aproximar a ciência do público leigo? Sem dúvida. Tivemos milhares de pessoas acessando o site. Temos recebido correspondências do mundo inteiro. O projeto baseia-se em estudos seus anteriores, como o que fez com que a macaca Aurora movimentasse o braço de um robô apenas com o pensamento. Ainda mais impressionante que o próprio movimento é o feedback que a pessoa recebe, afinal Minha relação com Deus está ótima. Eu não acredito nele e ele não acredita em mim. ela consegue sentir o chão embaixo dos seus pés. Como essa tecnologia funciona? Uma máquina registra os sinais cerebrais e um comando motor executa. Um outro nível é colocar sensores que informam ao paciente quando, por exemplo, a perna está suspensa ou toca no chão. É usar a interpretação do cérebro para gerar uma sensação realista. Nos oito primeiros casos em que realizamos testes, eles tiveram esta sensação de andar novamente. O projeto gerou polêmica em relação ao que foi prometido e ao que foi mostrado na abertura da Copa. Ficou satisfeito com o resultado? A polêmica foi artificial e restrita a São Paulo e a razões políticas. Havia interesse no fracasso da Copa. O projeto teve repercussão mundial, tenho ido a palestras e tenho visto pessoas emocionadas, que assistiram e entenderam o simbolismo. É algo que ninguém jamais imaginou ser possível. A Fifa interpretou de maneira errada. Foi um trabalho que começou do zero, um feito que entrou para a história. Mas já me conformei com a selvageria. O fato entrou para história, um projeto brasileiro que é a esperança de Tudo é criado pelo cérebro, a máquina não cria nada, dependemos do cérebro para criar. milhões voltarem a andar. O que se pode esperar agora? Quais são as novidades que essa tecnologia pode oferecer em um futuro próximo? O cérebro produz o comando e a atividade elétrica contém os comandos, que extraímos e transformamos em sinais digitais que podem ser lidos pelo computador. Para um futuro próximo temos várias aplicações que vão ajudar na cura do mal de Parkinson e da epilepsia, por exemplo, além de várias outras tecnologias que estamos trabalhando. No livro Muito Além do Eu você traz algumas ideias revolucionárias, como a comunicação por meio do pensamento. Como será possível? São ideias para daqui centenas de anos. Temos já trabalhos feitos com animais, mas que são experimentos para discussão teórica. Estamos discutindo a perspectiva e temos demonstrado conceitos simples, mas ainda é ciência abstrata e pura. O cérebro é tão misterioso quanto o próprio universo. O que você pode compartilhar dos avanços e pesquisas para tentar entendê-lo? Estamos na infância da neurociência, conhecemos pouco o que ela faz. O estudo está sendo detalhado, mas é muito insipiente. Por isso é necessário o conhecimento. Teremos um impacto grande, mudanças muito profundas. Nos últimos 30 anos, este é o momento de maior ênfase de estudos no mundo. Você acredita que a tecnologia vai transformar a sociedade. O que imagina de realmente aplicável para um futuro próximo? Veja o impacto que a internet teve no mundo nos últimos anos – e ela ainda não está completamente desenvolvida. Existem muitas coisas surgindo, mas a questão é: até onde melhora e a partir de quando começa a destruir? Tem de haver um equilíbrio. Tudo é criado pelo cérebro, a máquina não cria nada, dependemos do cérebro para criar. E está equação é muito delicada. Curiosa a sua descrição na Wikipedia: médico e cientista ateu brasileiro. Acredita que a ciência em algum momento se aproximará da religião? (Risos) Não, sou da velha guarda. São coisas separadas, minha relação com Deus está ótima, eu não acredito nele e ele não acredita em mim. Mecanismos do prazer e da moral P aul Bloom, 50 anos, psicólogo canadense referência mundial em estudos sobre o desenvolvimento cognitivo, desembarca em Florianópolis amanhã para encerrar o Fronteiras do Pensamento. Considerado um dos maiores teóricos sobre o aprendizado, suas pesquisas exploram como as pessoas percebem os mundos físico e social. Confira a seguir a entrevista que ele concedeu por telefone à reportagem. Um dos seus campos de estudo é a moral. Hoje, em sociedades complexas e cosmopolitas, que reúnem pessoas de diferentes lugares e religiões, como se conseguir um consenso entre o que é moral e o que é imoral? Essa é uma grande pergunta. Um dos argumentos que uso é que temos uma moral que veio e evoluiu de nossa própria natureza – até mesmo os bebês têm moral. Mas ela evoluiu diferentemente em cada um dos pequenos grupos existentes. Mas neste mundo moderno nossa inclinação moral não é suficiente para manejar os problemas que vão surgindo. Sendo assim, parte da resposta para essa pergunta é que nós devemos utilizar nossa imaginação e nossa inteligência para transcender essa moral. Mas como decidimos o que é justo e o que não é? (Risos) Essa resposta eu não tenho. Como psicólogo, posso explorar o que as pessoas naturalmente acreditam ser justo e diferentes noções do que é justiça em diferentes culturas. O que posso falar é sobre como cada pessoa chega a uma conclusão, mas responder o que é certo é uma habilidade que não tenho. Você também pesquisa sobre o prazer. Existe algum modo de encorajar alguém a gostar de algo? Há prazeres que são da nossa natureza, dos quais a evolução nos fez gostar. Prazeres como sexo e aqueles sentidos com determinados tipos de comida e bebidas, até mesmo certos tipos de música e arte. E a cultura pode mudar isso. Por exemplo: muitas pessoas não nascem gostando de música clássica ou arte moderna, porém em determinado ponto passam a gostar delas. Mas obviamente há limites para isso, algumas coisas nunca serão prazerosas. Provavelmente as pessoas nunca gostarão do barulho da estática ou de comer poeira. O prazer que você recebe não é apenas causado por alguma coisa, mas também pelo que você acredita que essa coisa é. Então, um vinho tem um gosto melhor se é mais caro, uma pessoa parece mais bonita quando você gosta dela. Nesse sentido, podemos ser influenciados. Podemos aprender a gostar de algumas coisas que previamente não gostávamos. SIGRID ESTRADA, DIVULGAÇÃO O quê: conferência com Paul Bloom Quando: amanhã, às 20h Onde: Teatro Pedro Ivo (Rodovia SC-401, Km 5, 4.600, Saco Grande, Florianópolis) Quanto: R$ 40 e R$ 20 (meia), à venda no site Blueticket Informações: (48) 3216-3432 * ingressos para as palestras de Miguel Nicolelis já esgotaram Temos uma moral que veio e evoluiu de nossa própria natureza – até mesmo os bebês têm moral.