INTRODUÇÃO Tabela 02: Valores de pK e H de resíduos de aminoácidos ionizáveis Grupo Ácido Base Ácido Aspártico Ácido Glutâmico Histidina -N terminal Cisteína Tirosina Lisina -C terminal pK médio H(kcal/mol) 3,51,2 0 1,5 4,20,9 0 ± 1,5 6,61,0 +6,9 – 7,5 7,70,5 +10 – 13 6,82,7 +6,5 – 7,0 10,31,2 +6,0 10,51,1 +10 – 12 3,30,8 0 ± 1,5 Adaptado de [46, 47] Deve-se levar em consideração que para a determinação dos valores de pKa, é recomendável que o substrato usado não tenha nenhuma ionização significante no intervalo de pH analisado [20]. A definição da dependência do pH na catálise enzimática é também importante para prover informações da região do perfil de pH onde a enzima está operando com eficiência ótima e que não há eventos de dissociação. Esta região também é importante para estudos de efeito isotópico do solvente de deutério ou do efeito de inibidores análogos do estado de transição [20]. A dependência do pH de uma enzima pode ser obtida pela observação da catálise de um determinado substrato e os valores das constantes dos 51 INTRODUÇÃO parâmetros cinéticos obtidos são plotados em uma curva de acordo com a equação mais adequada, ou seja, a atividade de uma enzima pode depender de um ou mais grupos ionizáveis [24, 45]. Por exemplo: k ( Limit )10 pH pKa1 k 102 pH pKa1 pKa 2 A equação apresentada se encaixa com o modelo de curva de pH no qual a atividade da enzima depende de dois grupos ionizáveis (dois valores de pKa obtidos), onde k(Limit) refere-se ao valor da constante catalítica máxima independente do pH e k1 e k2 são as constantes de dissociação dos componentes catalíticos nos limbos ácidos e básicos respectivamente. Relative activity 1 0.8 0.6 0.4 0.2 0 4 5 6 7 8 pH 9 10 11 Figura 17: Esquema de uma curva de pH com dois grupos ionizáveis. 52 INTRODUÇÃO 1.7 EFEITO ISOTÓPICO CINÉTICO DO SOLVENTE (Solvent Kinetic Isotopic Effect –SKIE) Em muitos casos, a relação entre as constantes cinéticas de uma reação é influenciada pela troca de isótopos tanto de um átomo do solvente quanto de um reagente. Tal efeito é chamado efeito isotópico cinético do solvente, que pode ocorrer, por exemplo, quando o solvente água (HOH/H2O) é trocado por óxido de deutério (DOD/D2O). A introdução de átomos de deutério no lugar de prótons nos sítios de hidrogênio da água e sua subsequente substituição em resíduos de enzimas e substratos produzem efeitos no comportamento cinético e nas constantes de equilíbrio associadas à reação enzimática. Há muitos estudos envolvendo proteases e outras enzimas baseados neste fenômeno, encontrando-se os princípios teóricos e a dedução do modelo matemático na revisão de Schowen e Schowen, 1982 [48]. Os efeitos isotópico do solvente são obtidos comparando-se a relação entre as constantes cinéticas de uma reação em água (HOH) e em óxido de deutério (DOD). Eles são geralmente resultantes da transferência de próton entre átomos eletronegativos nas etapas de formação e quebra entre os átomos mais pesados na reação e fornecem dados importantes para o estudo dos mecanismos de reação envolvidos. A característica mais imediata observada no efeito isotópico do solvente é a sua direção: se a velocidade de reação observada é maior em HOH ou em DOD. Simplificando, quando um próton é transferido de ou para um átomo pesado, tal como carbono, oxigênio ou nitrogênio, o efeito isotópico é 53 INTRODUÇÃO creditado principalmente à diferença na energia vibracional da ligação átomo pesado-hidrogênio (X-H) e entre a energia da ligação átomo pesado-deutério (X-D). Como a frequência de vibração é menor entre um átomo de massa maior, a energia da ligação X-D é menor do que uma ligação X-H. Uma vez que há mais energia vibracional na ligação X-H, menos trabalho é necessário para quebrá-la. O efeito isotópico é então determinado através destas diferenças de energia, que são perdidas na formação do estado de transição enquanto o átomo de hidrogênio ou deutério move em direção ao seu aceptor. Assim, quando um núcleo isotópico apresenta menor ligação e consequentemente menor restrição no estado de transição do que no estado reagente, o isótopo mais leve vai reagir mais rápido que o pesado [49] de tal forma que um efeito é classificado como “normal” quando V HOH/VDOD > 1 e “inverso” quando esse valor é menor que 1, indicando a retenção dos hidrogênios no estado de transição. No caso de enzimas proteolíticas, diferentes comportamentos são esperados dependendo do tipo de mecanismo catalítico e resíduos envolvidos. Todavia a relação VHOH/VDOD não indica o número de sítios envolvidos na reação analisada, onde cada efeito pode ser resultado de um ou vários sítios contribuindo para o efeito global observado. Para essa distinção, o efeito do solvente isotópico entre seus componentes de diferentes sítios nos estados de transição e reagente, pode ser realizado através de estudos cinéticos do efeito do solvente isotópico em uma série de misturas de HOH e DOD na metodologia denominada Inventário de Prótons. O Inventário de Prótons é baseado na distinção dos sítios hidrogeniônicos em sítios e Z. Sítios constituem elementos estruturais da 54 INTRODUÇÃO própria enzima, de tal forma que o potencial de ligação do hidrogênio difere substancialmente do potencial em um sítio do solvente, sendo substancial a sua contribuição para o efeito total. Os sítios hidrogeniônicos em moléculas de água ou ainda na proteína, nos quais o potencial de ligação do hidrogênio é muito próximo ao do solvente são denominados sítios Z. Neste caso, como o efeito isotópico individual é baixo, sua contribuição só é mensurada quando o efeito agregado torna-se significante, podendo ainda ser interpretado como reorganização do solvente durante o processo [50]. Os parâmetros cinéticos são expressos como kn(n) funções da fração de deutério n presente no solvente isotópico, e testados nos diversos modelos teóricos de reação (ver quadro I) derivados da equação geral (I) permitindo a obtenção de informações sobre o número de sítios de hidrogênio contribuintes para o efeito global e ainda sobre a magnitude dos efeitos isotópicos individuais ou fator de fracionamento. (I) N Fração de Deutério no solvente Vn Velocidade observada na fração n de deutério V0 Velocidade observada em água TS Estado de Transição RS Estado Reagente T Fator de Fracionamento do Estado de Transição R Fator de Fracionamento do Estado Reagente O modelo mais simples é obtido quando apenas um sítio hidrogeniônico determina todo o efeito do solvente isotópico: se o sítio está no estado de transição, kn(n) é uma função linear; se o sítio está no estado reagente, kn-1(n) 55 INTRODUÇÃO é linear. De forma similar, se dois sítios no estado de transição determinam o efeito, kn(n) é uma função quadrática; caso sejam três, cúbica; etc. Uma consideração importante na interpretação mecanicista é justamente a correta definição da natureza da constante de velocidade analisada em cada Inventário de Próton. Por exemplo, no caso das reações catalisadas por serino e cisteíno peptidases, os parâmetros cinéticos kcat e kcat/KM tem os seguintes estados de reagente e de transição: • kcat: O estado de reagente é acil-enzima; o estado de transição é relativo ao processo de deacilação. • kcat/KM: O estado de reagente é definido por enzima e substrato livres; o estado de transição é relativo ao processo de acilação. Para a interpretação mecanicista é, portanto necessária a correta definição da natureza da constante de velocidade analisada em cada Inventário de Próton. Quadro I – Modelos teóricos de reação e suas respectivas equações. Informação Obtida Equação TS1 Vn = Vo (1 – n + n1) TS1 + Sítios Z Vn = Vo (1 – n + n1). zn 2TS1 Vn = Vo (1 – n + n1)2 2TS1 + Sítios Z Vn = Vo (1 – n + n1)2zn TS1 + TS2 Vn = Vo (1 – n + n1). (1 – n + n2) TS1 + TS2 + Sítios Z Vn = Vo (1 – n + n1). (1 – n + n2) zn TS + RS Vn = Vo (1 – n + n1)/ (1 – n + nR) 56 INTRODUÇÃO 1.8 SUBSTRATOS SINTÉTICOS O estudo das atividades proteolíticas das peptidases tem sido realizado principalmente através do uso de substratos peptídicos sintéticos, que comparados aos substratos protéicos naturais, apresentam vantagens como maior sensibilidade e facilidade de ensaio, permitindo ainda a variação de aminoácidos e a análise do efeito destas substituições [11]. Os ensaios utilizados para monitorar a atividade catalítica de peptidases com substratos sintéticos são os colorimétricos, fluorimétricos ou de radiação, sendo que todos possuem limitações, seja devido a procedimentos onerosos, baixa sensibilidade ou à necessidade do uso de isótopos radiativos [51]. Dentre os substratos sintéticos que permitem o monitoramento da reação enzimática de forma contínua em aparelhos de espectrofluorimetria, os substratos fluorogênicos empregam as aminas aromáticas tais como as 7amino-4-metilcoumarinas. A clivagem de uma ligação amida por uma peptidase é acompanhada por um aumento na fluorescência, monitorada no comprimento de onda adequado. Na maioria destes tipos de substratos, o grupo fluorescente é conjugado a um peptídeo pequeno. Como o grupo fluorescente clivado ocupa o sitio de especificidade S1’, os substratos são mais úteis para peptidases cuja especificidade é predominantemente determinada pelo lado não-linha [51] Muitas peptidases, no entanto, requerem os lados não-linha e linha ocupados por aminoácidos, e as enzimas não clivam eficientemente os substratos do tipo 7-amino-4-metilcoumarina. Como alternativa, os peptídeos FRET (Fluorescence Energy Resonance Transfer), substratos com supressão 57 INTRODUÇÃO intramolecular de fluorescência, constituem uma ferramenta apropriada permitindo a análise da catálise com a presença de aminoácidos no lado linha, além de proporcionar como vantagem um método prático e rápido para a determinação da atividade enzimática em fluídos biológicos, extrato bruto de tecidos ou na superfície de cultura de células [52]. Nos substratos FRET, o grupo doador de fluorescência ligado a um dos resíduos de aminoácidos do peptídeo transfere energia ao grupo aceptor de fluorescência ligado a outro resíduo da sequência de aminoácidos seguindo o mecanismo de ressonância descrito por Förster (1948) [53]. Este processo ocorre toda vez que o espectro de emissão do fluoróforo se sobrepõe com o espectro de absorção do aceptor [54]. Os peptídeos FRET exibem supressão interna de fluorescência quando intactos, porém a clivagem de qualquer ligação peptídica entre o par doador/aceptor libera fluorescência que pode ser detectada continuamente, permitindo a medição quantitativa da atividade enzimática. Os mecanismos dos substratos fluorogênicos e FRET são esquematizados a seguir: Baixa fluorescência 380 380 nm nm 4620nm 460nm Ponto de clivagem Grupo f luorescente Grupo bloqueador- Suc/Cbz/Boc MCA (-7-amino-4-metilcoumarina-hidrocloreto) Peptideo + Protease Hid rólise Grupo bloqueador- + Grupo f luorescente Suc/Cbz/Boc MCA (-7-amino-4-metilcoumarina-hidrocloreto) 380 nm 460nm Alta fluorescência Figura 18 – Representação da catálise de substratos fluorogênicos. Adaptado de [52]. 58 INTRODUÇÃO Transferência de energia Baixa fluorescência 320 nm 420nm Ponto de clivagem Grupo fluorescente Abz:ácido ortoaminobenzóico Gln: presença constante – estratégia de síntese Grupo apagador Peptideo EDDnp:N-[2, 4-dinitrofenil]etilenodiamino Hidrólise 320 nm 420nm Alta fluorescência Figura 19 - Representação do mecanismo de supressão intramolecular da fluorescência devido à transferência de energia dos substratos FRET Abz-peptideo-EDDnp. Adaptado de [52]. 59 INTRODUÇÃO 2. PEPTIDASES CARBOXÍLICAS INSENSÍVEIS A PEPSTATINA Como descrito anteriormente nesta tese, existem inúmeras enzimas proteolíticas presentes em todos os organismos e estas apresentam diferentes tipos de mecanismos de ação, especificidade e estrutura entre outras características. Dentre as chamadas proteases carboxílicas ou ácidas, cuja grande maioria atua na faixa de pH 2-6, as mais estudadas são as aspártico peptidases e por muito tempo, acreditou-se que todas as proteases ácidas seriam pertencentes a esta classe. Além da presença de Asp no sítio catalítico, uma das características das aspártico peptidases é que com exceção de algumas proteases, quase todas as famílias de proteases pertencentes a esta classe são inibidas por moléculas do tipo pepstatina, um hexa-peptídeo de aproximadamente 685 Da que contém um aminoácido não usual, a estatina (Sta, (3S,4S) ácido 4-amino3-hidróxi-6-metilheptanóico) com a sequência Isovaleril-Val-Val-Sta-Ala-Sta (pepstatina A) ou Ac-Val-Val-Sta-Ala-Sta (S-PI). Estes peptídeos foram isolados de espécies de bactérias Actinomicetos no início dos anos de 1970 por dois grupos de pesquisa japoneses [12, 55]. A inibição das aspártico peptidases pela pepstatina é do tipo reversível e a faixa de inibição é de 10-8-10-12M, numa ligação firme “tight binding” entre enzima-inibidor [11, 56]. O mecanismo de inibição pela pepstatina não está totalmente esclarecido, porém muitos estudos que visam o desenvolvimento de inibidores derivados da pepstatina, específicos para algumas aspártico proteases têm sido realizados assumindo-se a hipótese de inibição por 60 INTRODUÇÃO análogos do estado de transição, no qual estruturas estáveis semelhantes ao estado de transição de uma reação enzimática, neste caso a estatina, se ligariam mais fortemente à enzima do que o substrato [56]. Estas características fazem da pepstatina um dos inibidores mais usados no estudo de proteases, sendo seletivo para as aspártico peptidases [13]. Com a aplicação da pepstatina como inibidor de aspártico peptidases iniciou-se também a descoberta de novas proteases carboxílicas, prospectadas principalmente em microrganismos como parte do trabalho dos co-descobridores da pepstatina Sawao Murao e Kohei Oda [55]. Porém, para algumas destas novas proteases que apresentavam atividade em pH ácido, quando testadas com a pepstatina não havia o efeito inibitório, sendo estas então qualificadas como proteases carboxílicas insensíveis à pepstatina e, devido à falta de informações, durante muitos anos acreditou se que estas proteases seriam aspártico peptidases [2]. Há apenas uma década atrás, através de novos dados com relação à estrutura e mecanismo catalítico é que as proteases carboxílicas passaram a ser classificadas em dois tipos distintos: o das sensíveis à pepstatina, no qual se encontram as aspártico peptidases e o das insensíveis à pepstatina, que possui dois representantes, o primeiro grupo das serino peptidases carboxílicas e o outro das glutâmico peptidases [55]. 61 INTRODUÇÃO A B Figura 20: (A) Estrutra da pepstatina A e (B) pepstatina complexada com pepsina. Adaptado de [57]. 2.1 Serino peptidases carboxílicas As serino peptidases carboxílicas foram propostas como um grupo novo de proteases em 2001. Existem atualmente 11 proteases caracterizadas como serino peptidases carboxílicas catalogadas no banco de dados Merops, a maioria identificada em microrganismos: em archaeas, bactérias, fungos, leveduras e amebas e entre os vertebrados, estas peptidases já foram identificadas em anfíbios, peixes e mamíferos [12]. A primeira serino peptidase carboxílica foi isolada da bactéria Pseudomonas sp.101 por Oda e colaboradores (1987) e foi inicialmente chamada de proteinase carboxílica de Pseudomonas insensível a pepstatina (Pseudomonas pepstatin-insensitive carboxyl proteinase - PCP). Posteriormente, outras enzimas com as mesmas características foram isoladas de Xanthomonas sp. T-22 (XCP), da bactéria termofilica Bacillus novo sp. MN-32 (KCP ou KSCP) e do Bacillus coagulans foi isolada a proteinase J4, que é resistente a etanol [58]. 62 INTRODUÇÃO Além de não apresentarem inibição por pepstatina, estas proteases possuem a atividade ótima em pH ácido, massa molecular de aproximadamente 40 kDa e uma pró-região amino terminal longa constituída de cerca de 200 resíduos de aminoácidos. Quase todas as serino peptidases carboxílicas apresentam ainda a inibição por um inibidor chamado de tirostatina, isolado de microrganismos, cuja estrutura química é formada pela sequência isovaleril-tirosil-leucil-tirosinal [59]. Devido a estas características em comum, estas enzimas foram inicialmente agrupadas como aspártico peptidases insensíveis à pepstatina na família A7 de clã desconhecido [60]. Entretanto, esta classificação começou a ser questionada a partir da descoberta da protease lisossomal CLN2p em humanos, identificada também como tripeptidil peptidase I (TPP-I) por Sleat e colaboradores em 1997, cuja mutação leva a ocorrência de uma doença neurodegenerativa fatal, a lipofuscinose ceróide neuronal infantil tardia clássica ou doença de Batten [61]. A peptidase carboxílica TPP-I/CLN2p apresentava características em comum com as demais proteases de microrganismos citadas acima, porém a primeira tentativa de classificação desta enzima foi como serino peptidase no clã SB, que consistia apenas da família de enzimas do tipo subtilisinas (S8). A dúvida em relação à classificação destas peptidases carboxílicas só foi esclarecida com a obtenção das estruturas dos cristais da proteinase carboxílica de Pseudomonas em 2001 [62] e da proteinase da bactéria termofilica Bacillus novo em 2002 [63]. Através da resolução da estrutura destas proteases pode se observar que elas apresentam um único domínio 63 INTRODUÇÃO com configuração do tipo subtilisina e sítio ativo composto pela tríade Ser-GluAsp, também confirmada por mutagênese sítio dirigida [64]. A B Figura 21: (A) Estrutura da sedolisina na presença de inibidor. Adaptado de [62]. (B) Superposição dos resíduos catalíticos de CLN2p/TPP-1 (azul), kumamolisina (vermelho) e sedolisina (laranja) sobre o modelo da CLN2p/TPP-1. A alta similaridade estrutural do centro catalítico das três proteases ocorre pela presença e posição dos mesmos resíduos catalíticos. Adaptado de [65]. Baseado nas informações estruturais, estas peptidases foram então reclassificadas como serino peptidases no mesmo clã da subtilisina (clã SB), porém em uma nova família, a S53 [59]. Após a confirmação da nova classificação, algumas destas peptidases foram também renomeadas e a atual nomenclatura é: serino peptidase carboxilica de Pseudomonas sp 101 (PCP) sedolisina serino peptidase carboxilica de Xanthomonas sp. T-22 (XCP) sedolisina-B serino peptidase carboxilica de Bacillus novo sp.MN-32 (KCP/KSCP) kumamolisina serino peptidase carboxilica de Bacillus coagulans (J-4) kumamolisina-B serino peptidase carboxilica de Alicyclobacillus sendaiensis (ScpA)kumamolisina-As O nome sedolisina, dado a protease protótipo desta família é uma alusão ao sítio catalítico destas enzimas constituído pela tríade Ser-Glu-Asp (SED), sendo as enzimas deste grupo também conhecidas como peptidases do tipo SEDolisinas [55]. Além das enzimas citadas acima, que foram as 64 INTRODUÇÃO inicialmente descritas, outras SEDolisinas tem sido identificadas em fungos como a aorsina de Aspergillus orizae, grifolisin de Grifola frondosa e scytalidolisin de Scytalidium lignicolum e as Sed A, B, C e D de Aspergillus fumigatus [12]. A partir do mixomiceto Physarum polycephalum, foram isoladas a physarolisin e physarolisin II [12]. Baseados na sequências de genes existem outras possíveis serino peptidases carboxílicas presentes em diversos organismos [12]. Todas as SEDolisinas conhecidas até então atuam em pH ácido e possuem especificidade diversificada. Dentre estas proteases, algumas apresentam atividade exopeptidásica de tripeptidil peptidase (CLN2p/TPP-I e Sed B, C e D) [66]. As SEDolisinas apresentam ainda estrutura muito similar entre si [55, 65]. O mecanismo catalítico proposto para as serino peptidases carboxílicas (Ser, Glu, Asp) foi sugerido em analogia ao mecanismo catalítico da subtilisina (Ser, His, Asp), no qual há formação de intermediário covalente, éster ou tioéster e o estado de transição e do intermediário tetraédrico é acompanhado por separação de cargas [62, 67]. Além das evidencias estruturais, o mecanismo catalítico das SEDolisinas foi também verificado por estudos de modelagem computacional de mecânica quântica/ dinâmica de mecânica molecular (QM/MM) e simulações de energia livre, provendo informações a respeito da etapa de acilação [68, 69]. Na catálise das SEDolisinas propõe-se que a Ser287 (numeração da sedolisina) age como nucleófilo atacando o carbono da carbonila da ligação peptídica do substrato para formar o intermediário tetraédrico, o Glu80 age 65 INTRODUÇÃO como base geral recebendo o próton da Ser287 e depois como ácido para protonar a saída da porção C-terminal do substrato, a cadeia lateral do Asp84 auxiliaria estabilizando o intermediário tetraédrico da reação e na criação do segundo intermediário. A porção N-terminal do substrato (acilada) é liberada pelo ataque de uma molécula de água à enzima (catálise ácida específica) via um segundo intermediário tetraédrico formado por outro resíduo ácido, Asp170 (análogo a Asn155 das subtilisinas) [59]. Complexo enzima-substrato (ES) Acilenzima (AE) Estado de transição 1 (TS1) Intermediário tetraédrico (TI) Estado de transição 2 (TS2) Figura 22: Mecanismo catalítico das sedolisinas. Adaptado de [58] Além do potencial biotecnológico apresentado por estas proteases devido a atuação em pH ácido e em alguns casos em altas temperaturas como a kumamolisina (temperatura ótima ~70ºC), é importante ressaltar a presença de uma destas enzimas, a CLN2p/TPP-I, em humanos e outros vertebrados [2]. 66 INTRODUÇÃO A CLN2p/TPP-I está distribuída pelo corpo humano, com altos níveis de expressão no cérebro. Embora os substratos naturais e a função biológica desta enzima ainda sejam elusivos, sugere-se que as mutações descritas para o gene cln2/tpp-I, que resultam em deficiência da peptidase, estão diretamente relacionadas ao acúmulo de lipopigmentos autofluorescentes constituídos da subunidade C do complexo mitocondrial ATP sintase (F0F1-ATPase) no lisossomo [70-72]. Este acúmulo é uma característica patomorfológica clínica típica da Lipofuscinose Ceroide Neuronal Infantil Tardia (Late-Infantile Neuronal Ceroid Lipofuscinoses - LINCL), uma doença genética neurodegenerativa que é fatal e ocorre durante a infância [73, 74]. Por outro lado, a superexpressão da CLN2p/TPP-I assim como outras peptidases lisossomais, já foi reportada em câncer de mama, esôfago e coloretal, sugerindo-se também uma relação da CLN2p/TPP-I na metástase [75, 76]. A CLN2p/TPP-I possui predominantemente atividade de tripeptidil exopeptidase, ocorrendo em pH ótimo ~5,0, catalisando a liberação de sequências de tripeptídeos da região amino terminal dos substratos e também uma atividade endopeptidásica fraca com pH ótimo de ~3,0 [77-79]. A preferência de hidrólise de tripeptídeos em blocos pela CLN2p/TPP-I é explicada através da estrutura do cristal pela presença de interações que supostamente ocluiriam o subsítio S4 [65]. 67 INTRODUÇÃO 2.2 Glutâmico peptidases O outro grupo de proteases carboxílicas insensíveis à pepstatina é o das glutâmico peptidases que foi estabelecido em 2004. Assim como para as serino peptidases carboxílicas acreditava-se que as primeiras proteases desta classe seriam do tipo aspártico peptidases [2]. A primeira glutâmico peptidase foi isolada de Scytalidium lignicolum, um fungo decompositor de madeira em 1972 por Murao e colaboradores. Esta enzima inicialmente chamada de scytalidopepsin B, possuía pH ótimo de aproximadamente 3,0, levando os pesquisadores a acreditarem que esta também pertencia à família 1A das aspártico peptidases [2, 55]. Mais tarde descobriu-se que a scytalidopepsin B apresentava resistência à inibição pelos inibidiores pepstatina e diazoacetil-DL-norleucina metil ester, porém era inibida por 1,2-epoxi-3-(p-nitrofenoxi) propano, além de ser também menor (~21 kDa) que as demais aspártico peptidases da família 1A, o que causou dúvidas em relação a sua classificação [23]. Assim, a scytalidopepsin B passou então a ser classificada numa outra família de aspártico peptidases, família 4A do clã AX. Neste ínterim, outras peptidases que apresentavam as mesmas características foram sendo isoladas de diferentes fungos filamentosos por outros grupos de pesquisa e foram também tentativamente classificadas na família 4A [2, 12, 80]. Somente anos depois da primeira tentativa de classificação destas proteases, com a obtenção do cristal da então denominada scytalidopepsin B, verificou-se que a estrutura e a díade catalítica formada por resíduos de Glu e Gln eram inéditas entre as proteases, justificando a criação de um novo grupo 68 INTRODUÇÃO [16, 81]. Assim, a atual nomenclatura da antiga scytalidopepsin B é scytalidoglutâmico peptidase e além dela existem outras oito enzimas pertencentes à mesma família G1, clã GA e uma peptidase pertencente à recém-criada família G2, clã GB [12]. 2.2.1 Família G1, clã GA As glutâmico peptidases da família G1, clã GA possuem a díade catalítica formada por ácido glutâmico Glu (E) e glutamina Gln (Q) e por isso são também conhecidas como “EQolisinas”. A maior parte da bibliografia referente a estas peptidases é focada na caracterização desta nova classe estudando-se principalmente as enzimas isoladas de Scytalidium lignicolum (SGP) e Aspergillus niger var. macrosporus (AGP). Até o momento, quase todas as glutâmico peptidases conhecidas foram isoladas de espécies de fungos filamentosos do filo Ascomycota: Scytalidium lignicolum scytalidoglutâmico peptidase (SGP) Aspergullus niger var. macrosporus aspergiloglutâmico peptidase (AGP) Penicillium marneffei PMAP-1 Talaromyces emersonii TGP1 Cryphonectria parasitica EapB Cryphonectria parasitica EapC Sclerotinia sclerotiorum Acp1 Botrytis clinerea BcACP1 Aspergillus fumigatus AfuGprA Há nesta família apenas uma protease isolada de bactéria: Alicyclobacillus sp PepG1 69 INTRODUÇÃO Com exceção do fungo Talaromyces emersonii e da bactéria Alicyclobacillus sp, os demais fungos são classificados como parasitas de plantas ou animais, incluindo humanos. Apesar da escassez de informações a respeito do papel das glutâmico peptidases da família G1, sabe-se que após a infecção por Sclerotinia sclerotiorum ocorre um aumento considerável da secreção de Acp1 durante a fase de necrose do cotilédone do girassol, sugerindo a importância desta protease na progressão da patogenia [82]. Rolland e colaboradores (2009) também sugerem o papel da BcACP1 ligado à patogenicidade do fungo, já que esta protease é secretada durante a infecção de tecidos de plantas por Botrytis clinerea [83]. A proteólise de proteínas de plantas forneceria nutrientes essenciais quando não houvesse outra fonte disponível, relacionando-se então a expressão destas glutâmico peptidases à fase de colonização do fungos [84]. Já a PMAP-1 é a principal peptidase ácida secretada pelo fungo Penicillium marneffei, nativo do Sudeste Asiático, cuja infecção considerada rara até alguns anos atrás tem se tornado mais frequente e é associada ao aumento do número de casos de pacientes imunodebilitados vítimas da AIDS e terapias imunossupressivas pós transplante de órgãos ou quimioterapia. O papel da PMAP-1 na patogenicidade do fungo, todavia, ainda não foi esclarecido [85]. A TGP1 secretada durante a fase de proliferação do fungo termofílico Talaromyces emersonii, que além de não patogênico é de interesse biotecnológico por secretar diversas hidrolases como xilanases e celulases no 70 INTRODUÇÃO processamento de biomassa em combustível, têm atividade essencial no crescimento do fungo provavelmente providenciando fonte de nitrogênio através de degradação de matéria orgânica [86]. A última glutâmico peptidase de fungos descrita é a AfuGprA, secretada pelo fungo Aspergillus fumigatus, ascomiceto presente no solo, que pode se comportar como patógeno oportunista e é o principal agente causador de aspergilose invasiva em pacientes, geralmente imunodebilitados, que apresentam neutropenia. Os ensaios iniciais de caracterização desta protease mostraram que apesar dela ser secretada durante a fase de proliferação do fungo, a sua deficiência não afeta significativamente o crescimento ao contrário do observado para TGP1 [87]. Há ainda indícios, baseados em sequências de genes, de que existam outras glutâmico proteases que ainda não foram experimentalmente caracterizadas em outras espécies de fungos [87-89]. Dentre as glutâmico peptidases da família G1, a única não isolada de fungos até o momento é a PepG1, presente na bactéria termofílica ácida Alicyclobacillus sp., que cresce em pH ácido (~4,5) e altas temperaturas (60ºC). Os autores deste trabalho verificaram ainda com base na homologia entre sequências, que existiriam outras cinco glutâmico peptidases em bactérias e uma em archaea [90]. Além da importância da caracterização de uma nova classe de peptidases, o estudo das EQolisinas apresenta potencial biotecnológico no desenvolvimento de fungicidas para os fungos patogênicos [55]. 71 INTRODUÇÃO 2.2.1.a Scytalidoglutamico peptidase (SGP) A scytalidoglutamico peptidase (SGP), isolada do fungo Scytalidium lignicolum na década de 1970, é a enzima protótipo desta classe e também referida por alguns autores como eqolisina por ter sido a primeira glutâmico peptidase a ter a estrutura e mecanismo catalítico descrito [12, 55]. A SGP é sintetizada na forma de zimogênio, consistindo de uma prépró região composta por 54 resíduos de aminoácidos e pela região madura contendo 206 resíduos. A enzima madura é constituída por uma cadeia polipeptídica simples, com massa molecular de 21.969 kDa e três pontes de dissulfeto intramoleculares. A enzima madura apresenta um predomínio de cargas carregadas negativamente (32 Asp+Glu) sobre resíduos carregados positivamente (2 Lys + 1Arg), o que contribui para um baixo ponto isoelétrico (pI ~3,0) calculado para a SGP [58]. Pré-pró região 1 61 121 181 241 MKFTTAAVLSALVSAEIAFAAPGGNGFARRQARRQARAAGLKASPFRQVNAKEATVESNW GGAILIGSDFDTVSATANVPSASGGSSAAGTAWVGIDGDTCQTAILQTGFDWYGDGTYDA WYEWYPEVSDDFSGITISEGDSIQMSVTATSDTSGSATLENLTTGQKVSKSFSNESSGSL CRTNAEFIIEDFEECNSNGSDCEFVPFASFSPAVEFTDCSVTSDGESVSLDDAQITQVII NNQDVTDCSVSGTTVSCSYV 60 120 180 240 Figura 23: Sequência da scytalidoglutâmico peptidase (SGP) [G01.001 MER001320] protease madura: 54-260 (resíduos do sítio ativo: 107 e 190 ) (Scytalidium lignicolum) (Fonte: UniProt P15369). Adaptado de [12]. As demais EQolisinas também apresentam características comuns a SGP quanto à presença de precursor, número de resíduos da pré-pro região, enzima madura e tamanho aproximado, porém o número de pontes de dissulfeto intramolecular é variável nas demais glutâmico peptidases [81]. 72 INTRODUÇÃO Figura 24: Alinhamento das sequências das glutâmico peptidases de fungos. A numeração dos resíduos de aminoácidos seguida é a da sequência da SGP. Adaptado de [81]. Os primeiros ensaios da atividade catalítica da SGP mostraram que ela possuía pH ótimo 2,0 com a caseína como substrato e a hidrólise usando como substrato a cadeia da insulina ocorria entre YT e em FF (RGFFYTPKT) e para a angiotensina II entre HP (DRVYIHPFHL). A especificidade estudada com substratos FRET mostrou a preferência da SGP por resíduos carregados positivamente nas posições P3 e P3’ (Arg e Lys), resíduos pequenos na posição P1’ (Ala, Gly ou Ser) e Phe, Tyr ou His em P1 [91]. Em 2004 foi obtida a estrutura tridimensional da SGP por cristalografia de raios-X em duas formas: somente a da enzima madura, em sua forma nativa e da peptidase complexada com o substrato angiotensina II (Asp-Arg-Val-Tyr-Ile-His-Pro-Phe) [16]. Um terceiro cristal da enzima 73 INTRODUÇÃO mostrando as interações com um inibidor específico foi obtido em 2007 [16, 81]. O inibidor usado foi desenvolvido com base nos dados de especificidade e no mecanismo catalítico proposto a partir da estrutura da SGP obtida em 2004. Este inibidor é um peptídeo formado por AcFKF(3S,4S)-fenilstatinil-LR-NH2, que contém um grupamento de hidroxietileno (fenil estatina - S) que mimetiza o estado tetraédrico de transição da reação de catálise e é chamado de TA1. O inibidor se liga de forma não covalente à enzima e apresenta forte inibição com Ki1,2X10-10M [81]. Figura 25: Estrutura química do inibidor análogo do estado de transição (TA1) contendo o resíduo (3S,4S) fenil-estatina que ocupa os resíduos dos subsítios S1-S1´. Adaptado de [81]. A SGP apresenta estrutura terciária com configuração de um sanduíche formado por duas partes na qual cada uma consiste de sete folhas antiparalelas. Esta configuração de -sanduíche com uma face côncava e outra convexa é única entre as proteases e similar à encontrada nos membros da superfamília de lectinas/glucanases do tipo concanavalina-A, que são proteínas funcionalmente distantes das enzimas proteolíticas [81]. Os resíduos catalíticos foram identificados como sendo o Glu 136 e Gln53 e estão localizados na superfície côncava da folha superior. Próximo a estes resíduos encontra-se ainda uma molécula de água, HOH169 que estaria envolvida na catálise [16, 81]. 74 INTRODUÇÃO A B Figura 26: (A) Representação da estrutura da SGP. (B) Representação das estruturas da SGP (bege) e AGP (azul) complexadas com inibidor TA1, mostrando a similaridade entre as duas enzimas. Adaptado de [16, 81]. Tendo como base os dados estruturais e em analogia ao mecanismo das aspártico e metalo peptidases, o mecanismo catalítico proposto para SGP (eqolisina) sugere que a molécula de água (HOH169), posicionada entre Glu136 e Gln53, seja ativada por uma base geral (Glu136). A molécula de água ativada (OH-) realiza o ataque nucleofílico na face-si do átomo de carbono da carbonila do peptídeo formando o intermediário tetraédrico através de ligação covalente [16, 23, 81]. O resíduo Gln53 providencia a estabilização do intermediário tetraédrico através da assistência eletrofílica pela polarização da carbonila do peptídeo que é feita pela amida da cadeia lateral da Gln53. A interação por ponte de hidrogênio entre a amida da Gln53 e o oxigênio da carbonila é bifuncional e auxilia na formação do intermediário tetraédrico promovendo a estabilização do oxianion que resulta no intermediário. A protonação do nitrogênio do grupo de saída seria realizada pelo Glu 136 que assumiria a função de ácido geral nesta etapa doando próton. 75 INTRODUÇÃO A direção do ataque nucleofílico na face-si é vista somente na família das peptidases do tipo papaína das cisteíno peptidases, já em serino, aspártico e metalo peptidases o ataque ocorre na face-re [16]. Figura 27: Mecanismo catalítico proposto para SGP. Adaptado de [81]. A partir das informações referentes à estrutura e mecanismo proposto, estudos envolvendo mutações sítio-dirigidas dos resíduos catalíticos Glu e Gln tanto para SGP (E136A, Q53A e Q53E) como para AGP confirmaram estes resíduos como a díade catalítica destas peptidases [91, 92]. A AGP, diferente das demais glutâmico peptidases que possuem uma única cadeia, é composta por duas cadeias: leve (39 aa) e pesada (173 aa) não ligadas covalentemente uma à outra. A estrutura do cristal da AGP resolvida em 2004 mostrou-se muito semelhante à obtida para SGP, porém o mecanismo catalítico proposto para AGP é diferente [93, 94]. 76 INTRODUÇÃO O mecanismo catalítico proposto para AGP foi baseado nos dados estruturais e estudos da dependência do pH da enzima na catálise de alguns substratos. Neste mecanismo, o Glu110 estaria agindo como ácido geral na primeira etapa da catálise, doando um próton ao oxigênio da carbonila do peptídeo e a água (HOH88) estaria já na forma ativa (OH-) e formaria então o intermediário tetraédrico, que seria estabilizado pelos dois resíduos catalíticos (Glu110 e Gln24). Na última etapa, a protonação do grupo de saída seria realizada pelo Glu110 que agiria novamente como ácido [93]. Figura 28: Mecanismo catalítico proposto para AGP. Adaptado de [93]. Os mecanismos propostos para SGP e AGP mostraram-se inconsistentes entre si, apesar da semelhança na estrutura e características gerais das duas enzimas sendo razoável assumir que as proteases desta família possuem o mesmo tipo de mecanismo catalítico. 77 INTRODUÇÃO 2.2.2 Família G2, clã GB A segunda família de glutâmico peptidases foi recém-estabelecida em 2011 e possui apenas um representante até o momento. Porém, diferente das proteases da Família G1, para esta família a díade catalítica é composta pelos resíduos Glu e Asp [12]. A peptidase pertencente a esta família é uma proteína do bacteriófago caudado Phi29(29) denominada “pre-neck appendage protein” envolvida na constituição estrutural do vírus [95, 96]. No bacteriófago Phi29, tailspike (Phi29-TSP) é uma proteína homotrimérica alongada e consiste de uma estrutura tripla hélice , que é capaz de degradar glicopolímeros da parede celular de bactérias. A tripla hélice também serve como determinante de especificidade da célula hospedeira do bacteriófago [95]. A conformação dependentes de e estruturação chaperonas destas presentes nos proteínas domínios tailspike são C-terminais denominadas chaperonas intramoleculares (intramolecular chaperones IMC) ou autochaperonas. Estas IMCs se auto liberam por atividade proteolítica após a maturação da preproteína. As auto chaperonas de Phi29-TSP utilizam um ácido glutâmico (Glu695) para ativar a molécula de água, que ataca a ligação peptídica da Ser 691. No seu estado protonado, Asp692 estaria envolvido na estabilização do intermediário tetraédrico permitindo a hidrólise da ligação peptídica. Após a reação de clivagem se completar, as alças voltam ao rearranjo conformacional 78 INTRODUÇÃO que é provocado por hidrólise envolvendo ATP, que leva à liberação de IMC do Phi29-TSP maduro [95]. Comparações estruturais e de sequências similares a chaperona intramolecular de Phi29-TSP sugerem que IMCs poderiam também ser identificada em outras adesinas de vírus e bactérias [95, 96]. Figura 29: (A) Phi29-TSP antes da clivagem pela chaperona intramolecular. (B) IMC de Phi29-TSP. (C) Folhas antiparalelas projetam-se do domínio globular dando origem a uma nova estruturação Auto clivagem dos sítios de Phi-TSP. Adaptado de [95]. 79 OBJETIVOS OBJETIVOS O presente trabalho tem como objetivo principal caracterizar o mecanismo catalítico da SGP, enzima protótipo das glutâmico peptidases, através de estudos da dependência do pH e do efeito isotópico cinético do solvente (SKIEs) na hidrólise do substrato sintético FRET: MCA-KLFSSK-QEDDnp, onde MCA (7-amino-4-metilcoumarina) é o grupo doador de fluorescência e EDDnp o grupo apagador. Segundo dados de especificidade da enzima, o subsítio S1 acomoda igualmente bem as cadeias laterais dos aminoácidos hidrofóbicos Phe e Tyr e do resíduo positivamente carregado His. Os substratos MCA-KLHSSKQ- EDDnp, MCA-KLFPSKQ-EDDnp e MCA-KLHPSKQ-EDDnp foram também sintetizados e através da análise da dependência do pH e SKIE nos parâmetros cinéticos, o intuito foi entender a acomodação de diferentes grupos de aminoácidos no subsítio S1. Por fim, pretendeu-se verificar a especificidade de substratos contendo o aminoácido Pro na posição P1’ comparando os parâmetros cinéticos de hidrólise de duas séries de peptídeos FRET: Abz-KLXSSK-Q-EDDnp e AbzKLXPSK-Q-EDDnp, no qual o doador de fluorescência é o ácido ortoaminobenzoico (Abz) e X= diferentes aminoácidos. 80 ARTIGO PUBLICADO Artigo publicado 1 Publicação: JBC (2010) vol.285, n°28: 21437–21445 Studies on the Catalytic Mechanism of a Glutamic Peptidase Marcia Y. Kondo, Debora N. Okamoto, Jorge A. N. Santos, Maria A. Juliano, Kohei Oda, Bindu Pillai, Michael N. G. James, Luiz Juliano, and Iuri E. Gouvea 81 ARTIGO PUBLICADO Descrição Os resultados do estudo com a scytalidoglutamic peptidase (SGP), enzima protótipo entre as glutâmico peptidases (família G1 Merops), são apresentados no artigo a seguir. A SGP além da díade catalítica formada por Gln53 e Glu136 e mecanismo catalítico único, hidrolisa substratos contendo Pro na posição P´1, evento não usual entre peptidases, devido à presença do imino grupo neste aminoácido. No artigo, primeiramente são demonstrados os dados da análise da especificidade com variação na posição P1 com as séries de peptídeos FRET Abz-KLXSSKQ-EDDnp e Abz-KLXPSKQ-EDDnp, sendo X= His e Phe como os melhores aminoácidos em ambas as séries. Estes resultados junto ao perfil de pH da atividade da SGP mostraram que o subsítio S1 pode acomodar o grupo benzil da Phe em pH 4,0 assim como o grupo positivamente carregado imidazol da His. Foi também analisada a estrutura e estabilidade da enzima frente à variação de pH. Os estudos de efeitos isotópicos cinéticos do solvente e experimentos do inventário de prótons corroboram o mecanismo proposto para glutâmico peptidase no qual o resíduo catalítico Glu136, atuando como base geral ativa a molécula de água que promove o ataque nucleofílico, estabelecendo um papel fundamental nas interações do subsítio S1 na promoção da catálise. 82 ARTIGO PUBLICADO Artigo – Mecanismo catalítico da SGP 83 DISCUSSÃO & CONCLUSÃO DISCUSSÃO & CONCLUSÃO No artigo “Studies on the Catalytic Mechanism of a Glutamic Peptidase” foram apresentados os resultados referentes ao trabalho de caracterização do mecanismo catalítico da enzima scytalidoglutamico peptidase (SGP) também chamada de eqolisina. O trabalho foi realizado a partir da colaboração com o Dr. Kohei Oda, um dos pesquisadores pioneiros na descoberta e consolidação das peptidases carboxílicas insensíveis ao inibidor pepstatina como um novo grupo de proteases. As peptidases carboxílicas insensíveis à pepstatina já vinham sendo descritas há mais de 30 anos, porém devido à dificuldade na sua caracterização, elas permaneceram por muito tempo erroneamente classificadas como aspártico peptidases, que até então eram as únicas proteases ácidas conhecidas. As glutâmico peptidases foram homologadas como uma nova classe de proteases em 2004 a partir de dados da estrutura do cristal da SGP, que revelou uma nova configuração estrutural entre as proteases e uma díade catalítica também inédita, composta por resíduos de ácido glutâmico (E) e glutamina (Q). Outros dados obtidos por mutagênese dos sítios catalíticos da SGP e da aspergiloglutamico peptidase (AGP), assim como a estrutura do cristal desta última sustentaram as glutâmico peptidases como distintas das demais proteases. 84 DISCUSSÃO & CONCLUSÃO Referente à especificidade destas peptidases, havia pouca informação obtida a partir de substratos naturais como a clivagem da cadeia da insulina, da angiotensina II, substancia P e hemoglobina. Kataoka e colaboradores publicaram em 2005 [91] um estudo contendo mais informações a respeito da especificidade da SGP, onde foi realizada a varredura da preferência dos subsítios S3-S3’ utilizando substratos FRET e foi determinado que o melhor substrato para esta enzima seria o DDap(MeNHBz)-GFKFFALRK(Dnp)-D-R-D-R, com kcat:34,8s-1, KM:0,065M e kcat/KM:535M.s-1. Estes valores obtidos para os parâmetros cinéticos refletem a alta eficiência catalítica da enzima, o que foi observado também nos nossos dados quando outros substratos foram testados. Com relação ao papel biológico das glutâmico peptidases, encontradas principalmente em fungos filamentosos, os trabalhos relacionados à prospecção destas enzimas sugerem que elas teriam relevância durante o crescimento e também na patogenicidade, no caso dos fungos patogênicos. Apesar destas informações geradas para as glutâmico peptidases, ainda havia pouca informação referente à caracterização bioquímica do mecanismo catalítico destas enzimas e sendo esta uma das vertentes do laboratório do Professor Dr. Luiz Juliano Neto, iniciou-se o estudo da SGP utilizando os substratos FRET, sintetizados pela Professora Dra. Maria Aparecida Juliano. Os primeiros ensaios realizados foram do comportamento da SGP frente a diferentes pHs através de ensaios de varredura da fluorescência intrínseca dos resíduos de triptofano (W) e de dicroísmo circular onde 85 DISCUSSÃO & CONCLUSÃO mostrou-se que a conformação estrutural da enzima ativa é dependente de pH. A relação das condições do pH do meio representa um fator importante para os fungos, que também são capazes de modificar o pH através da liberação de ácidos orgânicos. Nos trabalhos de Poussereau (2001) [82], O’Donoghue (2008) [86], Rolland (2009) [83] e seus respectivos colaboradores mostrou-se que a produção das eqolisinas por fungos é executada sob condições de pH ácido do meio. Para os ensaios da atividade da enzima, com base em informações prévias a respeito da especificidade da SGP, foram utilizadas as bibliotecas Abz-KLXSSK-Q-EDDnp e Abz-KLXPSK-Q-EDDnp, onde X corresponde ao aminoácido que ocuparia a posição P1 de clivagem do substrato. Ao usar estas bibliotecas, as questões principais eram: 1. Confirmar a especificidade obtida no trabalho de Kataoka e colaboradores que postulavam a preferência na posição P1 tanto para resíduos hidrofóbicos Phe ou Tyr quanto pelo resíduo hidrofílico carregado positivamente His. 2. Estudar a especificidade da enzima com substratos contendo o aminoácido Pro na posição P1’, considerado não usual para peptidases. A especificidade da SGP foi realizada com a obtenção dos parâmetros cinéticos kcat, KM e kcat/KM e para posição P1 foi observada pouca diferença em relação ao trabalho de especificidade anterior de Kataoka e colaboradores, comprovando Phe, Tyr e His como os melhores substratos na posição P1. 86 DISCUSSÃO & CONCLUSÃO A confirmação da hidrólise em peptídeos contendo Pro na posição P1’ também foi realizada mostrando que em comparação com a biblioteca com Ser em P1’, a especificidade em P1 não é alterada. a) b) c) Figura 30: Ponto de clivagem do substrato Abz-KLHPSKQ-EDDnp obtido através de analise por espectrometria de massa LCMS. Outra questão ainda não resolvida referente às glutâmico peptidases era a caracterização bioquímica do mecanismo catalítico destas enzimas, uma vez que haviam dois mecanismos propostos de acordo com dados estruturais: um para SGP, que previa que o Glu136 catalítico estaria agindo como base ativando a molécula de água na primeira etapa da catálise assim como ocorre para aspártico peptidases e o outro mecanismo proposto para AGP, previa que o Glu110 catalítico estaria agindo como ácido nesta primeira etapa da catálise, algo que seria inédito entre as proteases. Uma vez que estas peptidases da mesma família apresentam estrutura semelhante e mesma díade catalítica é esperado que compartilhem também o mesmo mecanismo catalítico. A fim de estudar esta questão, optou-se por 87 DISCUSSÃO & CONCLUSÃO verificar a dependência do pH na atividade catalítica da SGP, através do qual o perfil da curva de pH e os valores de pK obtidos podem sugerir quais os resíduos envolvidos e a forma destes quanto à protonação. Para verificar a dependência do pH na atividade catalítica da SGP, foram sintetizados os substratos MCA-KLFSSK-Q-EDDnp, MCA-KLFPSK-QEDDnp, MCA-KLHSSK-Q-EDDnp e MCA-KLHPSK-Q-EDDnp. A utilização da sonda MCA (7-amino-4-metilcoumarina) no lugar do comumente usado Abz (ácido orto-aminobenzóico) foi necessária devido aos ensaios ocorrerem em pH ácido (2~6), que afeta a emissão de fluorescência de algumas sondas. O peptídeo D-Dap(MeNHBz)-GFKFFALRK(Dnp)-D-R-D-R, tido como o melhor substrato para SGP, descrito em [91], também mostrou-se inadequado para os ensaios em pH ácido, sendo seu uso descartado nos ensaios de caracterização do mecanismo da enzima. MCA- =325-395 nM fluorescencia relativa (%) 100 Ddap- =340-440 80 nM Abz- =320-420 nM 60 40 20 0 0 2 4 6 pH Figura 31: Titulação da fluorescência de substratos FRET em função do pH. 88 DISCUSSÃO & CONCLUSÃO Com os substratos MCA-peptídeo-QEDDnp foi possível realizar diferentes ensaios: Analisar a dependência do pH na atividade da SGP, Estudar o efeito do sal na atividade da enzima, Determinar os parâmetros termodinâmicos na atividade da SGP, Realizar estudos do efeito cinético de solvente isotópico (DOD) na curva de pH. Através do perfil das curvas de pH e valores de pK obtido (~3,4) para o substrato MCA-KLFSSKQ-EDDnp foi possível inferir que o resíduo envolvido na catálise era de fato, o ácido glutâmico e que este estaria desprotonado no início da catálise, agindo então como base geral, corroborando o mecanismo catalítico proposto através de dados estruturais da SGP por Fujinaga e colaboradores [16]. Todos os demais experimentos analisados de forma conjunta sustentaram este dado e foi mostrado ainda que a acomodação dos aminoácidos Phe e His no subsítio S1 da enzima ocorrem de maneira distinta. Estes dados obtidos primeiramente na forma experimental foram depois confirmados pelos colaboradores Dra. Bindu Pillai e Dr. Michael James, que são também os cristalógrafos responsáveis pela resolução do cristal da SGP. A comparação das curvas de pH obtidas a partir dos parâmetros cinéticos kcat e kcat/KM em H2O e em D2O, analisando-se o efeito isotópico cinético do solvente (SKIE) e o inventário de prótons sugeriram quais seriam 89 DISCUSSÃO & CONCLUSÃO as etapas limitantes da catálise dos substratos. Este tipo de estudo como já realizado para outras proteases como a HIV-1 protease por Szelter e Polgar, 1996 [97] apesar de requerer critérios rígidos na execução dos experimentos e análise dos dados fornece informações relevantes quanto ao mecanismo de ação da enzima estudada e no desenvolvimento de inibidores de protease mais eficientes. Concluindo, o estudo mostrado nesta tese corrobora a partir de dados experimentais o mecanismo proposto para SGP. A ratificação de um modelo de mecanismo de catálise de uma família de peptidases através de diferentes caracterizações é importante para consolidar os resíduos e mecanismos catalíticos não canônicos que podem ocorrer em diversas enzimas. 90 OUTROS TRABALHOS Outros trabalhos: Esta seção reúne estudos realizados que não fizeram parte do tema do projeto inicial da tese de doutorado. Será apresentada uma breve descrição de cada tema e serão anexados os resumos dos trabalhos publicados . 91 OUTROS TRABALHOS 1– Tema: NS2B/NS3 recombinante do vírus da febre amarela Publicação n°1: BBRC (2011), 407: 640–644 Yellow fever virus NS2B/NS3 protease: Hydrolytic Properties and Substrate Specificity Marcia Y. Kondo, Lilian C.G. Oliveira, Debora N. Okamoto, Marina R.T. de Araujo, Claudia N. Duarte dos Santos, Maria A. Juliano, Luiz Juliano, Iuri E. Gouvea 92 OUTROS TRABALHOS Descrição A febre amarela é uma doença causada por um arbovírus (YFV-Yellow Fever Virus) que é também o protótipo do gênero Flavivirus (Monath TP, 2008). De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), no mundo inteiro são estimados 200 000 casos de febre amarela por ano, causando aproximadamente 30 000 mortes [98]. O vírus da febre amarela é envelopado e constituído por um genoma RNA fita simples positivo de aproximadamente 11000 nucleotídeos, que codifica o precursor de uma longa poliproteína de aproximadamente 350 kDa, composta por três proteínas estruturais encontradas no vírus maduro: C (central), prM (precursor de membrana) e E (envelope) além de sete proteínas não estruturais (NS), que não fazem parte da arquitetura viral (NS1, NS2A, NS2B, NS3, NS4A, NS4B e NS5) [99]. No presente trabalho (anexo 3.2.3a) estudamos a hidrólise de substratos FRET que mimetizam as regiões linha e não linha dos sítios de clivagem da poliproteína viral pela protease recombinante NS2B/NS3 do vírus da febre amarela. Os resultados obtidos foram comparados com aqueles descritos para as proteases NS2B/NS3 dos vírus da Dengue e West Nile, nos quais o motivo P2-P1’ é o principal fator associado com a diferença na eficiência catalítica dos sítios de processamento. Para a protease NS2B/NS3 da febre amarela, apesar da presença do mesmo motivo em todas as sequências naturais, os valores de kcat/KM variaram mais de duas ordens de magnitude. Baseado nos resultados descritos acima, peptídeos FRET contendo todas as combinações possíveis de dois e três aminoácidos básicos 93 OUTROS TRABALHOS em sequência foram analisados. Foi observado que ocorre aumento significativo no kcat, quando se encontra Arg tanto na posição P1 ou P2, já a hidrólise de peptídeos contendo Lys em P1 apresenta KM menor. Nossos dados quando comparados com aqueles obtidos in vivo por Chambers e colaboradores (1991) [100], corroboram o postulado de que interações secundárias do substrato distantes dos sítios de clivagem são os principais fatores associados às diferentes velocidades de hidrólise nos substratos naturais. 94 OUTROS TRABALHOS 1. NS2B/NS3 recombinante do vírus da febre amarela 95 OUTROS TRABALHOS 2 – Tema: Enzima halofilica SR5-3 Publicação n° 2: BBA Proteins and Proteomics (2009), 1794: 367373 Kinetic analysis of salting activation of a subtilisin-like halophilic protease Débora N. Okamoto, Marcia Y. Kondo, Jorge A.N. Santos, Sawa Nakajima, Kazumi Hiraga, Kohei Oda, Maria A. Juliano, Luiz Juliano, Iuri E. Gouvea Publicação n° 3: Protein & Peptide Letters (2010), 17: 796-802 Salt Effect on Substrate Specificity of a Subtilisin-Like Halophilic Protease Debora N. Okamoto, Marcia Y. Kondo, Kazumi Hiraga, Maria A. Juliano, Luiz Juliano, Iuri E. Gouvea and Kohei Oda 96 OUTROS TRABALHOS Descrição Enzimas halofílicas (do grego hals=sal, phil=afinidade) executam funções idênticas aos seus símiles não halofílicos, porém apresentam algumas propriedades bioquímicas diferentes como a exigência por altas concentrações de sal (NaCl ou KCl) na faixa de 1-4M para manter sua atividade, solubilidade e estabilidade além da presença de resíduos ácidos em excesso em relação aos básicos em sua estrutura [101]. Em nosso laboratório, a subtilase extracellular SR5-3 secretada pela bactéria Halobacillus sp., isolada de um molho de peixe Tailandês que contém alta concentração de sal, foi utilizada como modelo de serino peptidase halofílica. O primeiro trabalho (anexo 3.2.1a) apresenta informações detalhadas sobre o efeito do sal na atividade catalítica da peptidase halofílica SR5-3 através de ensaios da enzima com Suc-AAPF-MCA e com o peptídeo FRET Abz-AAPFSSKQ-EDDnp. Foram também analisados o efeito do solvente isotópico e os parâmetros termodinâmicos para ativação da hidrólise dos mesmos substratos pela peptidase SR5-3 na presença de sais. Os resultados obtidos corroboram o efeito de “salting out” como responsável pelo caráter halofílico da SR5-3, e a atividade hidrolítica com ganho de eficiência de até duas ordens de grandeza na presença de 1,5 M de Na2SO4, sendo derivada principalmente da melhora dos processos de catálise ou interações, dependendo da natureza e tamanho dos substratos, com uma melhora na atividade catalítica influenciada pela presença de resíduos no lado linha. 97 OUTROS TRABALHOS Já no segundo trabalho (anexo 3.2.1b), o efeito do sal na espeficidade do substrato pela peptidase halofílica SR5-3 foi estudado usando-se substratos cromogênicos de coumarina, bem como substratos FRET derivados da sequência “mãe” Abz-KLRSSKQ-EDDnp. Através dos resultados obtidos, concluiu-se que a preferência da SR5-3 para os aminoácidos nas posições P3, P2, P1, P1’ ou P2’ dos substratos FRET foi praticamente similar a subtilisina e que na presença de sais (3M NaCl ou 1M Na2SO4), a peptidase SR5-3 apresentou kcat maiores e de KM menores, e um kcat/KM 2-6x maiores comparados com aos substratos FRET controles. Concluiu-se ainda que os sais não afetam significativamente a preferência de um resíduo de aminoácido em posições primárias (P1 e P1’), porém eles afetam a preferência nas posições P2 e P2’. Em contraste, para substratos menores com apenas sítios não linha, a peptidase SR5-3 apresentou um aumento de kcat/KM 20-75 vezes maior comparados ao controle. Os resultados corroboram o postulado de que o aumento nas interações enzima-substrato em subtilases alteram a etapa de determinação na hidrólise peptídica. 98 OUTROS TRABALHOS 2.1 - Ativação da atividade catalítica da subtilase halofilica SR5-3 por sal 2.2. Efeito do sal na especificidade da subtilase halofilica SR5-3 99 OUTROS TRABALHOS 3 Tema: SARS-CoV 3CL. Publicação n°4: Biol. Chem, (2010) 391:1461–1468 Increase of SARS-CoV 3CL peptidase activity due to macromolecular crowding effects in the milieu composition Debora N. Okamoto, Lilian C.G. Oliveira, Marcia Y. Kondo, Maria H.S. Cezari, Zoltan Szeltner, Tunde Juhasz, Maria A. Juliano1, Laszlo Polgar, Luiz Juliano and Iuri E. Gouvea 100