Relato de caso Metástase Renal Bilateral de um Carcinoma de Esôfago Bilateral Renal Metastases from an Esophageal Carcinoma Luis Alberto Batista Peres1, Alexandre Galvão Bueno2, Diogo Alberto Lopes Bader3, Sérgio Luiz Bader4 1Professor Assistente da disciplina de Nefrologia da UNIOESTE; 2Patologista do Anatom-Laboratório de Anatomiapatológica; 3Acadêmico do Curso de Medicina da UNIOESTE; 4Professor auxiliar da disciplina de Urologia da UNIOESTE Trabalho realizado na Universidade Estadual do Oeste do Paraná-UNIOESTE RESUMO Metástases renais de carcinoma primário de esôfago são pouco diagnosticadas, sendo muitas vezes relatadas como achados em estudos de necrópsia. Relatamos um caso que evoluiu para óbito por uremia devido à infiltração renal bilateral. Paciente de 37 anos, branco, sexo masculino, foi admitido com história de disfagia. Investigação revelou carcinoma espinocelular de esôfago pouco diferenciado grau III. Tratado com radioterapia. Oito meses depois o paciente procurou serviço médico com queixa de dor lombar, sendo diagnosticada metástase renal bilateral. Evoluiu com uremia e óbito 10 dias após a biópsia. (J Bras Nefrol 2006;28(2):118-120) Descritores: Carcinoma. Rim. Esôfago. Metástase. ABSTRACT Renal metastases from esophageal carcinomas are very uncommon and frequently reported as a necropsy finding. We described a case who died in renal failure in consequence a bilateral infiltration of kidneys. A 37-year-old man was admitted with dysphagia. Investigation revealed an esophageal espinocellular carcinoma. He was managed with radiotherapy. Eight months later, the patient had lumbar pain, and the diagnosis of bilateral renal metastases was done. He developed renal failure and died ten days later. (J Bras Nefrol 2006;28(2):118-120) Keywords: Carcinoma. Kidney. Esophageal. Metastases. Recebido em 19/04/05 / Aprovado em 18/08/05 Endereço para correspondência: Luis Alberto Batista Peres Rua São Paulo, 769 - apto. 901- Centro 85801-020 Cascavel, PR E-mail: [email protected] J Bras Nefrol Volume XXVIII - nº 2 - Junho de 2006 119 INTRODUÇÃO DISCUSSÃO Metástases renais de carcinoma primário de esôfago são um diagnóstico pouco freqüente, sendo muitas vezes diagnosticadas somente em estudos de necrópsia, atingindo em séries de autópsias a taxa de 8 a 13%, sendo o quarto sítio de metástases esofágicas1. Relatamos um caso raro de metástase renal de carcinoma de esôfago com infiltração difusa dos rins. Metástases renais de carcinoma epidermóide de esôfago são raras. Usualmente são múltiplas e bilaterais, se manifestando clinicamente com dor, hematúria ou proteinúria. Mais comumente são achados de necrópsia2. Tipicamente são indistinguíveis clinica e radiologicamente de malignidade primária renal3. Raramente são isoladas, sendo mais comumente acompanhadas por metástases em outros sítios, como nódulos linfáticos, pulmões, fígado, adrenais e ossos. Geralmente são pequenas, somente 10% são maiores do que 3,0 cm, múltiplas em 80% e bilaterais em 50% dos casos. É comum um período de latência entre o diagnóstico do tumor esofágico e as manifestações clínicas de invasão renal, como hematúria e dor lombar. As anormalidades radiológicas identificadas à urografia excretora não são específicas, podendo-se observar massa renal, rim de volume aumentado ou não-funcionante. Arteriografia renal freqüentemente é normal, ou mostra uma área hipovascularizada. Ultrassonografia e tomografia computadorizada comumente localizam estes tumores a despeito do pequeno tamanho e localização periférica. Nefrectomia é freqüentemente indicada, mas o prognóstico destes tumores renais secundários é reservado. O tratamento do cancer de esôfago metastático é realizado através de radioterapia e/ou quimioterapia1. Relatamos um caso raro de carcinoma esofágico de células escamosas em paciente jovem do sexo masculino, tratado com radioterapia, que evoluiu com metástases renais diagnosticadas oito meses depois. A apresentação clínica do quadro infiltrativo renal foi dor lombar, hematúria e insuficiência renal. Submetido à biópsia renal a céu aberto, devido ao risco de sangramento e possibilidade de nefrectomia. Evoluiu com piora da função renal e a equipe optou por não realizar tratamento dialítico, devido à prognóstico reservado, sem perspectiva de melhora com a diálise. Mori e colaboradores relatam um caso de um paciente de 64 anos que foi submetido à esofagectomia devido á carcinoma de esôfago de células escamosas, sete meses após foi diagnosticado tumor renal à direita, tendo sido submetido à nefrectomia4. Ku e colaboradores (2005) relataram recentemente um caso de metástase renal solitária em paciente de 65 anos portador de carcinoma de células escamosas de esôfago após esofagectomia e lobectomia por tumor pulmonar e ressaltam a necessidade de monitorar metástases de esôfago em outros órgãos, como o rim5. Diante de lesão renal metastática deve-se pensar na possibilidade de sítio primário em esôfago. Marsan e colaboradores descreveram um caso de carcinoma de RELATO DO CASO Paciente de 37 anos, branco, sexo masculino, admitido com história de disfagia. Realizado estudo radiográfico contrastado que revelou esôfago estreitado e irregularidade grosseira em terço médio. Submetido à biópsia que diagnosticou um carcinoma espinocelular pouco diferenciado grau III. O tumor foi considerado inoperável e radioterapia com 5000 rads foi realizada. Oito meses depois o paciente procurou serviço médico com queixa de dor lombar. Investigação laboratorial revelou hematúria e insuficiência renal (creatinina=4,2 mg/dL). Tomografia computadorizada revelou comprometimento bilateral dos rins (não fotografada). Submetido à biópsia a céu aberto, cujo anátomo-patológico diagnosticou carcinoma espinocelular pouco diferenciado (Figura 1). Radiografia de tórax revelou múltiplos nódulos esparsos no parênquima pulmonar bilateralmente. Evoluiu com aumento nos níveis de creatinina atingindo 6,0 mg/dL sete dias após o internamento. Discutido com a oncologia e optou-se pelo tratamento conservador devido à doença metastática terminal. Evoluiu para óbito 10 dias após a biópsia devido à uremia. Figura 1. HE - Aumento de 100 vezes - Parênquima renal demonstrando córtex e medula infiltradas por carcinoma epidermóide pouco diferenciado metastático do esôfago, confirmado por imunohistoquímica. 120 Metástase Renal de Ca de Esôfago esôfago que se apresentou como um tumor renal primário, que na investigação pré-operatória da nefrectomia devido à anemia intensa, foi feito o diagnóstico de carcinoma epidermóide de esôfago3. O prognóstico do câncer de esôfago em fase avançada permanece insatisfatório, apesar dos avanços nos procedimentos de diagnóstico, perio-peratórios e operatórios, como os procedimentos endoscópicos6,7. O câncer de esôfago é uma das malignidades de mais difícil controle somente com a cirurgia8. O tratamento combinado de hipertermia com irradiação e quimioterapia para redução do tamanho do tumor e posterior cirurgia tem sido preconizado9. Relatamos um caso de metástase renal de carcinoma de esôfago raramente descrito, principalmente com infiltração difusa dos rins e evolução para uremia. Salientamos aventar esta possibilidade diante de doença renal neoplásica infiltrativa de sítio primário desconhecido. REFERÊNCIAS 1. Quint LE, Hepburn LM, Francis IR, Whyte RI, Orringer MB. Incidence and distribution of distant metastases from newly diagnosed esophageal carcinoma. Cancer 1995; 76:1120-5. 2. Chan KW, Chan YET, Chan CW. Carcinoma of the esophagus: an autopsy study of 231 cases. Pathology 1986; 18:400-5. 3. Marsan RE, Baker DA, Morin ME. Esophageal carcinoma presenting as a primary renal tumor. J Urol 1979; 121:90-1. 4. Mori N, Tei N, Kakimoto K, Hara T, Koide T. Three cases of metastatic renal tumor. Hinyokita Kiyo 1999; 45:343-7. 5. Ku JH, Park HK, Lee E, Heo DS, Kim HH. Solitary squamous cell carcinoma in the kidney after metachronous development of esophageal and lung cancer. Tumori 2005; 91:93-5. 6. Inoue H, Endo M. Endoscopic esophageal mucosal resection using a transparent tube. Surg Endosc 1990; 4:198-201. 7. Toh H, Baba K, Ikebe M, Kuwano H, Suguimachi K. Endoscopic ultrasonography in the diagnosis of na early esophageal carcinoma. Hepato-Gastroenterol 1993; 40:212-216. 8. Gara CJ, Payne-James JJ, Silk DBA, Misiewics JJ, Menziesgow N. Esophagogastrectomy: a consecutive singlecenter series. Hepato-Gastroenterol 1992; 39:515-9. 9. Kitamua M, Sumiyoshi K, Sonoda K, Kitamura K, Tsutsui S, Toh Y et al. The clinical and histopathological contribuing factors influencing the effectiveness of preoperative hyperthermo-chemo-radiotherapy for the patients with esophageal cancer. Hepato-Gastroenterol 1997; 44:175-80.