CRESCIMENTO DE MOGNO (Khaya senegalensis) SUBMETIDO À DEFICIÊNCIA HÍDRICA EM DIFERENTES DEMANDAS EVAPORATIVAS DA ATMOSFERA Erilva Machado Costa(1); José Eduardo Macedo Pezzopane(2); Siléia de Oliveira Guimarães(3); Alcides Pereira Santos Neto(4); Sileide Santos da Paixão Reis(5) (1) Mestre em Ciências Florestais; UFES/Universidade Federal do Espírito Santo; [email protected]; (2) Professor, UFES/ Universidade Federal do Espírito Santo, [email protected]; (3) Mestre em Ciências Florestais; UFES/Universidade Federal do Espírito Santo; [email protected]; (4) Professor, IFAM/Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas; [email protected]; (5) Bióloga; UESB/Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia; [email protected]. RESUMO A Khaya senegalensis é a espécie mais tolerante à seca dentro do gênero Khaya. No entanto, ambientes úmidos são mais favoráveis ao seu crescimento. O objetivo deste estudo é avaliar o crescimento de plantas jovens de K. senegalensis submetidas ao déficit hídrico em microclimas com demandas atmosférica distintas.. As investigações foram conduzidas no Laboratório de Meteorologia e Ecofisiologia Florestal na Universidade Federal do Espírito Santo, em Jerônimo Monteiro, no período de outubro de 2013 a janeiro de 2014. As 70 dias após a semeadura, as mudas foram transplantadas para vasos com capacidade de 12,5 litros, preenchidos com substrato composto por Latossolo Vermelho Amarelo, palha de café e esterco bovino. O experimento foi montado seguindo delineamento inteiramente casualizado em esquema fatorial 2x2 (duas condições microclimáticas de baixa e alta demanda atmosférica x dois regimes hídricos, irrigadas e não irrigadas) em seis repetições. As condições microclimáticas foram estabelecidas em casas de vegetação climatizada, com controle de temperatura e umidade relativa do ar. Os regimes hídricos formam determinados através de dados obtidos em curvas de retenção de água no solo. As plantas não irrigadas apresentaram reduções significativas de 66,8% e 62,9% na matéria seca total no microclima de baixa e alta demanda atmosférica, respectivamente. A espécie K. senegalensis mostra-se sensível ao déficit hídrico no solo, independente do microclima. Mesmo como água no solo, K. senegalensis apresentou o crescimento reduzido quando mantida no microclima com alta demanda atmosférica, demonstrando intolerância a essas condições microclimáticas. Palavras-chave: Mogno africano, mudanças climáticas, estresse hídrico. INTRODUÇÃO A Khaya senegalensis é uma espécie da família Meliaceae, conhecida como mogno africano no Brasil. Ocorre naturalmente na África, desde a Mauritânia e Leste do Senegal até o Norte de Uganda, preferencialmente em florestas ciliares e savanas florestadas de alta precipitação (LAMPRECHT, 1990). A sua madeira é considerada nobre devido às semelhanças com a madeira do mogno brasileiro (Swietenia macrophylla) quanto às propriedades físicas e mecânicas, tornandoa uma boa opção para atender a demanda crescente de produtos florestais nobres para a indústria moveleira (PINHEIRO, et al., 2011). Dentro do gênero Khaya, a espécie é a mais tolerante à seca, no entanto ambientes úmidos são mais favoráveis ao seu crescimento (JOKER & GAMÉNÉ, 2013). A deficiência hídrica provoca alterações no comportamento vegetal cuja irreversibilidade vai depender do genótipo, da duração, da severidade e do estágio de desenvolvimento da planta (SANTOS & CARLESSO, 1998). O déficit hídrico tanto no solo quanto na atmosfera causam efeitos diretos na capacidade fotossintética das plantas, afetando as reações bioquímicas, o funcionamento do aparato fotossintético e indiretamente o fechamento estomático. Consequentemente, o crescimento da planta é reduzido podendo ocasionar a morte da planta (CUNHA et al. 2013). Assim, os estudos de crescimento e desenvolvimento de plantas em ambientes com baixa disponibilidade hídrica é importante, visto que diversas pesquisas, referentes às alterações climáticas, sugerem o aumento da intensidade, frequência e duração de períodos secos (MISSON et al., 2010). Neste contexto, o presente estudo teve como objetivo avaliar o crescimento de plantas jovens de K. senegalensis submetidas ao déficit hídrico em microclimas com demandas atmosférica distintas. MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi realizado no Laboratório de Meteorologia e Ecofisiologia Florestal do Departamento de Ciências Florestais e da Madeira localizado na Universidade Federal do Espírito Santo, em Jerônimo Monteiro, no estado do Espírito Santo (latitude 20º 47’ 25” S, longitude 41º 23’48” W a 120 metros de altitude). Foram avaliadas plantas jovens de mogno (K. senegalensis Desr.) no período entre outubro de 2013 a janeiro de 2014, totalizando 90 dias de experimentação. As mudas com idade de 70 dias após a semeadura, selecionadas de maneira uniforme quanto a altura e diâmetro do coleto, foram transplantadas para vasos com capacidade de 12,5 litros, preenchidos com 10 kg de substrato composto por Latossolo Vermelho Amarelo, palha de café e esterco bovino devidamente adubado de acordo com as exigências da espécie. O experimento foi montado seguindo delineamento inteiramente casualizado em esquema fatorial 2x2 (duas condições microclimáticas de baixa e alta demanda atmosférica x dois regimes hídricos, irrigadas e não irrigadas) em seis repetições, sendo cada vaso com uma muda correspondente a uma parcela. As condições microclimáticas foram estabelecidas em casas de vegetação climatizada com controle de temperatura e umidade relativa do ar. Para tanto, instalou-se, no interior das casas de vegetação, estações meteorológicas automáticas compostas por sensores de temperatura e umidade relativa do ar (Marca Vaisala, modelo CS500). Os dados foram coletados a partir de um datalogger (Campbell Scientific Inc, CR-10x) com leituras a cada 10 segundos e armazenamento a cada 5 minutos. Os dados déficit de pressão de vapor do ar (DPV) foram obtidos a partir da diferença entre os valores da pressão de saturação de vapor de água (es) e pressão parcial de vapor (ea), de acordo a Pereira et al., (2002). Na Tabela 1, encontram-se os valores máximos, médios e mínimos da temperatura e DPV durante o período de estudo. Tabela 1: Médias das variáveis climáticas registradas em cada microclima durante o período experimental entre os meses de outubro de 2013 a janeiro de 2014. Temperatura média ° C Temperatura máxima Temperatura mínima DPV médio KPa DPV máximo DPV mínimo Microclimas Baixa Demanda atmosférica Alta Demanda atmosférica 24,0 28,9 27,4 34,9 21,8 24,3 0,21 1,41 0,67 2,89 0,02 0,56 Os regimes hídricos formam determinados através de dados obtidos em curvas de retenção de água no solo, obtidas por meio de amostras deformadas previamente peneiradas e saturadas por no mínimo 12 horas em câmara de pressão de Richards com placa porosa para estabilização, adotando um tempo não inferior de três dias. Posteriormente, determinou-se a umidade gravimétrica (U), correspondendo às tensões de 0,010 MPa para capacidade de campo e 1,5 MPa para ponto de murcha permanente com três repetições (EMBRAPA, 1997). A partir desses pontos, determinou-se 13% de água disponível (AD), calculada a partir dos valores da umidade volumétrica na curva de retenção do substrato na capacidade de campo (CC) em 33%, determinada na tensão de 0,010 MPa e para o ponto de murcha (PMP) 20% na tensão 1,5 MPa, utilizando a expressão AD=CC-PMP proposta por Centurion & Andreoli (2000). Todos os vasos foram submetidos à saturação hídrica e posteriormente ficaram sem rega até a drenagem completa da água gravitacional, em seguida os mesmos foram pesados para determinação do peso na CC. Em média, o peso dos vasos na CC foi de 13 Kg com 4,2 litros de água total, sendo deste total 0,546 ml de AD. Seguidamente estabeleceram-se os tratamentos das plantas irrigadas e não irrigadas com base nos valores do peso da CC de campo de cada vaso. As plantas irrigadas receberam 100% da água disponível, com frequência de rega a cada dois dias com 0,930 ml e 1,4 litros no ambiente com baixa e alta demanda atmosférica, respectivamente. As plantas não irrigadas foram submetidas à restrição até que o solo atingisse o nível de 20% da sua CC, quando o nível fosse atingido, realizava-se a reposição da água para que o solo voltasse a sua CC. A reposição da água foi controlada através de pesagens diárias dos vasos, utilizando balança com precisão de 10 g. O crescimento das plantas foi avaliado ao final dos 90 dias de experimentação através da área foliar e matéria seca total das plantas. A área foliar total foi realizada através de medidor de área foliar (LI-COR LI 3100) e a matéria seca após a secagem das folhas, hastes e raízes em estufa de circulação forçada a uma temperatura de 75ºC durante 72 horas. Os dados de crescimento das plantas foram submetidos à análise estatística para avaliar possíveis interações entre os fatores, e quando as médias significativas, estas foram submetidas ao teste de “Tukey (P<0,05)”, utilizando o software Sisvar 5.3 (FERREIRA, 2010). RESULTADOS E DISCUSSÃO Constatou-se, no presente estudo, que as plantas de mogno não irrigadas apresentaram reduções significativas de 66,8% e 62,9% na matéria seca total no microclima de baixa e alta demanda atmosférica, respectivamente (Figura 1A). A baixa disponibilidade hídrica no solo para planta afeta principalmente os processos metabólicos como fechamento estomático, transpiração e redução na fotossíntese (PORTES et al., 2006), diminuindo assim o alongamento celular e posteriormente a produção de matéria seca. Algumas plantas toleram déficits hídricos moderados de 70% a 50% na redução da água disponível no solo (OLIVEIRA, 2000). Porém, um déficit de 20% provoca efeito danoso no crescimento da planta, como observado para o mogno. Cabral et al., (2004) ao estudarem mudas de Tabebuia aurea sob 25% da água disponível no solo, verificaram redução no crescimento das plantas, principalmente na parte aérea. Lenhard et al., (2010) avaliando o crescimento de plantas jovens de pau-ferro (Caesalpinia ferrea) submetidas ao déficit hídrico, constataram que as plantas reduziram a matéria seca total quando mantidas com 12,5% da água disponível no solo. Comparando os microclimas em cada regime hídrico, notou-se que a alta demanda atmosférica reduziu o acúmulo de matéria seca nas plantas não irrigadas, deixando em evidência o efeito estressante do microclima sobre o mogno, mesmo com água no solo. Os valores de matéria seca das plantas não irrigadas foram semelhantes entre os microclimas (Figura 1B). Segundo Passioura (1997), a seca é considerada uma ocasião na qual as plantas sofrem redução do seu crescimento ou produtividade, devido à carência do suprimento de água, ou a um grande déficit de umidade do ar, mesmo com o suprimento de água adequado do solo. Desta forma, alguns trabalhos indicam que a transpiração aumenta com o aumento da demanda atmosférica, e que as respostas variam entre espécies (GHOLIPOOR et al., 2010; KHOLOVÁ et al., 2010). A B Figura 1: Valores médios da matéria seca total de plantas de mogno irrigadas e não irrigadas, mantidas em microclimas de baixa e alta demanda atmosférica, no período de outubro de 2013 a janeiro de 2014. Para a área foliar, as plantas não irrigadas apresentaram decréscimos significativos de 75,2% e 44,6% nos microclimas de baixa e alta demanda, respectivamente (Figura 2A). Nas plantas irrigadas, a área foliar reduziu significativamente no microclima de alta demanda atmosférica, por outro lado as plantas não irrigadas aumentaram a área foliar quando mantidas na alta demanda atmosférica (Figura 2B). A redução na área foliar pode estar relacionada à perda das folhas, ocasionada pelo intenso estresse hídrico no solo como na atmosfera. Resultados semelhantes foram encontrados por Barros & Barbosa (1995) ao verificarem redução significativa na área foliar total das plantas jovens de Anadenanthera macrocarpa e Acacia farnesiana quando mantidas sob deficiência hídrica. Resultados similares também foram encontrados por Figueirôa et al. (2004) para Myracroduon urundeuva e Cabral et al. (2004) para T. aurea, quando essas espécies foram mantidas sob 25% da água disponível para planta. C D Figura 2: Valores médios da área foliar total de plantas de mogno irrigadas e não irrigadas, mantidas em microclimas de baixa e alta demanda atmosférica, no período de outubro de 2013 a janeiro de 2014. CONCLUSÕES A espécie Khaya senegalensis mostra-se sensível ao déficit hídrico no solo, apresentando redução na matéria seca total e área foliar, independente da condição microclimática. As plantas irrigadas apresentaram o crescimento reduzido sob a alta demanda atmosférica, demostrando assim sensibilidade às condições do microclima com elevado déficit de pressão de vapor no ar. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARROS, L. M.; BARBOSA, D. C. A. Crescimento de Acacia farnesiana (L.) Willd. em casa de vegetação. Phyton, v. 2, n. 57, p. 179-191. 1995. CABRAL, E. L.; BARBOSA, D. D. A.; SIMABUKURO, E. A. Crescimento de plantas jovens de Tabebuia aurea (Manso) Benth. & Hook. f. ex S. Moore submetidas a estresse hídrico. Acta Botanica Brasílica, v. 2, n. 18, p. 241-251. 2004. CENTURION, J. F.; ANDREOLI, I. Regime Hídrico de alguns solos de Jaboticabal. Revista Brasileira de Ciência do Solo. Viçosa, v. 24, p.701-709, 2000. CUNHA, R. L. M.; FILHO, B. G. S.; COSTA, R. C. L.; VIÉGAS, I. J. M. Physiological assessment in young Brazilian and African mahogany plants during the dry and rainy seasons in northeastern Para state, Brazil. 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