Núcleo de Educação Popular 13 de Maio - São Paulo, SP . CRÍTICA SEMANAL DA ECONOMIA www.criticadaeconomia.com.br EDIÇÃO Nº 1224/1225 – Ano 29; 1ª 2ª Semanas Fevereiro 2015. País rico é país com pobreza Enquanto os trabalhadores ficam mais pobres, a alta classe média improdutiva move os mercados dos EUA. A prosperidade dos ricos e a pauperização absoluta da classe média e baixa renda reconfiguram todos os mercados da maior economia do planeta, de imóveis a roupas, passando por alimentos e cerveja. E a economia do mal estar pode crescer livremente. JOSÉ MARTINS.. A pobreza não atrapalha a vida do capital. Nunca atrapalhou. A administração deste problema ele deixa por conta dos sindicatos, das ONGS humanitárias, dos educadores, da alta burocracia estatal, da justiça e da polícia. E dos partidos políticos, claro, onde a burguesia e seus capachos pequeno-burgueses se movimentam para legalizar e perenizar as regras democráticas da luta de classes. Tanto de direita como de esquerda, embora estes últimos tenham se mostrado bem mais eficientes na patriótica missão de administrar a acelerada pauperização absoluta e matança da classe operária nas primeiras décadas do século 21. O aumento ininterrupto da pauperização absoluta da classe operária mundial é um elemento de destaque na lei geral da acumulação do capital, desenvolvida por Marx e Engels, especialmente nos livros 1 e 2 de O Capital. Os revolucionários nunca tiveram ilusão de que a pauperização da classe produtiva pudesse ser pelo menos relativizada, amenizada no desenrolar histórico do modo de produção capitalista. Nem pelos mecanismos do mercado e muito menos pela ação política do Estado. A possibilidade de uma imaginária pauperização relativa é a contra-tese da esquerda democrática e reformista que acredita na harmonia de interesses entre trabalho e capital ou, dito de maneira mais popular, na “redução das desigualdades de renda”. A DEMANDA QUE SALVA – É impossível encontrar um meio-termo entre a tese de Marx e Engels da pauperização absoluta e a contra-tese dos reformadores sociais da pauperização relativa. E a comprovação de uma ou da outra só pode ser encontrada no desenvolvimento real da economia. Já vimos em recentes boletins que o nível dos salários e do emprego das massas é importantíssimo para a produção de capital, dos lucros e, finalmente, para o crescimento da economia. 1 Mas que é cada vez menos importante para o consumo ou demanda das mercadorias produzidas. Quer dizer, o capital não depende da demanda dos trabalhadores produtivos de mais-valia para a realização da massa de mercadorias carregadas de mais-valia. Se o capital dependesse da elevação dos salários e do consumo dos trabalhadores produtivos, aí sim teria um grande motivo para se preocupar com o aumento da pobreza em todas as áreas e países do mundo. Mas, ao contrário dessa hipótese, o que se verifica no movimento econômico real é uma substituição do consumo dos trabalhadores produtivos pelo consumo das classes improdutivas e proprietárias do capital. Essa irrelevância do consumo da classe trabalhadora para a forte expansão atual da economia dos Estados Unidos é comprovada por fatos descritos em matéria recentemente publicada pelo The Wall Street Journal, o mais prestigioso jornal da mídia econômica mundial. Resumidamente, a matéria quer dizer que enquanto os trabalhadores sofrem, a alta classe média move os mercados dos EUA. 1 “ O surgimento de uma economia dividida nos Estados Unidos, na qual as famílias mais ricas continuam prosperando, enquanto os americanos de classe média e baixa ainda encontram dificuldades, está reconfigurando todos os mercados, de imóveis a roupas, passando por alimentos e cerveja. É um conto de duas economias... Há um mercado de alto padrão que está florescendo. Ao mesmo tempo há uma classe média e baixa que não tem esperança de aumento de salário.” 2 SALÁRIO DESCE E LUXO SOBE – Pelos números apresentados na matéria do jornal, a crise de 2008-2009 causou a erosão dos rendimentos da maioria das famílias norte-americanas e pôs fim a um período de várias décadas de crédito fácil para a classe média e baixa. Os padrões norte-americanos de consumo depois da última crise revelam por que muitas das empresas americanas estão se reorientando para atender consumidores de alta renda. E de bens de luxo. Segundo estudo dos economistas Barry Cynamon e Steven Fazzari, do Federal Reserve Bank of St. Louis (Fred, banco central dos EUA em St. Louis), a média de gastos por domicílio entre os 5% das famílias americanas com maior renda – 1 Chamam a classe trabalhadora de “middle class- and lower-income”, literalmente “classe média e baixa renda”. Retratam, na verdade, classes sociais definidas pelo rendimento ou capacidade de consumo e não mais pela sua função no processo de produção. Na verdade, esse é o padrão mundial da economia política da burguesia: negar a existência de um modo de produção capitalista e suas características relações de produção para, em seguida, substitui-lo por um simples mercado de oferta e demanda de um produto, quer dizer, oferta e demanda de uma massa de utilidades de um lado e, de outro, uma massa de consumidores diferenciados apenas pelo nível de rendimento. Todos são produtivos e todos são proprietários. As classes sociais são substituídas por “famílias” com diferentes níveis de rendimentos que as habilitam a consumir ou “poupar” mais ou menos que as outras. 2 The Wall Street Journal – How a Two-Tier Economy Is Reshaping the U.S. Marketplace [Como a Economia de Dois-Estratos Está Remodelando o Mercado dos EUA] – 28/Janeiro/2015 http://www.wsj.com/articles/how-a-two-tier-economy-is-reshaping-the-u-s-marketplace1422502201?tesla=y 2 ajustada pela inflação – subiu 12% entre 2009 e 2012. No mesmo período, os gastos das demais famílias caíram 1% por domicilio. A recuperação do consumo depois da crise “parece ter sido, em grande parte, provocada por consumidores de alta renda” afirmam Cynamon e Fazzini. Eles descobriram também que os 5% das famílias norte-americanas representam cerca de 30% do consumo em 2012, em comparação com os 23% registrados em 1992, como é retratado na figura abaixo: EUA: variação média dos gastos das famílias, desde 1989. (ajustado pela inflação) Fonte. Synamon, FRED St. Louis e Fazzani, Universidade de Washington, em St. Louis. Não é de se estranhar, relata a matéria do Wall Street Journal, que os varejistas que se concentram nas classes média e baixa, como J.CPenney, Macy’s, Sears e Target, estejam em dificuldades. Já o varejo de luxo atravessa uma fase de bonança. A demanda se bifurcou. A mudança aparece até no consumo de bebidas alcoólicas. As vendas de cervejas do segmento “premium” de luxo subiram 16% desde 2007, dado deflacionado, enquanto as vendas de marcas populares mais baratas cresceram 8% e, finalmente, as de preço médio caíram 1%. A ECONOMIA DO MAL ESTAR – Até poucos anos atrás, a maioria das pessoas ainda acreditava na esdrúxula regra da economia política do capital de que só o aumento do emprego e da massa salarial dos trabalhadores forneceria a demanda necessária ao funcionamento do mercado. Esta ingênua formulação – com a qual 3 a economia do capital quer demonstrar que todos, mais cedo ou mais tarde, podem alcançar o bem-estar na economia capitalista – é exatamente a base ideológica daquela esquerda de reformistas propagadores da possibilidade de harmonização dos interesses do trabalho e do capital. Com base nesta crença do colaboracionismo político, o problema não é mais a existência do modo de produção capitalista, da propriedade privada dos meios de produção, do mercado e do Estado – mas do modo de repartição das mercadorias. Como se o segundo não fosse rigorosamente determinado pelo primeiro. Então, fica fácil para a propaganda burguesa e pequeno-burguesa substituir a questão social do aumento da exploração do capital e classes dominantes sobre a classe trabalhadora pelo problema meramente político da “redução da desigualdade de renda” entre famílias ricas e famílias pobres. Mas nada melhor do que fatos econômicos reais para desmascarar as piores falsificações políticas, como exprimem os dados apresentados acima. O que ocorre atualmente com a atual reconfiguração da demanda na maior economia do planeta não é um mero acidente de percurso, que pode ser revertido politicamente, com a harmoniosa parceria entre capital e trabalho. Acontece que nas primeiras décadas do século 21 a pauperização absoluta se espalha como lepra social no interior das maiores potências econômicas. Isso não tem nada a ver com a “desigualdade ou concentração da renda”. Tem a ver exclusivamente com as necessidades de valorização e de acumulação do capital, quer dizer, com a própria vida do atual modo de produção social. No mesmo ritmo em que as crises periódicas são superadas, a pauperização absoluta das massas aumenta nas economias mais ricas do mundo. O que era impensável até poucos anos atrás, agora as favelas, a fome e o racismo social característicos da periferia do sistema aparecem de maneira mais visível na paisagem urbana de EUA, Alemanha, Japão, França, Suécia, Dinamarca... É o lado revolucionário deste sanguinário processo histórico: o proletariado das grandes potências capitalistas do centro do sistema torna-se cada vez mais negro, asiático, latino e muçulmano. Torna-se, materialmente falando, mais internacional do que jamais se poderia imaginar. Em 2015, estamos completando 28 ANOS DE VIDA. Vinte e sete anos informando e educando a classe trabalhadora! ASSINE AGORA A CRÍTICA ENTRE EM CONTATO CONOSCO NO NOSSO SITE www.criticadaeconomia.com.br e saiba as condições para a assinatura! 4 5