análise das canções de Don e Ravel

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE JUSSARA
LICENCIATURA EM HISTÓRIA
MÚSICA POPULAR BRASILEIRA EM TEMPOS DE DITADURA:
ANÁLISE DAS CANÇÕES DE DON E RAVEL (1974-1982)
ANTÔNIO SABINO DE CARVALHO
JUSSARA-GO
2012
ANTÔNIO SABINO DE CARVALHO
MÚSICA POPULAR BRASILEIRA EM TEMPOS DE DITADURA:
ANÁLISE DAS CANÇÕES DE DON E RAVEL (1974-1982)
Monografia apresentada ao Departamento de
História da Universidade Estadual de Goiás –
UEG, Unidade Universitária de Jussara/GO,
como requisito parcial para obtenção do título
de licenciado em História.
Orientador: Me. Aruanã Antonio dos Passos.
JUSSARA-GO
2012
Título: Música Popular Brasileira em tempos de ditadura: análise das canções de Don e
Ravel (1974-1982)
Monografia defendida e aprovada em 15 de Fevereiro de 2012, pela Banca
Examinadora constituída pelos professores:
Professor Orientador: Aruãna Antonio Passos
Professor: Rodrigo Fernandes da Silva
Professor: Wilson de Souza Gomes
4
Dedico este trabalho à minha esposa: Terezinha,
por me incentivar a voltar a estudar, estando
sempre do meu lado nos momentos mais difíceis.
E também aos meus dois filhos sendo a minha
maior riqueza.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço o meu professor orientador, Aruanã Antonio Passos e todos os professores
que, com imenso carinho passaram o conhecimento ao longo destes anos.
Todos os colegas de curso por estes anos que convivemos juntos.
Todos os funcionários da unidade que sempre me atendeu bem, quando eu os solicitei.
O meu aprendizado não ficou restrito somente as disciplinas: aprendi que á vida esta muito
além dos muros de uma universidade.
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“Um dia a maioria de nós irá se separar.
Sentiremos saudades de todas as conversas
jogadas fora, as descobertas que fizemos, dos
sonhos que tivemos, dos tantos risos e
momentos que compartilhamos”.
Vinícius de Moraes
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CARVALHO, Antônio Sabino de. Música Popular Brasileira em tempos de ditadura:
análise das canções de Don e Ravel (1974-1982). 2012. Monografia em História. UEG
(Universidade Estadual de Goiás - Unidade Universitária de Jussara).
Resumo: Analisaremos a música no período da ditadura militar através da produção cultural
da época pela dupla de cantores Don e Ravel. Ao direcionarmos nossa pesquisa, para este
contexto vivenciado pelos brasileiros, procuramos entender a trajetória desses artistas, com
um olhar para um novo viés historiográfico, que pudesse a vir compreender a música para
além da dicotomia engajamento-alienação bastante forte em nossa historiografia do período
autoritário. Ao abordar o período compreendido entre 1974 a 1982, iremos analisar os
acontecimentos e o contexto histórico no qual estavam inseridos Don e Ravel, em meios há
uns efervescentes movimentos culturais. Na década 70, surge varias tendências musicais,
como bossa nova, tropicália e jovem guarda, e vários cantores adaptando seu estilo musical de
acordo com sua vocação. Para tanto, buscamos analisar a obra de Don Ravel não pelo viés do
engajamento, mas da própria formação da indústria cultural brasileira. Assim, esperamos
contribuir para uma crítica da produção e circulação de bens culturais e sua absorção pela
sociedade em tempos de ditadura.
Palavras–chave: Ditadura Militar; Música Popular Brasileira; Don e Ravel.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
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CAPÍTULO 1 – A MÚSICA POPULAR BRASILEIRA EM TEMPOS
DE DITADURA MILITAR: ELEMENTOS PARA UMA ANÁLISE
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CAPÍTULO 2 – TEORIA CRÍTICA DA INDÚSTRIA CULTURAL E
MPB: APORTES TEÓRICOS E METODOLÓGICOS
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CAPÍTULO 3 – ENGAJADOS OU NÃO-ENGAJADOS? ANÁLISE
DAS CANÇÕES DE DON E RAVEL EM TEMPOS DE DITADURA
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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FONTES
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por objetivo, analisar a música no período da ditadura militar que
ocorreu recentemente em nossa história, onde pretendemos observar do ponto de vista da
indústria cultural, os caminhos percorridos pela dupla de cantores Don e Ravel. Ao
direcionarmos nossa pesquisa, para este contexto vivenciado pelos brasileiros, foi no sentido
de procurar entender a trajetória desses artistas, com um olhar para um novo viés
historiográfico, que pudesse a vir esclarecer o estilo musical deles.
Podemos observar que não é somente através das explicações advindas da política
que podemos esclarecer pontos obscuros e as divergências que tange os esclarecimentos sobre
determinados elementos, que de certa forma contribuíram como agentes participantes neste
espaço histórico registrado na memória nacional brasileira. E por ser um tema contemporâneo
há muitas cicatrizes que ainda não se fecharam que dificultam os trabalhos dos pesquisadores
sobre os mesclados anos ditatoriais, assim mantendo a distância necessária, dando uma
isenção e credibilidade a sua produção historiográfica.
Ao abordar o período compreendido entre 1974-1982, iremos analisar os
acontecimentos e o contexto histórico no qual estavam inseridos Don e Ravel, em meios há
uns efervescentes movimentos culturais. Na década de setenta surge varias tendências
musicais, como bossa nova, tropicália e jovem guarda, e vários cantores adaptando seu estilo
musical de acordo com sua vocação artística. No meio desta demanda na busca de espaço que
viesse proporcionar um retorno financeiro, á dupla Don e Ravel entram no mercado
fonográfico com suas melodias, procurando superar a concorrência.
As canções de Don e Ravel contem letras com uma temática diferente das maiorias das
músicas da época, que vinham carregadas de conteúdos políticos, engajadas na luta contra o
sistema político vigente no Brasil. Eles procuram fazer músicas alegres exaltando as belezas
das paisagens, e das mulheres brasileiras. Diante de um espaço temporal, denominado de
ditatorial, influenciador dos meios de comunicação, ao divulgar, e justificar as suas ações.
Manipula os acontecimentos, para que as massas populares fiquem anestesiadas, e
imobilizadas pelo gesso da propaganda.
Ao ouvir as músicas dos irmãos Don e Ravel1, lançamos um olhar examinador no
sentido de analisar as canções, relacionando com o contexto histórico discutido em si dentro
1
Nasceram em Itaiçaba, no Ceará, Eustáquio em 1944 e Eduardo em 1947. Mudaram-se para a cidade de São
Paulo em 1950. Eduardo obteve o apelido de Ravel, devido sua aptidão pela arte. Em 1960, a dupla, então já
conhecida como Dom & Ravel, lançaram o seu primeiro LP em 1969, conhecido como "Terra boa", que trazia
outras canções como "Você também é responsável", transformada em 1971. Nos anos de 1970 a dupla atingiu
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do período da ditadura militar. E desta forma verificar qual a linha musical adotada por eles. E
por que os militares apropriaram-se de suas músicas beneficiando em suas propagandas para
melhorar a imagem de um governo.
A nossa pesquisa baseada no referencial teórico que esta apoiada, em abordagem de
Rodrigo Duarte. Pensando a história deste espaço temporal de grande importância a ser
esclarecidas, elaboraremos a nossa pesquisa na direção do esclarecimento de pontos obscuros
que ainda não tenha sido devidamente esclarecido.
A escolha da música, como sendo nosso objeto não foi decisão aleatória, porque
podemos notar que é um campo aberto, que ainda não foi devidamente trabalhado. Apesar de
ser muito subjetiva a música nos fornece dados importantes de acontecimentos de
determinadas sociedades, e procurando nos embrenhar por esse emaranhado de fragmentos
queremos construir nosso texto dentro da contribuição oferecida pela música. No contexto
histórico dentro do recorte temporal que fizemos há uma efervescência de movimentos sociais
e cultural muito grande, e como é sabido á maioria de oposição e de protesto contra o regime
estabelecido pelos os militares.
Portanto a nossa opção pela música como fonte de pesquisa foi motivada pelo
engajamento de artistas, cantores e compositores nos movimentos deflagrados neste período.
E verificando os posicionamentos das correntes existentes na época percebemos as
tendências, MPB, Tropicália e Samba, usaram nas letras de suas músicas as mais variadas
formas de driblar a censura nas suas canções de protesto contra a ditadura. Os militares não
pediam, simplesmente apoderavam das músicas, as usavam em suas propagandas para
melhorar a imagem do governo junto à população.
E com isso criou-se sérios problemas para os cantores perante os críticos de músicas
que estavam engajados na luta contra a ação ditatorial vigente no País. E suas melodias foram
criticadas e rejeitadas pelos intelectuais de esquerda. Foi a partir desse embate que
começamos a questionar as relações entre música de protesto e a pró-ditadura. E também os
métodos usados pelos militares, através das canções para desviarem atenção do povo da
verdadeira realidade.
Visando trabalhar dentro deste foco, escolhemos uma dupla de cantores e
compositores, que suas músicas foram usadas pelo governo em suas propagandas. Dessa
grande sucesso, com a canção "Eu te amo meu Brasil”, conhecidos como um dos maiores cantores do ufanismo
Brasileiro Brasileiro. In: www.brasilcultura.com.br. Publicado em 17/06/2011 pela Redação, nas categorias
Cultura, Música, Notícias. Acessado em 01/02/2012.
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forma procuraremos desvendar uma problemática levantada por nós, dentro de um debate
oferecido pelas fontes historiográficas, a qual pesquisará para obter o conhecimento
necessário para elucidação dos fatos. Espero que este trabalho tenha uma relevância de certa
importância na contribuição do conhecimento.
No primeiro capitulo a música popular brasileira em tempos de ditadura militar:
elemento para uma analise. Abordaremos a música popular brasileira, analisando o seu
desenvolvimento, e sua contribuição no contexto histórico dentro do período da ditadura
militar. Neste capitulo vamos discutir a formação de nosso gênero musical, depois de um
período de decadência pelo qual a nossa identidade social e cultural havia passado.
No segundo capitulo situaremos nossos aportes teóricos e metodológicos, dentro da
indústria cultural, e as influencias sofridas pela MPB. Para dar suporte a nossa pesquisa
vamos trabalhar com autores que nos ofereça embasamentos teóricos; como Rodrigo Duarte,
que faz uma analise da Indústria Cultural de massa, sobre a música popular brasileira. E para
finalizar no terceiro e ultimo capitulo vamos analisar as músicas de Don e Ravel,
contextualizando com o período compreendido entre 74 á 85. Fazendo um levantamento do
histórico artístico, e o posicionamento dos cantores Don e Ravel, no período da ditadura,
abordando as influencias contida em suas canções. E pra isto contaremos com os dados
bibliográficos de autores como Carla Pinsky, Marco Napolitano, Geraldo Vince. Que ira nós
informar o significado das músicas em um contexto histórico dentro de um período ditatorial.
No terceiro capitulo iremos analisar as canções que marcaram a dupla Don e Ravel
fazendo analise não só das canções más do seu contexto histórico em que está inserido.
Músicas que marcaram o nosso país em tempos de censura.
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CAP. 1 – A MÚSICA POPULAR BRASILEIRA EM TEMPOS DE DITADURA
MILITAR: ELEMENTOS PARA UMA ANÁLISE.
Falar sobre música é voltar às origens em mesclados anos de transformação. A música
a priori foi se desenvolvendo ao longo dos tempos em: perfomaces, sons, melodias, estilos,
sonorização, letra e contexto separando da obra e autor. Ao analisarmos a música popular
brasileira, foi ganhando reconhecimento e circulação em diversas culturas em massa, sendo a
música constituída por: formas, gêneros e estilos onde a herança cultural ocasionou a
globalização musical e estética. Podemos observar que:
A música popular urbana reuniu uma série de elementos musicais, políticos e
performáticos da música erudita (o lied, a chançan, àrias de ópera, bel canto, corais
etc.) da música “folclórica” (danças dramáticas camponesas, narrativas orais, cantos
de trabalho, jogos de linguagem e quadrinhas cognitivas e morais e do cancioneiro
“interessado” do século XVIII e XIX. (NAPOLITANO, 2002, p.08)
A música popular ligada à urbanização e as classes populares consideradas (classes
sociais) ligando a vida cultural das pessoas, em que a música reuniu grandes performaces
musicais como: a erudita, música religiosa, folclórica e popular. Segundo Canclini (1998 apud
Napolitano 2002, p.10 ).“Como conseqüência do caráter hibrido de nossas culturas nacionais,
o plano “culto” e “popular”, “hegemônico” e “Vanguardista”, “folclórico” e “comercial”.
Seguindo a linha de pensamento do autor, podemos dizer que a música passou por períodos de
transações cada qual com caráter diferente. A música ao longo dos tempos tem proporcionado
aos musicólogos a trabalhar a música como um todo. Vale destacar que a música estava
entrelaçado no cotidiano das pessoas em festas foram surgindo ritmo, sons e música cada vez
mais aglutinado em que ritmos africanos misturados com modinhas e músicas profanas e
religiosas.
Em 1950 período que a música brasileira passa por um processo de decadência
conhecida como idade das trevas, 1930 á 1940 período da era do radio, o ritmo marcado pelas
separações social na cidade do Rio de janeiro na Zona Norte – pobre e Zona Sul classe media
no ritmo dos sambas onde os jovens dos morros desligados a tradição popular.
Nos ano 1950 foram surgindo cantores musicais de estilo: Wilson Batista, Armando
Cavalcanti e Haroldo Lobo predominando as machinhas e frevo. A criação da revista música
popular em 1991(Paiano) de perspectiva folclórica marcado por um publico amplo e anônimo.
A revista música popular ganhou ajuda de diversos autores de jornais como: Fernando Lobo,
Manuel Bandeira, Sergio Porto, Claudio Murilo Leal voltada por um publico mais estilista
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com tendências folclóricas tendo diversos segmentos intelectuais que atendia os ouvintes o
folclorista urbano era visto como faceta cultural.
Em 1937 Almirante com canções: o Choro e samba na Vila Isabel com samba
moderno. Em 1960 consagração da MPB- culta e 1968 período em que preocupavam com a
autencidades dos gêneros e canções. Verificaremos que: “Em 1950 passaram a ser sinônimos
de baixa qualidade representada por boleros exagerados, sambas pré- fabricados e trilhas
sonoras de quermesse”. (NAPOLITANO, 2010, p.64).
Neste documento, a música popular brasileira composta por: boleros, sambas de má
qualidade em que a linguagem e composição não tinham valor estético. Tal aspecto se
caracteriza por estruturas musicais pelo qual a sociedade não se definia. Ao fazer uma
retrospectiva linear a música em 1930 propagou-se a radiodifusão ocasionando expectativa à
população urbana em levar a cultura em diferentes performaces da música brasileira.
Em 1943 – 1945 períodos que milhões de melodias propagaram nas emissoras de
rádios como: o programa da Manoel Carlos com novas e extrovertidas performace da música
brasileira, mudança da cultura popular e novos gêneros. Em 1930, agregado aos novos
gêneros musicais como: nordestino, estrangeiros e sertanejos. O choro música brasileira
reconhecida pelo samba, nesta época o samba de morro composto por compositores mítico
trazendo inovação aos gêneros da época. Como: Wilson Batista, Geraldo pereira e Zé Keti.
Neste aspecto a música foi revitalizando as estruturas e melodias, porém complexas. Podemos
dizer que: “O samba-canção desenvolveu - se um tipo de tratamento musical moderno,
baseando nos timbres do cool – jazz (caixa de bateria) piano dedilhado, marcação sutil de
contrabaixo”. (NAPOLITANO, 2010, p. 67)
O samba-canção baseou em novos timbres dando ênfase ao samba com o cool-jazz
marcação sutil do contrabaixo em sua forma e ritmo, criticado pelos tradicionais e pelos
modernos. O baião dança e cantos populares com som de viola e outros instrumentos tiveram
seu glamour na década de 1940 como: xote das meninas de Luiz Gonzaga. A música
nordestina e caipiras que marcaram a época. A peça Orfeu da Conceição escrita em 1943 por
Vinicius de Moraes configurando se a linguagem do cinema e teatro, expiração que veio
visitar a favela da praia do pinto. Sua obra apontava a fusão da tradição letrada com a erudita,
música popular brasileira proporcionando aos cidadãos observar diversos olhares culturais.
O Brasil atravessou diversas tiranias ligadas ao regime militar brasileiro. A cena
musical em varias performances como: letra música obra e documento e produção em época
de autoritarismo, estado autoritário da música em meados dos séculos 1968-1981. O regime
militar tinha por excelência vigiar e controlar o espaço público garantindo a paz social. É
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notório como a vigilância sobre a sociedade era constante por funcionários públicos e civis.
As instituições ligadas à cultura, educação e arte eram vigiadas pela comunidade. Em
determinado evento musical, para os agentes era motivo de repressão tendo caráter subversivo
confundidos como cidadão inocente. Em 1974 períodos do golpe militar em que os agentes
civis e militares investigavam de forma brutal todo individuam com caráter suspeito.
Salientamos que:
Trata-se, realmente de um relato apologístico dos efeitos de elementos
reconhecidamente comunistas e nacionalistas, contrários ao regime instaurado a
31/03/1964. Em todo a narrativa, os editores usavam expressões depreciativas, com
referencia ao governo revolucionário fazendo crer aos leitores encontrar-se o país
sob regime do terror. (NAPOLITANO, 2007, p.106).
Com caráter a priori, todo documento informativo: prontuário e dados, o individuo era
suspeito, porém editores usavam narrativas para expressar á prisão que eram vivenciadas,
fazendo com que os leitores percebessem o regime em vigor. Alguns cantores comunistas e
compositores que destacaram: Nara Leão, Vinicius de Moraes, Caetano Veloso, Gilberto Gil,
Francisco Buarque de Holanda sendo canções voltadas ao publico jovem.
Em 1967 à 1968 configuração da MPB, sucesso dos anos 60 tendo a música imagem
de propaganda subversiva. Em 1971, show circuito universitário passando a ser o primeiro
documento e relatório informativo. Chico Buarque primeiro inimigo do regime militar e
segundo Ivan Lins, Milton Nascimento e Caetano Veloso aumentando o grau de suspeição ao
regime militar ligados aos prontuários e fichas2.
Com o atentado do Riocentro que seria contra o show da MPB no dia 1° de maio de
1981 sendo os agentes de repressão interligados as campanhas partidárias e entidades de
oposição, passaram a ser motivo de preocupação dos agentes uma vez que esses eventos e
espaços sociais eram considerados subversivos. Com essa guerra psicológica uniram-se
alguns cantores e compositores em meio cultural para promover o bem comum da sociedade e
classes sociais, visando alterar o regime a priori. Edu lobo, Geraldo Vandré e Chico Buarque
considerados comunistas. Vejamos o que diz Napolitano:
2
Arquivo do Dops sendo (Departamento de Ordem Política e Social) paulista constitui um dos mais completos
acervos da polícia política e com mais de 165 mil acervos de documentos investigativos, sendo arquivos que
recordam candidatos que foram combatentes pela democracia. A espionagem era interna dedicando a bisbilhotar
a vida dos brasileiros de 1963 a 1983 (Chiavenato, 1994, p.104).
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2. A ação se desenvolve através da chamada “música de protesto”, numa propaganda
subliminar muito bem conduzida. Entre as músicas mais difundidas por aquelas
emissoras, destaca-se AROEIRA, de Geraldo Vandré, cujo texto emprega
ostensivamente a revolta e a subversão.
3. Geraldo Vandré, que é também fiscal da SUNAB, é tido como comunista atuante.
Consta que seu pai, médico em João Pessoa, é um dos chefes comunistas do Estado
do Paraíba.
4. No dia 5 de julho teve inicio o programa “DIA DA M.P.B” desenvolvido pelo
referido grupo. O programa procura interessar particularmente aos estudantes,
alguns portando cartazes com instruções também de protesto, outros com frases
MPPD (Movimento Popular Pela Democracia). O programa desse dia foi dirigido
pela cantora Elis Regina, o próximo, dia 12/07, será dirigido por Geraldo Vandré.
(NAPOLITANO, 2007 p.106).
Em relação à citação acima, podemos dizer que a música era bem representada pelos
autores como forma de revolta e subversão motivos pelo qual os agentes eram filtrados em
determinados ambientes social em que autores e compositores não tinham liberdade de
expressão, com isso criaram programas que interessavam aos estudantes sendo o mesmo forte
protestantes do governo militar. Podemos dizer que:
28/03/73 – show no Anfiteatro do Biênio – Grêmio politécnico da USP - 1.500
universitários. No final cantou “Cálice”, música proibida oficialmente. Boletim
informativo do Grêmio Politécnico. “Estando entre os participantes dos festivais dos
anos 60” e “artista ligado a Chico Buarque de Hollanda”. (NAPOLITANO, 2007,
p.122).
Este documento retrata a humanidade na época da ditadura em épocas que a sociedade
não tinha liberdade de expressão que vivia calado, oprimidos pelos agentes e civis e que os
seres humanos pediam para ser livre, abrir a porta sem medo e repressão, libertar dos maus
acarretado pelas guerras psicológicas. A música “Apesar de você” retratando ao regime
militar sobre tortura dos militares mesmos havendo holocaustos sempre haverá um amanhã
onde futuros serão melhores, páginas obscuras serão reveladas nas primícias do dia a dia. Em
que as pessoas que trabalhavam no regime militar serão julgadas e condenadas quando chegar
o momento todo sofrimento irá acabar.
Ao longo das pesquisas acadêmicas a música popular e erudita foram objeto de estudo
em sua pratica musical como: as formas, estilos, fusões caracterizando diversas culturas
musicais em seu valor estético no universo da música. Grandes modinhas surgem tocadas em
violão e batuques expressando a música e sua linearidade tratando como objeto sonoro a
evolução no campo tecnológico que vai do áudio-visual, linguagens renovadas. As circulações
das músicas permitindo a difusão, misturas de raças e culturas em que a música passa por
processo de transformação tanto: na estrutura, ritmo e som, mudanças que foram lentamente
sendo modificada pelos musicólogos.
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O golpe de 1964 períodos da Ditadura Militar no Brasil que encerrou o governo do
presidente João Belchior Marques Goulart com um golpe de Estado. É notório, que muitos
eventos marcaram á época como: o atentado da Rua Tone-Lero e o suicídio de Getulio Vagas.
È pertinente como o perdão do crime político foi se desencadeando ao longo dos tempos,
nota-se que os regimes militares eram ocasionados pelo ajuste do capitalismo como: a
expansão capitalista, o capital internacional e a classe social em seu contexto.
No dia 28 de março de 1968 na cidade do Rio de Janeiro “Edson Luis” sendo morto
em uma ação policial, com isso os estudantes e intelectuais revoltaram-se formando uma
escalada multidão em protesto. Neste período de 1968 a censura ainda era marcante, guerras
entre policiais e estudantes eram constantes. Segundo Carlos Fico (2004, p.34) o ano de 1968
foi “golpe dentro do golpe”, em que policiais militares, policial civil e os governantes e
políticos estavam em confronto com os mesmo trazendo discórdia e desordem ao estado.
Em 1969 criou-se o sistema Codi-Doi que eram: policia militar, policia civil, policia
feminina que a sociedade passou a chamar de linha dura. Afirmamos que:
Não houve uma censura durante o regime militar, mas duas. A censura da imprensa
distinguia-se muito da censura de diversões públicas. A primeira era
“revolucionaria”, ou seja, não regulamentava por normas ostensivas. Objetivava,
sobretudo, os temas políticos stricto sensu. Era praticada de maneira acobertada,
através de bilhetinhos ou telefonemas que as redações recebiam. A segunda era
antiga e legalizada, existindo desde 1945 e sendo familiar aos produtores de teatro,
de cinema, aos músicos e outros artistas. Era praticada por funcionários especialistas
(os censores) e por eles defendia com orgulho. Amparava-se em longa e ainda viva
na tradição de defesa da moral e dos bons costumes, cara a diversos setores da
sociedade brasileira. (FICO, 2004, p.37).
Tal fato ocorre devido ao regime militar que qualquer possibilidade de subversão era
motivo de tortura, porém a imprensa era, mas acobertada através de boletinhos não
demonstrando nenhum tipo de suspeita. Em 1945, período do romance regionalista que
agregava tradição e bom costume como: o samba, forte auge de critica social.
A ditadura militar ocorreu em 1964 á 1985, período em qualquer ato de manifestação
vanguardista ou conflito de classe social era motivo de censura. A intenção de Goulart é que
os militares aliassem ao mesmo para lhe ser fiel constituindo para fins golpistas. O sistema
político não era homogêneo e sim heterogêneo, criando instabilidade nas coligações políticas,
com isso o sistema político estava em situação de suspeita.
Os anos 60, fatores ligados aos aspectos econômicos e estrutural acarretando o golpe.
Tais aspectos econômicos são decorrentes do Capitalismo Internacional e Nacional que
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trabalhadores brasileiros lutavam pelo mundo melhor, porém nesta época a burguesia passava
por crise sendo um processo interno do capitalismo. Dizemos que:
O período de 1960-1964 marca o ponto mais alto das lutas dos brasileiros neste
século [XX]. O auge da luta das classes, em que se pôs em xeque a estabilidade
institucional da ordem da burguesa sob os aspectos do direito de propriedade e da
força coercitiva do Estado. Nos primeiros meses de 1964. Esboçou-se uma situação
pré-revolucionária e o golpe direitista se definiu, por isso mesmo, pelo caráter
contra-revolucionário preventivo. A classe dominante e o imperialismo tinha
sobradas razões para agir antes que o caldo entornasse. (FICO, 2004, p.49).
Observamos que 1960 – 1964 período que os brasileiros lutavam pelos seus objetivos,
más sendo interrompido pelos governantes militares tendo o poder de controlar a vida das
pessoas. Com isso, a Ditadura Militar foi um período em que os militares controlavam a vida
das pessoas com o objetivo de salvar a democracia em pleno desenvolvimento e segurança,
porém sendo beneficiados poucos e promovendo segurança ao Estado.
No período ditatorial, instalado no nosso país. Coincide com o crescimento da cultura
de massa iniciada nos anos 20 e 30, com o advento da “radiofonia” e a indústria
“fonográfica”. (MORAES, 2000, p.217). E no decorrer das décadas seguintes modificam o
comportamento da sociedade brasileira com a institucionalização com os meios de
comunicação, más precisamente o rádio até chegar à televisão. Como o rádio tem uma
propagação rápida e chegam às camadas de baixa renda de nossa sociedade, isto provoca
grande mudança na cultura da música, influenciando nos gêneros e estilos musicais do Brasil.
E como ainda não havia identidades plenas ancoradas nas raízes das músicas, surge
vários movimentos como: Choro, Samba, machinha, Baião, sendo a gênese da formação
musical que identificasse com o povo brasileiro. Na década de 60, que a música brasileira
ganha uma identidade com a MPB, agregando as matrizes da música nacional. É neste
período, que se instá-la á ditadura no Brasil e a MPB irá combater através dos seus integrantes
os novos agentes do poder, com as músicas de protesto, e com os cantores engajados na luta,
compondo e gravando música. De acordo com Silveira:
No inícios dos anos 60, a conciliação do discurso nacionalista com os aspectos
cosmopolitas da bossa nova resultou no aparecimento de um novo tipo de música: a
MPB- Música Popular Brasileira. O golpe militar de 1964 provocou o
revigoramento da idéia dessa MPB como centro de confluência de questões políticas
e culturais, concomitante ao aprofundamento das discussões em curso e dos
impasses surgidos com a implantação do novo regime político. (SILVEIRA,
2011,p.91-92).
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Quando Silveira discorre sobre a MPB, notamos que os intelectuais de esquerda, se
agrupam no seio desta chamando para si á responsabilidade da conscientização da população
dos abusos cometidos por um governo antidemocrático, que usa da violência repressiva para
impor seu projeto de governo. Baseado no imperialismo das impressas multinacionais e no
atrelamento da economia nacional ao capital externo, gerando com isso um aumento na
desigualdade social.
Se não bastasse toda essa violência com a economia brasileira, eles cada vez mais
aprimoravam os mecanismos de torturas legalizados pelos chamados atos Institucionais que
lhes dava cada vez mais poderes. “No entanto a violência repressiva desses atos não anulou a
capacidade de resistência popular”. (Chiavenato, 1994, p. 77). Percebemos nas colocações do
autor, a preocupação dos militares de manter o controle do país em sua totalidade. Ainda de
acordo com, Chiavenato.
O AI-5 nasceu para inibir as greves dos metalúrgicos de Contagem (MG) e Osasco
(SP),conter as manifestações estudantis e anular a crescente militância dos
trabalhadores.[...] O AI-5 dava tantos poderes ao presidente, aumentando a repressão
e a censura á imprensa, que qualquer oposição real tornou-se impossível.(
CHIAVENATO,1994, p.77).
Segundo a citação acima, fica claro a preocupação dos generais que estão no poder de
que não podem afrouxar a vigilância, e nem perder vista os segmentos organizados da
sociedade. “Por exemplo, o ministério do trabalho fez uma “depuração” nos sindicatos,
intervindo em 563deles até 1970”. (Chiavenato, 1994, p. 79). Por estas ações podemos ter
uma ideia da força repressiva institucionalizada em nosso país. Mesmo com toda esta
vigilância impostas pelo sistema ditatorial, a MPB, através de seus integrantes os intelectuais
de esquerda como o próprio sistema os denominou, mantem-se na luta contra os desmandos
dos poderes constituídos. Ao explanar sobre a vigilância Marco Napolitanos nos diz o
seguinte;
Todas as ações e declarações que se chocassem contra a moral dominante, a ordem
política vigente, ou que escapassem aos padrões de comportamento da moral
conservadora, eram vistos como suspeitos. No caso da música, o conteúdo das letras
cantadas, a performance e eventuais declarações que o artista proferisse durante os
seus shows, também agravar o seu “perfil suspeito”, ganhando destaque nas
anotações dos agentes da repressão política. (NAPOLITANO, 2004, p. 107)
Todas as pessoas que praticassem de alguma forma qualquer ato que levantasse
suspeita, os mecanismos de repressão do governo era acionado, agindo e reprimindo com
violência em nome da manutenção da moral e ordem. Mas com toda a truculência da ditadura
militar os compositores e cantores conseguem transmitir através da música sua mensagem de
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descontentamento com a situação política administrativa do país, alguns engajados na luta
contra o regime encontram nas letras das canções maneiras de expressar a sua indignação
contra o autoritarismo dos governantes. “Dentro desta esfera, o campo musical destacava-se
como alvo da vigilância, sobre tudo os artistas e eventos ligados á MPB”. (NAPOLITANO,
2004, p. 105). Verifica-se na analise do autor que os órgãos de censuras impunham uma
rigorosa vigilância nos adeptos da MPB.
Se os intelectuais de esquerda eram censurados pelos órgãos do governo, os mesmos
censuravam os que não se alinhavam contra as ações dos governantes. E entre os censurados
pela esquerda estavam os cantores Don e Ravel, que eram criticados e acusados de fazer
músicas que beneficiava a política dos militares. É bom salientar que dentro da música
popular brasileira havia no período da ditadura militar duas correntes musicais, uma defendida
pela classe intelectual como a culta, e a brega como pertencentes às camadas menos
politizadas, e com menor conhecimento de diferentes aspectos culturais.
Partindo do principio, de que a ideologia defendida pela esquerda sempre que as
músicas não estivessem alinhadas com os ideais de protesto, e dentro dos padrões estéticos e
intelectual de qualidade, eram taxadas de brega ou cafona. Muitos artistas usaram este estilo
musical para sobreviver, por ter letras ligadas ao cotidiano de pessoas simples, e muitas delas
passou despercebidas pela censura militar, e por isso foram criticadas pela esquerda
intelectual, como sendo composições de má qualidade. Estas músicas mesmo qualificadas de
mau gosto tinham no período ditatorial, uma grade receptividade dentro da sociedade. Duarte
esclarece da seguinte forma:
A discussão prévia mostra que a diferença entre música popular e música séria pode
ser compreendida em termos mais precisos do que aqueles que se referem a níveis
musicais como “inferior e superior”, “simples e complexo”, “ingênuo e sofisticado”.
Por exemplo, a diferença entre as esferas não pode ser adequadamente expressa em
termos de complexidade e simplicidade. [..] ( DUARTE, 2007, p. 35).
Na fala de Duarte, demonstra que não é possível analisar á música na simplicidade
estética, do inferior ou superior, é preciso contextualizá-la no seu tempo e espaço. E é neste
contexto, que surge os cantores Dom e Ravel, nascido no Ceará, e ainda criança se muda para
São Paulo. Desde inícios dos anos 60, forma uma dupla, mas só nos 70, conhecem o sucesso
com uma música alegre diferente exaltando as belezas do Brasil, fizeram tanto sucesso que
uma de suas músicas, Eu te amo meu Brasil, era uma das mais tocada na década de setenta.
Isto lhes rendeu fama dinheiro e também inimigos dentro da imprensa que combatia o
governo, por suas músicas conter em suas letras um nacionalismo exagerado, em um
momento histórico onde as liberdades de expressão eram inexistentes.
20
CAP. 2 – TEORIA CRÍTICA DA INDÚSTRIA CULTURAL E MPB: APORTES
TEÓRICOS E METODOLÓGICOS.
Quando analisamos o passado e procuramos entendê-lo, partimos de princípios
baseados em indícios, vestígios deixados por sociedades que viveram naquele espaço
temporal e espacial, específicos dentro do recorte de nossa pesquisa. “O Historiador examina
sempre uma determinada realidade, que se passou concretamente em um tempo determinado e
em lugar preciso. Sua primeira tarefa é situar no tempo e no espaço o objeto que ele quer
estudar”: [..] (BORGES,1993, p. 58). Conforme a exposição da autora se faz necessário, em
uma narrativa histórica, selecionar um objeto especifica pra que ele seja o centro de sua
pesquisa. E partir da definição do que ira desenvolver a sua narrativa, analisar as fontes
oferecidas pelo objeto de pesquisa, como esclarece, Borges:
O trabalho de investigação do historiador tem procedimentos muito semelhantes aos
do detetive: é uma pesquisa no sentido policial do termo, buscando indícios, provas
e testemunhos, para encontrar os condicionamentos, os motivos e as razões. Só se
pode conhecer algo do passado através do que ficou registrado e documentado para a
posteridade. [..] (BORGES, 1993, p.58,60)
Estas marcas deixadas pelas pessoas nos levam a verificar as relações de civilizações
de um passado remoto ou mais recentes, que possibilite uma análise, e a remontagem dos
fatos que fiquem bem próximo da verdade, ou seja, uma verossimilhança. “A renovação
historiográfica, ocorrida no Século XX, trouxe á renovação da concepção de documento
histórico e da relação do historiador com ele”. Dentro da ótica da autora podemos perceber
que todas as ações desenvolvidas pelos seres humanos, em tempos passados deixam vestígios
que podem ser analisados. E ela descreve o seguinte.
[..] Documentos quer dizer fonte, isto, é, fragmentos ou indícios de situações já
vividas, passiveis de ser exploradas pelo historiador [..]. A história se faz com
documentos escritos, sem duvida, quando eles existem,. Mas pode ser feita, ela deve
ser feita com tudo o que a engenhosidade do historiador lhe permitir utilizar.
(SCHMIDT, 2004, p, 90).
Estes indícios ou vestígios deixados por sociedades do passado, dos quais é o ponto de
partida de uma pesquisa de um texto histórico, são encontrados das suas mais variadas
formas. Os exemplos são muitos, pois fontes são marcas do foi, são traços, cacos, fragmentos,
registros, vestígios do passado que chegam até nos, revelados como documento pelas
indagações trazidas pela Historia. Nessa medida, elas são fruto de uma renovada descoberta,
pois só se tornam fontes quando contem pistas de sentido para a solução de um enigma
proposto. São, sem duvida, dados objetivos de outro tempo, mas que dependem do historiador
21
para revelar sentidos. Elas são, a rigor, uma construção do pesquisador e é por elas que se
acessa o passado. Schmidt nos leva a meditar que:
De modo geral, discurso histórico, mesmo acompanhado pelas indicações das
atividades e metodologias do historiador, cria constantemente, o paradoxo de
mascarar as condições de sua produção e colocar em cena uma realidade com que
ele tende, abusivamente, a se confundir. (SCHMIDT, 2004, p. 89).
Os registros dos comportamentos do ser humanos produtor de cultura que modifica o
ambiente onde ele vive, de acordo com suas tradições e costumes. Ao estabelecer em um
determinado espaço geográfico, edificando as raízes. Construirá através dos tempos, com seus
hábitos contínuos uma cultura própria de uma sociedade, que ira influenciar todos os
indivíduos nela pertencentes. Burke nos esclarece da seguinte forma.
O termo cultura costumava se referir as artes e as ciências. Depois, foi empregado
para descrever seus equivalentes populares música folclórica, medicina popular e
assim por diante. Na ultima geração, a palavra passou a se referir a uma ampla gama
de artefatos, (imagens, ferramentas, casas e assim por diante) e praticas (conversas,
ler, jogar). (BURKE, 2004, p, 43).
E no desenvolver social, que os seres humanos na busca de autoafirmação dentro de
uma determinada civilização, procuram construir sua própria identidade, que terá em seu
relacionamento, de Constância de hábitos ao longo dos tempos um referencial de cultura.
“Sabemos que os seres humanos aprendem a interpretar o mundo a partir da lógica que
possuem, construída através de suas experiências, do que aprendem a perceber observar,
conviver”. [..] (LEITE, 2003, p, 16). As ações humanas, desenvolvidas em seu ambiente de
convívio, esta ligada ao seu aprendizado nos relacionamentos adquiridos em um ambiente,
espacial e temporal de uma sociedade, de acordo com a autora. E o que também podemos
observar em: Borges.
O homem é um ser finito, temporal e histórico. Ele tem consciência de sua
historicidade, isto é, de seu caráter eminentemente histórico. O homem vive em um
determinado período de tempo, em um espaço físico concreto; nesse tempo e nesse
lugar ele age sempre, em relação á natureza, aos outros homens. É esse o seu caráter
histórico. Tudo o que se relaciona com o homem tem sua história; [..] (BORGES,
1993, p, 55).
Todo o caminhar, construtivo dos seres humanos ao longo de sua trajetória, individual
ou coletiva, que deixem indícios ou vestígios, que os identifiquem, terão seu registro na
historia, mesmos com a chegada de novos elementos oriundos da modernidade, que possa
22
modificá-los ao longo do tempo. (“transformações culturais na sociedade que, como é sabido,
são sempre lentas e não podem ser facilmente induzidas.”). Mesmo porque estas
transformações são processadas e gestadas no seio da sociedade por meios de novos
mecanismos de produção que altera os relacionamentos entre homem e natureza, ou através
dos veículos de comunicação, impulsionados por novas tecnologias interligando as pessoas
num mundo globalizado. Analisamos que:
Para os seres humanos, como seres de práxis, transformar o mundo, processo em que
se transformam também, significa impregna-lo de sua presença criadora, deixando
nela as marcas de seu trabalho. A criticidade e as finalidades que se acham nas
relações se dão com espaço que não é apenas físico, mas histórico e cultural. Para os
seres humanos, o aqui e o ali envolveram sempre um agora, antes e um depois.
(FREIRE, 1978,p.68).
Ao mencionarmos os indícios, do qual iniciamos as nossas pesquisas, estamos nos
referindo ao amplo campo de fontes proporcionadas, pela abertura de novas perspectivas
históricas. Com ampliação dos documentos como fontes de pesquisas, a partir do século XX,
surgem novas formas de abordagem, com um campo mais amplo de objetos, a disposição dos
pesquisadores. De acordo com os esclarecimentos da autora Pinsky:
Todo documento, incluindo os documentos de natureza audiovisual, deve ser
analisado a partir de uma ótica sistemática que dê conta de seu estabelecimento
como fonte histórica (datação, autoria, condições de elaboração, coerência histórica
do seu “testemunho”) e de seu conteúdo (potencial informativo sobre evento ou
processo histórico). Com a crescente sofisticação da critica documental, novas
técnicas linguísticas e novas técnicas quantitativas e seriais permitiram não apenas a
ampliação do potencial informativo das fontes histórica, mas a própria ampliação da
tipologia das fontes, (PINSKY, 2008, p. 266).
Só assim foi possível usar a música como vestígios de comportamentos e movimentos
sociais de determinado tempo. “É notório que a música é uma fonte subjetiva, porém este
fator foi superado por historiadores durante a “revolução documental.” que aceitou a
avaliação e o uso de documentos das mais variadas naturezas”. Por ser sensível a música
expressa todo o sentimento do momento vivenciado de uma geração, com os conflitos
existentes que os obriga a se expressar através da música. No entendimento de Campoy:
Nela são ensaiadas transformações sociais vindouras. A perspectiva de Atalli
encaixa a peça que nos faltava para compor uma visão da transformação da música
em sociedade, e das transformações das sociedades expressas nas suas músicas.
Experimentar a música pode desencadear sociabilidades organizadas a partir dessa
própria experiência. Nessa reflexão, a música, além de um veículo de comunicação,
de uma linguagem, é o próprio fundamento do coletivo.(CAMPOY, 2006, p, 41)
23
As canções que contem em suas letras mensagens, que de alguma forma tenha
pretensão de informar ou alertar as pessoas, dos acontecimentos no contexto histórico de um
período turbulento, onde impera a violência contra os direitos humanos, como ocorreu na
época da ditadura. Os autores de músicas escreveram em uma linguagem subjetiva, mas com
muita sensibilidade, que pudesse ser entendida pelo publico ouvinte. “Sons e ruídos estão
impregnados em nosso cotidiano de tal forma que, na maioria das vezes, não tomamos
consciência deles” (MORAES, 2000, p.204.) A música por ter uma maior acessibilidade se
propaga com maior, em sua divulgação, veiculada aos meios de comunicação das massas.
Moraes discorre sobre este assunto da seguinte forma:
Entre as inúmeras formas musicais, a canção popular (versos e música), nas suas
diversas variantes, certamente é a que mais embala e acompanha as diferentes
experiências humanas. [..] Ela esta muito mais próxima dos setores menos
escolarizados (como criador e receptor), que maneja de modo informal (pois, como a
maioria de nos, também é um analfabeto do código musical).[..]Além disso, a
canção é uma expressão artística que contem um forte poder de comunicação.[..] Ou
seja, a canção e a música popular poderiam ser encaradas como rica fonte para
compreender certas realidades da cultura popular desvendar a historia de setores da
sociedade pouco lembrado pela historiografia. (MORAES, 2000, p. 205)
Como podemos observar, a música vem expressar os sentimentos de uma determinada
sociedade de um determinado tempo, e as circunstâncias como se relacionavam. “A música
possui uma memória, evocando lembranças em quem a ouve, pode ser um caminho para
chegar a um determinado período histórico e uma forma para se falar dos sujeitos sociais
excluídos do processo histórico”. (PIEROLI, 2011, p.8.). Sendo a música uma expressão de
sentimentos, que determina os desejos de mudanças em situações opressoras, impostas a
determinados grupos de pessoas, podemos através das canções extravasarem nossos múltiplos
sonhos, de transformações, fazendo com que chegue ao público desejado na forma de
melodias. O que denominamos de música, portanto pressupõe condições históricas especiais
que na realidade criam e instituem as relações entre som, criação musical, instrumentista e o
consumidor/receptor.
[.] Porque a música além de seu estado de imaterialidade, atinge os sentidos do
receptor, estando, portanto, fundamentalmente no universo da sensibilidade. Por
tratar-se de um material marcado por objetivos essencialmente estéticos e artísticos,
destinado á fruição pessoal e/ou coletiva, a canção também assume inevitavelmente
a singularidade e características especiais do autor e de seu universo cultural [..].
(MORAES, 2000, p, 211)
Ao observar a abordagem feita pelo autor, percebemos que as composições são feitas
de acordo, com o meio e as condições de vida de seus autores. A música ao longo de toda
24
trajetória humana esta presente em seu cotidiano, seja no momento solitário de uma reflexão
ou em grupos para celebrações e rituais religiosos. Determinando os comportamentos e
sentimentos das pessoas da época e de seu relacionamento e de convívio dentro do grupo ao
qual pertencia.
Nesse sentido podemos observar que com o passar dos tempos, as canções sofreram
transformações de acordo com os comportamentos das sociedades. Sofrendo influências
conforme o surgimento de novos meios de comunicação. A música que, é secularizada e
atravessa os tempos, se metamorfoseia de acordo com as novas tendências do contexto social
e econômico vigente. Com as novas tecnologias desenvolvidas nos meios de comunicação foi
possível às camadas ditas “populares” ter acesso às artes, e com isso consolidando o processo
de massificação cultural.
Destaca-se aqui, a interpretação da música tocada nas rádios, e as influências nos
hábitos e nos conceitos de músicas da população: “O cotidiano das pessoas foi transformados
irreversivelmente pelo radio” (MORAES, 2000, p. 216), a qual conclui que, ao contrário do
que deve ocorrer na música seria que vive de um dialogo criativo e inovador com a tradição.
Não há qualquer inovação na música de massa quanto ao aspecto musical
propriamente dito apesar de sua fatura obedecer aos mais modernos métodos “industriais de
produção”.
Isso é notório nos anos 50 quando o Brasil busca uma auto-afirmação em sua
identidade cultural através da música e a sua identidade no gênero musical. Como A Bossa
Nova e outros ritmos, mas a “indústria cultural, que ao se apropriar das músicas, compositores
e intérpretes passam a vender sua força de trabalho ao mercado e estes têm que se submeter ao
poder das grandes gravadoras que passam a ditar as regras e temas, influenciando inclusive no
discurso das composições”. (CALDAS, 1977, p. 12).
Isto esta acontecendo em um período de liberdade proporcionado pela chamada
republica liberal, quando aconteciam grandes avanços no seu pátio industrial, principalmente
no governo JK, e também no período chamado de “milagre econômico”, quando a economia
brasileira é aberta ao capital multinacional. “Nessa fase, deu-se a ampla abertura ao capital
externo: fortalecia-se a implantação do modelo capitalista ligado ás empresas internacionais.”
(QUEIROZ, 1982, p, 238). A autora com sua explanação nos mostram a influências que o
capital externo ira exercer na economia brasileira inclusive no mercado artístico. As emissoras
de rádios e a televisão vão manipular a ideologia musical através da mídia. Ao discorrer sobre
o assunto, Duarte faz uma idéia de como se processa as transformações no trajeto da
25
musicalidade proporcionados por estes novos instrumentos de comunicação. Analisaremos
que:
[..] Criação musical na contemporaneidade é um resultado direto do processo de
dominação da natureza pela racionalidade instrumental, a qual se transfere, no
momento de sua apoteose, para a “segunda natureza”, para um tipo de sociedade que
encarna em si a inconsciência que sempre foi atribuída ao mundo natural [..].(
DUARTE, 2007,p.106)
No que tange ao fato de que a “substância da música séria não permanece intacta”.
Adorno observa que “a violência que a música de massa exerce sobre as pessoas reaparece na
sua contraparte social, e, na música que se esquiva das pessoas”, (DUARTE, 2007, p. 106).
Não reafirmando a idéia de que não há caminho fácil, mesmo o compositor que
subjetivamente, pretende levar adiante o desenvolvimento da linguagem musical não esta
livre de certa forma de fetichismo.
A partir dessa correlação entre grotesco e o declínio da subjetividade autônoma e de
conexões estilísticas de fato existentes. Adorno procura mostrar a semelhança entre a música
de Stravinsky e o jazz, pela enorme influencia que possuía na cena cultural norte-americanas
dos anos 30 e 40- visto por Adorno como uma espécie de regressão do sujeito autônomo no
mundo administrado: “Essa possibilidade de extinção do eu autônomo - de resto cara aos
desígnios da indústria cultural e do sistema de poder ao qual ela serve-remete a uma
interessante discussão sobre o tempo da música e suas relações com a subjetividade
autônoma. (DUARTE, 2007, p, 109)
Adorno chama a atenção para o fato de que a criação artística, desde tempos
imemoriais esteve tutelada por forças externas á consciência do artista, tais como autoridades
clericais, nobreza ou burguesia ascendente (nos primórdios do capitalismo).Apenas a partir do
inicio do século XIX consolida-se um processo que culminou com a chegada das obras de
artes ao mercado: Telas, gravuras e desenhos são livremente vendidos, do mesmo modo como
já o era livros e que passaram a ser ingressos para concertos, apresentações teatrais e de balé.
É por isso que Adorno dedica-se quase obsessivamente a mostrar em que medida a
indústria cultural não é simplesmente a “herdeira” da arte tradicional mais inimiga mortal do
que dela restou na época contemporânea.
[..] Embora sejam múltiplas as estratégias adotadas para esta confrontação, destacase nela um elemento que fora muito importante na construção critica do conceito de
indústria cultural[..],sua pretensão de, mediante recursos tecnológicos cada vez mais
aperfeiçoados, a oferecer um substitutivo para a experiência sensível que se tem e se
pode ter do mundo.[..]. (DUARTE, 2007, p, 111)
26
Em outras palavras, a ocorrência do estilo nesse sentido substantivo depende da
existência de artistas com personalidade própria, não funcionários de conglomerados
transnacionais, pagos para “criar,” por encomenda, aquilo que interessa aos bolsos e ao
sossego político dos seus patrões.
Na verdade, nenhum vinculo entre a obra de arte e a mercadoria cultural, porque elas
são antagônicas. Ao visualizar uma criação de uma obra de arte, podemos sentir a alma do seu
autor em uma configuração, que transcende o desejo e a sensibilidades das pessoas. Mesmo
em suas formas mais tradicionais, enquanto esta se encontra inserida á categoria de um objeto
de consumo. Sem qualquer projeção para além de si mesmo e de suas funções no interior do
capitalismo tardio.
[..] Um exemplo disso é a relação a música de massa: “ O ouvido treinado é
perfeitamente capaz, desde os primeiros compassos, de adivinhar o desenvolvimento
do tema e sente-se feliz quando ele tem lugar como previsto.’ Tal processo contrasta,
segundo Horkheimer e Adorno, imensamente com o da arte autônoma, não
dominada pelos imperativos da lucratividade e da geração de conformidade ao status
quo.[..] (DUARTE, 2007, p, 55)
Percebe-se que, as mutações sofrida pelas obras de artes conforme o desenvolvimento
do capitalismo denominado de “tardio”, e suas influencias dentro da cultura como podermos
ver nas “aporias simbolizadas na Filosofia da nova música pela contraposição entre
Schonberg e Stravinnsky” (DUARTE, 2007, p. 110). Podemos perceber as transformações em
relação as suas produções historiográficas com o evento da indústria cultural, mudando o seu
estilo conservador por assim dizer, moderando suas criticas,para direcionar seu olhar para um
entendimento de um mundo da cultura de massa.
De modo geral, discurso histórico, mesmo acompanhado pelas indicações das
atividades e metodologias do historiador, cria constantemente, o paradoxo de mascarar as
condições de sua produção e colocar em cena uma realidade com que ele tende,
abusivamente, a se confundir. A valorização do documento como recurso imprescindível ao
historiador foi em fenômeno do século XIX. O trabalho do historiador seria extrair do
documento a informação que nele estava contida, sem lhe acrescentar nada do seu. O Objetivo
era, então, mostrar os acontecimentos tal como tinha sucedido.
Nessa perspectiva, o documento histórico seria para a pesquisa e para o ensino como,
prova irrefutável da realidade passada que deveria ser transmitida ao aluno. Do ponto de vista
didático, a utilização do documento histórico como prova do real, para legitimar o discurso do
professor, trazia como perspectiva metodologia um ensino centrado na figura deste. Era ele
27
quem explorava o documento, descrevendo seus elementos e suas características com a
finalidade de comprovar o que ensinava ao aluno.
Nos livros didáticos eram utilizados documentos escritos, que conferiam a prova de
realidade ao texto sobre o conteúdo estudado. Os documentos serviam, também,
para o professor utiliza-lós como comprovação de sua narrativa da historia ou do
fato histórico estudado. (SICHMIDT, 2004, p.91).
A renovação historiográfica, ocorrida no século XX, trouxe á renovação da concepção
de documento histórico e da relação do historiador com ele. Os historiadores constataram a
idéia de documento histórico como matéria inerte, com a qual se reconstrói o que os homens
fizeram, como o fizeram, prosperam uma relação diferente entre ambos. Os historiadores
criticaram, também, a valorização e o primado do documento escrito. O documento
considerado vestígio deixado pelos homens, voluntaria ou involuntária, passou a ser encarado
como produto da sociedade que o fabricou, de acordo com determinadas relações de poder.
Rechaçado como prova do real, o documento passou a ser visto a maneira de indicio,
testemunha do passado, o qual fala quando é perguntado: “A reconstrução do passado exige,
também, que os historiadores organizem-no por meio de algumas características peculiares ao
próprio tempo, ou seja, pelas noções temporais: sucessão, duração, simultaneidade, mudanças
e permanências”. (SCHMIDT, 2004, p.2004).
O trabalho com documento histórico exige do historiador que ele próprio amplie sua
concepção e o uso do próprio documento. Mas não basta pesquisador ampliar o uso de
documentos, também deve rever seu tratamento buscando superar a compreensão de que ele
serve apenas como ilustração de narrativa histórica e de sua exposição de seu discurso.
Superar o tratamento tradicional dado ao documento histórico implica por parte do historiador
a mobilização de conhecimentos e informações própria do conteúdo abordado, para que ele
possa elaborar apreensões globais e complexas. Existe documento que são denominados
fontes primários e outros, fontes secundários.
A fonte primaria são testemunhas do passado que se caracterizam por ser de primeira mão
ou contemporâneas dos fatos históricos a que se referem. A fonte secundaria são registros que
contêm informações sobre os conteúdos históricos resultantes de uma ou, mas elaboração
realizada por diferentes pessoas. De modo geral, a aprendizagem da historia tem acontecido
com base em fontes secundarias.
[..]Saber identificar o documento que esta trabalhando, se é uma fonte primaria ou
uma fonte secundária, e como ele se apresenta: de forma escrita, oral, iconográfica,
material, arqueológica, por exemplo. Algumas fontes apresentam-se com múltiplas
28
formas, como um mapa histórico, que é, ao mesmo tempo, registro escrito e visual.
[..] (SCHMIDT, 2004 p. 96).
Compreender como datar um documento e localizá-lo em uma temporalidade histórica
depende da aprendizagem de um conjunto de diferentes fases do tempo histórico, pois o aluno
poder ter de identificá-lo numa cronologia, numa conjuntura, mas também considerando
gerações dinastias, ritmos de vida e mudanças de períodos históricos.
A fase de identificação do documento significa, portanto, selecionar elementos
significativos, como datas, idéias, expressões, palavras cujo significado seja desconhecido.
Contextualizar o documento é situá-lo no tempo e no espaço, procurando realizar uma
reconstituição a mais razoável possível, dos elementos e acontecimentos que possibilitem
esclarecê-lo. Possibilitando colocar algumas questões sobre os elementos identificados, isto é,
sobre os dados, a autoria, a natureza do texto e as idéias, e depois tentar responder, as
questões iniciais.
Implicar retorno sistemático ao documento, seja com breves comentários explicando,
seja com citação de expressões, entre aspas, do documento, seja com referencias a
dados, como autor, datas e fatos. A fase do comentário implica redigir texto com
explicação sobre o conteúdo do documento relacionando-a com o objetivo de
responder as questões mais gerais. Possibilita também a aprendizagem da construção
de comentários históricos, além de reforçar conhecimentos apreendidos. (SCHMIDT,
2004, p.102).
O aluno deve inscrever o documento uma problemática construída a priori e das
respostas encontradas, procurarem levantar novas questões. Essa estratégia é importante para
reforçar determinadas atitudes intelectuais. Da mesma forma, buscam-se diversificar as
possibilidades de uso de documentos históricos em sala de aula com o objetivo de construir
propostas de ensino identificadas com as expectativas e a cultura do aluno. Como é evidente,
não existem “receitas” ou modelo único para o comentário de textos históricos, já que um
mesmo documento pode ser comentado de varias maneiras; o importante é se fizer um estudo
exaustivo do mesmo e evitar a utilização do documento apenas como ilustração das
afirmações de professor: “[..] Para já, entende-se que alguns cuidados são necessários, tais
como conhecer o sentido produzido pelas imagens canônicas, diferenciar o uso das linguagens
como recursos didático e como documento histórico e apreender o significado ou natureza de
cada linguagem” (SCMIDT,2004,p. 110).
A Divulgação sistemática de determinadas imagens fase por livro ou por veículos de
comunicação, como publicidade, formal e televisão, contribui para que o passado se
confundisse com a própria imagem. Assim, essas imagens tornavam-se canônicas.
29
Construir essas novas interpretações equivale a um trabalho de construção de
experiências e pesquisas, que poderão colaborar para a consolidação do uso de imagens, como
fotografias e filmes e a música.
Sobre essa canonização de imagens temos o exemplo do heavy metal que segundo
Campoy ao longo de sua história formou nas cidades grupos que têm como causa de sua
convivência a experiência de ouvir heavy metal. Na convivência de música organizou-se uma
sociabilidade especifica, formada por elementos próprios, como a vestimenta e cortes de
cabelo. Este estilo espalhou-se pelas ruas e becos das cidades nos corpos e discursos de seus
apreciadores. Ele tornou-se uma conduta, e vale dizer, com regras: “De fato ele é construído
na relação entre sua produção, fazer heavy metal, e seu consumo, ouvir heavy metal. É no
encontro do sentido da música do havy metal com o sentido de quem ouve, que emerge o
sentido do nosso objeto”. (CAMPOY, 2006, p. 38.).
Contudo, sem contrariar a perspectiva crítica dos frankfurtianos, uma etnografia do
grupo que faz e ouve heavy metal nos mostra que em sua prática outro espaço, á margem do
mercado, veio se formando. Na organização dos shows, na imagética, na música e nas letras
das canções percebemos práticas complementares entre si, constituindo um discurso, uma
posição cultural. “A morte da aura na obra de arte fala não tanto da arte quanto dessa nova
percepção que, rompendo o envoltório, o halo, o brilho das coisas, põe os homens, qualquer
homem, o homem de massa, em posição de usá-las e gozá-las”.
A reflexão de Benjamim nos coloca á procura do que é feito com a arte por quem a
recebe. Veremos na etnografia que a relação da pessoa com, o heavy metal não cessa
quando ela desliga seu discplayer ou quando vai para sua casa após o show, o
manejo do estilo musical, dessa manifestação artística, enquadra relações sociais e
molda um código cultural. (CAMPOY, 2006,p.40).
A música é profética. Nela são ensaiadas transformações sociais vindouras. Em uma
perspectiva que encaixa a peça que nos falta para compor uma visão da transformação da
música em sociedade, e das transformações das sociedades expressas nas suas músicas.
Experimentar a música no sentido de sociabilidades organizadas a partir dessa própria
experiência. Nessa linha reflexiva, a música, além de um veículo de comunicação, de uma
linguagem, é a própria identidade que nela trafega, agenciando-se a formação do grupo.
Verificamos que:
As bandas que tocam nesses shows ainda buscam o reconhecimento do público.
Algumas já conseguiram lançar um cd ou uma fita-demo bancando os custos, mas
grande parte das bandas ainda não possui material gravado. Às vezes em bares,
outras em casas de shows pequenas, as apresentações circulam por espaços na
30
cidade. Os integrantes das bandas estão constantemente à procura por lugar
adequado que possa abrigar seus shows. (CAMPOY, 2006, p. 41).
As músicas, as roupas, os temas aludidos, em resumo, o sistema cultural heavy metal
oferece um quadro de referencias para algumas pessoas, o qual está em dissonância com seu
entorno social. Não buscar o sucesso, a fama, e não visar lucro, ou qualquer retorno
financeiro, com seu trabalho, numa palavra, as bandas que buscam a fama ou lucro, estão “se
vendendo”, e assim, negando o sentido do “underground”.
Daí compreende-se a importância que a imagem da biografia da pessoa representa para
o grupo. É pela pessoalidade, só desvendada após certo tempo na convivência, com o grupo,
que uma pessoa será aceita como participante e, num segundo momento, poderá ser
classificada como real. Esse construto prático de seleção dos participantes, assim como o
mecanismo de classificação destes em real e falso, são as armas do underground na luta pelo
seu espaço, pela sua autonomia, pela sua identidade fundada no heavy metal.
Podemos compreender o sentido cultural do discurso do underground heavy metal
quando é produzida e veiculada. Ao mesmo tempo em que o estudo da música, pode também
abarcá-la como veiculo de crenças, identidades de mitos, enfim, de cultura.
Aqui não estamos considerando a vasta produção das “Histórias da música”, erudita
ou popular, muitas vezes escritas por jornalistas diletantes ou eruditos. O uso de fontes
escritas (além das “letras” das canções) para a pesquisa histórica em torno da música
brasileira essa opção heurística tem dado o tom das analises e da organização de uma pauta de
conteúdos historiográficos.
No caso da música popular, uma mesmo canção assume significados culturais e efeitos
estético-ideológicos diferenciados, dependendo do suporte analisado: sua partitura original
(que muitas vezes nem existe como documento primário, sendo de transcrição posterior ao
fonograma), seus registros em fonograma e suas performances registradas em vídeos. Esse
material, com o passar dos anos, pode se constituir num corpus documental a ser utilizado por
historiadores da cultura e da música, que irão se debruçar sobre o material etnográfico
transformado em fonte histórica. Citamos que:
Na análise da chamada “música popular” produzida pela indústria fonográfica e
audiovisual, a questão das fontes coloca-se de outra maneira. O suporte privilegiado
de boa parte da produção musical urbana, voltada para o mercado, é o fonograma. A
partir do final da década de 1980, o videoclipe e a apresentação de cantores em
programas televisuais passou a determinar as características da produção musical
(PINSKY, 2008, p. 256).
31
O fonograma, por sua vez, é o corpus documental privilegiado do pesquisador em
música popular do século XX. Entre 1902 e 1990 no Brasil, o fonograma impresso em discos
de vários formatos (78 rotações por minuto, compactos simples e duplos, long-playings de 10
e 12 polegadas, compact discs) constitui um patrimônio documental ainda longe de ser
amplamente explorado.
Somente a partir da década de 1990 os trabalhos historiográficos estão trabalhando de
maneira mais ampla e sistemática com fontes audiovisuais e sonoras para o estudo da música
popular. Tal negligência ocorreu não apenas pela dificuldade de acesso ás fontes audiovisuais
e fonográficas, mas também porque há, na academia brasileira, certa tradição de analise da
Historia e Sociologia da música centrada na palavra escrita. Analisaremos que:
Os historiadores, lentamente, vêm tentando encontrar caminhos próprios de analise,
na medida em que não tem formação em critica literária/poética, nem são treinados
em pesquisas de campo e conceitos sociológicos, correndo o risco de fazer péssima
analise poética e má sociologia. Sem falar da dificuldade, para quem não tem
formação em música, na analise da linguagem musical, escrita em partitura ou
registrada em fonograma. (PINSKY, 2008, p. 257).
Na fala da autora, notamos a dificuldade dos historiadores em trabalhar com a música
como fontes por não ser especialista da área. E a canção, objeto ultimo da critica interna da
fonte, começa a se desvelar na analise do contexto histórico no qual o compositor se insere,
como agente social e personagem histórico. Nessa ótica, o caráter polissêmico do documento
música não é um obstáculo intransponível e as possibilidades de trabalho do historiador
ancoram-se no mapeamento das “escutas” históricas (critica, publico e os próprios artistas,
que são também ouvintes) que dão sentidos históricos ás obras musicais.
A questão central é que, em que pese à estrutura interna da obra e as intenções
subjetivas do compositor, o sentido social, ideológico e histórico de uma obra musical reside
em convenções culturais que permitem a formação de uma rede de escuta sincrônica e
diacrônica. Sincrônica, pois uma obra erudita ou uma canção popular tem um tempo/espaço
de nascimento e circulação original, caso contrário não seria uma fonte histórica.
Mesmo o esquecimento reservado a uma obra ou um artista é um dado para o
historiador, cuja preocupação com o juízo de valor não deve ser o foco principal da
analise. Em outras palavras, as “obras medíocres” também são portadoras de
significados sociais e históricos, ainda que menos profundos e instigantes do que as
“obras-primas” consagradas pela memória e pelo gosto vigente (PINSKY, 2008, p.
259).
O valor que se destaca, em uma obra de arte, em uma música tem que ser a analisada
do ponto de vista do historiador, não somente esteticamente, mais também é preciso verificar,
32
os componentes que estão inseridos dentro de uma canção, como foram escritos em que meios
seus criadores estão se relacionando, qual o contexto histórico vivenciados por eles. Quais as
pretensões com esta canção e por que ela foi produzida, quais foram os juízos de sua época,
nos sentidos políticos, culturais e sociais a partir de sua distribuição que á transformou em
patrimônio cultural coletivo.
Ao analisarmos a historiografia em relação á música popular brasileira verificaremos
que o estudo é representativo á historia. Em relação à música pressupõe buscar fontes
metodológicas e históricas para aglutinação de vários fatores que surgem ao longo do tempo.
A música popular brasileira tem como fonte á Historia sendo investigados por vários
pesquisadores que buscam repercutir a origem da mesma. A música tem por excelência
padrões estética não obtendo lugar definido nas ciências humanas e arte. Podemos perceber
que não só na área da arte, ciência e sociologia como em todos os campos passam por faces
(processos) seja qualitativo ou interdisciplinar. Podemos afirmar que:
Normalmente existem duas formas básicas de abordagem: Uma que prioriza um
olhar externo sobre a obra e outra que procura suas articulações internas, estruturais.
Os campos da historia, da sociologia e da comunicação tende mais para o primeiro
caso. Os campos da semiótica, da musicologia e das letras, tendem mais para o
segundo caso. (NAPOLITANO, 2007, p.154).
Seguindo a linha de pensamento do autor, é interessante como a música está presente
em varias áreas de conhecimento. Em relação à semiótica procura valores internos
(entrelinhas) que revelam determinados valores subjacentes nas obras. No campo da historia
procura ligar à narrativa, cronistas e antropologia ligada ao recorte histórico, unindo a música
e identidade.
A musicologia tradicional é composta pela forma euridita, folclórica e tradicional,
analisando suas formas e estruturas metodológicas. A música popular é a difusão da música
leviana com as músicas tradicionais tendo características especificas como sinal gráfico que
representa uns sons atribuídos a formas e gêneros musical sendo necessário entender suas
origens em determinada experiência musical aspectos como: a dança, canção e a identidade
cultural destacando o timbre musical em que designa a natureza do proprietário passando por
processos tecnológicos e industriais, no meio musical a performace se define entre o musicista
e a obra em conjunto.
O estudo da música popular delimita por vários processos de abordagem e problemas
que o mesmo não caia no ecletismo teórico uma vez que os recursos metodológicos e
instrumentais utilizados nas músicas não sejam enviesadas. Para falarmos sobre a historia da
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música popular é necessário investigar as origens e culturas que marcaram a sociedade: em
obras, canções, performance, cronista, historiadores e música. Diante dos estudos feitos por
historiadores podemos dizer que:
Em 1960, a área de letras, mais preocupada com a forma e sentido dos discursos
poéticos das canções: a área da sociologia, mais voltada para analise dos circuitos,
sobretudo os circuitos industriais e comerciais que marcavam a canção como
experiência social. Por outro lado o musicólogos e memorialistas tinham
concentrados no estudo das formas tradicionais e seminais da música popular
brasileira, num olhar freqüentemente marcado pela busca das origens, dos gêneros
matrizes e das raízes folclóricas. (NAPOLITANO, 2007, p.158).
É interessante observarmos que cada área de conhecimento está ligada á fatores que
emerge a historicidade como no caso da música: analisa a letra separando da música, o
contexto, a obra, o autor, separando da sociedade e da ideologia. Além disso, os trabalhos
histográficos de forma evolutiva buscam valores culturais expressos em compositores
buscando origens e gêneros da música popular.
Em 1960 expandiram-se os títulos, biografias e crônicas jornalistas. A música
começou a ser valorizada em seus valores poéticos e formal. Em 1980 período pelo qual
ganhou a música popular pautava-se em misturas de uma narrativa linear e tradicional.
Arnaldo Contier (In: PINSKY, 2008, p. 259) pautava-se em abordagem que ridicularizava a
performance da música em tempo diacrônico, explicações herdadas do estado da arte
ganhando novas possibilidades como a historicidades das obras como um todo, as canções e
sonoridade dos gêneros musicais.
A antropologia e historiografia começaram a investigar a genealogia da canção como
objeto cultural. No Brasil a música popular faz presente na vida sociocultural do individuo
onde passou por períodos de performances em que a música começou a ser cantada, a
sonorização, a melodia chegando à gravação em que obras primas foram tomando espaço
mercadológico. A música comercial e urbana não teve grande repercussão marcados pelos
críticos e preconceitos dos pesquisadores como: o samba, o tango no período das construções
das identidades nacionais em meados do século XX.
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CAP. 3 – ENGAJADOS OU NÃO-ENGAJADOS? ANÁLISE DAS CANÇÕES DE DON
E RAVEL EM TEMPOS DE DITADURA.
A dupla de cantores e compositores Don e Ravel, de origem nordestina, “Ceará,
mudaram-se ainda pequenos para São Paulo. Na década de 1950, com os pais e a irmã caçula
Eva.” Como todas as crianças oriundas do nordeste que se mudou para São Paulo, passaram
por momentos difíceis e eles não foi há exceção.” Foram criados na periferia de São Paulo
onde foram morar com seus pais, sendo que o pai era vendedor ambulante. Ingressando na
carreira artística por volta do início dos anos 1960, a dupla, já como Dom & Ravel lançou em
1969 o primeiro LP, "Terra boa", que trazia” Você também é responsável”. Este LP foi
lançado em momento histórico conturbado, cheios de conflitos, dentro do próprio governo
com setores da linha dura assumindo o poder e combatendo seus opositores com violência
usando o famigerado Ato Institucional numero 5. SALES:
O fato é que, ás 22h30 de 13 de dezembro de 1968 (sexta- feira), um porta-voz da
ditadura anunciava, em cadeia de radio e TV, o Ato Institucional n. 5, reeditando o
golpe militar de 1964 e suspendendo as liberdades civis no Brasil. O novo
instrumento dá ao presidente da Republica poderes para “decretar o recesso do
Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores,
por Ato Complementar, em estado de sitio ou fora dele, só voltando os mesmos a
funcionar quando convocados pelo presidente da Republica”. Sendo “decretado o
recesso parlamentar, o Poder Executivo correspondente fica autorizado a legislar em
todas as mátrias e exercer as atribuições previstas nas Constituições ou Lei
Orgânicas dos Municípios”. [..] Naquela fatídica noite, o Brasil foi coberto por
trevas absolutas.[..] ( SALES,1999, p.52-53).
Em meios a todas estas turbulências, esta música foi bem aceita pelos militares, e
acabou sendo usada por eles, como propaganda do programa de educação elaborado pelo
Ministério da Educação, como o projeto de alfabetização, “Você também é responsável,
transformada, dois anos depois, pelo ex-ministro da Educação, Jarbas Passarinho, no hino do
Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral)”.
Você também é responsável (1969)
Eu venho de campos, subúrbios e vilas,
Sonhando e cantando, chorando nas filas,
Seguindo a corrente sem participar,
Me falta a semente do ler e contar
Eu sou brasileiro anseio um lugar,
Suplico que parem, prá ouvir meu cant ar
Você também é responsável,
Então me ensine a escrever,
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Eu tenho a minha mão domável,
Eu sinto a sede do saber
Eu venho de campos, tão ricos tão lindos,
Cantando e chamando, são todos bem vindos
A nação merece maior dimensão,
Marchemos prá luta, de lápis na mão
Eu sou brasileiro, anseio um lugar,
Suplico que parem, prá ouvir meu cantar.
Esta canção traz em sua letra uma temática, que para este período de nossa historia, de
certa forma não era abordada tão claramente, ainda mais quando estávamos passando pelo
momento mais repressivo da ditadura Militar. Os cantores chamam atenção para a
necessidade de que todos assumam a responsabilidade no combate ao analfabetismo no País
onde uma grande parcela da sociedade não sabia ler e escrever. “Eu venho de campos,
subúrbios e vilas, Sonhando e cantando, chorando nas filas, Seguindo a corrente sem
participar, Me falta à semente do ler e contar.” Esta música gravada á mais de três décadas,
abordavam problemas sociais existentes até hoje, na educação que não conseguiu erradicar
completamente o analfabetismo do Brasil. Se no passado tínhamos uma taxa elevada de
analfabeto no campo, hoje este problema transferiu para as periferias das grandes cidades.
Em 1972 denominava o ciclo dos festivais em que vários cantores de forma peculiar
vivenciaram o grande período das “trevas” tanto social, econômico e musical. E importante
rever que os festivais demonstravam a existência e o entusiasmo do sucesso da MPB. A
música se faz tão necessária na vida das pessoas que ao ouvir uma canção, relembra um
momento inesquecível de nossa trajetória de vida, tal que marcaram a vida do país. Podemos
observar que a música “Animais Irracionais” marcaram á vidas dos seres humanos em época
de ditadura militar.
Este LP foi o marco da grande virada na carreira profissional e também na vida dos
cantores Dom e Ravel. Se antes da gravação deste álbum, eles eram bajulados pelos militares,
que usavam suas canções em propagandas para melhorar a imagem do governo junto à
população, isto por que as músicas anteriores da dupla, continham um conteúdo ufanista, que
exaltava a exuberância das paisagens de nosso País e da beleza da mulher brasileira.
Á analise musical é, portanto compreendido de forma constitutiva repleta de
contradições e tensões e cada qual com sua peculiaridade. A música popular brasileira “Você
Também é Responsável”, cantada por Don e Ravel trata-se do contexto histórico da época,
revelando-se a realidade vivenciada pelos brasileiros em época de censura como a música
“Animais Irracionais”.
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Animais Irracionais (1974)
Autoria: Don e Ravel
Ás vezes eu olho pra terra sem compreender
A luta dos seres humanos para sobreviver.
O grande açoitando o pequeno,
Terceiros mandando apartar,
Mas na maioria das vezes o grande não quer parar.
Tem vezes que o desesperado se põe a pensar(a pensar)
Por que deve aos pés de um dos grandes se ajoelhar,
Eu passo por muitas igrejas pedindo respostas de Deus
Pra ele calado nos espaços ouvir os lamentos meus.
(Refrão)
Animais (animais) nós os homens somos todos meio
Animais irracionais
Levantamos, guerreamos e deitamos e rezamos antes
A vida é um sonho e nada mais. Oh! cantem a trás.
Às vezes eu olho por cima do mundo e os maus (os maus)
Eu vejo vencendo na vida os mais altos degraus
Não querem ouvir nem falar
De fome, problemas e dor
Dos outros nem ao menos admitir ou supor.
E sempre eles acham que eles são certos demais (demais)
Dinheiro perdido em seus vícios não volta jamais,
Pequenos e grandes ladrões
No meio dos homens de bem
Que cruzam as ruas da vida matando ou roubando alguém.
Ao mudar a temática da letra da música, deixando o nacionalismo que era a marca do
estilo musical deles, estava também perdendo de certa forma a tutela que até o momento eles
tinham perante os militares, e isto ira lhes trazer serias conseqüências, se eles já tinham
problemas com a esquerda, que os criticava, e taxa-os como sendo coniventes com o regime
vigente. Agora eles estão no meio de um fogo cruzado, sozinhos e por isto a carreira artística
esta fadada ao fracasso, se por um lado são vigiados e criticados pelos intelectuais da
esquerda, do outro esta a censura do governo, que vai questionar o conteúdo das músicas
deste LP. Convocando-os a deporem nos órgãos de censuras do governo. Conforme entrevista
de Ravel, a censuramusical.com:
Então em 1974, lançamos “Animais Irracionais” e ela foi censurada; [..] Eu que já era
perseguido pela esquerda que dizia que eu era engajado da direita, passei a ser
perseguido pela direita também. [..] Todo show tinha homens da Polícia Federal. Tive
algumas intimações para me apresentar no departamento de censura de São Paulo que
era na Rua Xavier de Toledo no centro de São Paulo. No departamento de censura eles
colocavam você numa sala escura gelada e te davam uma canseira, porque você ficava
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lá horas e horas sem ninguém dizer nada, era um clima psicologicamente pesado, um
frio danado. E depois de horas questionavam sobre a letra de “Animais Irracionais”.
(www.censuramusical.com/includes/entrevistas/RAVEL.pdf).
A música “Animais Irracionais”, que contrapunha ao estilo ufanista das músicas
anteriores, que procura mostrar um Brasil bonito onde não havia um contraste social de
grandes proporções provocado pelos programas de governos, elaborados para beneficiar os
grandes monopólios capitalistas. Com uma nova proposta neste disco, os cantores compõem
uma melodia, falando do sofrimento das pessoas em seu cotidiano na busca de uma
sobrevivência digna, onde a exclusão e as diferenças sociais provocadas pela exploração dos
ricos sobre os pobres, gerando um grande contingente de excluídos neste período dentro da
sociedade brasileira. Salientamos que:
O governo brasileiro revelou, nesta época, uma forte preocupação em conquistar
certo consenso em torno do seu projeto de desenvolvimento econômico que trazia
consigo como já é sabido, uma grande desigualdade com relação á distribuição de
renda. O “milagre econômico”, como se convencionou chamar atingiu somente os
setores economicamente privilegiados, deixando á margem desses ‘desenvolvimento
‘a grande maioria da população brasileira. (MARTINS, 1999, p.08).
Com o crescimento atípico á realidade do povo brasileiro manipulado pelos meios de
comunicação sendo dominados pelo governo divulgando um crescimento econômico que
beneficia uma pequena parcela da sociedade, colocando como pano de fundo um País onde
todos têm as mesmas oportunidades. É neste clima de contraste com a realidade vivenciada,
que os governantes neste período eliminam todos os focos de resistências da luta armada,
ficando a música como uma das principais alternativa para combater o regime militar. Como
podemos perceber na letra da música “Só o amor constrói”.
Só o Amor constrói (1970)
Autores: Dom e Domingos Leoni
Eu quero ver, minha gente eu quero ver,
Um povo todo pelos seus caminhos se encontrar
Eu quero ver, minha gente eu quero ver,
Você e eu, e toda nossa gente se abraçar
Eu quero te abraçar
Eu quero ver, minha gente eu quero ver,
Passando na calçada ver crianças a brincar
Eu quero ver, minha gente eu quero ver,
Nos campos e cidades a alegria quero encontrar
Eu quero encontrar
Não quero ver, não, não quero ver
O choro atrás dos rastros que você deixar,
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O conflito dominar, as novas gerações,
O desamor e a tristeza em tantos corações
Só o amor constrói
Por favor plante uma flor
Prá florir nosso país,
Quem destrói a paz
Não verá jamais
Um irmão feliz
A música gravada em 1970, Don e Ravel através das suas melodias buscavam
expressar os sofrimentos que as pessoas viviam em época ditatorial e censura. É notável que
nesta melodia o “amor”, a paz e harmonia, construímos um mundo melhor. Nota-se que a
humanidade vivia sendo vigiados a todo o momento, ignorando os direitos humanos e noções
constitucionais, fazendo a própria lei.
Quando citamos o Ato Institucional número cinco, foi para demonstrar amplitude de
sua abrangência em relação aos anteriores. Enquanto os seus antecessores eram decretados
com uma data de vigência, o AI, 05 foi decretado com prazo indeterminado. Com a
decretação deste Ato institucional,haverá um rompimento com as possibilidades dos
movimentos de protestos fazer uma oposição pacifica, partindo para o confronto da luta
armada. A partir daí podemos presenciar um duelo de ideologias, defendidas entre as partes
que dividiam os movimentos sociais da época. Transformando em uma luta travada entre a
esquerda e a direita. Chiavenato nos diz que:
O perigo é o inimigo interno. Evidentemente essa linha de pensamento favoreceu a
política norte-americana: ela ganhou um aliado na Guerra Fria que identificava
como “inimigo interno” todos aqueles que pretendiam mudar o sistema e, por
extensão, acabar com a espoliação sofrida pelo Brasil (CHIAVENATO, 1994, p.
106).
Em meio a toda esta movimentação social em busca de uma definição organizacional
que pudesse modificar as condições da sociedade brasileira naquele período histórico do
Brasil. Entram em discussão os métodos adotados por ambos os lados se do lado da esquerda
era composta pela maioria dos intelectuais buscavam soluções no socialismo, para resolver as
desigualdades sociais provocada por políticas de exclusão, que sempre favoreceram uma
pequena parcela detentora dos bens e capitais em nosso País. Para colocar o seu projeto de
mudança era necessário o uso da violência. Analisamos que:
Os grupos de Esquerda armada no Brasil foram formados, em sua maioria, por
estudantes secundaristas e universitários influenciados pelas teses marxistasleninistas. Mas também existiram guerrilheiros oriundos do exército, de sindicatos e
de alas progressistas da Igreja Católica. Os movimentos de guerrilha urbana e rural
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se intensificaram no Brasil após o golpe militar de 1964 que derrubou o presidente
democraticamente eleito João Goulart, o Jango. A Esquerda optou pela luta armada
quando não havia mais espaço para contestação ao regime militar. Após a instituição
do AI-5 - Ato Institucional número 5 - ficava proibida qualquer tipo de
manifestação, mesmo que pacífica, ao regime militar, instaurou-se a pena de morte,
prisão sem julgamento e censura prévia aos meios de comunicação. A tortura,
mesmo que não admitida oficialmente, se tornou regra em delegacias e divisões
do DOI-CODI - Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações
de Defesa Interna. (www.comunistas.spruz.com/guerrilha1.htm).
Como podemos ver a esquerda não foi nada pacifica em seus métodos de ação na
busca de seus objetivos. Do mesmo jeito a direita agiu impondo na base da força seu projeto
de governo, e consolidando sua administração com métodos repressivos, subjugando as
pessoas com autoritarismo, nem que pra isso fosse necessário o uso da repressão e da tortura.
No meio deste fogo cruzado a dupla, Dom e Ravel ao ver a violência cometida com as
pessoas tanto no campo físico como no emocional destruindo as estruturas psicológicas,
oriundas das políticas que excluem as massas populares do acesso a uma educação de
qualidade, deixando-a mercê de manobras ideológicas.
Através da música, os autores transmitem aos corações das multidões multifacetadas por
uma disputa de poder, para definir que comandaria o povo brasileiro. Neste clima de conflitos
e lutas, eles com seus versos procura acalentar o sofrimento daqueles que sofrem as
conseqüências das desavenças provadas pelo confronto ideológico envolvido nesta disputa.
“Não quero ver não, não quero ver o choro atrás dos rastros que você deixar, O conflito
dominar, as novas gerações, O desamor e a tristeza em tantos corações”. Na letra desta
melodia percebemos a preocupação que os cantores demonstram a necessidade do
entendimento para se chegar à paz.
Os Cantores Dom e Ravel procura transmitir uma mensagem de amor e esperança em
tempos de trevas e desespero. Quando as pessoas se apegam em uma linha imaginaria da
subjetividade de uma música para dar sentido a sua vida. “Só o amor constrói Por favor,
plante uma flor Prá florir nosso país, Quem destrói a paz Não verá jamais Um irmão feliz.” O
amor palavra universal para expressar todo nosso sentimento pela pessoa amada, ou algo que
amamos e todo aquilo que construímos com amor é mais duradouro.
Dom e Ravel usam-se da sensibilidade artística para falar de um momento de
apreensão, que atinge grande parte da população brasileira naquela época. Quando a realidade
do povo, era manipulada pela propaganda dos agentes que comandava o poder através da
mídia que veiculava nos meios de comunicação.. “O governo gastava milhões de cruzeiros em
propagandas destinadas a melhorar sua imagem junto ao povo”. Um dos slogans dessa
propaganda dizia “Brasil, ame-o ou deixe-o.”
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Usando das palavras em suas músicas como formas pacíficas de combater, a violência,
como “plantar uma flor” a dupla procura mostrar que o dialogo possibilita o entendimento nas
soluções dos conflitos sociais. Em meios as tantas dificuldades, opressão, falta de liberdade,
poder, e situação econômica, a dupla Don e Ravel homenageou os trabalhadores em geral pela
o alimento do pão de cada dia, em meios as dificuldades eles tentaram lutar pelo uma vida
melhor, portanto a música “Obrigado ao homem do campo”, foi uma forma de agradecer pela
dura jornada do dia a dia dos trabalhadores rurais, pela esperança alcançada sendo forma de
demonstrar o amor pelo próximo.
OBRIGADO AO HOMEM DO CAMPO
Autoria: Dom e Ravel
Obrigado ao homem do campo
Pelo leite o café e o pão
Deus abençoe os braços que fazem
O suado cultivo do chão
Obrigado ao homem do campo
Pela carne, o arroz e feijão
Os legumes, verduras e frutas
E as ervas do nosso sertão
Obrigado ao homem do campo
Pela madeira da construção
Pelo couro e os fios das roupas
Que agasalham a nossa nação
Pelo couro e os fios das roupas
Que agasalham a nossa nação
Obrigado ao homem do campo
O boiadeiro e o lavrador
O patrão que dirige a fazenda
O irmão que dirige o trator
Obrigado ao homem do campo
O estudante e o professor
A quem fecunda o solo cansado
Recuperando o antigo valor
Obrigado ao homem do campo
Do oeste, do norte e do sul
Sertanejo da pele queimada
Do sol que brilha no céu azul
Sertanejo da pele queimada
Do sol que brilha no céu azul
E obrigado ao homem do campo
Que deu a vida pelo Brasil
Seus atletas, heróis e soldados
Que a santa terra já cobriu
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Obrigado ao homem do campo
Que ainda guarda com zelo a raiz
Da cultura, da fé, dos costumes
E valores do nosso país
Obrigado ao homem do campo
Pela semeadura do chão
E pela conservação do folclore
Empunhando a viola na mão
E pela conservação do folclore
Empunhando a viola na mão
Lá rá lá, lá rá lá, lá rá lá....
Mesmo com todas as dificuldades existente no meio rural o homem do campo se
mantém forte e acreditando na possibilidade de construir um mundo onde todos possam ter
em sua mesa o alimento de cada dia. Ate meados da década de 60, a maior parte da população
brasileira vivia no campo. Com a tomada do poder pelos militares, inicia um novo ciclo
produtivo em nosso País, voltado para a produção em grande escala, destinada exportação.
Mas para aumentar a produtividade era necessário mudar a formula de trabalhar na lavoura, e
neste momento que se implanta no Brasil a chamada mecanização do campo, como afirma
Assis:
[..] todo esse processo verifica-se com o respaldo político e financeiro do próprio
Estado, comprometido com os latifúndios. Política de credito subsidiados a
agricultura beneficia médios e grandes proprietários dificultando o acesso do
pequeno proprietário a financiamento publico da lavoura. Dessa forma, intensificase a concentração de terras e o êxodo rural torna-se um grave problema para os
principais centros urbanos do [..] (ASSIS. 2005.p. 136).
Todo este processo, elaborado para aumentar a produção vai gerar no campo um grande
desagregamento nas raízes do trabalhador que esta acostumado com o seu estilo rudimentar de
lidar com a terra, e ira também modificar seus costumes, interferindo na sua cultura e nas
relações com o meio ambiente. Apartir das novas técnicas adotada pelas exigências do
mercado o homem do campo continuará produzindo. Obrigado ao homem do campo. “Ela
carne, o arroz e o feijão. Os legumes, frutas. Ervas do nosso sertão”. Mesmo sendo
modificados os meios produtivos no meio rural, o homem do campo continua sendo de
fundamental importância na produção de alimentos, para o sustento de nossa nação.
Os irmãos Dom e Ravel como podemos notar, em suas letras músicas dando ênfase aos
valores nacionais, que estava acontecendo naquele momento, e embalados em clima eufórico
do patriotismo, característicos de suas formações. Eles de família humilde do nordeste, vê na
música a possibilidade de transformar as suas vidas, compondo e cantando temas do
42
cotidiano, com versos como estes: “Obrigado ao homem do campo. Pela madeira da
construção. Pelo couro e os fios das roupas. Que agasalham a nossa nação.”
Ao fazer músicas que exaltava o nacionalismo, em período que a maioria das produções
musicais era voltada para protesto do regime político vigente, marcaram eles pra sempre,
apesar de afirmar que não tinha nada com os políticos que comandava o Brasil na época.
As canções da dupla sempre envolviam temas sociais como percebemos na melodia de
Obrigado Ao Homem do Campo, O boiadeiro e o lavrador, O patrão que dirige a fazenda, O
irmão que dirige o trator.” Mesmo assim eram criticados pelos intelectuais da esquerda que se
intitulava de. “patrulha ideológica”. Ravel em uma entrevista ao jornal do Estado de São
Paulo:
Andaram falando que a gente ganhou rios de dinheiro a serviço da ditadura. É
mentira. O governo usou as nossas músicas e nunca deu um tostão para nós. Na
verdade, de tanta aporrinhação, de tanta perseguição política, os nossos shows
sofriam uma violência muito grande. Quando a gente chegava numa cidade o Dops
(polícia política) escoltava a gente, era um comboio para nos proteger. Onde a gente
chegava vinham aquelas pessoas influenciadas pela mídia para nos hostilizar. A
gente
sofria
isso
na
pele.
(MACEDO,Fausto,2010).http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/.
Acessado em 28/12/2011 as 19hs).
Segundo o cantor em sua entrevista, os mesmos eram escoltados pelos Dops, o órgão
mais repressivo do governo, protegidos pelas forças do governo, só reforçava a tese de que
eles estavam ligados com os militares, porque o publico que presenciava estas cenas tinham
em suas mentes, a imagem que representava esta sintonia entre eles e a ditadura. Outro
episodio comentado por ele foi uma homenagem que fizeram ao então presidente João
Figueiredo, entregando o premio que eles ganharam pela vendagem do disco, onde a música
obrigado ao homem do campo, fez muito sucesso lhes proporcionando o disco de ouro.
Verificaremos que:
Com o presidente João Figueiredo (último dos generais no Planalto) a gente se
encontrou em 78, quando lançamos Obrigado ao Homem do Campo. Em duas
semanas a gravadora nos deu um disco de ouro. A gente decidiu dar esse disco para
o João porque ele estava com a atenção voltada para a agricultura, era um homem
que tinha interesse em valorizar a agricultura. (MACEDO, Fausto, 2010.Disponivel
em
http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/
Acessado
em
28/12/2011 as 20 hs).
Seguindo a linha de pensamento do autor, o lançamento da música “Obrigado ao
homem do campo”, foi umas das suas vitórias em que ganharam o disco de ouro, decidindo
dar o disco para João, pois era um trabalhador voltado para á agricultura, que tinha interesse
em valorizar a terra e seu plantio. A música “Eu te amo meu Brasil”, não é tão diferente pois
43
ressalta o seu amor pela terra de nosso país, mostrando a sua identidade expressa em suas
músicas nacionais.
Eu te amo meu Brasil
Autoria: Dom e Ravel- 1970
As praias do Brasil ensolaradas
O chão onde o país se elevou
A mão de Deus abençoou
Mulher que nasce aqui
Tem muito mais valor
O céu do meu Brasil tem mais estrelas
O sol do meu país mais esplendor
A mão de Deus abençoou
Em terras brasileiras
Vou plantar amor
Eu te amo meu Brasil, eu te amo
Meu coração é verde, amarelo, branco, azul, anil
Eu te amo meu Brasil, eu te amo
Ninguém segura a juventude do Brasil
As tardes do Brasil são mais douradas-mulatas.
Brotam cheias de calor
A mão de Deus abençoou
Eu vou ficar aqui
Porque existe amor
No carnaval os povos querem vê-las
No colossal desfile multicor
A mão de Deus abençoou
Em terras brasileiras
Vou plantar amor
Adoro meu Brasil de madrugada
Na hora em que estou com meu amor
A mão de Deus abençoou
A minha amada vai comigo aonde eu for
As noites do Brasil, tem mais beleza
A hora chora de tristeza e dor
Porque a natureza sopra e ela vai-se embora
Enquanto eu planto o amor
A música Eu Te Amo meu Brasil, de autoria de Dom e Ravel, foi gravada em 1970, pelo
grupo Os Incríveis, e posteriormente por eles mesmos. Esta música teve uma grande
repercussão no meio artístico e na critica na década de 70, pela sua letra que exaltava as
belezas naturais do Brasil, e das mulheres. Levados pela euforia da conquista da copa do
mundo, em 1970 no México, a dupla compôs a música influenciados pelo clima de
nacionalismo, proporcionado pela conquista do tri campeonato mundial. Ravel em sua
entrevista ao jornal Estado de São Paulo, diz que:
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“As praias do Brasil ensolaradas, o chão onde o país se elevou, a mão de Deus
abençoou, mulher que nasce aqui tem muito mais amor, o céu do meu Brasil tem
mais estrelas, o sol do meu país mais esplendor, a mão de Deus abençoou, em terras
brasileiras vou plantar amor...eu te amo meu Brasil, eu te amo, meu coração é
verde-amarelo-branco-azul-anil..."
(MACEDO, Fausto,2010. http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/
Acessado em 01/01/2012.
E isto, lhes rendeu o titulo de “filhotes da ditadura”, concedido pela esquerda que
lutava contra os desmando dos militares. Porque uma das armas adotada pelos opositores do
sistema político vigente, eram as músicas que continha em suas letras, temas de protesto
contra a política adotada pelos militares. Enquanto Dom e Ravel componham suas canções
voltadas para um patriotismo descritivo mostrando as potencialidades turísticas de nosso País,
e que apesar tudo, alegria do povo brasileiro. Criando-se um clima de tensão entre os músicos
de esquerda com a dupla. Como salienta. `
Se você parar pra analisar todas as letras de Dom e Ravel, você percebe que tem
um forte conteúdo social. Fomos perseguidos e agredidos em diversos locais por
pessoas enquadradas na tal patrulha ideológica da época. Percebemos que
não dava mais pra irmos à nenhum lugar de badalação e tivemos que mudar nossos
hábitos e não freqüentamos
mais locais públicos sozinhos, só com seguranças.
(MACEDO,Fausto,2010.http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/
Acessado em 02/01/2012 as 21hs).
Como a música “Eu Te Amo Meu Brasil”, foi gravada no período em que a ditadura,
estava vendendo a sua imagem de um País promissor veiculada nos meios de comunicação,
através das propagandas de origem do chamado: “milagre econômico” para captar atenção e
maior prestigio junto à população. A carreira artística da dupla formada pelos irmãos começou
nos anos 60, mas só ficou conhecida apartir desta canção que acarretou seu grande sucesso,
Ravel.
Mas seria na virada dos anos 1970 que dupla atingiria seu maior sucesso, através de
sua composição "Eu te amo meu Brasil", gravada pelo conjunto Os incríveis. A obra
rendeu-lhes, ao mesmo tempo, sucesso e rotulações de bajuladores da direita. Tais
críticas ocorreram devido ao caráter ufanista,daquela canção, que foi utilizada, no
contexto político daquele momento, em pleno auge da ditadura, pelos governos
militares.
(MACEDO, Fausto,2010. http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/
Acessado em 02/01/2012).
Quando os militares apropriam da música de Dom e Ravel e a usa em suas
propagandas para maquiar a sua cara perante a opinião pública no intuito de encobrir a
realidade do que esta acontecendo, mostrando uma sociedade em pleno desenvolvimento,
quando a real situação do povo é outra. E que o crescimento esta sendo à custa dos baixos
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salários, achatados para beneficiar as grandes empresas de capital estrangeiras. É neste palco
de contradições que os cantores e compositores, lançam uma música que falam das belezas
naturais de nosso Brasil.
O sucesso de "Eu te amo meu Brasil" teria levado o então governador de São Paulo,
Roberto de Abreu Sodré, a sugerir ao ex-presidente da República, Emílio Garrastazu
Médici, que a citada canção fosse transformada em hino nacional. Médici nada teria
respondido. Mas a notícia teria sido divulgada na imprensa e os artistas começaram
a ser apontados como arautos da ditadura.
(MACEDO,Fausto,2010.http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/
Acessado em 03/01/2012).
Como as músicas dos irmãos, encaixa no perfil propagandístico dos militares, a
esquerda vai cair em cima, criticando chamando-os de garotos propaganda do sistema que
oprime a liberdade de expressão com um censura sem trégua, daqueles que não estão
alinhados com eles. “Credito que o meu sucesso com o meu irmão causaram um prejuízo
muito grande para outros artistas e isso deve ter provocado uma dor de cotovelo tremenda
porque tudo é competição”. Porque outros artistas também fizeram músicas, não alinhada a
correte de protesto e nem por isso foi rotulados de “filhotes da ditadura”. Ravel.
Quando nós estouramos todos esses sucessos o governo se interessou e usou
essas músicas. Automaticamente se criou uma situação complicada para quem
monopolizava o mercado, para as gravadoras multinacionais, para os artistas,
porque você vendendo mais colocava outros "em baixa". O público estava conosco.
Causando esses prejuízos, começaram a inventar mentiras a nosso respeito. Diziam
que Dom e Ravel eram puxa-sacos do governo, fabricados pela ditadura militar, etc..
(MACEDO,Fausto,2010.http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/
Acessado em 04/01/2012).
A MPB, na época estava visada pelos órgãos de censuras, e por isto poucas músicas
conseguia furar este bloqueio imposto sobre a música de protesto elaborada pela a MPB. E
com isso a música foi discriminada e denominada brega ou cafona, estilo que foi enquadrado
Dom e Ravel, pela elite intelectual da esquerda, ganhou espaço no mercado. De acordo com a
entrevista, Ravel diz que esta música foi aproveitando as circunstâncias propiciadas pelo
momento e por isso a elite da esquerda nunca nos perdôo, pela nossa músicas serem usadas
pela ditadura. Ravel.
Isso aconteceu depois dessa mentira, que se tornou pública pelos maus
jornalistas da época, e muitos destes nos perseguem até hoje, dizendo que nós fomos
puxa-sacos do governo militar, e as conseqüências destas mentiras tornaram-se
muito graves para nós. Começamos a sofrer muitas perseguições políticas,
violência, agressividade em toda parte do país, por onde íamos fazer os shows.
(MACEDO, Fausto,2010.http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/
Acessado em 05/01/2012 as 20, hs).
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Segundo Ravel, esta situação foi se agravando à medida que éramos criticado, pela
esquerda colocando a nossa música que era uma das mais executada no anos 70, virando uma
espécie de hino por todo o Brasil.Se de um lado era elogiada pelo publico, por outro lado era
criticada por aqueles que usavam a música para protestar e lutar contra a ditadura militar.
Dom e Ravel, fala das praias do sol, das mulheres. “As praias do Brasil ensolaradas, O chão
onde o país se elevou, A mão de Deus abençoou, Mulher que nasce aqui, Tem muito mais
valor.” As letras musicais desta dupla demonstram a preocupação de falar de coisas belas
elevando a auto-estima do povo brasileiro, num momento tão difícil de nossa historia.
Em outra estrofe da música, eles usam as cores do universo para representar o amor
através das multicores do infinito, explorando a sensibilidade da compreensão humana na
busca da harmonia que possibilita a convivência pacifica. “O céu do meu Brasil tem mais
estrelas,
O
sol
do
meu
país
mais
esplendor,
A
mão
de
Deus
abençoou
Em terras brasileiras, Vou plantar amor.” Com estas músicas ufanistas, exaltando as nossas
riquezas proporcionadas pela natureza, os cantores de estilo “brega’ chegaram ao topo das
paradas de sucesso.
Impulsionados pelas músicas voltadas para um nacionalismo e com apropriação pelo
governo usando-as em suas propagandas, eles se manterão nas paradas de sucesso, no radio e
na televisão, cantando assim. “Eu te amo meu Brasil, eu te amo, Meu coração é verde,
amarelo, branco, azul, anil, Eu te amo meu Brasil, eu te amo, Ninguém segura a juventude do
Brasil.’O povo de certa forma estava precisando de uma dose exagerada de patriotismo, e os
cantores Dom e Ravel injetaram nas cabeças de boa parte dos brasileiros.
E com esse nacionalismo eles procuram através de suas canções, mostrarem um País
sem preconceitos, onde todos são iguais, sem distinção de cor, ou religiosidade. “As tarde do
Brasil são mais douradas-mulatas. Brotam cheias de calor. A mão de Deus abençoou. Eu vou
ficar aqui porque existe amor”. Nesta linha musical eles acabam beneficiando os comandantes
do poder, e a esquerda aproveita para criticá-los. Falando que as músicas da dupla elogia o
regime político vigente no País.
A música “Se você me pudesse ouvir” em meados anos de ditadura em que a
sociedade vivia sendo ameaçados, não tinha paz, eram submetidos as ordens civis e
censurados, período obscuros da historia brasileira em que submetido aos poderes: político e
social. Podemos dizer que:
A ditadura verticalizou o poder, transpondo para as relações políticas algo parecido
com a hierarquia dos quartéis. Beneficiando esse quadro havia leis repressivas e os
conceitos geopolíticos – como o da segurança nacional -, nessas alturas já
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enrraizados no aparelho burocrático. Conseguentemente passou-se a cultivar certo
rigor administrativo contra tudo o que parecesse “subversivo”. (CHIAVENATO,
1994, p.78).
Analisando a citação acima, podemos dizer que a ditadura não era só vivenciada pela
sociedade, más também pela hierarquia dos quartéis, como as leis da segurança nacional já
eram enraizadas, conseqüentemente sendo cultivada pelo setor administrativo. Com isso, os
cantores, compositores e outros eram submetidos ao poder dos civis, tal que qualquer
manifesto cultural ou musical era ato subversivo.
Esta canção de Don e Ravel “Se você me pudesse Ouvir” revela-nos, tempos de
angustia onde as pessoas não poderiam expressar suas vontades, sentimentos, lazer, eram
obrigados há concordar e ficar calado para não sofrer algum ato (morte).
Se Você Me Pudesse Ouvir
Autoria: Dom e Ravel - 1960
Se você me pudesse ouvir
Eu não tenho mais pra onde ir
Minhas horas vão passando e eu não sinto mais
Prazer em coisa alguma que eu ande atrás
Estou ficando louco e perdendo a paz
Preciso te esquecer e não consigo mais
Eu sinto saudade, saudade, saudade
E muita vontade, vontade, vontade
De ver esse rosto bonito outra vez
Mas vou chorar de alegria talvez
Se você estivesse aqui
Pra de novo me fazer sorrir
Nossa noite então seria uma noite assim
Eu só pra você e você só pra mim
Como antigamente e antes do fim
Mas eu estou sonhando nesse botequim
Cantores populares da MPB: Dom e Ravel em uma das suas músicas “Se Você Me
Pudesse Ouvir” música em meados na década de 60, ano de caos políticos onde a música
brasileira e a produção musical foi intensa, grandes festivais e músicas alegravam o povo
brasileiro em época de trevas. Em análise, a música em sua primeira estrofe onde a melodia
retrata uma tristeza “Eu não tenho mais para onde ir”, “Estou louco e perdendo a paz”,
mostrando o eu lírico insatisfeito não tendo direção. A segunda estrofe “Eu sinto saudade,
saudade, saudade”, “Mas vou chorar de alegria talvez”. Os cantores em sua melodia
demonstram a insatisfação de fazer algo e não estar em suas mãos “vontade, vontade” em que
não se pode expressar manifestar em tempos da ditadura militar. A terceira estrofe “Se você
estivesse aqui”, “Pra de novo me fazer sorrir”, “Mas eu estou sonhando nesse botequim”.
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Certamente o autor em sua música sente falta de alguém: das conversas, brincadeiras,
harmonia, saudade de antigamente “paz” e sentar em um botequim, ficar ali altas horas sem
preocupar com amanhã.
Em 1960, a música, o teatro e o cinema tiveram consagração da MPB (Música Popular
Brasileira) culta e despojada, onde grandes cantores como João Gilberto, Dom e Ravel e
outros lançaram seus discos trazendo helenismo em épocas difíceis. Observamos que:
Na década de 1960, na vaga de ruptura estética e sociológica que se implantou na
vida musical brasileira após o impacto dos primeiros LPs de João Gilberto, muitas
concepções arcaístas e folclóricas da Revista da Música Popular foram rejeitados
pelos criadores e aficionados da “moderna” MPB. (NAPOLITANO, 2001, p.63).
Ao analisarmos a época de 1960 em relação à música teve estágios de decadência e
aceitação, apesar disso, a música foi expandindo lentamente rejeitados pela burguesia e
intelectuais e elites, pois tinha uma imagem da música subversiva, porém a mesma tem estilo,
valor e ideologia em seu contexto. Mesmo as músicas sendo rejeitadas pelas elites, as nações
lutavam pela sua liberdade.
É pertinente, que vários cantores musicais foram proibidos pela ditadura militar,
portanto toda circulação social dos artistas em particular era alvo de censura. Como podemos
observar os estudantes faziam manifestações de protesto más eram contidos por: bombas de
gás, tortura e até pessoas eram desaparecidas. A canção “Caminhante” não é diferente, pois
retrata a sociedade que caminha sem saber um destino ou um futuro melhor, sendo situação
em que o país estava vivendo: caminha sem direção, sem destino em que não podiam bater no
peito e dizer: “Eu sou um cidadão Brasileiro e mereço respeito”, eram maltratados como
animais.
O Caminhante
Autoria: Dom e Ravel - 1982
O Caminhante
O Caminhante
Eu ando caminhando por aí
Procurando uma região sem dono,
Local do qual me sinta proprietário,
Usuário do que dele eu extrair.
Tomaram palmo a palmo quase tudo.
Absurdo, eu não consigo acreditar!
Conquistarei um dia o meu lugar?
Preciso tanto recomeçar!
Onde eu piso, dizem: "Isto não é seu"!
Tanta coisa boa eu deixo de fazer!
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Quantos outros caminhantes como eu,
Sonham tanto um paraíso prá viver!
Eu vi milhões de arames grossos e farpados!
Já cansado, sobre a areia então chorei.
Ali, gigantes blocos de concreto,
Com seus tetos sobrepostos levantei.
O Sol rachou meu violão de lado,
Mas sou calado, não costumo me grilar!
Até o Céu se encontra dividido:
"Seus antigos astros buscam seu lugar"
E onde eu piso, dizem isto não é seu!
Tanta coisa boa eu deixo de fazer!
Grande parte de caminhantes já morreu,
Sem o nosso pobre mundo compreender!
Esta canção de Dom e Ravel “O Caminhante” em 1982, período em que buscava a
forma e o sentido poético das canções sendo a música brasileira em faces de transições da
música populares e simples, ligeiras de estrutura harmônicas básicas. Os long plays lançado
no Brasil como suporte fonográfico da historia da música popular brasileira acarretando a
expansão da música em várias perfomaces como: Samba, Axé, popularesco, tropicália, tango
dando ritmo a novos sons e música. Também conhecido como desordem monetária
internacional e o desequilíbrio financeiro.
A canção de Dom e Ravel “O caminhante”, música popular brasileira retratando o
trabalhador em que caminham todos os dias, caminhando, caminhando.... Á procura de status.
A primeira estrofe da canção “Eu ando caminhando por ai”, “Conquistarei um dia meu
lugar?”, onde trabalhadores à procura de uma moradia ou um lugar que se possa morar, com
esperança de conquistar um dia. A segunda estrofe “Onde piso, dizem: “Isto não é seu”! Em
analise do que adianta pisar em uma terra que não é sua, ou em espaço que não é seu, são
tantos obstáculos e humilhação que a sociedade passa dia-a-dia. Na terceira estrofe, relata o
grande esforço de um trabalhador rural em que arames grossos e farpados, cansados e
exaustos, calados pois não tinha aquém recorrer nesta triste lida do campo onde caminhantes e
piões do trecho morreram à procura de estabilidade, porém sempre há esperança como
podemos verificar na letra da música “Marcas do que se foi”.
Marcas Do Que Se Foi
Autoria: Dom e Ravel -1970
Neste ano quero paz no meu coração
quem quiser ter um amigo que me dê a mão
o tempo passa e com ele caminhamos todos juntos sem parar
nossos passos pelo chão vão ficar
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Marcas do que se foi
sonhos que vamos ter
como todo dia nasce novo em cada amanhecer
Marcas do que se foi, sonhos que vamos ter
como todo dia nasce novo em cada amanhecer
A música em 1970, memorialistas e musicólogos estudava as músicas e suas formas
tradicionais (raízes e gêneros), articulando a critica pessoal e os efeitos musicais da
modernidade sendo de origem popular: o choro e o samba. A dupla Dom e Ravel sendo a
expressão máxima do ufanismo que agradavam os governantes.
O cantor Chico Buarque, foi cantor e compositor uns dos mais censurados com suas
canções de protesto com a música “Apesar de Você”, sendo exilado. A música brega e
popularesco não escapava da censura.
Dom e Ravel lançaram a música Cabelos Brancos, que retrata anos de suor e
esperança e sacrifícios onde jovens poderá refletir sobre as condições brasileiras tanto
econômicas e social que o cidadão vive, em que cada rosto trás um sonho “Quanta coisa
dizem seus cabelos brancos”. A música “Marcas do Que Se Foi”, retrata marcas passadas, em
sua primeira estrofe “Neste ano quero paz no meu coração”, “O tempo passa e com ele
caminhamos todos juntos sem parar”. A música em toda sua performance onde sonhos e anos
sejam diferentes como os passados sendo: alegria, paz e amor em cada coração onde
caminhamos juntos em busca dos nossos objetivos. O refrão fala sobre passado que se foram,
sonhos e esperanças que podemos ter “como todo dia nasce um novo amanhecer”.
A música “Saudade de Minha Terra” demonstra os tempos difíceis que os cantores
viveram na cidade em tempos de censura, sofrimento, tristeza sem ter um objetivo a ser
alcançado. É importante observar as entrelinhas das músicas para ser ter algo concreto mesmo
que seja contraditório, é você ter uma visão de mundo e estar sujeito á vários olhares no
contexto musical.
Saudade de Minha Terra
Goiá - 1982
De que me adianta, viver na cidade,
Se a felicidade não me acompanhar.
Adeus paulistinha do meu coração,
Lá pro meu sertão eu quero voltar.
Ver na madrugada, quando a passarada,
Fazendo alvorada, começa a cantar,
Com satisfação, arreio o burrão,
Cortando o estradão, saio a galopar;
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E vou escutando o gado berrando,
Sabiá cantando no jequitibá.
Por Nossa Senhora, meu sertão querido,
Vivo arrependido por ter te deixado;
Esta nova vida, aqui na cidade,
De tanta saudade eu tenho chorado,
Aqui tem alguém, diz que me quer bem,
Mas não me convém, eu tenho pensado,
Eu fico com pena, mas esta morena,
Não sabe o sistema em que fui criado.
Tô aqui cantando, de longe escutando,
Alguém está chorando com o rádio ligado.
Que saudade imensa, do campo e do mato,
Do manso regato que corta as campinas,
Aos domingos ia, passear de canoa,
Na linda lagoa de águas cristalinas;
Que doce lembrança, daquelas festanças,
Onde tinha danças e lindas meninas,
Eu vivo hoje em dia, sem ter alegria,
O mundo judia mas também ensina.
Estou contrariado mas não derrotado,
Eu sou bem guiado pelas mãos divinas.
Pra minha mãezinha, já telegrafei,
Que já me cansei de tanto sofrer;
Nesta madrugada estarei de partida,
Pra terra querida que me viu nascer;
Já ouço sonhando, o galo cantando,
O inhambu piando no escurecer,
A lua prateada, clareando as estradas,
A relva molhada desde o anoitecer.
Eu preciso ir, pra ver tudo alí,
Foi lá que nascí, lá quero morrer.
Esta música de Dom e Ravel cantada pelo Goiá Belmont consagrando o seu amor pela
sua terra natal, saudade do sertão, da passarada, do estradão a galopar, gado berrando e sabiá
cantando, cansado da cidade sem felicidade. Na segunda estrofe, “sertão querido” “sertão eu
quero voltar”, retratando o sofrimento na cidade onde nunca deveria ter saído, saudade que
tem de voltar. A terceira estrofe “Que saudade imensa, do campo e do mato”, “Na linda lagoa
do campo”, “Eu vivo hoje sem ter alegria”. É notável a insatisfação na vida na cidade, onde á
poluição, crueldade e censura em tempos difíceis tanto cultura e social onde não se tem paz e
o cantor sente saudade de sua terra. A quarta estrofe “Que já cansei de tanto sofrer”, “Já ouço
o sonhando, galo cantando”, “O inhambu piando no escurecer”. O cantor mostra de forma
bem clara o “eufenismo” em só de lembrar as belas paisagens naturais retratando o campo e a
natureza.
A importância deste trabalho é estudar o período de 1974 á 1982 em relação ao golpe
do estado brasileiro que ocasionou a censura e também analisamos as canções de Don e Ravel
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no período da Ditadura Militar que marcaram a época. Neste sentido, para analisar uma
música se faz necessário observar a relação entre texto e contexto da mesma. É importante
entender o sentido da canção e a forma como a música está inserida na sociedade e história,
sendo que vários cantores marcaram á história musical como: Caetano Veloso, Gonzaguinha,
Geraldo Vandré, Chico Buarque, Maria Bethânia e Don e Ravel.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A música por acessível a todas as camadas sociais, por meios de vários veículos de
comunicação ela torna uma fonte importante. E por ser fácil a sua propagação, as pessoas
absorvem com maior facilidade o conteúdo de sua letra, que codifica a mensagem que o autor
quer transmitir aos seus ouvintes. Dessa forma é possível descrever através das canções os
anseios de determinada sociedade situada em uma época especifica. E foi com este
pensamento voltado para um período recente de nossa historia, que usamos a música como
objeto de pesquisa para entender e explicar os movimentos, provocados por vários
acontecimentos internos e externos.
Baseado e um controle repressivo, os novos agentes do poder, controlam todos os
movimentos daqueles considerados perigosos para o regime instalado no País. E de uma
forma truculenta e agressiva eles procuram eliminar seus inimigos, usando todos os métodos
possíveis e imagináveis de torturas. Sob toda esta tensão surgem vários grupos que vão lutar
contra os desmandos arbitrários de um governo, que apropria das músicas de cantores como
Dom e Ravel. Para maquiar a face de uma Nação, e lhe dar uma falsa realidade da situação,
usando para isso as canções que exalta as belezas do Brasil. Sem ao menos perguntar se os
autores das melodias estavam de acordo, com seu uso em suas propagandas.
Os irmãos compositores e cantores, segundo este trabalho compuseram as melodias
embalados pelo clima de euforia proporcionado pela conquista da copa do mundo de 1970, no
México. Pegando carona com a seleção, lança uma música cantada de norte a sul do País. Por
ser de um conteúdo bastante ufanista, exaltando as belezas culturais e naturais do Brasil, vai
criar certo atrito com os intelectuais de esquerda que criticam suas músicas porque acha que
elas são apologéticas a política vigente praticada pela ditadura militar. Na verdade os cantores
Don e Ravel, de origem nordestina e de família humilde só queriam desenvolver um trabalho
artístico como meio de sobrevivência, como milhares de brasileiros que procura na música a
oportunidade de melhorar de vida.
E que eles procuram se encaixar dentro das exigências de um mercado competitivo
onde as oportunidades de sucesso são poucas, por que as portas são sempre fechadas para os
novos, que tentam entrar no mundo artístico, em um período que nosso país procura criar seu
próprio modelo de cultural se afirmando principalmente na música.
Ao tomar a decisão de gravar uma música de protesto, “Animais Irracionais em 1974”,
eles conseguem complicar ainda mais a situação, atraindo a raiva dos militares, e continuando
sendo rejeitado pelos intelectuais de esquerda. Neste período de censuras tanto de esquerda
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como de direita, a sobrevivência de cantores estão restritos ao tempo em que eles estão
relacionados, aqueles tutelados da ditadura tiveram a sua vida artística vinculada à duração do
regime, os censurados pelo sistema militar, vieram à tona com o retorno da democracia, e a
maioria deles estão na ativa na atualidade. Ao longo deste período, houve variadas formas de
manifestação a favor e contra, e a música foi uma das manifestações de maior destaque, por
ser subjetiva e criar no imaginário das pessoas, uma nova ótica de ver o mundo.
As músicas de Don e Ravel, ao longo das análises que fizemos verificaram em seu
conteúdo além do ufanismo exagerado, uma dosagem de sentimentos e preocupação com as
pessoas menos favorecidas tanto da zona rural como das periferias das grandes cidades.
Falando das desigualdades sociais, dos desmandos dos grandes sobre os pequenos, da luta do
homem do campo na produção de alimento para sustentar sua família, e a nação com suor de
seu próprio rosto. Respeitando uma seqüência de letras que fala de vários temas, como o amor
as belezas das mulheres e da natureza, a luta pela sobrevivência convidando as pessoas para
serem mais harmoniosas umas com as outras.
Toda esta luta em busca de seu espaço, em um período que o mercado da música esta
sendo direcionada para á indústria cultural de massa, com os meios de comunicação esta
sendo monopolizado pelas empresas de capital internacional. Don e Ravel começam á carreira
como compositores, compondo para outros cantores, só depois de algum tempo começa a
gravar seus discos.
Analisando todos estes aspectos da vida dos artistas percebemos que não há nenhum
vínculo deles com setores políticos nem de direita nem de esquerda, e que suas músicas não
foram feitas de encomendas para os militares, portanto eles não podem ser analisados somente
pelo viés político, o que incorreria em risco de uma analise incompleto prejudicando o
resultado da pesquisa. Nosso trabalho tem objetivo de demonstrar que há outros caminhos a
serem percorridos pelo historiador, para pesquisar um mesmo objeto com novas abordagens, é
que pretendemos em nossa pesquisa sobre a trajetória artística de Don e Ravel.
Por fim, esperamos que o nosso trabalho pudesse contribuir com novos pesquisadores,
que venha se interessar por esta temática.
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FONTES
Artista: Don & Ravel
Álbum: “Terra Boa”
Gravadora: RCA- VITOR, 1971
Canções: LP
1- Forró no escuro
2 - Eu te adoro meu amor
3 – Terra boa
4 - Todo o amor que eu sinto em mim
5 - Essa menina tá ficando moça
6- Na praia de Iracema
7 - Só o amor constrói
8 - Partido da barata / no meu barco eu vou de proa
9 - Será verdade que eu vou te perder?
10 - Papai noel, um velhinho camarada
11 - Você também é responsável
Artista: Don & Ravel
Álbum: “Animais Irracionais”
Gravadora: RCA- VITOR, 1974
Canções: LP
1 - Animais irracionais
2 - Marinheiro
3 - Conflito de gerações
4 - Todo dia, a mesma história
5 - O que é que você esta fazendo aí, meu bem?
6 - Se você me pudesse ouvir
7 - Laço de boi
8 - Rainha do mar
9 - Rondeiro do cruzeiro do sul
10 - O caminhante
11 - Os astronauta
Artista: Don & Ravel
Álbum: “Brasil, Cidade e Campo”
Gravadora: RCA- VITOR, 1982
Canções: LP
1- Êxodo rural
2 - Como diz o eclesiastes
3 - O menino da porteira
4 - Canção da fraternidade
5- Universos paralelos
6 - Saudade da minha terra
7 - Tristeza do jeca
8- Aurora
9 - Chico mineiro
10 – O brigado ao homem do campo
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Disponível em http://blogs.estadao.com.br/radar-politico/tag/dom-ravel/ Acessado em 28/12/2011 as
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