AVALIAÇÃO PSIQUIÁTRICA DO PACIENTE COM DOR Dr. João Paulo C. Solano Equipe de Controle da Dor ICHC-FMUSP Quando indicar avaliação Pq? • Suspeita de presença de sintomas emocionais, comportamentais ou transtornos psiquiátricos atuais (por ex., depressão, ansiedade, somatizações, hipocondria, estresse, uso de drogas etc) • História de transtornos psiquiátricos ou de tentativas de suicídio • Sintomas /queixas são maiores que os esperados • Pacientes com uso excessivo do sistema de saúde • Sintomas / dores que persistem por muitos anos • Suspeita de uso abusivo de analgésicos opioides (Adaptado de Angelotti & Sardá Jr., 2005) Principais comorbidades psiquiátricas da dor crônica • depressão • ansiedade • transtornos somatoformes - transtorno de somatização - hipocondria - transtorno doloroso somatoforme persistente • transtornos de personalidade - Borderline - Narcisista - Antissocial • histeria • transtorno factício • simulação • traços de personalidade que levam a desadaptações (como catastrofismo, comportamento doloroso crônico, autovitimização e histrionismo crônicos) DOR: experiência subjetiva resultante de múltiplas influências • Tipo de lesão e área lesada • Integridade das vias de neuromodulação • Experiências prévias com eventos dolorosos • História familiar e relações atuais com o ambiente • Estado de humor (depressão, ansiedade, medo) • Ganhos primário e secundário DOIS DADOS INTERESSANTES: Por que qualquer médico precisa de uma boa anamnese ? • Num período de 6 m, 60% dos pacientes com transtornos psiquiátricos consultamse com não-psiquiatras. • Pacientes com transtornos psiquiátricos têm uma tendência 2x maior de se consultarem com clínicos gerais, em comparação com pacientes nãopsiquiátricos. ANAMNESE EM PSIQUIATRIA • gr. Anámnésis: 'ação de trazer à memória, recordação'; • Identificação • Encaminhamento • QD • HPMA • ISDA ANAMNESE EM PSIQUIATRIA: HPMA abrangente • • • • início e a evolução da dor alterações prévias ou concomitantes na vida associações com fatores estressores tratamentos/intervenções já feitos e relacionados com a dor • consequências dos sintomas sobre o pragmatismo global • atitude do paciente frente ao problema da dor • atitude dos familiares coincidentes à condição ANAMNESE EM PSIQUIATRIA: AP • • • • • Psiquiátricos (incluindo tentativas de suicídio) Neurológicos Clínicos: doenças da infância, doenças transmissíveis e sequelas, imunizações, reações alérgicas e medicamentosas, doenças crônicas (DM, HAS, auto-imunes), idiopáticas, de transmissão genética, neoplasias, Aids, doenças com aspectos psicossomáticos relevantes Cirúrgicos: cirurgias, acidentes, traumatismos, lesões graves, internações, etc Medicações já utilizadas: uso prescrito ou nãoprescrito, abuso, dependência ANAMNESE EM PSIQUIATRIA: AF • Doenças na família: inquirir antecedentes psiquiátricos, neurológicos, clínicos, cirúrgicos, etc. • Medicamentos usados na casa. • Hábitos familiares. ANAMNESE EM PSIQUIATRIA: HISTÓRIA SOCIAL • • • • • • • Condições de vida e moradia. Nível educacional. Características culturais. História ocupacional. Situação trabalhista ou previdenciária Ambiente social. Constituição do núcleo familiar atual: idade e estado de saúde do cônjuge, filhos e agregados. Anamnese objetiva ou subjetiva? • Objetiva: feita com familiares ou amigos do paciente • Subjetiva: feita com o próprio paciente AMBAS SÃO NECESSÁRIAS!!! Comunicação verbal e não verbal Relação médico-paciente e a escuta ativa • Comunicação verbal vs não verbal • As contradições entre ambas • Comunicação não verbal: o que observar? - expressão facial - movimento e desvios dos olhos - movimentos da cabeça - movimentos do corpo/postura - voz: volume, entoação, ritmo, velocidade - aparências Relação médico-paciente e a escuta ativa Rapport: - compreensão; - entendimento; - aproximação entre duas pessoas com vistas a um “entrelaçamento” de experiências (ou ao estabelecimento de uma relação em que há igualdade de condições para a discussão). Rapport “Rapport é a capacidade de entrar no mundo de alguém, fazê-lo sentir que você o entende e que vocês têm um forte laço em comum. É a capacidade de ir totalmente do seu mapa do mundo para o mapa do mundo dele. É a essência da comunicação bem-sucedida” (Anthony Robbins, autor de livros nas áreas de negócios e administração) Relação médico-paciente e a escuta ativa • Estabelecer um rápido rapport: lugar / momento / apresentações nominais • Começar com perguntas abertas (se necessário) • Atitude do médico: interessada, não-crítica, envolvida, gentil. • Interrupções à entrevista: espaço físico, telefone, anotações, música. • “Hum...”; “Ah, sim...”; “E o que mais?...”(facilitação verbal e não verbal) • Evitar linguagem técnica demais 15 dicas para um bom rapport 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. Priorizar a fala espontânea inicial do paciente Não interromper o paciente até que o rapport esteja estabelecido Interromper somente para clarificar (durante todo o contato) Evitar mudanças de assunto Não fingir que está compreendendo o relato (não fingir em momento nenhum...) Explorar mais as áreas de interesse do paciente e aquelas que o abalaram emocionalmente Não escrever durante a entrevista (impossibilita observação de expressões faciais: choro, irritação, nojo, alegria, interesse, gratificação) Observar mudanças bruscas de humor, de tom e volume da voz, desvios do olhar etc Permitir ao paciente expressão de suas emoções sem demonstrar surpresa, espanto, reações irônicas Evitar interromper bruscamente o relato em busca de informações que faltam Evitar julgamentos morais (suas opiniões sobre religião e política também não interessam) Evitar discussões, evitar mostrar-se ansioso, impaciente ou irritado Evitar perguntas que envolvam mais de um tema simultaneamente (cuidado com as anamneses feitas em grupo) Deixar as perguntas fechadas (objetivas) para o final Lembrar que a avaliação inicial não precisa ser completada no primeiro encontro Além da anamnese detalhada, o que mais faz o psiquiatra? Exame Psíquico • • • • • • • Apresentação Atitude Contato Consciência Atenção Orientação Memória • • • • • • Senso-percepção Pensamento Inteligência Linguagem Humor e Afeto Volição e Pragmatismo • Psico-motricidade • Juízo crítico Dificuldades para a avaliação “objetiva” • • • • Confusão mental Demência Deficits intelectivos Quadros psicóticos Alternativas: • Desenho da relação corpo-dor • Comunicação não-verbal: choro, gemidos, agitação, observação do comportamento (sono e apetite, inclusive), mímica, padrão respiratório de desconforto Transtornos depressivo-ansiosos e dor crônica • 65% dos pacientes com depressão relatam uma ou mais queixas de dor • 5-85% dos pacientes com dor podem apresentar depressão • 30% dos pacientes com dor intratável têm transtornos ansiosos F45.0 - Transtorno de somatização • Mais comum em mulheres • Queixas físicas múltiplas, recorrentes e usualmente mutáveis, que ocorrem por um período de vários anos (mínimo de 2 a) • Resulta em longa e complicada história de tratamentos médicos e investigações / intervenções infrutíferas • Sintomas comuns: Trato GI; sensações cutâneas (prurido, sensibilidade, erupções/manchas, parestesias); queixas sexuais; queixas menstruais • Curso crônico e flutuante • Paciente geralmente nega causação não-médica • Prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes de funcionamento do indivíduo F45.2 – Hipocondria • Preocupação persistente com a possibilidade de ter um ou mais transtornos físicos sérios e progressivos causando os sintomas • Preocupações persistentes com supostas deformações e desfiguramentos • Recusa em aceitar reasseguramentos por parte dos médicos de que os sintomas não têm base física • Pacientes aceitam mal encaminhamento ao psiquiatra • Histrionismo • Duração mínima para o diagnóstico: 6 meses F 45.4 - Transtorno doloroso somatoforme persistente • Dor persistente, grave e angustiante, sem bases etiológicas orgânicas • Comportamento histriônico • Associação causal com conflitos emocionais ou problemas psicossociais • Exemplos: – lombalgia psicogênica; – fibromialgias obscuras etc Catastrofismo • Tipo de viés cognitivo em que o paciente interpreta distorcidamente a experiência de dor • Está relacionado à cronificação da dor • Ruminações sobre a sensação álgica • Amplificação da intensidade e/ou duração da dor • Sentimentos de desesperança • Tendência viciosa à autovitimização • Em pacientes com dor crônica, é preditor de intensidade da dor, grau de incapacidade e carga de sintomas psicológicos, independente do tipo de dor (de Boer MJ et al., 2012, Eur J Pain 16: 1044–52; Severeijns R et al., 2001, Clin J Pain 17, 165–72.) Um bom rapport entre médico e paciente é o prenúncio da cura ou do alívio dos sintomas - Lown, Bernard. A Arte Perdida de Curar. 3a. Ed, Plantarum, 2009. A confiança em seu médico é, muitas vezes, o primeiro e mais poderoso comprimido de remédio que o paciente irá experimentar em todo o tratamento.